Acórdão nº 772/06.9TBLRA.C1 de Court of Appeal of Coimbra (Portugal), 09 de Fevereiro de 2010

Magistrado ResponsávelTELES PEREIRA
Data da Resolução09 de Fevereiro de 2010
EmissorCourt of Appeal of Coimbra (Portugal)

Acordam na Secção Cível do Tribunal da Relação de Coimbra I – A Causa 1.

Em Fevereiro de 2006[1], a Caixa Geral de Depósitos, S.A.

(A. e nesta instância Apelante) demandou a Caixa de Crédito Agrícola Mútuo de Leiria, CRL (R e aqui Apelada), imputando a esta o uso da expressão “CAIXA DE LEIRIA”, em diversas circunstâncias comunicacionais com incidência pública (na fachada do seu estabelecimento em Leiria; num anúncio publicado numa revista), sendo que esse procedimento da R. consubstancia, cumulativamente, na visão das coisas da A., um “uso ilegal de firma ou denominação”, uma “violação do direito à marca”, um acto de “concorrência desleal” e um acto de “publicidade enganosa”.

Com efeito – e disto decorrem os referidos desvalores comportamentais atribuídos à R. –, a A. é titular do registo de marca nacional consubstanciado na expressão “CAIXA”, no domínio dos serviços e negócios bancários, não correspondendo a referida expressão empregue pela R. a nenhum sinal distintivo cujo registo esta tenha obtido em seu nome. Daí – afirma-o a A. – o carácter “ilegal, ilícit[o] e danos[o]” (fls. 6) da utilização dessa expressão nos contextos mencionados, devendo cessar tal uso.

Em função destes argumentos, formula a A. os seguintes pedidos: “[…] 1) Condenar-se a R. a abster-se de usar e a cessar o uso da expressão «CAIXA DE LEIRIA», nomeadamente no exterior ou no interior dos seus estabelecimentos, em publicidade e quaisquer outros documentos ou materiais de carácter comercial e/ou promocional.

2) Condenar-se a R. a pagar uma quantia de €500,00 a título de sanção pecuniária compulsória, por cada dia de atraso no cumprimento do pedido anterior, desde a data de citação até prova de total cumprimento, nos termos do artigo 829º-A, nºs 1, 2 e 3 do Código Civil.

3) Condenar-se a R. a pagar à A. a indemnização a título de responsabilidade civil extracontratual que se liquidar em execução de sentença acrescida de juros vencidos e vincendos, com todas as legais consequências.

[…]” [transcrição de fls. 17] 1.1.

Citada em 07/02/2006 (fls. 48), apresentou-se a R. a contestar pugnando pela improcedência da acção, negando qualquer propósito de, com o emprego da expressão “CAIXA DE LEIRIA”, se ver confundida com a A.. Invoca, todavia, a falta de carácter distintivo do termo “CAIXA” e, alicerçada em tal asserção, afirma a inadequação legal desse termo a constituir uma marca e a impossibilidade de através dele se originar algum tipo de confusão entre a R. e a A..

Adicionalmente, invoca a R. a ineptidão, por falta de causa de pedir, relativamente ao pedido indemnizatório referido em 3) do pedido da A..

1.2.

Findo o julgamento[2], fixados os factos provados por referência à base instrutória (despacho de fls. 183/185) e produzidas, por escrito, as alegações de direito da A. (fls. 187/196), proferiu o Tribunal de Leiria (Juiz de Círculo) a Sentença de fls. 201/210 vº – constitui esta a decisão objecto do presente recurso –, julgando a acção improcedente e absolvendo a R. do pedido.

In itinere deste pronunciamento decisório julgou a mesma Sentença improcedente a alegação da R. respeitante à ineptidão da petição inicial no que respeita ao pedido indemnizatório[3]. 1.3.

Inconformada reagiu a A. através do presente recurso de apelação, motivando-o a fls. 215/262, nele formulando as conclusões que aqui se transcrevem: [………………………………………………………………..] II – Fundamentação 2.

Encetando a apreciação da apelação, importa ter presente que as conclusões formuladas pela Apelante na sua motivação operaram a delimitação temática do objecto do recurso [artigos 684º, nº 3 e 690º, nº 1, ambos do Código de Processo Civil (CPC)].

Começando pelos factos, sublinha-se que a Apelante os não discute – rectius, não suscita a reapreciação destes por referência aos poderes de controlo desta instância previstos no artigo 712º, nºs 1 e 2 do CPC –, devendo os factos fixados no Tribunal a quo terem-se por definitivamente estabelecidos, nos exactos termos em que a Sentença recorrida, conjugando o teor dos despachos de fls. 73/75 e 183/185, os indicou no seu texto. É esse elenco fáctico que aqui reproduzimos visando propiciar a total compreensão da situação através do texto do presente Acórdão: “[…] 1.

A A. [a Caixa Geral de Depósitos] é uma sociedade anónima de capitais exclusivamente públicos que se dedica à actividade bancária – alínea A) da especificação.

  1. No preâmbulo do Decreto-lei n.º 287/93, de 20 de Agosto (diploma que aprovou os estatutos da autora), consta escrito que a Caixa Geral de Depósito «chegou aos nossos dias com uma posição de grande destaque no conjunto das instituições de crédito portuguesas, já não dependendo dos depósitos públicos, actuando como um banco universal e sendo a matriz do maior grupo financeiro português» – alínea B) da especificação.

