Acórdão nº 10798/08.2TBMAI.P1 de Court of Appeal of Porto (Portugal), 24 de Fevereiro de 2010

Magistrado ResponsávelPAULA GUERREIRO
Data da Resolução24 de Fevereiro de 2010
EmissorCourt of Appeal of Porto (Portugal)

S Privacidade: 1 Meio Processual: REC PENAL.

Decisão: PROVIDO.

Indicações Eventuais: 1ª SECÇÃO - LIVRO 621 - FLS 01.

Área Temática: .

Sumário: I - A imputação de factos tem de ser precisa e não genérica, concreta e não conclusiva, recortando com nitidez os factos que são relevantes para caracterizarem o comportamento contra-ordenacional.

II - A decisão administrativa condenatória deve conter “a descrição dos factos imputados com indicação das provas obtidas” (art. 58º, 1, b) do RGCO).

IIII - A decisão administrativa que não contenha os elementos referidos no art. 58º,1, b) do RGCO está ferida de nulidade relativa, nos termos das disposições conjugadas dos artigos 374º, n.º 2 e 479º, n.º 1, al. a) do CPP, dependente de arguição, podendo ser suscitada no requerimento de impugnação judicial.

Reclamações: Decisão Texto Integral: Recurso Penal no processo nº 10798/08.2TBMAI.P1 Acordam, em conferência, na 1ª Secção Criminal do Tribunal da Relação do Porto 1 – Relatório No recurso de contra-ordenação com o nº 10798/08.2TBMAI do .º Juízo Criminal do Tribunal Judicial da Maia veio "B………., S.A." interpor recurso da decisão judicial que, em 10 de Julho de 2009, decidiu manter a condenação pela prática da contra-ordenação p. e p. pelas disposições conjugadas dos artigos 12.º, n.º 1, e 14.º, n.º 1, do Decreto-Lei n.º 69/2003, de 10 de Abril, e art.º 6.º, n.º 1, e), do Decreto Regulamentar n.º 8/2003, de 11 de Abril, reduzindo o montante da coima aplicada para 5.000 €, (cinco mil euros).

Das conclusões de recurso extraem-se os seguintes argumentos: - vd. fls. 300 a 318.

Na sentença não são referidas a área implantada/anteriormente licenciada; a área da ampliação; a área do estabelecimento efectivamente em utilização aquando da fiscalização pelo C………. (actual D……….) - elementos que são essenciais para apurar a percentagem do aumento em relação à área licenciada e sem os quais, verdadeiramente, nunca poderá dar-se por verificada a contra-ordenação em causa.

A fundamentação da sentença e que serviu para formar a convicção do tribunal, não tem um suporte factual, tendo em conta que deu como assente o facto, rectius, a conclusão (!) de que "a arguida estava a proceder à laboração industrial na área total das suas instalações, incluindo numa área de ampliação, superior em 20% à área anteriormente licenciada...", mas sem ter dado como provado qualquer verdadeiro facto, concreto e mensurável, que permitisse certificar aquela percentagem, nomeadamente a indicação das referidas áreas.

A sentença recorrida refere a violação do art. 6 n.º 1, alínea e) do Decreto - Regulamentar n.º 8/2003 de 11 de Abril, mas não relata factos que se subsumam à respectiva norma.

Nesta parte, a sentença está em clara violação do art. 64º n.º 4 do Decreto-Lei nº 433/82, de 27 de Outubro (RGCO), e do art. 374º do Código de Processo Penal, aplicável ao abrigo do disposto no art. 41º do RGCO, por falta de fundamentação da sua decisão no que concerne aos factos e ao direito aplicado.

Relativamente à determinação da medida concreta da coima, não existe qualquer fundamento que alicerce a referida decisão judicial.

Tendo em conta a alteração à coima aplicada pela entidade administrativa, deviam constar da sentença ora recorrida as circunstâncias que determinaram a medida da sanção, conforme o disposto no art. 64º n.º 4 do RGCO.

No entanto, da sentença nada consta no que diz respeito à apreciação da culpa e à gravidade da contra-ordenação...

...e relativamente à situação financeira da arguida/recorrente, apenas se refere que "não foi efectivamente pensada, de acordo com a razoabilidade que se exige e dentro da moldura abstracta prevista...razão pela qual há que alterar a decisão nesta parte..." Pelo que, também por este motivo, violou a sentença ora recorrida o disposto no art. 64º n.º 4 do Decreto-Lei nº 433/82, de 27 de Outubro (RGCO), e do art. 374º, n.º2 do Código de Processo Penal (aplicável ao abrigo do disposto no art. 41º do RGCO), por falta de fundamentação da sua decisão relativamente às circunstâncias que determinaram a medida da sanção.

A sentença é pois, nesta parte, nula, requerendo-se a respectiva declaração, ao abrigo do art. 379º n.º 1 alínea a) do CPP.

