Acórdão nº 10066/15.3T8CBR.C1.S2 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 02 de Maio de 2019
Magistrado Responsável | MARIA DA GRAÇA TRIGO |
Data da Resolução | 02 de Maio de 2019 |
Emissor | Supremo Tribunal de Justiça (Portugal) |
Acordam no Supremo Tribunal de Justiça 1. AA intentou, em 29 de Novembro de 2015, a presente acção declarativa, sob a forma de processo comum, contra BB - Casa de Saúde BB, S.A.
, CC e DD, peticionando a condenação solidária dos RR. a pagar-lhe: a quantia de € 2.263,33 a título de “danos materiais”, uma indemnização por “danos futuros” a liquidar após o exame médico requerido; a quantia de € 250.000,00 a título de “danos morais”.
Fundou a sua pretensão em responsabilidade civil por actos médicos, tanto contratual como extracontratual.
Todos os RR. contestaram, tendo o 2º e 3º RR., além do mais, invocado excepção de incompetência material do tribunal, considerando que a competência para conhecer dos pedidos da A. cabe à jurisdição administrativa.
A A. e a 1ª R. responderam, defendendo a competência do tribunal judicial.
Por despacho de fls. 376 foi admitida a intervenção acessória das seguradoras EE - Companhia de Seguros, S.A.
(actual FF Portugal, S.A.), GG, S.A.
e HH, S.A.
Todas as intervenientes contestaram, tendo a 1ª e 3ª intervenientes vindo também arguir a referida excepção de incompetência material do tribunal.
De novo, a A. e a 1ª R. responderam, mantendo a sua posição.
A fls. 492, foi proferido despacho saneador-sentença, com data de 28/07/2106, no qual se declarou o tribunal judicial materialmente incompetente, por a competência pertencer ao tribunal administrativo, absolvendo-se os RR. da instância.
A A. interpôs recurso per saltum para o Supremo Tribunal de Justiça (cfr. fls. 499).
A interveniente HH, S.A. e o R. CC contra-alegaram e defenderam ser tal modalidade de recurso inadmissível no caso concreto pelo que o recurso devia ser de apelação, a ser conhecido pelo Tribunal da Relação de Coimbra. Por despacho de fls. 541 foi admitido o recurso da A. como apelação, e ordenada a remessa dos autos à Relação.
Na Relação foi proferido despacho de fls. 546 a ordenar a remessa dos autos ao Supremo Tribunal de Justiça, considerando-se reunidos os requisitos do recurso per saltum.
Neste Supremo Tribunal foi proferido despacho do relator de fls. 567, ao abrigo do art. 678º, nº 4, do CPC, que – em virtude da decisão recorrida ser totalmente omissa sobre qualquer factualidade provada – ordenou a baixa dos autos à Relação “a fim de o recurso aí ser processado, podendo a Relação, se o tiver por necessário, ordenar a baixa do mesmo à 1ª instância para os efeitos mencionados” na decisão.
Na Relação foi proferido despacho de fls. 587 a ordenar a baixa dos autos à 1ª instância para os efeitos mencionados na decisão do Supremo Tribunal de Justiça.
Na 1ª instância foi proferida nova decisão, com data de 24/03/2017 (cfr. fls. 590), que manteve a decisão anterior de absolvição dos RR. da instância. Para tanto acrescentou-se que tal decisão assentava num denominado “complemento fáctico”. Após a decisão (cfr. fls. 592v) foi lavrado despacho do seguinte teor: “Volvidos 10 dias, nada sendo requerido conclua de novo para remessa dos autos ao Tribunal da Relação de Coimbra, a fim de aí ser apreciada a apelação, atento o teor do despacho proferido no Colendo STJ.” A fls. 593v-594, a A. veio declarar que mantinha as suas alegações de recurso.
Por sua vez, a fls. 596, a 1ª R. veio pugnar pela procedência do recurso da A. Enquanto, a fls. 603, o 2º R., CC, veio igualmente declarar que mantinha a posição anteriormente assumida em sede de contestação e de contra-alegações de recurso.
Na Relação foi proferido despacho, a fls. 610, a remeter os autos ao Supremo Tribunal de Justiça.
Por decisão do relator deste Supremo Tribunal, de fls. 622, foi determinada a devolução dos autos à Relação para os efeitos referidos, a saber: “(…) cabe à Relação, tal como em qualquer recurso de Apelação, apreciar e decidir em julgamento de 2ª Instância, da decisão proferida pelo tribunal ‘a quo’, não se limitando a remeter o processo para o Supremo Tribunal de Justiça como se ainda estivesse no âmbito de um recurso per saltum. Este cessou perante a decisão do Relator do STJ, anteriormente referida.” Na Relação, foi proferida, a fls. 642, a seguinte decisão singular: “Pelo exposto, anula-se oficiosamente a decisão recorrida, devendo ser proferida uma nova decisão que elenque a matéria provada”.