  2. A A. detém uma rede de balcões que se estende por todo o território nacional, incluindo uma agência em Leiria (na Praça Goa, Damão e Diu), um gabinete de empresas em Leiria (ao Largo Santana, 14) e outras agências no distrito de Leiria, a saber, na Caranguejeira e na Marinha Grande – alínea C) da especificação.

  3. A R. [a Caixa de Crédito Agrícola Mútuo de Leiria] é uma caixa de crédito agrícola mútuo e uma instituição de crédito cujo objecto é o exercício de funções de crédito agrícola em favor dos seus associados, bem como a prática dos demais actos inerentes à actividade bancária – alínea D) da especificação.

  4. Para além da sua sede em Leiria, a R. tem também delegação noutras localidades do distrito de Leiria, a saber, na Caranguejeira e na Marinha Grande – alínea E) da especificação.

  5. A denominação completa da R. é «Caixa de Crédito Agrícola Mútuo de Leiria, C.R.L.» – alínea F) da especificação.

  6. A R. utiliza na fachada do seu estabelecimento em Leiria a expressão «Caixa de Leiria» – alínea G) da especificação.

  7. Na referida fachada não se visualizam quaisquer outras palavras ou expressões – alínea H) da especificação.

  8. A mesma expressão, «Caixa de Leiria», surgiu, pelo menos, num anúncio publicado na revista Invest de Julho de 2005 – alínea I) da especificação.

  9. Nesse anúncio, a expressão «Caixa de Leiria» é reproduzida duas vezes: a primeira com letras de pequena dimensão, sublinhadas e acompanhadas pela denominação integral Caixa de Crédito Agrícola Mútuo de Leiria, C.R.L. e pelo símbolo do crédito agrícola; e a segunda, na parte inferior do anúncio, em letras de grande dimensão, por cima da frase «90 anos ao Serviço da Comunidade» – alíneas J) e L) da especificação.

  10. No mesmo anúncio lêem-se, na parte superior, as frases «Cada vez mais perto de si» e «Cada vez mais o Banco da Terra» – alínea M) da especificação.

  11. A A. é titular do registo da marca nacional n.º 357.310 «CAIXA», o seu registo foi requerido ao Instituto Nacional da Propriedade Industrial em 10 de Julho de 2001 e foi concedido em 25 de Setembro de 2002 para serviços e negócios bancários, incluindo os serviços de crédito, serviços e negócios financeiros – alínea N) da especificação.

  12. A A. é titular do registo da marca nacional n.º 357.311 «CAIXA», requerido em 10 de Julho de 2001 e concedido em 7 de Outubro de 2002 para serviços e negócios bancários, incluindo os serviços de crédito, serviços e negócios financeiros – alínea O) da especificação.

  13. A expressão «Caixa de Leiria» não corresponde a nenhum sinal distintivo que a R. tenha registado em seu nome – alínea P) da especificação.

  14. A mesma abreviatura, «Caixa», era já utilizada para referir a autora desde pelo menos 1969, no diploma que constituía a lei orgânica vigente até 1 de Setembro de 1993, isto é, o Decreto-Lei n.º 48953, de 5 de Abril de 1969 – alínea Q) da especificação.

  15. O símbolo colocado na frontaria dos estabelecimentos da R. é o do Crédito Agrícola Mútuo, usado por todas as caixas de crédito agrícola mútuo, pela Federação Nacional das Caixas de Crédito Agrícola Mútuo e pela Caixa Central de Crédito Agrícola Mútuo – resposta ao quesito 7.º.

  16. O uso, pela R., da expressão «de Leiria» visa efectuar a destrinça relativamente às demais caixas de crédito agrícola mútuo – resposta ao quesito 8.º.

  17. A R. não se quer ver confundida com a A. ou ver esta confundida consigo – respostas ao quesitos 9.º, 10.º e 11.º.

  18. A R., como todas as demais caixas de crédito agrícola mútuo, esteve entre 1919 e 1982 sujeita e subordinada à A., que a tutelava, nomeadamente dando ordens e autorizando ou proibindo a realização de actos do seu comércio – respostas aos quesitos 12.º, 10.º e 11.º.

[…]” [transcrição de fls. 203/204] 2.1.

A Sentença apelada delimitou adequadamente o thema decidendum da acção, sendo que tal objecto, face ao pronunciamento da primeira instância no sentido da improcedência do pedido, e tendo em conta o carácter abrangente das conclusões – introduzem elas, com efeito, a rediscussão dos próprios fundamentos da acção –, se transfere agora, nos seus exactos termos, para esta Relação, passando a corresponder ao tema do presente recurso. Assim, utilizando a caracterização feita pelo Exmo. Juiz a quo quanto ao objecto da acção que se lhe deparou, diremos que a apreciação do recurso implica “[v]erificar se ocorrem os pressupostos que justificam a pretendida condenação da R. a abster-se de usar e a cessar o uso da expressão «CAIXA DE LEIRIA», sendo que isso […]” pressupõe a determinação da “[…] relevância dos registos de marca nacional [«CAIXA»] de que a A. é titular […]”[4], enquanto elemento integrador da proibição da R. de utilizar, nos contextos aqui em causa e noutros, a referida designação «CAIXA DE LEIRIA».

Uma resposta positiva a este elemento (central) da pretensão da A., ou seja a afirmação do exclusivo da marca «CAIXA», conduzir-nos-á, complementarmente, à apreciação das questões correspondentes aos pontos 2) e 3) do pedido transcrito supra no final do item 1. (sanção pecuniária compulsória; responsabilidade civil extracontratual da R. por violação do direito da A. consubstanciado na marca). De facto, estes elementos do pedido da A. só não foram...

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