Acórdão nº 7/08.0TAMUR.P1 de Court of Appeal of Porto (Portugal), 03 de Fevereiro de 2010

Magistrado ResponsávelCASTELA RIO
Data da Resolução03 de Fevereiro de 2010
EmissorCourt of Appeal of Porto (Portugal)

S Privacidade: 1 Meio Processual: REC PENAL.

Decisão: REVOGADA A DECISÃO.

Indicações Eventuais: 1ª SECÇÃO - LIVRO 616 - FLS 157.

Área Temática: .

Sumário: I - Os princípios da vinculação temática de facto e de direito e da garantia da defesa impõem ao Assistente, que requer a abertura de instrução, que concretize a imputação da matéria de facto e da matéria de direito.

II - Porque só é punível o facto praticado com dolo – directo/necessário/eventual – ou, nos casos especialmente previstos na lei, com negligência – consciente/inconsciente -, impõe-se, então, ao Assistente o dever de afirmar factualmente qual o tipo de atitude ético-pessoal do agente, se de oposição ou de indiferença ou de descuido, perante o bem jurídico-penal lesado ou posto em perigo pela conduta proibida.

Reclamações: Decisão Texto Integral: Acordam em Conferência os Juízes do TRPRT no Recurso Penal nº 7/08.0 TAMUR.P1 da 1ª Secção Criminal: Inconformado com o Despacho de 22.5.2009 a fls 174-175 que, “porque legalmente inadmissível, rejeito[u] o requerimento para abertura de instrução apresentado pelo assistente (art. 287.º/3 CPP)” B………., Advogado residente na Rua ………., Murça, interpôs RECURSO, por fax das 20:30 de dia 18 a fls 179-184 entrado o original no dia 19 jun 2009 a fls 195-210, pretendendo a revogação de tal Decisão, com a consequente realização da Instrução conforme Requerimento de 26.01.2009 a fls 152-159, para Pronúncia do Arguido C………., agricultor residente no ………., Murça, pela autoria de um crime (doloso) de alteração de marcos p.p. pelo art 216º do Código Penal ao qual pertencem as disposições legais adiante referidas sem menção quanto a sua origem, tendo integrado nas Motivações §§ relevados das matérias de facto, direito e prova daquele Requerimento e rematado-as com 39 CONCLUSÕES delimitadoras do objecto do Recurso sem prejuízo das matérias de conhecimento oficioso conforme consabida Jurisprudência dos Tribunais Superiores, as quais seguidamente se reproduzem por transcrição após scanner: 1. Por douto despacho foi rejeitado o requerimento de abertura de instrução porque “(...) não obedece às prescrições do art. 283/3/als, impostas pelo art.287°/2 do CPP, pelo que qualquer despacho de pronúncia que fosse proferido na sua essência seria nulo”; 2. É por discordarmos do referido despacho de rejeição que se interpõe o presente recurso.

  1. Como se sabe, o requerimento de abertura de instrução não está sujeito a formalidades especiais — cfr. n° 2 do art. 287° do C.P.P.

  2. Todavia, porque deduzido pelo assistente e ora recorrente na sequência de um despacho de arquivamento, trata-se de uma verdadeira acusação; 5. Pelo que deverá o referido requerimento de instrução conter a alegação de concretos e explícitos factos materiais praticados pelo arguido e do elemento subjectivo que presidiu para o cometimento do crime; 6. Vejamos, então se o requerimento de instrução formulado pelo assistente e ora recorrente, obedece ou não às prescrições constantes do n° 3 do art. 283° do C.P.P, por remissão do n° 2 do art. 287° do mesmo diploma legal; 7. Não existem dúvidas quanto à identidade do arguido C………. — cfr. alínea a) do n° 3 do art. 283° do C.P.P.; 8. Quanto à narração dos factos constantes do requerimento de abertura de instrução, verificamos que começa o ora recorrente por referir que resulta inequivocamente da prova produzida no inquérito que existia um marco delimitador dos prédios do assistente e do arguido — cfr. arts. 4° e 9° do requerimento instrutório; 9. [Inexistente nas Conclusões sem se vislumbrar omissão na alegação narrativa] 10. Ulteriormente, o assistente refere que havia prova bastante nos autos de que foi o arguido quem colocou esse mesmo marco — cfr. art. 5° e 7° do requerimento; 11. Isso resulta, designadamente do testemunho de D………. e de E………. — fls. 34 e 36 dos autos, respectivamente; 12. Portanto, não há dúvidas da existência de um marco delimitador dos prédios e de quem o colocou; 13. Se ainda pudessem existir dúvidas, mais não se teria do que perguntar às pessoas que também estavam presentes, o que, por não ter sido feito no inquérito, se requereu a sua realização em sede de instrução; 14. Ainda no que concerne à narração dos factos, resulta também da prova produzida no inquérito que o ora recorrente e assistente, há cerca de 5 anos, mandou colocar postes e arames a delimitar ambos os prédios — cfr. art. 10° do requerimento instrutório; 15. Sobre esta matéria, o arguido a fls. 78 dos autos disse o seguinte: “Confirma que, de facto, foram colocados postes e arames, a delimitar os terrenos, mas que não foram colocados no alinhamento do marco” - cfr. art. 11° do requerimento instrutório; 16. Portanto, na óptica do arguido, os referidos postes e arames foram colocados para delimitar os terrenos, só não foram colocados no alinhamento do marco; 17. Enunciou, assim, o assistente, no referido requerimento, os factos e as provas existentes no inquérito que demonstram a existência do marco; 18. Depois disso, o ora recorrente enuncia as provas (documental e testemunhal) produzida no inquérito que comprovam que os postes e arames foram colocados no alinhamento do marco até com claro prejuízo para o ofendido, ora recorrente — vide fotografias juntas sob o docs. n° 1 a 7 e, entre outros, o depoimento das testemunhas F………. e G……….; 19. O depoimento destas testemunhas quanto àqueles factos não foi contrariado por qualquer outra prova no inquérito; 20. Assim, sendo os postes e arames colocados há cerca de 5 anos para delimitar os terrenos (palavras do arguido) na presença do arguido, passaram, desde então, a também serem marcos delimitadores de ambos os prédios; 21. Além do marco delimitador colocado pelo arguido, que agora com a sua conduta colocou um poste a 70 cm daquele no terreno propriedade do assistente: “(...) com a intenção clara de delimitar e se apropriar daquela faixa de terreno” - cfr. art. 17° do requerimento instrutório; 22. Essa é uma conclusão indiscutível, atento toda a factualidade e prova constante dos autos e que motivou a discordância do assistente e ora recorrente quanto ao despacho de arquivamento; 23. E isto mais assim é se tivermos em atenção o conceito vertido por Manuel Leal - Henriques e Manuel Simas Santos, no Código Penal Anotado, 2° Vol. Ed. Reis dos Livros, Pág. 832”; 24. No requerimento de abertura de instrução o assistente ainda deu como reproduzida a acusação pública deduzida contra o arguido pelo crime de dano; 25. Ou seja, resulta, assim, humildemente julgamos, que do requerimento instrutório foi feita adequada narração dos factos; 26. Identificando o assistente também a ausência de fundamento no arquivamento dos autos relativamente ao crime de alteração de marcos, o que, de resto, motivou o requerimento instrutório; 27. Após a narração dos factos, o assistente e ora recorrente, subsumiu os referidos factos e conduta do arguido no crime de alteração de marcos, como resulta dos arts. 18° e seguintes do requerimento de abertura de instrução.