A fls. 657-657v, a 1ª instância fixou a matéria de facto e proferiu novo despacho saneador-sentença, com data de 18/10/2017, julgando a acção improcedente e absolvendo os RR. da instância. Após a decisão (a fls. 660) foi exarado o seguinte despacho: “Dado o recurso já interposto, volvidos 10 dias, nada sendo requerido, remeta os autos ao Tribunal da Relação de Coimbra, a fim de aí ser apreciada a apelação, atento o teor do despacho proferido no Colendo STJ”.
A fls. 661v, veio a A. pronunciar-se nos termos seguintes: “AA (…) vem perante V. Exª, em face da R. decisão proferida em 18.10.2007 [rectius: 2017], ora notificada com a refª 74...3, designadamente o último parágrafo, declarar: – Que mantém inteiramente o Recurso de Apelação que apresentou, socorrendo-se ainda, e, designadamente dos argumentos jurídicos expendidos na R. decisão Sumária, proferida no Supremo Tribunal de Justiça que faz seus.” Por sua vez, a fls. 663v-664, a 1ª R. veio de novo declarar que mantinha a sua anterior posição no sentido da revogação do despacho-saneador do tribunal a quo.
A fls. 667, foi proferido despacho a remeter os autos ao Tribunal da Relação.
A fls. 670, por despacho do relator da Relação, decidiu-se não conhecer do recurso.
Desta decisão reclamou a A. para a conferência, tendo vindo, em 27/02/2018 (cfr. fls. 713), a ser proferido acórdão que julgou a reclamação improcedente, mantendo a decisão do relator de não conhecimento do recurso.
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Inconformada, veio a A. interpor, em 13/03/2018, recurso de revista para o Supremo Tribunal de Justiça, que foi admitido por despacho do relator da Relação de fls. 770.
Tendo sido oportunamente distribuído neste Supremo Tribunal, em 21/12/2019 (cfr. fls. 782) foi proferido despacho do relator, ordenando que, por motivo de eminente jubilação, o processo fosse redistribuído.
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Assim, e por jubilação do primitivo relator, foi o processo redistribuído à presente relatora.
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A A. Recorrente formulou as seguintes conclusões recursórias: “1.ª Considerando que:
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Conforme consta dos autos, da sentença proferida em 11.7.2016, a Apelante interpôs Recurso de Apelação, que admitido foi.
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Tal recurso, após intervenção do Supremo Tribunal de Justiça, baixou ao Tribunal recorrido e daqui ao Tribunal de 1.ª instância.
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Conforme consta da decisão recorrida, na primeira instância manteve-se a decisão e apenas se acrescentou que se elaborava tal decisão com base num denominado “complemento fáctico”.
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Neste Tribunal “a quo” veio a ser proferida decisão que anulou a sentença, ordenando o seu prosseguimento, designadamente para elencar os factos provados.
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Consta dos autos, da decisão de 1.ª instância de 18.10.2017, que vem na sequência da decisão de 21.3.2017, e, na qual se ordenou a subida a este Tribunal, do Recurso de Apelação pendente.
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Sendo certo que, a parte não pode ser prejudicada no seu Recurso por tal decisão judicial que admitiu o recurso tal como foi apresentado e que ordenou a subida de ofício ao Tribunal Recorrido para o seu conhecimento.
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Bem como não pode a recorrente ser confrontada com uma decisão judicial que além de se entender ser uma “decisão surpresa”, é, no fundo, uma armadilha processual, juridicamente inaceitável, porque violadora de princípios constitucionais como o direito ao recurso e à tutela jurisdicional efetiva que a R. decisão Sumária constituiria em concreto na interpretação normativa que fez do artigo 641º, do C.P.C.
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Se, no Tribunal de 1ª instância se considerou e decidiu que aquela decisão era em complemento das anteriores decisões, interligadas e em remissão entre si, entende-se que não poderia o Tribunal de Recurso sustentar o que consta da R. decisão, sem violação do princípio da equidade, da boa-fé, da tutela jurisdicional efetiva, posta em causa com tal decisão.
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Tanto mais gravosa a decisão recorrida quando as partes processuais não tiveram nenhum comportamento ativo ou omissivo para aquela decisão proferida no Tribunal de 1ª. Instância que ordenou oficiosamente a subida do Recurso...
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