Acórdão nº 01744/13.2BELRS 0162/18 de Supremo Tribunal Administrativo (Portugal), 22 de Maio de 2019

Magistrado ResponsávelARAGÃO SEIA
Data da Resolução22 de Maio de 2019
EmissorSupremo Tribunal Administrativo (Portugal)

Acordam os juízes da secção do Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo: A AUTORIDADE TRIBUTÁRIA E ADUANEIRA, inconformada, interpôs recurso da decisão do Tribunal Tributário de Lisboa (TTL) datada de 13 de Novembro de 2017, que julgou procedente a acção interposta pelo SINDICATO INDEPENDENTE DOS MÉDICOS E OUTROS, para reconhecimento de um direito ou interesse legitimo em matéria tributária, com o objectivo de ver reconhecido o direito de não sujeição a IRS dos montantes auferidos a título de bolsa de formação.

Alegou, tendo apresentado conclusões, como se segue:

  1. O presente recurso vem instaurado contra a sentença de 13/11/2017, que reconheceu o direito à não tributação em sede de IRS das quantias recebidas a título de bolsa de formação por médicos em regime de internato médico que ocupem vagas preferenciais, ao abrigo do regime jurídico de formação médica.

  2. O recurso vem intentado contra aquela sentença com fundamento em erro de julgamento quanto ao direito, pugnando pelo enquadramento jurídico-tributário das situações fácticas em apreço no disposto na al. b) do nº 3 do art. 2º do CIRS, com a consequente sujeição e tributação em sede de IRS.

  3. No que respeita à sentença sob recurso, a mesma entendeu, em síntese, que “estando a bolsa de formação prevista no nº 8 do art. 12º-A do Decreto-Lei nº 203/2004, excluída actualmente pelo artigo 2º- A do nº 1 al. c) do CIRS de tributação em sede de IRS, e até 31 de dezembro de 2014 pelo artigo 2º nº 8 al. c) do mesmo código, a liquidação e retenção na fonte das quantias percebidas com aquele encontra-se ferida de ilegalidade por violação de lei” d) Outro é o entendimento da ora Recorrente, plasmado na informação nº 3.212/13, da Direcção de Serviços de IRS, sobre a qual recaiu o despacho de concordância do Senhor Secretário de Estado dos Assuntos Fiscais nº 368/2013-XIX, de 2013-08-22.

  4. De harmonia com entendimento da ora Recorrente, as bolsas de formação em apreço constituem uma remuneração acessória com enquadramento na alínea b) do nº 3 do art. 2º do CIRS: I. Os médicos internos colocados em vagas preferenciais, destinadas a suprir necessidades médicas de determinadas especialidades, vêm acrescer à sua remuneração base também uma bolsa de formação, sendo que, nos termos do nº 5 do art. 12º-A do Decreto-Lei nº 203/2004, de 18/08, aditado pelo Decreto-Lei nº 45/2009, de 13/02, “o exercício destas funções implica a celebração de um contrato de trabalho em funções públicas por tempo indeterminado”; II. A bolsa de formação destina-se a compensar os médicos internos pelo exercício da sua actividade, no âmbito de uma relação de trabalho por conta de outrem, com vista à ocupação de uma vaga preferencial, ou seja, a ocupação de uma vaga preferencial é “concretamente uma actividade desempenhada no exercício de função, ou de serviço público, que consubstancia trabalho prestado sob a autoridade e direcção da entidade que ocupa a posição de sujeito ativo da relação jurídica dele resultante”; III – “Ora, para efeitos de IRS os rendimentos provenientes do trabalho dependente são enquadrados na Categoria A, previstos no art. 2º do Código do IRS (CIRS), compreendendo todas as remunerações a que alude o nº 2 deste artigo, e ainda as remunerações acessórias que se traduzam em direitos, benefícios ou regalias não incluídos na remuneração principal que sejam auferidos devido à prestação de trabalho ou em conexão com esta e constituam para o respectivo beneficiário uma vantagem económica, conforme estipula a alínea b) do nº 3 do mesmo preceito”; IV. Concluindo, estes rendimentos estão sujeitos a retenção na fonte segundo as regras gerais aplicáveis aos rendimentos do trabalho dependente, conforme nº 1 do art. 99º do CIRS e art. 3º do Decreto-Lei nº 42/91, de 22/01, devendo as retenções na fonte efectuadas constar da declaração a que se refere a alínea c) do nº 1 do art. 119º do CIRS. De salientar que em 2013 estas importâncias estão igualmente sujeitas à retenção na fonte da sobretaxa prevista no art. 187º da Lei nº 66-B/2012, de 31/12; V. Por fim, a eventual devolução do montante recebido a título de bolsa de formação, por não cumprimento da obrigação de permanência e vaga preferencial, tem o seu enquadramento no mecanismo de reposições indevidamente pagas a funcionários ou agentes da Administração Pública, cujos procedimentos constam da circular nº 3/2008, de 06/02, da ATA.

