Acórdão nº 2157/16.0BELSB de Tribunal Central Administrativo Sul, 10 de Outubro de 2019

Magistrado ResponsávelALDA NUNES
Data da Resolução10 de Outubro de 2019
EmissorTribunal Central Administrativo Sul

Acordam, em conferência, na Secção de Contencioso Administrativo do Tribunal Central Administrativo Sul: Relatório O Ministério Público intentou, contra K.........., ação, com processo especial, de oposição à aquisição da nacionalidade portuguesa, pedindo que, por falta de ligação efetiva da requerida à comunidade nacional, se ordene o arquivamento do processo pendente na Conservatória dos Registos Centrais conducente ao registo da aquisição dessa nacionalidade.

Por sentença do TAC de Lisboa, foi a ação julgada procedente.

Inconformada a requerida interpôs recurso para este TCA-Sul, tendo nas alegações formulado as conclusões seguintes: 1. «A douta sentença recorrida, em violação do artigo 342º nº 1 do Código Civil, impõe à ora Recorrente o ónus da prova de se encontrar a residir em território Português há pelo menos 5 (cinco) anos, quando cabe ao Ministério Público o ónus da prova (e alegação) desse facto constitutivo.

  1. Uma vez que o ónus da prova cabe ao Ministério Público, o qual não logrou provar, ao longo do processo, que impedissem a aquisição da Nacionalidade Portuguesa pela aqui Recorrente, mal andou a sentença recorrida ao preencher esse ónus de falta de alegação, em violação da distribuição do ónus da prova, como firmado na Jurisprudência do Supremo Tribunal Administrativo, em especial os seus Acórdãos nºs 3/2016 e 4/2016.

  2. Termos em que deve ser valorado o erro de julgamento, error in judicando, na medida em que não se logrou fazer prova dos factos impeditivos de aquisição por parte da Recorrente da nacionalidade Portuguesa, revogando-se a douta Sentença Recorrida, uma vez que a mesma subverte esta lógica de distribuição do ónus da prova e coloca na Recorrente esse mesmo ónus.

  3. Do mesmo modo, não se logrou cumprir a densificação ou o efetivo preenchimento do conceito indeterminado de «inexistência de ligação efetiva à comunidade nacional», uma vez que, cabendo o ónus da prova ao Autor - Ministério Público - e não tendo este provado factos que conduzissem à procedência da oposição, isto é, não resultando invocada na Petição Inicial qualquer facto que prove a Ré não tem ligação com a comunidade nacional, não se pode concluir pela inexistência de ligação efetiva deste à comunidade nacional, o que obsta à procedência da oposição e à procedência da contestação.

  4. Não se pode concluir que está verificado o fundamento da oposição à aquisição da nacionalidade portuguesa – inexistência de ligação efetiva da Ré à comunidade nacional, uma vez que nenhum facto é objetivamente invocado pelo Ministério Público que consubstancie ou concretize este conceito, sendo que cabe ao Autor o ónus da alegação (e prova) dos factos negatórios dos fatores de integração real ou de ligação efetiva à portugalidade, isto é à nação portuguesa como uma comunidade histórico - cultural e para tal seria necessário que se alegasse e provasse, nomeadamente, “que a Ré nunca tenha vindo ou residido em Portugal, e ou que não convive com portugueses, e ou que não conhece a comida e a música portuguesas, e ou que não sabe História de Portugal, e ou que não sabe quem governa o país, etc.” (5, neste sentido, acórdão do TCA Sul, de 4.10.2017, processo nº 1596/16.0BELSB).

  5. Em abono da verdade, não existe qualquer densificação do conceito indeterminado de «inexistência de ligação efetiva à comunidade nacional», apenas ilações sem substrato, dado que o Ministério Público não logrou alegar, nem provar, tal como lhe competia, factos que consubstanciassem esse conceito indeterminado, encontrando-se a Sentença Recorrida assente em conclusões sem suporte factual, termos em que deve ser a mesma revogada».

    O Ministério Público contra-alegou o recurso, concluindo: «1. Foi instaurada a presente ação pelo Ministério Público contra K.........., menor, em virtude de ter considerado que no processo (nº ...../16) instaurado na Conservatória dos Registos Centrais não resultavam quaisquer elementos comprovativos ou indicadores da ligação da mesma à comunidade nacional, para os efeitos do artigo 9º alínea a) da Lei nº 37/81 de 3 de outubro.

  6. Os factos considerados provados e a fundamentação da sentença permitem concluir que o Ministério Público logrou demonstrar a inexistência de ligação efetiva à comunidade nacional por parte da Requerida.

  7. Caso a Requerida hoje apresentasse novo pedido de aquisição de nacionalidade portuguesa com os mesmos factos que constam no processo (...../16) da Conservatória dos Registos Centrais, também não seria possível presumir a sua ligação efetiva à comunidade nacional, uma vez que não reside em território nacional nos cinco anos imediatamente anteriores ao pedido, não reunindo também os outros requisitos enunciados no artigo 56º nº 3 do DL nº 237-A/2006 de 14 de dezembro, com as últimas alterações introduzidas pelo DL nº 71/2017 de 12 de junho (Regulamento da Nacionalidade Portuguesa).

  8. A sentença recorrida não enferma de erro de direito, pelo que o recurso não deverá obter provimento».

    Colhidos os vistos vêm os autos à Conferência para decisão.

    Fundamentação De facto.

    Na sentença recorrida foi fixada a seguinte matéria de facto: 1. «A Requerida nasceu a 13.8.2006, em Água Grande. S. Tomé, República de S. Tomé e Príncipe (cfr. fls. 53); 2. É filha de Eneias .......... e Uelba .........., ambos naturais de S. Tomé e Príncipe (idem e de fls. 24 a 25); 3. O seu pai, nascido em 26.1.1974, veio a adquirir nacionalidade portuguesa, ao abrigo do artigo 6º, nº 6, da Lei nº 37/81, de 3 de outubro, conforme registo lavrado no assento de nascimento nº .........., de 3.12.2014 (cfr. fls. 12 a 13); 4. W.........., irmão do pai da Requerida, nascido em 17.6.1976 em Água Grande, veio a adquirir nacionalidade portuguesa, ao abrigo do artigo 6º, nº 4, da Lei nº 37/81, de 3 de outubro, conforme registo lavrado no assento de nascimento nº .........., de 4.8.2014 (cfr. fls. 14 a 15); 5. I.........., irmão do pai da Requerida, nascido em 6.1.1981 em São Tomé, veio a adquirir nacionalidade portuguesa, ao abrigo do artigo 6º, nº 4, da Lei nº 37/81, de 3 de outubro, conforme registo lavrado no assento de nascimento nº .........., de 20.5.2014 (cfr. fls. 16 a 17); 6. A.........., irmão do pai da Requerida, nascido em 7.11.1983 em São Tomé, veio a adquirir nacionalidade portuguesa, conforme registo lavrado no assento de nascimento nº .........., de 13.8.2014 (cfr. fls. 18); 7. Elisabete .........., irmã do pai da Requerida, nascida em 21.3.1970 em Madalena, veio a adquirir nacionalidade portuguesa, ao abrigo do artigo 6º, nº 6, da Lei nº 37/81, de 3 de outubro, conforme registo lavrado no assento de nascimento nº .........., de 6.11.2013 (cfr. fls. 19 a 20); 8. Em 4.3.2016, os pais da Requerida, na qualidade de representantes legais, mediante...

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