Acórdão nº 360/19 de Tribunal Constitucional (Port, 19 de Junho de 2019

Data19 Junho 2019
Órgãohttp://vlex.com/desc1/2000_01,Tribunal Constitucional (Port

ACÓRDÃO Nº 360/2019

Processo n.º 448/2019

3ª Secção

Relator: Conselheira Joana Fernandes Costa

Acordam, em conferência, na 3ª Secção do Tribunal Constitucional

I. Relatório

1. No âmbito dos presentes autos, em que é recorrente A. e recorrido o Ministério Público, foi interposto recurso da decisão proferida pela Vice-Presidente do Supremo Tribunal de Justiça, em 29 de março de 2019, que indeferiu a reclamação do despacho prolatado pelo Juiz Relator do Tribunal da Relação de Évora, de 22 de janeiro de 2019, que não admitiu o recurso interposto pelo ora reclamante do acórdão proferido pela mesma Relação, em 20 de dezembro de 2018.

Neste aresto, o Tribunal da Relação de Évora concedeu provimento apenas parcial ao recurso interposto pelo ora reclamante do acórdão condenatório proferido em primeira instância, tendo fixado em quatro ano e seis meses a pena de cinco anos e três meses de prisão em que ao mesmo fora imposta pela prática de um crime de tráfico de estupefacientes, p. e p. pelo artigo 21.º, n.º 1, do Decreto-Lei n.º 15/93.

2. Através da Decisão Sumária n.º 373/2019, decidiu-se, ao abrigo do disposto no n.º 1 do artigo 78.º-A da LTC, não tomar conhecimento do objeto do recurso.

Tal decisão tem a seguinte fundamentação:

«II – Fundamentação

4. Conforme resulta do teor do requerimento de interposição do recurso, o recorrente não indicou a alínea do n.º 1 do artigo 70.º da Lei do Tribunal Constitucional (em seguida, «LTC») ao abrigo da qual o mesmo é interposto, inobservando, assim, um dos requisitos formais a que aquele requerimento se encontra sujeito por força do disposto no artigo 75.º-A, n.º 1, da LTC.

Não se justifica, contudo, formular um convite ao aperfeiçoamento do requerimento de interposição do recurso, nos termos previstos no n.º 5 do artigo 75.º-A da LTC, em ordem a possibilitar o suprimento de tal omissão. Por duas razões essenciais.

Em primeiro lugar, é manifesto que o presente recurso, a ser admissível, apenas o poderia ser com fundamento na alínea b) do referido n.º 1, visto que não ocorreu, na decisão recorrida, qualquer recusa de aplicação de norma com fundamento em inconstitucionalidade ou ilegalidade (alíneas a) e c) do n.º 1 do artigo 70.º da LTC), nem esteve em causa a aplicação de norma constante de diploma regional ou ilegalidade por violação do estatuto de uma região autónoma (alíneas d) e e) do n.º 1 do artigo 70.º da LTC) ou qualquer questão de ilegalidade qualificada (alínea f) do n.º 1 do artigo 70.º da LTC), nem tão pouco foi invocado anterior julgamento de inconstitucionalidade (alíneas g) e h) do n.º 1 do artigo 70.º da LTC), não se tendo verificado, por último, qualquer recusa de aplicação de norma constante de ato legislativo, com fundamento na sua contrariedade com uma convenção internacional, ou a sua aplicação em desconformidade com o anteriormente decidido sobre a que questão pelo Tribunal Constitucional (alínea i) do n.º 1 do artigo 70.º da LTC).

A segunda razão prende-se com o facto de não se encontrarem verificados no caso todos os pressupostos de que depende a admissibilidade dos recursos interpostos ao abrigo da alínea b) do n.º 1 do artigo 70.º da LTC, o que obstaria, em qualquer caso, à possibilidade de conhecimento do respetivo objeto.

5. De acordo com a alínea b) do n.º 1 do artigo 70.º da LTC, cabe recurso para o Tribunal Constitucional «das decisões dos tribunais (…) [q]ue apliquem norma cuja inconstitucionalidade haja sido suscitada durante o processo».

Tal como delimitado no requerimento de interposição, o recurso tem por objeto a norma «do artigo 400º, nº. 1, alínea f), do Código de Processo Penal, resultante da revisão realizada pela Lei 20/2013, de 21 de fevereiro, que estabelece a irrecorribilidade do acórdão da Relação proferido, em recurso, que não confirme a decisão proferida pela primeira instância».