  5. Importa, por conseguinte, fazer a distinção entre “prestações relacionadas exclusivamente com acções de formação profissional” de remunerações auferidas “devido à prestação de trabalho ou em conexão com esta”.

  6. O facto de a bolsa de formação ter como objectivo incentivar a colocação de médicos internos em vagas preferenciais e estar sujeito à restituição em caso de incumprimento da obrigatoriedade de permanência que lhe está associada, não lhe retira a natureza de remuneração acessória pela prestação de trabalho realizada em vaga preferencial.

  7. Que assim é, resulta de diversos aspectos que importa especificar, fazendo o contraponto com a tese que o A. pretende ver reconhecida e que foi acolhida na sentença sob recurso.

  8. Desde logo, importa interpretar o disposto no art. 2º do CIRS, à luz do princípio da capacidade contributiva e da concepção de acréscimo que conduziram a uma definição compreensiva de rendimento tributável, conforme se pode ler no preâmbulo do Decreto-Lei que aprovou o CIRS.

  9. De acordo com a noção compreensiva de rendimento de trabalho dependente, o art. 2º do CIRS prevê expressamente que as remunerações de trabalho dependente compreendem todas as remunerações acessórias que constituam direitos, benefícios ou regalias não incluídos na remuneração principal que sejam auferidos devido à prestação de trabalho ou em conexão com esta e constituam para o respectivo beneficiário uma vantagem económica, enumerando alguns exemplos nas alíneas do nº 3 do art. 2º do CIRS, excluindo de tributação a parte em que devam ser consideradas a titulo de contrapartida legalmente devida pela entidade patronal para suportar despesas inerentes à prestação de trabalho.

  10. Não se vislumbra que a bolsa de for seja diferente das remunerações acessórias sujeitas a tributação, sendo que um tratamento fiscal diferenciado, nos termos pugnados pelo A., consubstanciaria uma clara violação dos princípios da capacidade contributiva e da igualdade tributária consignados na CRP.

    1) A bolsa de formação consubstancia, isso sim, um incentivo auferido em razão da prestação de trabalho no estabelecimento ou serviço onde se verificou a necessidade que originou a vaga preferencial e, como tal, trata-se de uma atribuição patrimonial com natureza remuneratória sujeita a IRS.

  11. Mais, o regime legal de IRS contempla um mecanismo para regularizar o imposto pago por importâncias que, eventualmente, venham a ser restituídas por incumprimento da correspondente obrigação de permanência.

  12. A propósito dos subsídios atribuídos a magistrados, e que os AA referem na sua PI, não se descortina qualquer paralelismo entre aquela jurisprudência e a situação em análise nos autos.

  13. Importa, pois, distinguir entre atribuições patrimoniais remuneratórias e as que têm natureza compensatória, sendo que estas são feitas com o objectivo de compensar os trabalhadores por conta de outrem de despesas provocadas pelo exercício das suas funções.

  14. Justamente, as bolsas de formação não têm como objectivo...

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