Acórdão nº 1607/17.9T8SNT.L1.S1 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 18 de Junho de 2019

Magistrado ResponsávelHENRIQUE ARAÚJO
Data da Resolução18 de Junho de 2019
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)

ACORDAM NO SUPREMO TRIBUNAL DE JUSTIÇA I. RELATÓRIO AA instaurou acção declarativa, sob a forma de processo ordinário, contra “BB Lda.”, pedindo que seja declarada a nulidade das Deliberações da Gerência de 06.07.2017 e 13.07.2017, que estabeleceram um limite temporal de 70 anos de idade para o cargo de gerente executivo da sociedade, retirando-lhe todos os poderes de gerência.

Alega, em síntese, ter sido violado o contrato de sociedade e, bem assim, as normas imperativas do Código das Sociedade Comerciais, no que concerne ao direito de qualquer sócio exercer a gerência da sociedade.

A Ré deduziu oposição, alegando a excepção de caducidade do direito de acção e, impugnando os factos, alegou não ter ocorrido qualquer violação do contrato social ou do Código das Sociedades Comerciais, mantendo o Autor o cargo de gerente e de representação da sociedade, tendo havido apenas uma reestruturação organizativa e administrativa da sociedade, com distribuição de cargos pelos diversos gerentes, cuja gerência plural se manteve.

Após julgamento, foi proferida sentença, cuja parte dispositiva reza do seguinte modo: “Pelo exposto, julgando improcedentes, por não provados, os alegados vícios das deliberações da Gerência da Ré de 6-7-2017 e 13-7-2017, e julgando tais deliberações válidas, improcedem os pedidos de anulação das ditas deliberações de 6- -7-2017 e 13-7-2017”.

Não se conformando com a decisão, dela apelou o Autor.

E fê-lo com êxito, já que a Relação de Lisboa decidiu como segue: “a) Revoga-se a decisão proferida pelo tribunal a quo em 8.5.2018; b) Anula-se a deliberação dos gerentes adotada em 6.7.2017 e declara-se nula a deliberação dos gerentes adotada em 13.7.2017”.

É agora a vez de a Ré apresentar recurso de revista para o Supremo, rematando as alegações do seguinte modo: A) A organização interna da Gerência, de acordo com critérios objetivos e razoáveis, não é ilegal ou ilícita e não comporta limitação ao exercício da gerência; B) O estabelecimento, no âmbito da Gerência, de um limite máximo de idade para o exercício de funções executivas por parte de qualquer gerente de uma sociedade não constitui a criação de um modo de cessação das funções de gerente da mesma; C) O art. 256º do CSC, ao estipular a duração da gerência, não impõe que esta subsista, em todas as situações, por tempo indeterminado, nem se aplica parcialmente à gerência designada; D) O exercício de funções executivas (e não outras, que se mantêm, ao abrigo da deliberação em crise, independentemente da idade ou de outra circunstância) não se pode configurar como uma limitação temporal da função de gerente da Recorrente, estando antes enquadrado na determinação e prática dos “atos que forem necessários ou convenientes para a realização do objeto social” que é obrigação dos gerentes garantir, nos termos do art. 259º do CSC.

E) Na presente situação, o Recorrido mantém o seu cargo de gerente, pelo que a duração do seu mandato não está em causa; F) Nos termos do art. 256º do CSC, ou se é gerente ou não se é (e o A./Recorrido, é-o, reconhecido como tal por funcionários e terceiros, mantendo a sua função de gerente) não havendo limitações temporais a esta função que lhe tenham sido impostas; G) A Assembleia Geral de uma Sociedade tem as suas competências delimitadas pela competência própria atribuída a outros órgãos societários; H) Cabe à Gerência plural de uma Sociedade organizar-se internamente, distribuindo as tarefas administrativas (ou pelouros de atuação e responsabilidade) pelos membros que a compõem, com vista à prossecução do objeto societário e no melhor interesse da Sociedade; I) Os Acórdãos cujos excertos são citados na fundamentação da decisão ora impugnada reportam-se a situações em que a organização da gerência era imposta pelos sócios, extravasando as suas competências, pelo que não devem ser atendidos para justificar a invalidade da deliberação tomada, que não ocorre; J) Tal situação não ocorre na presente situação, em que não são limitados os poderes de representação dos gerentes, inoponíveis a terceiros; K) Não ficou provado ou demonstrado qualquer redução dos poderes de representação do Autor/Recorrido – que, efectivamente, não ocorreu nem foi deliberada; L) Mesmo que a organização interna de uma sociedade possa ter repercussões externas, essa não afecta os poderes dos gerentes, nem afecta direitos ou interesses de terceiros; M) O facto de o Autor não lograr provar os factos por si alegados para comprovar o seu direito material, tem como consequência necessária a não demonstração das situações jurídicas para as quais reclama tutela; N) Bem esteve a sentença de primeira instância ao admitir que “a simples organização do funcionamento da gerência plural de acordo com certos critérios, entre os quais a idade e a organização administrativa e executiva dos diversos cargos, entre as várias áreas de actuação da sociedade, não se pode considerar como atribuições ou desatribuições de funções do cargo de gerência”, reconhecendo a conformidade do modelo de negócio e configuração interna da Gerência da Sociedade; O) Ao decidir como decidiu, violou o douto Tribunal da Relação, por errada aplicação e interpretação, as normas contidas nos artigos 256º, 259º, 260º, 261º do CSC, bem como o art. 662º do Código do Processo Civil (CPC) e art. 342º, nos 1 e 3 do Código Civil (CC), impondo esta última norma uma valoração da prova diferente da que ocorreu na decisão impugnada.

O recorrido contra-alegou, batendo-se pela manutenção do decidido.

* Sendo o objecto do recurso balizado pelas conclusões da recorrente, a questão que importa dirimir é a de saber se as deliberações impugnadas devem...

Para continuar a ler

PEÇA SUA AVALIAÇÃO

VLEX uses login cookies to provide you with a better browsing experience. If you click on 'Accept' or continue browsing this site we consider that you accept our cookie policy. ACCEPT