Acórdão nº 00177/08.7BECBR de Tribunal Central Administrativo Norte, 28 de Junho de 2019

Magistrado ResponsávelRicardo de Oliveira e Sousa
Data da Resolução28 de Junho de 2019
EmissorTribunal Central Administrativo Norte

Acordam, em conferência, os juízes da Secção de Contencioso Administrativo do Tribunal Central Administrativo Norte: I – RELATÓRIO MUNICÍPIO DE C…, vem intentar o presente RECURSO JURISDICIONAL da sentença do Tribunal Administrativo e Fiscal de Coimbra [doravante T.A.F. de Coimbra], de 13.02.2017, proferida no âmbito da Ação Administrativa Especial intentada por JFS, que julgou a mesma procedente, e, em consequência, declarou nulos os atos impugnados.

Em alegações, o Recorrente formula as conclusões que ora se reproduzem, que delimitam o objeto do recurso: “(…) I- A sentença recorrida opera, ainda que implicitamente, uma revolução coperniciana quanto àquilo que doutrina e jurisprudência vêm, ao longo dos tempos, afirmando pacificamente, ou seja, que o ius aedificandi não se apresenta à luz do texto constitucional, em especial do artigo 62.° da CRP, como fazendo parte integrante do direito fundamental de propriedade privada, tratando-se, antes, de um direito de natureza jurídico-pública e não de faculdade ínsita no conteúdo prévio e substancial do direito de propriedade privada; II- Ainda que se tenha chegado à conclusão de que as obras realizadas pelo Recorrido estão erigidas em propriedade deste, tal não conduz, automaticamente, com pretende o Tribunal a quo, à legalidade de tais obras.

III- Ao afirmar que essas obras foram construídas licitamente a sentença recorrida extravasa, manifestamente, aqueles que são os poderes judiciais, imiscuindo-se na esfera de poderes da Administração. Em bom rigor, por sentença licenciam-se as obras realizadas pelo Recorrido.

IV- Ainda que se considere que o direito de propriedade integra o poder de gozo sobre o bem objeto do direito, o certo é que o exercício desse poder não inclui o direito de construir aquilo que se quer, onde se quer e como se quer mas, apenas e tão só, a construir aquilo que as autoridades administrativas consentirem dentro das limitações e restrições assinaladas na legislação atinente; V- Se o direito de edificação inexiste como elemento integrador do direito de propriedade também dele não faz parte o direito de manter o edificado nas condições em que o proprietário quiser e na forma que quiser visto que tais edificações têm de respeitar as exigências legais, desde logo as relacionadas com a sua segurança e salubridade.

VI- O Tribunal a quo, ao declarar a nulidade dos atos impugnados por alegada violação do artigo 62.° da CRP, faz errada interpretação e aplicação desse preceito, violando-o.

VII- Mais, ao considerar que as obras erigidas pelo Autor o foram de forma lícita, o Tribunal a quo viola o princípio da separação de poderes, uma vez que, por essa via, licencia obras que carecem de licenciamento municipal, nos termos que decorrem do Regime Jurídico da Urbanização e Edificação, o que extravasa largamente os poderes que lhe decorrem do artigo 3.° do CPTA.

Nestes termos, Declarando procedente o presente recurso e revogando, em consequência, a sentença recorrida, farão V. Exas JUSTIÇA! (…)”.

*Notificado que foi para o efeito, o Recorrido apresentou contra-alegações, que concluiu da seguinte forma:: “(…) 1 - Cumpre desde logo referir que, da sentença do Tribunal “a quo” não decorre qualquer decisão condenatória que obrigue a Câmara Municipal a considerar que as obras foram construídas licitamente, o Tribunal “a quo” apenas cita uma afirmação dos Autores:" Como assim, os atos impugnados são nulos, pelo motivo de facto alegado pelo Autor - tratar-se de obras licitamente erigidas em terreno sua propriedade - mas por diverso motivo de direito - jura novit curia - (...) ” 2 - Pelo que, quem alega “tratar-se de obras licitamente erigidas em terreno sua propriedade” é o Autor, sendo que o Tribunal “a quo” apenas faz citação ao que foi dito pelo Autor.

3 - Referindo ainda que, a decisão do Tribunal “a quo” assenta em motivos diversos dos invocados pelo Autor/Recorrido, e consequentemente afasta afirmação que as obras foram construídas licitamente.

4 - A decisão do Tribunal “a quo” apenas refere que os atos são nulos “ por ofenderem, por esse erro nos pressupostos, o núcleo essencial de um direito fundamental do Autor (alínea d) dos mesmos número e artigo), a saber, o direito de propriedade.” 5 - Na verdade quem faz uma errada interpretação do artigo 62.° da CRP é o Recorrente, pois esquece-se que com base no princípio da legalidade e da proporcionalidade, o DIREITO DE PROPRIEDADE SÓ PODE SOFRER RESTRIÇÕES QUANDO O ATO ADMINISTRATIVO PREENCHA OS REQUISITOS LEGAIS PARA O RESTRINGIR! 6 - Assim, não é qualquer ato administrativo que pode restringir o Direito de Propriedade.

7 - O Direito de Propriedade só pode ser restringido, quando o ato que o restringe cumpre os requisitos de legalidade e proporcionalidade. O QUE NÃO ACONTECE NO CASO CONCRETO.

8 - De acordo com a Deliberação/Despacho do Presidente da Câmara de C… (ato administrativo) de 04/01/2008 (Ato administrativo que se realiza com aposição do concordo na informação proposta pelo Diretor do Departamento de Gestão Urbanística e Renovação urbana, cujo assunto é “ JFS - Urbanização S… - Obras de demolição”) : “Retomando a tramitação do processo e só agora possível por razões de deficiente arquivamento, refere-se o seguinte: Na sequência da deliberação camarária de 20/03/2006 foi dado cumprimento aos art°s 100.° e seguintes do CPA (Código do Procedimento Administrativo) Audição de Interessados (...) Assim, propõe-se: 1. A posse administrativa do imóvel ao abrigo do disposto no n.° 1 do art. 107° do RJUE, devendo notificar-se o interessado como previsto no n.° 2 do mesmo artigo e diploma legal. 2. A demolição dos muros de vedação e das ampliações efetuadas, repondo o projeto deferido por despacho de 19/9/1992 e telas finais deferidas por despacho de 22/7/1994, nos termos do n.° 4 do art.1 106.° do RJUE (Regime Jurídico de Urbanização e Edificação), a expensas do munícipe. Está fixado o prazo de 60 dias. (.)”(o despacho consta a folhas 130 e 148 do processo do Tribunal a quo) 9 - Da análise do despacho do Presidente da Câmara verifica-se que, o ato administrativo definitivo que ordena a demolição da...

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