Acórdão nº 1452/18.8BELSB-A de Tribunal Central Administrativo Sul, 10 de Outubro de 2019

Magistrado ResponsávelANA CELESTE CARVALHO
Data da Resolução10 de Outubro de 2019
EmissorTribunal Central Administrativo Sul

Acordam em conferência na Secção de Contencioso Administrativo do Tribunal Central Administrativo Sul: I – RELATÓRIO A......, devidamente identificado nos autos, veio interpor recurso jurisdicional da sentença proferida pelo Tribunal Administrativo de Círculo de Lisboa, datada de 14/05/2019, que no âmbito da ação administrativa urgente de contencioso de procedimentos de massa, instaurada contra o Centro de Estudos Judiciários, julgou a ação improcedente, absolvendo a entidade demandada dos pedidos formulados, relativos à impugnação dos atos de não graduação do Autor na Lista de Candidatos Conjunta de Graduados, de declaração de ilegalidade das normas dos n.ºs 2 e 3 do artigo 21.º do Regulamento do CEJ e a sua consequente desaplicação, e ainda a condenação à graduação do Autor na posição 70.º da Lista de Candidatos Conjunta de Graduados e consequente habilitação no 34.º Curso de Formação teórico-prática de Magistrados para os Tribunais Judiciais.

* Formula o aqui Recorrente nas respetivas alegações, as seguintes conclusões que infra e na íntegra se reproduzem: “I.

O Recorrente moveu a presente ação judicial com vista à declaração de nulidade ou anulação da: (i) Lista de Graduação Conjunta referente ao 34.º Curso de Formação teórico-prática de Magistrado para os Tribunais Judiciais, homologada por Despacho do Diretor do Centro de Estudos Judiciários, Juiz Conselheiro J................, publicada a 17.07.2018, a que corresponde o concurso para o preenchimento de 98 (noventa e oito) vagas, sendo 48 (quarenta e oito) na magistratura judicial e 50 (cinquenta) na magistratura do Ministério Público, divulgado pelo Aviso n.º 15620/2017, publicado em D.R., II Série, n.º 249, de 29 de dezembro de 2017 (cfr. documento n.º 1 junto com a Petição Inicial); (ii) Lista de Candidatos Habilitados à frequência do 34.º Curso de Formação teórico-prática de Magistrados para os Tribunais Judiciais, homologada por Despacho do Diretor do Centro de Estudos Judiciários, Juiz Conselheiro J............., publicadas a 17.07.2018 e a 02.08.2018 e referentes ao mesmo concurso (cfr. documentos n.ºs 2 e 3 juntos com a Petição Inicial).

II.

Concretamente, considerou o Recorrente que andou mal o Recorrido ao entender que o facto de o primeiro ter obtido classificação não positiva no segundo concurso o impediria de beneficiar da faculdade ínsita no n.º 6 do artigo 28.º do Regulamento – isto é, de dispensar a prestação de provas.

III.

Não obstante o entendimento veiculado pelo Recorrente, o Tribunal a quo julgou improcedente o recurso, considerando que “(…) o artigo 28.º, n.º 6 do mencionado diploma legal [da Lei n.º 2/2008, de 14 de janeiro] não confere aos candidatos aprovados mas não habilitados por falta de vaga que concorram no concurso imediatamente seguinte o direito de beneficiarem da classificação obtida no concurso anterior independentemente do resultado obtido no 2º concurso (…) do referido normativo legal não resulta que o candidato possa beneficiar dessa classificação (a obtida no concurso imediatamente anterior), na hipótese de, não obstante beneficiar da faculdade que lhe é concedida pelo artigo 28.º, n.º 6, optar por se candidatar ao concurso seguinte, não utilizando, deste modo, a referida prerrogativa. (…) verifica-se que um candidato nessa situação, na medida em que se submete a um novo procedimento de seleção, fica sujeito aos critérios gerais aplicáveis quanto à classificação e graduação nesse concurso, ficando a sua aprovação (e, consequentemente, a possibilidade de habilitação) no concurso dependente da obtenção da classificação igual ou superior a 10 valores (…)”.

IV.

Mais acrescentou que “(…) é uma opção individual e voluntária do candidato realizar as provas no concurso subsequente e como tal submeter-se ao regime de aprovação e exclusão a que estão sujeitos os demais candidatos, pelo que a decisão de exclusão e, consequentemente, de não graduação do candidato que, não obstante ter obtido aprovação no concurso imediatamente anterior, opta por prestar provas no concurso seguinte neste obtendo o resultado excluído, nos termos do artigo 24.º, n.º 2, alínea b), da Lei n.º 2/2008, decorrendo das regras legais aplicáveis ao procedimento, não se mostra violadora dos princípios da justiça, razoabilidade, igualdade, proporcionalidade, boa administração”.

V.

Não pode o Recorrente concordar com o mencionado julgado, porquanto o mesmo decorre de um manifesto erro de julgamento de Direito.

VI.

A título prévio, cumpre referir que o Tribunal recorrido baseou a sua decisão em acórdãos com reflexões ad latere que não constituíram o fundamento direto da sua parte decisória, ou seja, reflexões que, por definição, não merecem, nem têm que merecer (não mereceram não tinham que merecer) o cuidado e aprofundamento que por definição já assistem aos diretos fundamentos em que se apoiam (apoiaram) os arestos no normal labor jurisprudencial.

