Acórdão nº 736/04.7TBCTB-A.C1 de Court of Appeal of Coimbra (Portugal), 02 de Março de 2010

Data02 Março 2010
ÓrgãoCourt of Appeal of Coimbra (Portugal)

Acordam na Secção Cível do Tribunal da Relação de Coimbra I – A Causa 1.

Em Abril de 2004[1], A...

e o seu marido, B...

, por si e em representação do seu filho menor, C...

(são estes os AA. e neste recurso, que contramotivaram, assumem o papel de Agravados), demandaram a a D...

e a seguradora E..., Companhia de Seguros,...

(1ª e 2ª RR., respectivamente)[2], pedindo a condenação solidária destas entidades a satisfazerem-lhes, no quadro de uma imputação delitual à 1ª R. – e, no que respeita à 2ª R., de um contrato de seguro cobrindo tal imputação –, a indemnização de €310.800,00, respeitante a danos patrimoniais e não patrimoniais.

Suportando tal pedido, invocam os AA. a ocorrência de um acidente do qual foi vítima o menor C..., no dia 11/11/1998 no parque infantil da 1ª R. (com um baloiço rotativo vulgarmente referido como “cavalinhos”), acidente que atribuem a incúria da 1ª R., desvalor comportamental este que, na tese dos AA., é cumulativamente referido às condições de segurança do equipamento e à omissão do dever de vigilância das crianças utentes desse equipamento pela 1ª R.

[3], decorrendo a responsabilidade da 2ª R., como antes se disse, da cobertura propiciada pela existência de um contrato de seguro tomado pela 1ª R[4].

1.1.

A acção foi contestada por ambas as RR..

A 1ª delas (a D...) – e cingimo-nos aqui ao que na contestação apresenta interesse para o presente agravo –, pugnando pela improcedência da acção, atribuiu ao evento corrido ao menor a natureza de “acidente escolar” e, em função disso, abrangido pelo “seguro escolar”[5].

A 2ª R. (a Companhia de Seguros), por sua vez, invocou as particularidades do contrato de seguro tomado pela 1ª R., pugnando, em função dessas particularidades, pela redução do montante em que eventualmente venha a ser condenada.

1.2.

Replicaram os AA.

(vale aqui a peça processual certificada a fls. 129/132), sendo que aí provocaram a intervenção principal, como R., do Estado Português (3º R. e neste recurso Agravante), nos termos dos artigos 325º, nºs 1 e 2 e 31º-B do Código de Processo Civil (CPC), expressando tal pretensão da seguinte forma: “[…]30ºA proceder o alegado pela R. D... [refere-se à qualificação como acidente escolar abrangido pelo seguro escolar], tal responsabilidade de indemnizar os AA. caberá ao Estado Português, advindo tal responsabilidade da sua obrigação em possuir programa de prevenção de acidentes e seguro escolar que garanta a cobertura financeira da assistência a prestar a alunos sinistrados, complementarmente aos apoios assegurados pelo sistema nacional de saúde – artigo 17º do Decreto-Lei nº 35/90, de 25 de Janeiro.

  1. «São objecto de cobertura pelo seguro escolar os danos sofridos pelos alunos em consequência do acidente escolar» – artigo 3º do Despacho Conjunto nº 4 dos Secretários de Estado da Acção Educativa e da Educação e Inovação, publicado no DR II Série de 21/06/1996.

  2. Caso se entenda classificar o acidente em causa nos autos como «acidente escolar» a obrigação de indemnizar impenderá sobre o Estado Português.

  3. Assim, por existência de sérias dúvidas de a quem, afinal, caberia zelar pela saúde e segurança do menor C..., os AA. pretendem, nos termos do artigo 31º-B do CPC, deduzir subsidiariamente o mesmo pedido contra o Estado Português.

  4. Pelo que, com fundamento no artigo 325º, nº 2 do CPC, vêm os AA. requerer a intervenção principal provocada do mesmo.

[…]” [transcrição de fls. 131 e vº, sublinhado ora acrescentado] 1.2.1.

Através do despacho certificado a fls. 134/135 (corresponde a fls. 175/176 do processo matriz deste agravo) foi a intervenção do Estado Português admitida, determinando-se a sua citação[6].

1.2.2.

