Acórdão nº 477/19 de Tribunal Constitucional (Port, 25 de Setembro de 2019

Magistrado ResponsávelCons. Claudio Monteiro
Data da Resolução25 de Setembro de 2019
EmissorTribunal Constitucional (Port

ACÓRDÃO Nº 477/2019

Processo n.º 625/19

1.ª Secção

Relator: Conselheiro Claudio Monteiro

Acordam, em Conferência, na 1.ª Secção do Tribunal Constitucional

I – Relatório

1. Nos presentes autos, vindos do Tribunal da Relação do Porto, A. interpôs recurso de constitucionalidade, ao abrigo do artigo 70.º, n.º 1, alínea b), da Lei n.º 28/82, de 15 de novembro (Lei da Organização, Funcionamento e Processo do Tribunal Constitucional, doravante designada por LTC), do acórdão proferido naquele tribunal em 21 de fevereiro de 2019, que negou provimento ao recurso pelo mesmo interposto relativamente ao despacho datado de 4 de dezembro de 2018, que indeferiu arguição de nulidade referente a despacho que determinara o cumprimento do disposto no n.º 6 do artigo 139.º do Código de Processo Civil (CPC).

2. O objeto do recurso de constitucionalidade foi delimitado pelo recorrente, no requerimento de interposição do recurso, nos seguintes termos:

«(…) as disposições dos números 6 e 7 do art.139° do CPC, conflituam com o postulado no 5 do art.29° da CRP, dado estarmos perante duas sanções de natureza tributária.

7-De resto, sempre aqueles normativos deviam ser objeto de um juízo de inconstitucionalidade material, por violarem o princípio da razoabilidade e da proporcionalidade, como parâmetros de invalidade da norma legislativa com força obrigatória geral, bem como ofendem diretamente o seu art.º 13.º.».

3. Por despacho de 15 de março de 2019, o relator no Tribunal da Relação do Porto não considerou o requerimento de interposição do recurso de constitucionalidade com fundamento no facto de o meio utilizado para a sua apresentação – o fax – não ser o legalmente previsto. Assim, concluiu que «não sendo legalmente admissível a apresentação de um qualquer requerimento destinado à prática de um ato processual, por mandatário constituído no processo, que não o seja através da plataforma informática de suporte à atividade dos tribunais, não pode ser considerado o fax remetido ao processo que pretende fazê-lo».

4. Reagindo a tal despacho, apresentou, o recorrente, reclamação para o Tribunal Constitucional, sob a invocação do disposto no artigo 76.º, n.º 4, da LTC.

O reclamante sustenta a sua reclamação, no essencial, na seguinte ordem de razões:

«2. (…) a presente ação entrou em juízo em 20/01/2009, altura em que estava em vigor o Código de Processo Civil, aprovado pelo DL. n.º 44.129 de 28/12/l961, com as necessárias alterações, e não na vigência do atual CPC, razão pela qual, quer o peticionado da ação, quer as restantes peças processuais, sempre ao longo destes 10 anos, foram tramitadas via telecópia, sem que o Tribunal até hoje houvesse feito qualquer reparo, dado precisamente, por os autos terem entrado em tribunal antes de vigorar o Novo Código de Processo Civil e nessa medida não ser obrigatório aos processos pendentes a tramitação eletrónica (Vide art. 150º do anterior texto legislativo e a Portaria n.º 280/l3/26/08, no art.38° impõe que a "presente portaria entra em vigor a 1 de Setembro de 2013."

(…)

8. E no caso sub judice, se o Tribunal entendesse que o autor levava a efeito a prática de atos processuais que não correspondem "à forma de tramitação dos autos após a entrada em vigor da redação ao Código de Processo Civil" tinha aqui, oficiosamente, também a oportunidade de o convidar a corrigir a sua atuação processual. Porém, está demonstrado no processo, ao longo da instrução dos presentes autos, quer na 1.a Instância ou no Tribunal da Relação do Porto jamais convidaram o autor a praticar os atos processuais de outro modo que não fosse do método utilizado desde do seu inicio até à interposição do recurso para o Tribunal Constitucional, pelo que a Exma. Senhora Relatora não podia, legalmente indeferir o requerimento do recurso, sem antes notificar o autor a corrigir a situação observada.

(…)

13. (…) por conseguinte, [deve] admitir-se o presente recurso, uma vez que o requerimento da sua interposição reúne os pressupostos imprescindíveis a que aludem os termos do nº2 do art.76° da LOTC.