Segundo o entendimento reiteradamente expresso por este Tribunal, os recursos interpostos no âmbito da fiscalização concreta da constitucionalidade têm função instrumental, o que significa que apenas serão processualmente admissíveis nas situações em que o julgamento da questão de constitucionalidade que integra o respetivo objeto for suscetível de repercutir-se, de forma útil e eficaz, na solução jurídica do caso concreto. Quer isto significar que, sempre que a ratio decidendi da decisão recorrida surja integrada por um outro fundamento, diverso daquele em que radica a norma ou normas impugnadas, desde que suficiente, por si só, para suportar o sentido decisório alcançado pelo tribunal a quo, a apreciação do recurso carecerá de utilidade.

Como se escreveu no Acórdão n.º 389/00, «encontrando-se na decisão recorrida outro fundamento, para além da aplicação da norma impugnada [neste caso, do sentido normativo impugnado] só por si suficiente para chegar a tal decisão, não existe, pois, interesse processual que justifique o conhecimento da questão pelo Tribunal Constitucional – seja qual for o sentido da decisão que recaia sobre a questão, manter-se-á inalterado o decidido pelo tribunal recorrido» (Diário da República, II Série, de 13 de novembro de 2000).

Ora, é essa, justamente, a hipótese em presença.

6. Conforme se extrai do teor da decisão recorrida, a reclamação do despacho que não admitiu o recurso interposto pelo ora recorrente do acórdão proferido pelo Tribunal da Relação de Évora foi indeferida com base em duas distintas ordens de razão.

De acordo com o primeiro dos fundamentos invocados, tal recurso não era processualmente admissível pelo facto de se verificar dupla conforme: tendo reduzido a pena aplicada em primeira instância, o acórdão proferido pelo Tribunal da Relação efetuara uma confirmação da condenação in mellius, tornando, assim, inadmissível o recurso para o Supremo Tribunal de Justiça nos termos que resultam do disposto nos artigos 432.º, n.º 1, alínea b), e 400.º, n.º 1, alínea f), do Código de Processo Penal (doravante, «CPP»).

Numa segunda linha argumentativa, inteiramente subsidiária em relação à anterior, notou-se ainda, na referida decisão, que, mesmo na (mera) hipótese de assim não ser entendido, o recurso manter-se-ia processualmente inadmissível por força do preceituado no artigo 400.º, n.º 1, alínea e), do CPP, que estabelece a irrecorribilidade dos «acórdãos proferidos, em recurso, pelas Relações, que apliquem pena não privativa de liberdade ou pena de prisão não superior a 5 anos».

Ora, considerado o duplo fundamento invocado pelo Supremo Tribunal de Justiça para considerar processualmente inadmissível o recurso interposto pelo ora recorrente, a apreciação da questão de constitucionalidade colocada nos presentes autos revela-se inútil.

Não tendo o ora recorrente posto em causa, no âmbito do presente recurso, a constitucionalidade de qualquer norma extraível do preceito constante da alínea e) do n.º 1 do artigo 400.º do CPP, a conclusão de que o recurso interposto do acórdão do Tribunal da Relação de Évora é processualmente inadmissível manter-se-ia inalterada, tal como o próprio desatendimento da reclamação, mesmo na hipótese de vir a ser julgada inconstitucional a norma impugnada pelo recorrente.

Configurando a utilidade do recurso de constitucionalidade um dos seus pressupostos de admissibilidade, a insusceptibilidade de o julgamento da questão de constitucionalidade se repercutir, de forma útil e eficaz, na solução jurídica do caso concreto obsta ao conhecimento do respetivo objeto, o que justifica, por si só, a prolação da presente decisão sumária (cf. artigo 78.º-A, n.º 1, da LTC).

8. Ainda assim, não deixará de notar-se ainda que, caso o objeto do presente recurso pudesse ser conhecido, a circunstância de este Tribunal vir reiteradamente concluindo pela não inconstitucionalidade do critério de recorribilidade fixado na alínea f) do n.º 1 do artigo 400.º do CPP, sempre constituiria fundamento bastante para reconhecer a simplicidade da questão a decidir e, nos termos permitidos pelo n.º 1 do artigo 78.º-A da LTC, proferir correspondente...

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