  3. Terminando o assistente e ora recorrente o seu requerimento instrutório dizendo o seguinte: “(...) o arguido, com dolo directo, praticou o crime previsto e punido pelo art. 216° do C.P.”.

  4. Portanto, como supra se demonstrou, o ora recorrente no requerimento de abertura de instrução narrou os factos materiais concretos e explícitos praticados pelo arguido, as provas que os fundamentam e, por fim, indicou as disposições legais violadas pela conduta do arguido.

  5. Não descortinamos que outra matéria teria o assistente que alegar, nem a que a outras prescrições legais teria de obedecer.

  6. Quando muito poderia suscitar-se a questão do momento da prática dos factos pelo arguido, olvidando-se, assim, a referência aos 5 anos em que foi colocado o marco, os postes e os arames, que expressamente foi referido no requerimento instrutório. E esquecendo-nos ainda que o requerimento instrutório foi feito com referência a queixa e a acusação publica 32. De qualquer modo, mesmo a haver qualquer falta, mais não se teria do que se notificar o ora recorrente para suprir essa mesma insuficiência.

  7. Por último, acrescenta-se que o requerimento de abertura de instrução só pode ser rejeitado por extemporâneo, por incompetência do juiz ou por inadmissibilidade legal da instrução, conforme preceitua o n° 3 do art. 287° do C.P.P.

  8. Este preceito legal é taxativo, não admitindo interpretações extensivas.

  9. Como julgamos ter demonstrado, o ora recorrente no requerimento de abertura de instrução obedeceu às prescrições constantes do n° 3 do art. 283°, impostas pelo n° 2 do art. 287°, ambos do C.P.P; 36. Ou seja, aquele requerimento contém todos os elementos ali referidos e, mesmo que assim não fosse, não estabelece a lei qualquer sanção para a omissão destes elementos.

  10. Quando muito teria o Meritíssimo Juiz “a quo” que notificar o assistente para que este completasse o requerimento com os elementos que entendia ter omitido e que não deveria ter omitido.

  11. E, caso o assistente não completasse o requerimento, então o juiz não procederia à instrução.

  12. Era assim, não podemos deixar de pensar, que o Juiz “a quo” deveria ter procedido nos presentes autos, caso verificasse alguma omissão, que, sinceramente, não descortinamos, mas que, efectivamente, não fez, motivando o presente recurso.

    A Magistrada do MINISTÉRIO PÚBLICO respondeu em 06.7.2009 a fls 212-219, nos termos e para os efeitos do art 413º do CPP, concluindo pelo não provimento do Recurso e confirmação do Despacho recorrido conforme RESPOSTA que rematou com 6 CONCLUSÕES que seguidamente se reproduzem por transcrição após scanner: 1. O que está sob recurso é o douto despacho proferido em 22 de Maio de 2009, a fls. 174 a 175, que rejeitou, por legalmente inadmissível, o requerimento de abertura de instrução apresentado pelo assistente B………. ; 2. No requerimento de abertura de instrução apresentado pelo assistente não se procede a uma descrição circunstanciada dos factos que são imputados ao arguido, não os localizando...

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