Acórdão nº 332/17.9T8MCN.P1.S1 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 04 de Julho de 2019

Magistrado ResponsávelOLINDO GERALDES
Data da Resolução04 de Julho de 2019
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)

Acordam no Supremo Tribunal de Justiça: I – RELATÓRIO AA instaurou, em 6 de abril de 2017, no Juízo Local Cível de ....., Comarca do ....., contra BB, S.A., e CC, S.A., ação declarativa, sob a forma de processo comum, pedindo que a Ré BB fosse condenada a entregar à Ré CC o montante que vier a verificar-se necessário para a liquidação do mútuo concedido pela R. CC à Autora e marido, com a extinção da obrigação creditória e a extinção da obrigação de pagamento do prémio da apólice n.º 000000000000; que a R. BB fosse condenada a pagar-lhe os montantes que entregar à R. CC, para liquidação do mútuo, desde 26 de junho de 2014, acrescido dos juros de mora vencidos e vincendos; que a R. BB fosse condenada a restituir-lhe todos os prémios pagos referentes à referida apólice, após o falecimento do marido até à data em que a R. BB liquide integralmente o mútuo à R. CC, acrescido dos juros de mora vencidos e vincendos; e que a R. CC fosse condenada a reconhecer a extinção, por cumprimento, da sua obrigação emergente do contrato de mútuo.

Para tanto, alegou, em síntese, que, sendo casada com DD, compraram um prédio urbano, em 2002, com um financiamento da R. CC, por força do qual subscreveram, com a R. BB, um contrato de seguro do ramo vida, tendo como beneficiária a R. CC, o qual cobria, designadamente, o risco por morte dos segurados; o seu marido faleceu no dia 26 de junho de 2014, vítima de lesões provocadas por queda; nessa data, do mútuo, encontrava-se por pagar a quantia de € 35 507,65, que a R. BB declina pagar.

Contestou a R. BB, alegando, em síntese, que não tem a obrigação de indemnizar devido aos hábitos alcoólicos do falecido, o qual era portador de uma taxa de alcoolémia de 1,45 g/lo sangue, nos termos do art. 94.º do DL n.º 72/2008, e concluindo pela sua absolvição do pedido.

Realizou-se uma audiência prévia, durante a qual foi proferido o despacho saneador, identificado o objeto do litígio e enunciados os temas da prova.

Realizada a audiência de discussão e julgamento, foi proferida, em 20 de março de 2018, sentença que, julgando a ação parcialmente procedente, condenou a R. BB a pagar à R. CC a quantia em dívida à data da morte do marido da A., por conta do mútuo celebrado pelos mesmos com a R. CC; condenou a R. BB a pagar à A. todas as quantias por esta pagas, quer a título de amortização do mútuo, quer a título de pagamento de prémios do contrato de seguro, desde a data da morte do marido até efeito e integral pagamento; e relegou para liquidação a quantificação das quantias referidas em primeiro lugar, se necessário fosse.

Inconformada, a R. BB apelou para o Tribunal da Relação do Porto, que, por acórdão de 12 de fevereiro de 2019, revogando a sentença, absolveu a R. BB dos pedidos contra si formulados.

Inconformada com o acórdão, a Autora recorreu para o Supremo Tribunal de Justiça, e, tendo alegado, formulou essencialmente as conclusões:

  1. O Tribunal a quo teria de concluir pela aplicação do regime das cláusulas contratuais gerais ao contrato.

  2. Por isso, as cláusulas de exclusão das responsabilidades indemnizatórias devem considerar-se excluídas do contrato de seguro.

  3. Impendia sobre a R. o ónus probatório do cumprimento da comunicação adequada e efetiva das cláusulas contratuais que invoca como de exclusão da responsabilidade.

  4. A R. não logrou provar o cumprimento dos deveres de comunicação e informação imposto pelos arts. 5.º e 6.º do DL n.º 446/85, de 25 de outubro.

  5. As cláusulas de exclusão invocadas pela R. devem considerar-se excluídas do contrato de seguro, por aplicação do art. 8.º do DL n.º 446/85.

  6. Não se provou, ainda, o nexo de causalidade entre a taxa de álcool e a morte, exigível pela respetiva cláusula.

  7. A R., ao conformar-se com certos hábitos de consumo de álcool, não pode opor a cláusula de exclusão, incorrendo, com tal, em abuso do direito, por violação dos princípios da boa-fé e da confiança (art. 15.º do DL n.º 446/85).

  8. A circunstância do segurado não ter comunicado a alteração do seu estado de saúde e eventual agravamento do risco na vigência do contrato é irrelevante no caso.

Com a revista, a Autora pretende a revogação do acórdão recorrido e a sua substituição por decisão que condene a R. BB a pagar à R. CC a quantia em dívida à data da morte do marido, por conta do mútuo, e a pagar-lhe as quantias por si pagas, quer a título de amortização do mútuo, quer a título de pagamentos de prémios do contrato de seguro, desde a morte do marido até efetivo e integral pagamento.

Contra-alegou a R. BB, no sentido da improcedência do recurso.

Corridos os vistos legais, cumpre apreciar e decidir.

Em discussão está, essencialmente, a interpretação da cláusula geral do contrato de seguro, que exclui a responsabilidade civil da seguradora pelo sinistro.

II – FUNDAMENTAÇÃO 2.1. A Relação deu como provados os seguintes factos: 1.

A A. contraiu matrimónio, sob o regime da comunhão de adquiridos, com DD.

  1. O casamento vigorou até à morte deste, ocorrida em 26 de junho de 2014.

  2. Deixou como única herdeira a A.

  3. Na constância do matrimónio, em 1 de outubro de 2002, a A. e o marido adquiriram, por contrato de compra e venda, um prédio urbano composto por casa de habitação, sito no lugar de ......, da extinta freguesia de Várzea ......., descrito na Conservatória do Registo Predial de ..... sob o n.º 1316.

  4. Posteriormente, o casal solicitou à CC a concessão de crédito à habitação/construção, com hipoteca, que lhes veio a ser concedido, no valor de €...

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