VII.

Note-se bem que a questão essencial nos autos prende-se com a interpretação do n.º 6 do artigo 28.º da Lei n.º 2/2008, de 14 de janeiro, na parte em que este normativo prevê que “Os candidatos aptos que não tenham ficado habilitados para a frequência do curso teórico-prático imediato, por falta de vagas, ficam dispensados de prestar provas no concurso imediatamente seguinte, ficando graduados conjuntamente com os candidatos que concorram a este” (realce e sublinhado nosso).

VIII.

Da leitura do mencionado preceito, resulta claro que a lei apenas faz depender a verificação de dois pressupostos para que seja atribuída a faculdade de reutilizar a classificação de um concurso no curso seguinte, a saber, (i) a aprovação em curso imediatamente anterior e a (ii) ausência de vagas que tenham impedido o candidato de ficar habilitado.

IX.

Se o candidato optar por realizar as provas no concurso imediatamente seguinte para efeitos de melhoria de classificação, como expressamente prevê o regulamento, no caso de nestas não obter classificação positiva, nada diz a lei, e nada diz também o regulamento que a executa, nem sequer de forma subentendida, no sentido de ver ele (candidato) precludido o direito que a lei incondicionadamente lhe confere de aproveitar a classificação obtida no concurso anterior.

X.

Na tese do Tribunal a quo, uma vez que da Lei n.º 2/2008 não resulta expresso que um candidato possa beneficiar da classificação obtida em concurso anterior caso não obtenha aprovação no seguinte, o candidato terá que obter aprovação nos dois concursos.

XI.

O mais grave é que não é isso, sequer, que se extrai da interpretação literal do n.º 6 do artigo 28.º da Lei n.º 2/2008.

XII.

Note-se que da lei resulta que um candidato que tenha obtido aprovação no concurso imediatamente anterior e não tenha ingressado por falta de vagas tem a faculdade (conferida automaticamente) de não prestar novas provas no concurso imediatamente seguinte, aproveitando, deste modo, a classificação obtida para efeitos de graduação com os demais candidatos que tenham ficado aprovados no concurso imediatamente seguinte.

XIII.

Não existe qualquer preceito que determine que (na bizarra formulação negativa inventada pelo CEJ) o “não exercício da faculdade concedida pela lei” (diga-se, a de não prestar provas), ou, em formulação positiva (como deve ser), o exercício pelo candidato da faculdade expressamente conferida pelo regulamento de prestar novas provas (para tentar subir a classificação anteriormente obtida), tal «não exercício» ou «exercício», dizia-se, possa ter como consequência (designadamente, caso nestas novas provas obtenha uma classificação negativa) a perda da classificação obtida no concurso anterior e, por maioria de razão, da aptidão já demonstrada! XIV.

Se é certo que o artigo 9.º/1 do Código Civil prevê que “[a] interpretação não deve cingir-se à letra da lei, mas reconstituir a partir dos textos o pensamento legislativo, tendo sobretudo em conta a unidade do sistema jurídico, as circunstâncias em que a lei foi elaborada e as condições específicas do tempo em que é aplicada”, o facto é que, ressalva o n.º 2 do mesmo artigo, “[n]ão pode, porém, ser considerado pelo intérprete o pensamento legislativo que não tenha na metra da lei um mínimo de correspondência legal, ainda que imperfeitamente expresso”.

XV.

Por outro lado, entende o Tribunal a quo que um candidato que, nas circunstâncias em apreço, apresenta uma segunda candidatura se submete às regras desse segundo concurso, tendo como tal que obter aprovação positiva.

XVI.

Não se alcança, todavia, em que normativo (ou sequer em que princípio) encontrou o julgador a quo base para tal entendimento, sendo certo que da leitura do próprio n.º 6 do artigo 28.º da Lei n.º 2/2008 parece resultar precisamente o contrário.

XVII.

Ao permitir a lei que um candidato não habilitado por falta de vagas (num primeiro concurso) apresente candidatura ao concurso imediatamente seguinte e beneficie da classificação obtida no anterior, a lei está precisamente a vincar a existência de comunicabilidade entre os dois concursos.

XVIII.

Note-se que o propósito num e noutro concurso é o mesmo: aferir da aptidão de um candidato para ingressar no curso de formação teórico-prática para magistrados.

XIX.

Por conseguinte, a avaliação a levar a cabo pelo CEJ sobre um candidato que já foi declarado apto em concurso anterior só releva para efeitos de ordenação final dos candidatos aptos, uma vez que é pacífico o decorrer diretamente da lei o direito de o candidato aproveitar a nota obtida no primeiro concurso.

XX.

Atente-se, desde já, que a necessidade de “ficarem aptos”, estabelecida no n.º 2 do artigo 21.º do regulamento do CEJ, reporta-se a concurso imediatamente anterior, porquanto será graduado no “concurso seguinte” – diferentemente do que afirma a sentença recorrida, num claro erro de leitura que foi (desastrosamente) decisivo para os respetivos conteúdo e sentido.

XXI.

Saliente-se que o Regulamento, em execução da norma legal que visa regulamentar – e assumindo, corretamente, que a dita norma...

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