Acórdão nº 653/14.2T8LRS.L1.S1 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 01 de Outubro de 2019

Magistrado ResponsávelRAIMUNDO QUEIRÓS
Data da Resolução01 de Outubro de 2019
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)

Acordam no Supremo Tribunal de Justiça I- Relatório: AA intentou contra BB, S. A.

acção declarativa de condenação, com processo comum pedindo a condenação da ré no pagamento da quantia de € 111 126,82 (cento e onze mil cento e vinte e seis euros e oitenta e dois cêntimos) e o mais que se apurar a final, acrescida de juros à taxa legal desde a citação e até integral pagamento.

Alegou, o seguinte: - No dia 22 de Outubro de 2010, pelas 12 h. e 15 min., no IC 2, ao km 35,077, ocorreu um acidente de viação em que foram intervenientes o veículo automóvel, marca ...

, com a matrícula ...-ZX, conduzido pelo autor e propriedade de seu pai, e o veículo automóvel, marca ...

, com a matrícula ...-XN, conduzido pelo seu proprietário, onde a estrada forma uma ligeira descida, com curva à direita, pouca visibilidade, no sentido Norte-Sul; - O acidente ocorreu quando o veículo XN efectuava uma manobra de ultrapassagem a um veículo pesado de mercadorias e consistiu numa colisão frontal entre os dois veículos, sendo que o ZX circulava na sua mão de trânsito, no sentido Sul-Norte e o XN, a uma velocidade superior a 100 km/hora, no sentido Norte-Sul, tendo invadido a faixa de rodagem destinada ao trânsito em sentido contrário, onde se deu o embate; - Em consequência do acidente o autor sofreu múltiplas lesões e foi submetido a várias intervenções cirúrgicas, tendo suportado 720 dias de doença, com internamento hospitalar e incapacidade absoluta para o trabalho, ficando afectado de incapacidade permanente, pelo que lhe são devidas as correspondentes indemnizações; -A responsabilidade civil decorrente dos riscos da circulação do veículo XN, único causador do acidente, encontrava-se transferida, à data dos factos, para a seguradora ré.

A ré seguradora contestou impugnando os factos atinentes à dinâmica do acidente, porquanto o veículo ZX saiu da sua via de trânsito e invadiu repentinamente a via de trânsito por onde circulava o XN, tendo o embate ocorrido nesta via, vindo o XN a ser direccionado contra os rails de segurança situados no limite direito da via e depois impulsionado para a via contrária, onde se imobilizou, pelo que imputa a responsabilidade do acidente a culpa do condutor do ZX. Concluiu no sentido da improcedência da acção e sua absolvição do pedido.

Realizada a audiência final, foi proferida sentença (cf. fls. 633 a 640) que considerou não estar demonstrada uma conduta violadora de qualquer norma rodoviária ou de outra natureza por parte do condutor do XN e quanto à conduta do condutor do ZX, caso estivesse a efectuar uma ultrapassagem, a colisão com o veículo XN revela que o autor violou o disposto no art.º 38º, n.ºs 1, 2, a), 3 e 4 do Código da Estrada, pelo que o considerou como o único responsável pelo acidente e, por via disso, absolveu a ré dos pedidos deduzidos pelo autor e pelo Instituto da Segurança Social, IP.

Inconformado o Autor interpôs recurso de apelação para o Tribunal da Relação de Lisboa.

Este Tribunal por acórdão proferido, em 12 de Março de 2019, julgou parcialmente procedente a apelação, e, em consequência: -Julgou improcedente a impugnação da matéria de facto; - Alterou a decisão recorrida nos seguintes termos: Condenar a ré/recorrida BB, S. A. no pagamento ao autor/recorrente da quantia global de € 66 676,09 (sessenta e seis mil seiscentos e setenta e seis euros e nove cêntimos) acrescida de juros de mora, à taxa legal de 4% calculados nos termos acima expostos, desde a data da presente decisão, absolvendo-a do demais peticionado. Do acórdão da Relação veio a ré BB SA, interpor recurso de revista, formulando as seguintes conclusões de alegações: 1-O douto Acórdão de que agora se recorre, não deu provimento à pretensão do autor/recorrente de ver alterada a matéria de facto, tendo mantido intacta a factualidade provada e não provada constante da decisão da 1ª Instância.

