Acórdão nº 6537/17.5T8CBR.C1.S1 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 02 de Maio de 2019
Magistrado Responsável | BERNARDO DOMINGOS |
Data da Resolução | 02 de Maio de 2019 |
Emissor | Supremo Tribunal de Justiça (Portugal) |
Reclamação do Art.º 652º nº 3 do CPC * ** Na sequência da notificação do acórdão proferido pelo Tribunal da Relação de Coimbra, AA veio interpor recurso de revista, que foi admitido. Recebidos os autos neste Tribunal, o relator entendeu que a revista não seria admissível e proferiu despacho a convidar o recorrente a pronunciar-se. Este veio defender a admissibilidade do recurso.
De seguida foi proferido despacho de não admissão do recurso, do seguinte teor: «BB, intentou contra AA, acção de divórcio sem consentimento do outro cônjuge, pedindo além do decretamento do divórcio a condenação do réu no pagamento de uma pensão de alimentos no montante de €250,00 mensais.
Citado o R. e realizada a tentativa de conciliação, as partes aceitaram convolar o divórcio para mútuo consentimento. Porém uma vez que não houve acordo quanto aos alimentos pedidos, o processo prosseguiu os seus termos para apreciação dos efeitos do divórcio quanto aos alimentos pedidos pela A. Realizado o julgamento foi decretado o divórcio por mútuo consentimento e foi julgado improcedente o pedido de alimentos. Inconformada veio a A. apelar para a Relação de Coimbra que, apreciando o recurso, deliberou conceder-lhe provimento parcial e condenou o R. no pagamento de uma pensão de alimentos no montante de €90,00, por mês.
Desta vez foi o R. que não aceitou o decidido e resolveu interpor recurso de revista. Recebidos os autos neste Tribunal, o relator por entender que o recurso não seria admissível, em razão do valor da sucumbência, ordenou a notificação das partes nos termos do disposto no art.º 655º nº 1, do CPC, para em 10 dias se pronunciarem sobre a eventual não admissão do recurso.
Respondeu o recorrente defendendo que atento o valor da acção €30.000,01, a revista seria admissível.
Cumpre apreciar e decidir.
Em regra, para que uma decisão judicial admita recurso ordinário, é necessário que a causa tenha valor superior à alçada do Tribunal de que se recorre e que a decisão seja desfavorável para o recorrente em valor também superior a metade da alçada desse Tribunal (art.º 629º n.º 1 do CPC). Que o valor da causa excede a alçada deste Tribunal, não há dúvidas, porém já não se passa o mesmo com o valor da sucumbência do recorrente. Com efeito tal valor é muito inferior a metade do valor da alçada do Tribunal recorrido. Na verdade na apelação estava apenas em causa a fixação de alimentos à A.. Esta pedia uma pensão no valor mensal de €250,00. Considerando o critério legal estabelecido no nº 3 do art.º 298º do CPC, para a determinação do valor da causa em matéria de alimentos, teríamos que o valor dos mesmos seria de €15.000,00 (quinze mil euros). Este seria o valor do decaimento se o R. tivesse sido condenado no pedido. Ora este valor é inferior a metade do valor da alçada do Tribunal recorrido e consequentemente mesmo na hipótese de ter ficado integralmente vencido quanto ao pedido de alimentos, tal decisão não seria passível de revista em virtude do valor da sucumbência ser inferior a metade do valor da alçada dos Tribunais da Relação. Acontece que o R. não foi condenado no pedido formulado pela A., mas apenas numa pensão mensal de €90,00. Utilizando o critério previsto no nº 3 do art.º 298º do CPC, para a determinação do valor de uma acção de alimentos em que fosse pedida uma pensão mensal de €90,00, teríamos um valor de €5.400,00 (cinco mil e quatrocentos euros). Este será pois o valor da sucumbência do R. Ora sendo o valor da sucumbência de €5.400,00, muito inferior a metade do valor da alçada do tribunal recorrido é obvio que o acórdão da Relação que assim decidiu não admite recurso ordinário de revista, por falta de verificação de um dos pressupostos previsto no art.º 629º n.º 1 do CPC – sucumbência superior a metade da alçada do Tribunal de que se recorre).
Deste modo, pelo exposto e porque o despacho que admitiu o recurso no Tribunal da Relação não vincula o Tribunal superior (art.º 641º nº 5 do CPC), decide-se não admitir a revista».
* ** Mais uma vez inconformado veio o recorrente reclamar para a conferência nos termos do disposto no art.º 652º nº 3 e 679º do CPC, tendo alegado o seguinte: « 1.º Ao que aqui releva cumpre aludir, desde já, ao aresto deste digno Supremo Tribunal de 8 de fevereiro de 2011, proferido no âmbito do processo n.º 984/2002.L1.S1, onde foi relator Exmo. Sr. Dr. Juiz Conselheiro Nuno Cameira, cujo sumário dispõe: “I - Cabe à conferência a competência para apreciar, no quadro do art 700.º, n.º 3, do CPC, a reclamação do despacho do relator no STJ que, no uso dos poderes que a al. e) do n.º 1 do mesmo preceito expressamente lhe confere, julgou findo o recurso de agravo, por inadmissibilidade.
II - A situação não é subsumível à previsão do art. 688.º do CPC se o que está em causa apreciar é o bem fundado de um despacho do relator no STJ e não do relator na 2.ª instância, que não tenha admitido o agravo interposto.” 2.º Embora reportado à antiga lei processual civil, sempre se dirá que o antigo art.700.º, n.º 3 deu lugar ao atual 652.º, n.º 3, bem como o anterior 688.º equivale hoje ao art. 641.º do CPC.
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No mesmo sentido, cfr. Acórdão de Uniformização de Jurisprudência, proferido pelo Supremo Tribunal de Justiça de 20 de janeiro de 2010, no âmbito do processo n.º 103-H/2000.C1.S1, onde foi relator Exmo. Sr. Dr. Juiz Conselheiro João Bernardo: “Fora dos casos previstos no artigo 688.º do Código de Processo Civil (na redacção anterior ao Decreto-Lei n.º303/2007, de 24.9), apresentado requerimento de interposição de recurso de decisão do relator, que não seja de mero expediente, este deverá admiti-lo como requerimento para a conferência prevista no artigo 700.
° n.° 3 daquele código.” 4.° Como tal, importa trazer os arestos supra citados aos autos em causa, a fim de aferir da legitimidade do ora Recorrente para, por meio do presente requerimento dirigido à Conferência, solicitar Acórdão sobre a matéria visada.
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Com efeito, um cenário é o postulado pelo anterior art. 688.°, atual 641.° do CPC e o outro é o refletido pelo antigo art. 700.°, n.° 3, atual 652.°, n.° 3 do mesmo diploma legal.
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Assim, como é possível inferir das decisões ora transcritas, o primeiro reporta-se à possibilidade de o requerimento de interposição de Recurso ser rejeitado pelo próprio tribunal onde o requerimento é apresentado - o tribunal a quo - aqui, por força do n.º 6 do art. 641.º cabe reclamação, dirigida ao tribunal superior, aquele que seria competente para conhecer do recurso, elaborada nos termos do art. 643.º do CPC.
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No entanto, o segundo cenário ou hipótese e aquela que os autos refletem é a de depois de admitido o requerimento de interposição de...
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