Contestou o Estado Português (fê-lo em concreto o Exmo. Magistrado do Ministério Público junto do Tribunal de Castelo Branco), nos termos certificados a fls. 136/148. Em tal peça, no que releva para o presente recurso, veio arguir a incompetência absoluta em razão da matéria da jurisdição comum para apreciação de um evento que constitua acidente escolar e que possa estar coberto pelo seguro escolar (corresponderia tal competência à jurisdição administrativa) e, em função desta incidência, a inadmissibilidade do chamamento do Estado.

1.3.

Surge então, findos os articulados, o despacho saneador certificado a fls. 162/170, no qual se integra o trecho decisório aqui agravado (itens III.II e III.III, deste despacho a fls. 165/169), julgando improcedente a excepção de incompetência em razão da matéria e insubsistente a invocação da inadmissibilidade da intervenção provocada do Estado Português.

Quanto à primeira questão (incompetência em razão da matéria), consignou-se o seguinte: “[…] A competência do Tribunal em razão da matéria determina-se pela estrutura jurídica material em debate segundo a versão apresentada em juízo […].

[…] Consequentemente, é pela questão posta na petição inicial que se define a acção e a competência do tribunal.

[…] Os AA. fundam a presente acção em responsabilidade civil por factos ilícitos por parte da [1ª R.] por, em resumo, não dispor o equipamento onde o menor se encontrava a brincar de mecanismos de segurança que impedissem a queda daquele e ao mesmo passo terem sido omitidos os deveres de vigilância que se impunham por parte de funcionários da D....

Em adição, os AA. demandam ainda a [2ª R.], por, à data do sinistro, se encontrar transferida para esta a responsabilidade emergente de acidentes pessoais ocorridos dentro das instalações da D....

Apenas na sequência da defesa apresentada pela [1ª R.] vieram os AA., nos termos e ao abrigo do disposto nos artigos 31º-B e 325º, nº 2 do CPC, requerer a intervenção principal provocada do Estado Português e pedir subsidiariamente a sua condenação, caso se conclua que o acidente dos autos se mostra abrangido pelo «seguro escolar» […].

Assim, […] resulta claro que é da competência do tribunal comum e não do tribunal administrativo o pedido formulado pelos AA..

[…] [transcrição de fls. 167/168] Quanto à questão da intervenção provocada do Estado, renovando o entendimento de que a competência material dos tribunais comuns decorre do pedido feito na petição inicial, considerou-se admissível o chamamento do qual resultou a intervenção do Estado (fls. 169).

1.4.

Inconformado com estes pronunciamentos decisórios constantes do despacho saneador, apresentou-se o Estado Português (3º R.) a deles agravar, motivando o recurso a fls. 2/10, formulando em tal âmbito as seguintes conclusões: “[……………………………………….]” [transcrição de fls. 7 vº/9 vº] Os agravados responderam a fls. 35/45, pugnando pela confirmação dos trechos decisórios impugnados.

II – Fundamentação 2.

Encetando a apreciação do recurso, ocorre consignar que o âmbito objectivo do mesmo ficou definido através das conclusões acima transcritas (artigos 684º, nº 3 e 690º, nº 1 do CPC), sendo relevantes, enquanto factos a considerar no processo argumentativo subsequente – factos processuais, chamemos-lhe assim, são os aqui em causa –, os actos processuais relatados no antecedente item, actos que se encontram, como é bom de ver, documentalmente provados nos autos, emergindo todos eles das certidões com as quais o agravo foi instruído.

Através deste recurso são colocados em crise – assim se impedindo o respectivo trânsito (v. artigo 510º, nº 3 do CPC) – os trechos do saneador que expressamente apreciaram a questão da competência material da jurisdição comum relativamente ao pedido subsidiário formulado pelos AA. na réplica. Respeita tal pedido à apreciação do evento danoso do qual foi vítima o menor C... na perspectiva de se tratar, como o entendeu a 1ª R. na sua contestação, de um “acidente escolar” e de o mesmo estar coberto (ou de ter sido efectivamente coberto) pelo chamado “seguro escolar”, através da atribuição das prestações próprias deste[7].

Esta questão da competência da jurisdição comum foi...

Para continuar a ler

PEÇA SUA AVALIAÇÃO

VLEX uses login cookies to provide you with a better browsing experience. If you click on 'Accept' or continue browsing this site we consider that you accept our cookie policy. ACCEPT