Acórdão nº 42/06.2TAOVR-C.P1 de Court of Appeal of Porto (Portugal), 17 de Fevereiro de 2010

Magistrado ResponsávelARTUR VARGUES
Data da Resolução17 de Fevereiro de 2010
EmissorCourt of Appeal of Porto (Portugal)

S Privacidade: 1 Meio Processual: REC PENAL.

Decisão: REVOGADA A DECISÃO.

Indicações Eventuais: 1ª SECÇÃO - LIVRO 619 - FLS 77.

Área Temática: .

Sumário: Posto que a lei penal não previna relativamente ao regime de permanência na habitação os objectivos e saídas que consagrou para o regime de semidetenção, não resulta daí que a lei pretenda afastar que o condenado segundo aquele regime possa prosseguir a sua actividade profissional, a sua formação profissional ou os seus estudos, salvaguarda que se mostre a compatibilidade com as finalidades de prevenção.

Reclamações: Decisão Texto Integral: RECURSO Nº 42/06.2taovr-C.P1 Proc. nº 42/06.2TAOVR, da Comarca do Baixo Vouga Ovar - Juízo de Instância Criminal – Juiz .

Acordam, em conferência, na 1ª Secção Criminal do Tribunal da Relação do Porto I - RELATÓRIO 1. Nos autos com o Nº 42/06.2TAOVR, da Comarca do Baixo Vouga Ovar – Juízo de Instância Criminal – Juiz ., foi proferido, aos 11/11/2009, despacho que indeferiu requerimento do arguido B……… em que impetrava autorização para se ausentar da habitação, a fim de exercer a sua actividade laboral, encontrando-se ele em cumprimento de pena em regime de permanência na habitação, com fiscalização por meios técnicos de controlo à distância.

  1. O arguido não se conformou com a decisão de indeferimento e dela recorreu.

    2.1 Extraiu o recorrente da motivação as seguintes conclusões (transcrição): I.

    O arguido, ora recorrente, não se conformando com o despacho proferido dele vem recorrer, versando o recurso sobre matéria de direito.

    II.

    As normas jurídicas que o recorrente entende terem sido violadas são as referentes são os artigos 40°, n.° 1, do Código Penal, e, 3°, n.° 2, da Lei n.° 122/99, de 20 de Agosto.

    III.

    O art.° 40°, n.° 1, do Código Penal, enuncia um equilíbrio entre a prevenção geral positiva e a prevenção especial positiva.

    IV.

    No despacho posto em crise, o tribunal deu primazia absoluta à prevenção geral positiva em detrimento da prevenção especial positiva, em desrespeito pelas orientações enumeradas pelo Acórdão do tribunal da Relação do Porto nos autos principais e pela essência subjacente à pena substitutiva da prisão.

    V.

    Ao decidir como decidiu, o tribunal não teve em consideração as condições pessoais de vida do arguido e sua personalidade, que tiveram na base da opção por uma pena substitutiva da prisão – regime de permanência na habitação -, a finalidade de socialização foi ignorada, com a agravante de ter desencadeado diligências no sentido de averiguar tal possibilidade de se ausentar, contactando mesmo terceiros, pedindo informações sobre possível relação laboral, horários, funções exercidas, quando pura e simplesmente, a decisão seria sempre de indeferimento por entender não ter acolhimento legal tal possibilidade de ausência pelo motivo invocado, porquê o protelar da situação e o criar de expectativas legítimas na sua aceitação??? VI.

    Pelo conseguinte, interpretou tal preceito legal de forma restritiva quando o deveria ter interpretado de forma extensiva.

    VII.

    Por outro lado, com a decisão tomada o tribunal ignorou completamente a possibilidade de autorizações de ausência do domicílio para efeitos de prestar actividade profissional, já que não providenciou correctamente pela execução dessa modalidade de cumprimento, bem como, descurou o facto de que ao contrário da normalidade nestas situações, antes da aplicação efectiva de tal medida não foi providenciada qualquer visita/acompanhamento prévio para se inteirar da situação do arguido e seu agregado familiar no que às condições mínimas necessárias para esse efeito diz respeito, em termos amplos.

    VIII.

    Interpretando restritivamente o art.° 3°, n.° 2, da Lei n.° 122/99, de 20 de Agosto, quando o deveria ter interpretado de forma literal, violou tal disposição legal.

    Remata impetrando a modificação do despacho recorrido.

  2. Respondeu o Magistrado do Ministério Público junto do Tribunal a quo, pugnando pela improcedência do recurso interposto, com os seguintes fundamentos (transcrição): O arguido B………., ora recorrente, foi condenado como autor material de um crime de falsificação de documento p. e p. pelo artº 256º 1 a) e nº 3 do Código Penal e de um crime de abuso de confiança p. e p. pelo artº 205º nº 1 e 4 al. b) do Código Penal na pena de 19 meses de prisão.

    Em sede de recurso, viu a pena ser reduzida para um ano de prisão, determinando-se o respectivo cumprimento em regime de permanência na habitação.

    Entretanto, veio o arguido, de novo, requerer autorização para se ausentar da habitação para trabalhar.

    Essa pretensão foi indeferida, por douto despacho de fls. e segs. onde se lê que: “(…) O arguido encontra-se a cumprir uma pena de prisão ainda que o modo de cumprimento dessa pena seja em regime de permanência na habitação.

