Acórdão nº 288/18.0T9LRS.L1-9 de Court of Appeal of Lisbon (Portugal), 12 de Setembro de 2019

Data12 Setembro 2019
ÓrgãoCourt of Appeal of Lisbon (Portugal)

Decisão Texto Parcial:


Acordam em conferência os Juízes da 9ª. Secção Criminal do Tribunal da Relação de Lisboa: I – RELATÓRIO.

No processo comum supra identificado, do Juízo Local Criminal de Loures- Juiz 4, do Tribunal da Comarca de Lisboa Norte, o assistente BB…deduziu acusação particular, que o Mº.Pº. acompanhou- fls.55 e 56- contra AA…, imputando-lhe a prática do crime de injúria, previsto e punido pelo artigo 181.º do Código Penal.

Em despacho judicial, proferido em 26/03/2019- fls. 67 a 69 dos autos- a Mmª. Juíz titular rejeitou a acusação deduzida, que considerou manifestamente infundada, ao abrigo do disposto nos artigos 181 do C.P., 311-2 a) e 3 d) do C.P.P.

*** Inconformado, o assistente BB.., veio interpor recurso do referido despacho, com os fundamentos constantes da motivação de fls. 78 a 83 dos autos, onde escreveram as conclusões que se transcrevem: A) O Assistente não pode concordar com o entendimento defendido pelo Tribunal a quo, pois, atenta a factualidade alegada pelo Assistente e o contexto na qual a mesma decorreu e, bem assim, a qualidade em que, quer o Assistente, quer o Arguido, se encontravam a agir no momento da prática dos factos não se pode afastar a dignidade penal do comportamento do Arguido, nem se pode qualificar as expressões proferidas pelo mesmo, como não ultrapassando “ ... o nível discursivo da indelicadeza ou grosseria, aptas a qualificar pejorativamente quem as produz, mas inócuas para atingir as referenciadas honorabilidade ou respeitabilidade de quem as ouve.” B) Assim, errou o Tribunal a quo, padecendo a sentença ora recorrida de um vício de erro na apreciação dos factos trazidos ao conhecimento do Tribunal e erro na subsunção dos factos ao direito, com clara violação do disposto no Art. 181º, do CP, ao considerar os factos em causa não subsumíveis ao tipo de crime aí previsto.

  1. São elementos constitutivos do tipo de ilícito aqui em causa: a) o ato de injuriar outrem; b) dirigindo-lhe palavras, ofensivas da sua honra ou consideração; c) a existência de dolo, em qualquer das suas formas.

  2. A honra é a dignidade subjetiva, ou seja, o elenco de valores éticos que cada pessoa humana possui. Diz assim respeito ao património pessoal e interno de cada um. E a consideração será o merecimento que o indivíduo tem no meio social, isto é, a reputação, a boa fama, a estima, a dignidade objetiva, que é o mesmo que dizer, a forma como a sociedade vê cada cidadão.

  3. O crime de injúrias é um crime de perigo, pois, como ensina Beleza dos Santos, “a lei não exige, como elemento do tipo criminal, em nenhum dos casos, um dano efectivo do sentimento da honra ou da consideração. Basta, para a existência do crime, o perigo de que aquele dano possa verificar-se.” F) Posto isto, e delimitado o tipo de ilícito que aqui está em causa, importa responder à pergunta: Será a factualidade imputada na acusação particular ao Arguido suscetível de preencher os elementos constitutivos do tipo legal de crime de injúria, p. e p. pelo Art.º 181º, 1, do CP? Entendemos, inequivocamente que sim, ao contrário do que foi decidido na sentença recorrida.

  4. Ao proferir a sentença ora recorrida, o Tribunal a quo, não levou em linha de conta dois dados fundamentais: a) que existem expressões que, objetivamente, atingem o património pessoal do individuo a quem tais expressões são dirigidas, humilhando as mesmas; b) a qualidade em que agiam, no momento da pratica dos factos, quer o Assistente, quer o Arguido, já que ambos se encontravam no local no exercício de funções determinadas, e não meramente como espetadores.

  5. É inequívoco que existem determinadas expressões que são comunitariamente tidas como obscenas e que, contêm em si mesmas uma carga de ofensividade que lhe é inerente.

  6. Pelo que, atenta essa perceção que tais expressões acarretam e encerram em si mesmas, quando dirigidas a um individuo determinado, de forma direta, e intencional, as mesmas atingem o património pessoal deste, atingindo a sua honra, e dignidade e humilhando o indivíduo a quem são dirigidas.

  7. E, a expressão “filho da puta” carrega em si mesma essa carga negativa, reconhecida de forma geral pela comunidade, pelo que da mesma tal negatividade e intenção de ofender, maltratar e humilhar não podem ser retiradas.

  8. Pelo que, é forçoso concluir que a expressão aqui em causa se trata de uma expressão que atinge necessariamente a honra do visado, pelo que, quem dirija tal expressão a terceiro, de forma direta e intencional, ofende e injuria o mesmo, preenchendo, assim, o tipo de ilícito previsto no Art. 181º, do CP.

  9. Entendimento este que é defendido na jurisprudência, nomeadamente no Ac. da Relação de Guimarães de 30.11.2009, do qual resulta que: a) há palavras cujo sentido primeiro e último é tido, por toda a comunidade falante, como ofensivo da honra e consideração”; b) há expressões que exprimem e encerram em si mesmas um indesmentível desvalor objetivamente ofensivo.

  10. Não ponderou o Tribunal a quo a qualidade em que agiam, no momento da prática dos factos, quer o Assistente, quer o Arguido, já que ambos se encontravam no local no exercício de funções determinadas, e não meramente como espetadores.

  11. Na qualidade de dirigente de um clube desportivo o Arguido está sujeito a regras de ética desportiva, nomeadamente as previstas no Código de ética Desportiva, das quais se realçam as seguintes: “Reger-se por princípios de honestidade e de integridade de caráter - Integridade.”; e “Não proferir, sob...

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