14-Em ordem aos quais a Exma. Senhora Relatora, recusou a sua admissão, o que, salvo erro da nossa parte, não o podia acontecer, já que, os termos ali referidos preconizam que o requerimento de interposição de recurso para o Tribunal Constitucional só pode ser "indeferido quando não satisfaça os requisitos do art.75°-A. Mesmo após o suprimento previsto no nº 5, quando a decisão o não admita, o recurso haja sido interposto fora do prazo, quando o requerente careça de legitimidade ou ainda, no caso dos recursos previstos na alíneas b) e f) do n.º 1 do art.70.º, "quando forem manifestamente infundados". Porém, não só o recurso foi interposto ao abrigo das disposições da al. b) daquele art.70º, como satisfaz as condições observadas no art.75.º-A da lei referida, não é manifestamente infundado, bem como a sua rejeição é sustentada à margem dos limites, legalmente estabelecidos na referida lei Orgânica do Tribunal Constitucional.»

Em conclusão, defende que «a decisão reclamada violou ostensivamente o disposto no n.º 2 do art.76° da Lei Orgânica do Tribunal Constitucional, pelo que, mercê do que doutamente seja suprido, deve dar-se provimento à presente reclamação e, em consequência, ordenar-se a admissão do recurso interposto».

5. O Ministério Público, junto do Tribunal Constitucional, veio emitir parecer no sentido do indeferimento da reclamação.

Manifestando a sua concordância com o entendimento adotado pelo despacho reclamado, sustenta o Ministério Público que «diferentemente do que posteriormente veio a alegar quanto ao envio de outras peças processuais, o reclamante, quando interpôs recurso para o Tribunal Constitucional, não mencionou sequer qualquer circunstância que tivesse ocorrido e que de alguma forma impossibilitasse ou dificultasse a apresentação do ato processual através do sistema Citius».

Acrescenta, contudo, que «independentemente deste fundamento sempre a reclamação seria de indeferir», pois, apesar de o reclamante se referir «à inconstitucionalidade do artigo 139.º, n.ºs 6 e 7 do Código de Processo Civil», certo é que, «no requerimento de interposição do recurso, ainda que por diversas vezes se refira à violação da Constituição, não se consegue vislumbrar com clareza qual a exata interpretação daquele artigo que se reputa de inconstitucional».

Refere ainda que «nas alegações do recurso que interpôs para a Relação do Porto – e esse seria o momento processualmente adequado para a suscitação da questão de inconstitucionalidade – não se consegue descortinar qual a dimensão normativa que se considera ser inconstitucional».

Por fim, sublinha que, «embora tal não seja decisivo», «o acórdão recorrido aprecia a alegada violação da Constituição, mas provavelmente porque a questão não lhe fora devidamente colocada, não se pronuncia sobre constitucionalidade de uma exata e precisa interpretação do artigo 139.º, n.ºs 6 e 7 do Código de Processo Civil».

Em suma, defende que não foi «claramente identificada qual a dimensão normativa que se considera inconstitucional, nem no requerimento de interposição do recurso, nem durante o processo», o que determina o indeferimento da reclamação.

6. Por despacho de 9 de julho de 2019, foi determinada a notificação do reclamante para, «pronunciar-se, querendo, sobre os novos fundamentos para a não admissão do recurso de constitucionalidade invocados no parecer do Ministério Público».

7. Na resposta apresentada, o reclamante refere, quanto «à primeira questão suscitada pelo magistrado do MP, [que] não deixa de ser curiosa a sua intervenção quando este sabe que, no caso dos autos, foi demonstrado o justo impedimento a que alude o nºs do art.144° do CPC, além de que é jurisprudência pacífica no Tribunal Constitucional em caso de conflito, deve prevalecer o direito substantivo em detrimento da forma, por esta contender com o direito fundamental de acesso aos tribunais ou à tutela jurisdicional efetiva, plasmado no art.20º da CRP».

Quanto à «à 2ª questão», de relevante afirma que o que importa é que o «Tribunal da Relação do Porto tivesse entendido bem o sentido expresso nas alegações de recurso interposto na primeira instância, motivo pelo qual dele discordou, no aresto de que vem atravessado o presente recurso para o Tribunal Constitucional, sendo que o MP, em obediência aos termos do nº2 do art.3°...

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