    E precisamente porque cumpre uma pena de prisão afigura-se-nos que não pode o mesmo ser autorizado a ausentar-se da habitação, ainda que com o propósito de trabalhar, quando esse trabalho implica deslocações dentro do concelho de Santa Maria da Feira, em horário que se desconhece, bem como para locais que também se desconhece em concreto.

    Pois que com o regime de permanência na habitação, apenas pretenderá o legislador, salvaguardar o condenado a uma pena curta de pisão, do ingresso no meio prisional, mas não já preservar a sua inserção profissional, nem proteger a normalidade da vida do condenado, sob pena de ser completamente desvirtuado o cumprimento da pena de prisão imposta.

    Ora o arguido está a cumprir uma pena de prisão, não sendo possível compaginar o cumprimento dessa pena privativa de liberdade, com ausências diárias para as instalações da empresa que se propõe contratá-lo, por períodos diários de mais de 8 horas, acrescidas de ausências em dias e horas incertos, para locais não determinados do concelho de Santa Maria da Feira.

    Pelo exposto, indefere-se o requerido pelo arguido”.

    Inconformado com essa decisão, o arguido vem recorrer, alegando que o douto despacho violou os artºs 40º nº 1 do Código Penal e 3º nº 2 da Lei 122/99 de 20.8, dando primazia absoluta à prevenção geral positiva em detrimento do cumprimento da prevenção especial positiva, em desrespeito pelas orientações do douto Acórdão da Relação do Porto, nos autos principais e pela essência subjacente à pena substitutiva da prisão.

    Argumenta que o Tribunal não teve em conta as condições pessoais de vida do arguido e a sua personalidade, ignorando-se as finalidades da ressocialização, com a agravante de se terem encetado diligências no sentido de se averiguar da possibilidade de se ausentar, criando expectativas.

    Mais alega que o Tribunal não providenciou por qualquer visita ou acompanhamento prévio, para se inteirar da situação do arguido e do seu agregado familiar.

    Afirma ainda que o Tribunal interpretou restritivamente o artº 3º nº 2 da Lei 122/99 de 20 Agosto, quando o devia ter interpretado de forma literal.

    O arguido critica desta forma, o douto despacho recorrido, o que faz, a nosso ver, sem fundamento.

    Aliás, não é inédita a argumentação do arguido esquecido que está do facto de ter sido condenado, por douta decisão transitada em julgado, na pena de um ano de prisão.

    Porém, como noutra ocasião dissemos - em anterior resposta a recurso do arguido a versar sobre a mesma questão - o arguido/recorrente foi condenado numa pena de prisão.

    E foi-lhe aplicada uma pena privativa de liberdade, por se ter entendido que a pena de multa não era suficiente, nem adequada a preservar as finalidades da punição: a protecção de bens jurídicos e a reintegração do agente na sociedade - cfr. artº 40º nº 1 do Código Penal.

    Ou seja, entendeu-se que tais finalidades - prevenção geral positiva e prevenção especial positiva - só podiam ser alcançadas com a submissão do arguido a uma pena privativa de liberdade.

    Não pode o arguido/recorrente, por isso, pretender manter uma vida sem constrangimentos, semelhante àquela que tinha antes da sua condenação, a pretexto de que o trabalho contribuirá para a sua reintegração na sociedade.

    O arguido não está em liberdade! Foi condenado - por crimes graves - e foi-o em pena privativa de liberdade.

    E, ainda que importante, a ressocialização do arguido não é o único fim visado pela punição.

    Diga-se que importa, igualmente, que a punição responda à necessidade que a comunidade sente, de constatar que a norma violada mantém, apesar disso, a sua validade.

    Propósito que não será alcançado - com o consequente risco para a sociedade - se ao recorrente for concedida a liberdade de ir e vir, para onde quer, vivendo a sua vida como se a condenação que sofreu não tivesse ocorrido.

    É que, a ser assim, ficariam irremediavelmente comprometidas as finalidades da punição, quer as finalidades de prevenção especial, quer as de prevenção geral.

    Por um lado, porque o arguido/recorrente não sentirá a pena a que foi condenado, como uma verdadeira pena, pois que grande parte dos sacrifícios que esse cumprimento acarreta ficarão diluídos, levando a que não interiorize a censura que lhe foi dirigida.

    Por outro lado, e no que concerne às finalidade de prevenção geral, ficariam comprometidas, porque a comunidade sentirá como intolerável, a possibilidade dada ao arguido/recorrente, de cumprir em estado de “semi-liberdade”, uma pena privativa de liberdade.

    Argumenta o recorrente que o Tribunal ao fazer diligências na sequência do requerimento apresentado, criou expectativas de que o mesmo lhe viesse a ser deferido.

    Porém, entendemos que face ao requerimento apresentado pelo arguido, impunha-se ao Tribunal que fizesse diligências no sentido de apurar, com rigor em que circunstâncias, exactas, poderia ocorrer a prestação de trabalho, não devendo bastar-se com o que aquele entendeu expor no seu requerimento.

    Aliás, temos para nós, que se o Tribunal não fizesse quaisquer diligências, igualmente lhe seriam dirigidas críticas, desta feita por não ser exaustivo nas...

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