Foi dada à arguida a possibilidade de se pronunciar sobre uma imputação, que em sede de condenação foi revista e alterada pela autoridade administrativa, nos seus termos de direito. Nomeadamente: a)A notificação com vista ao exercício do direito de audição prévia imputava-lhe a prática da «(...) infracção de natureza contra-ordenacional: Falta de pedido de licenciamento para alteração/ampliação de estabelecimento industrial de fabricação de tintas e vernizes (CAE 24301), prevista e punível nos termos dos artigos 9.º, 12.º, nºs 1 e 8, e 21.º, n.º 1, alínea a) e n.º 2, do Decreto-Lei n.º 69/2003, de 10 de Abril, com referência aos artigos 10.º e 11.º, daquele diploma, ao Regulamento do Licenciamento da Actividade Industrial (RELAI), aprovado pelo Decreto Regulamentar n.º 8/2003, de 11 de Abril (artigo 6.º, n.º 1, alínea e), e à Portaria n.º 464/2003, de 06 de Junho.»; b)Enquanto a decisão condenatória lhe imputou «(...) a prática de uma contra-ordenação p. e p. nas disposições conjugadas dos art. 12º nº 1 e art. 14º nº 1 do Dec. Lei nº 69/2003 de 10 de Abril e art. 6º, nº 1, al. e) do Decreto Regulamentar nº 8/2003, de 11 de Abril, punível pelo art. 21º nº 1 al. a) do referido Dec. Lei nº 69/2003, com coima mínima de € 200,00 e máxima de € 44.000,00, dado que o infractor se trata de uma pessoa colectiva», condenando-a por violação do «disposto no art. 12º nº 1 e art. 14º nº 1 do Dec. Lei nº 69/2003 de 10 de Abril, constituindo, este facto, a contra-ordenação punível nos termos da Alina a) do nº 1 do art. 21º do citado diploma legal» Assim, a decisão não forneceu todos os elementos necessários para que a arguida ficasse a conhecer todos esses ditos aspectos relevantes.

O direito de defesa da arguida foi limitado numa dimensão essencial, e não pôde ser exercido de forma plena e efectiva, já que um efectivo direito de defesa pressupõe o conhecimento pelo arguido, de todos os elementos relevantes, incluindo factos imputados e sanção abstractamente aplicável.

A autoridade administrativa não possibilitou à arguida uma efectiva oportunidade de se pronunciar sobre a sanção em que incorria, melhor dizendo, esta teve oportunidade de se pronunciar sobre a sanção em que incorria, mas foi condenada com base em fundamentos jurídicos distintos, sobre os quais não foi ouvida previamente.

Não tendo sido dado conhecimento à arguida da qualificação jurídica que veio a ser adoptada em sede de decisão (a qualificação jurídica que foi comunicada para efeito de a arguida exercer o seu direito de defesa era diversa), ocorre nulidade da decisão, por violação do disposto no art. 50º RGCO), que desde já se invoca, e que deve ser judicialmente declarada, com todos os legais e devidos efeitos - especificamente, há a nulidade referida no art. 379º, n.º 1, al. b), do CPP, por violação do disposto no art. 358º nºs 1 e 3 do mesmo CPP, aplicável ex vi art. 41º do RCGO.

A sentença refere que para que o direito de defesa seja cabalmente exercido, é preciso que constem na decisão todos os elementos de facto e de direito para a integral elucidação do arguido, afirmando que tal não abarca a qualificação jurídica dos factos.

Ora, sendo o art. 50º do Regime Geral da Contra-Ordenações, uma manifestação do princípio fundamental do contraditório, abrange a qualificação jurídica dos factos, da qual deve ser dada conhecimento à arguida, sob pena de violação daquele preceito, pelo que o direito de defesa da arguida/recorrente, na sua plenitude, foi limitado numa dimensão fundamental, pois não lhe foi dado conhecimento da qualificação jurídica que a Autoridade Administrativa posteriormente adoptou em sede de decisão.

Por outro lado, a decisão administrativa não contém todos os factos necessários à concretização da acção que consubstancia a contra-ordenação imputada, já que não faz menção às áreas a) implantada/anteriormente licenciada, b) ampliada, c) área do estabelecimento efectivamente em utilização aquando da fiscalização pelo C………. (actual D……….), factos que são essenciais para apurar a percentagem do aumento em relação à área anteriormente licenciada.

Sem tais especificações, fica - também aqui - vedado à arguida o pleno exercício do contraditório, que constitui exigência fundamental do Estado de Direito (art. 32º n.º 1 da CRP e art. 50º do RGCO), facto que constitui nova nulidade, que se arguiu nos termos legais (artigos 105, n.º 1 e 120º, n.º 1, do CPP e 41º n.º 1 do RGCO, entre outros) e cuja declaração judicial se requer, com todas as legais consequências.

Entendeu o tribunal recorrido que a decisão administrativa contém todos os elementos essenciais exigidos pelo art. 58º do Regime Geral das Contra-Ordenações.

No entanto, este artigo, na alínea) b do n.º 1, refere que a decisão condenatória deve conter a descrição dos factos imputados, pelo que houve violação deste normativo legal, ao não constar da decisão da entidade administrativa a indicação das referidas áreas, facto essencial para se apurar a percentagem da área ampliada em relação à área...

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