2-Por isso, na aplicação do direito o Tribunal da Relação tem de ter em conta a factualidade que decidiu manter.

3-Não tendo o acidente ficado a dever-se ao risco próprio dos veículos intervenientes, mas antes à culpa efectiva e exclusiva do autor/recorrente, não pode o Tribunal julgar na base da responsabilidade pelo risco.

4-Do comportamento do condutor do veículo segurado na Ré, o XN, não decorre qualquer facto susceptível de haver contribuído, em termos de causalidade, para a produção do acidente versado nos autos.

5-Contrariamente ao condutor do XN, o autor/recorrente, ao conduzir o ZX da forma que resultou da prova, violou o disposto no artigo 13º nº 1 do Código da Estrada, o qual estatui que: "A posição de marcha dos veículos deve fazer-se pelo lado direito da faixa de rodagem, conservando das bermas ou passeios uma distância suficiente que permita evitar acidentes".

6-O veículo conduzido pelo Recorrente, saiu da sua mão de trânsito, invadiu a faixa de sentido contrário, onde ocorreu a colisão. É o que resulta do facto X do elencos dos provados, que refere ter o XN tombado e atravessado toda a faixa de rodagem da direita para a esquerda.

7-O mesmo sinistro já anteriormente julgado com decisões transitadas em julgado, nas duas instâncias, criminal e cível, com avaliações claras, quais sejam, as de imputar a responsabilidade exclusiva pelo evento danoso ao condutor do ZX, porquanto invadiu a faixa de circulação de sentido contrário ao seu, tendo em qualquer destas acções ficado provado que a colisão entre os veículos ocorreu na via de trânsito destinada ao sentido Cheganças-Carregado.

8-Sem conceder, a dúvida que o Tribunal a quo manifestou acerca da responsabilidade pelo sinistro, implicaria a imputação ao veículo segurado na R. ora recorrente de uma proporção do risco nunca superior a 50%.

9-O Venerando Tribunal da Relação de Lisboa, ao alterar a decisão da 1ª Instância, por erro de interpretação e aplicação da lei violou e/ou não considerou correctamente o disposto nos artºs 483 nº 2 , 506º e 570 do C.Civil.

O Autor contra-alegou pugnando pela manutenção do acórdão recorrido.

II- Objecto do Recurso Nos termos dos art.ºs 635.º, n.º 4 e 639.º, n.º 1 do CPC, é pelas conclusões do recorrente que se define o objecto e se delimita o âmbito do presente recurso, sem prejuízo das questões de que este tribunal ad quem possa ou deva conhecer oficiosamente, apenas estando adstrito à apreciação das questões suscitadas que sejam relevantes para conhecimento do objecto do recurso.

Assim, perante as conclusões da alegação do ora Recorrente há que apreciar as seguintes questões: A)- A imputação da responsabilidade subjectiva pela verificação do sinistro ao Autor ou, alternativamente, a imputação do evento danoso ao risco decorrente da circulação rodoviária.

B- A imputação a título de responsabilidade pelo risco na proporção de 60% para o veículo XN segurado pela Ré e 40% para o veículo ZX conduzido pelo Autor.

Colhidos que se mostram os vistos, cumpre apreciar e decidir.

III - FUNDAMENTAÇÃO FUNDAMENTOS DE FACTO O acórdão sob recurso considerou como provados os seguintes factos: i. No dia 22 de Outubro de 2010, pelas 12 h. e 15 min., no IC2, ao km 35,077, ocorreu um acidente de viação em que foram intervenientes os veículos ..., matrícula ...-ZX, conduzido por AA, e ..., matrícula ...-XN, conduzido por CC.

ii. No local do acidente, o IC2 forma uma ligeira descida, com pouca visibilidade, no sentido Norte/Sul.

iii. No local não havia sinais limitadores de velocidade.

iv. Estava bom tempo.

v. O trânsito era intenso nos dois sentidos, sobretudo com a circulação de veículos pesados de mercadorias.

vi. O veículo ZX circulava no sentido Sul/Norte.

vii. O veículo XN circulava no sentido Norte/Sul.

viii. O ZX e o XN colidiram de frente.

ix. Com a força do embate, o XN fica sem...

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