Acórdão nº 17/09.0GACNT.C1 de Court of Appeal of Coimbra (Portugal), 28 de Janeiro de 2010

Magistrado ResponsávelORLANDO GON
Data da Resolução28 de Janeiro de 2010
EmissorCourt of Appeal of Coimbra (Portugal)

Relatório Pelo 3.º Juízo Criminal do Tribunal de Coimbra, sob acusação do Ministério Público, foi submetida a julgamento, em processo sumário, a arguida CZ.

filha de M e de A., nascida a 25/…1961, em Coimbra, e residente, na Rua Principal,…. Coimbra, imputando‑se-lhe os factos constantes do auto de notícia e despacho de folhas 9, pelos quais teria cometido um crime de condução sem habilitação legal, p. e p. pelo artigo 3.º, n.ºs 1 e 2 do DL n.º 2/98, de 3 de Janeiro.

Realizada a audiência de julgamento, o Tribunal Singular, por sentença proferida a 10 de …. de 2009, decidiu condenar a arguida CZ , como autora material de um crime, p. e p. no artigo 3.º, n.ºs 1 e 2 do DL. n.º 2/98, de 03.01, na pena de 12 (doze) meses de prisão.

Inconformada com a sentença dela interpos recurso a arguida CZ concluindo a sua motivação do modo seguinte: A) não pretende o ora Recorrente controverter os factos provados, mas antes protestar contra a concreta pena que lhe foi aplicada.

  1. a Mma juiz a quo relevou como pena adequada a título principal a pena de prisão, determinou a medida concreta da mesma em 12 meses e concluiu que não se verificam in casu os pressupostos legais atinentes à aplicação de uma pena não privativa da liberdade. C) I. Questão prévia D) A não pronuncia do Tribunal sobre a possibilidade de substiruição da pena constitui uma nulidade prevista no artigo 379.º, n.º 1 alínea c) do C.P.P.

  2. Nos termos do art.58.º do C.P., e conforme entendimento do nosso STJ, vide ac. de 21 de Junho de 2007, “o tribunal não é livre de aplicar ou deixar de aplicar uma pena de substituição, pois não detém uma faculdade discricionária; antes, o que está consagrado na lei é um poder/dever ou um poder vinculado (...)”.

  3. “ Uma vez verificados os respectivos pressupostos, o tribunal não pode deixar de aplicar a pena de substituição. Esses pressupostos são os seguintes: ser de aplicar pena de prisão em medida não superior a um ano; ser de concluir que a substituição da pena de prisão por trabalho a favor da comunidade satisfaz as finalidades da punição.” G) Ora, in caso, encontra-se cumprido o primeiro requisito, H) tendo entendido o Tribunal que “ as penas não privativas da liberdade se mostram desajustadas ao caso concreto, atendendo às elevadas exigências de prevenção geral e especial”.

  4. Ora, do que aqui se trata não é de aplicar à arguida uma pena não privativa da liberdade, mas sim substituir a pena privativa da liberdade por uma outra.

  5. O que o Tribunal não questionou, havendo, como tal uma omissão de pronúncia acerca da possibilidade de aplicação de uma pena de substituição.

  6. Nulidade esta prevista no artigo 379.º, n.º1 alínea c) do C.P.P.

  7. II. Da pena aplicada.

  8. Para fundamentar a pena aplicada, o Tribunal a quo entendeu que, “as exigências de prevenção geral são elevadas, uma vez que este ilicito é muito praticado na área desta comarca, importando, por isso repor a confiança na norma violada. Por outro lado, não podemos esquecer que a condução sem habilitação legal é um dos factores que contribui para o elevado número de acidentes rodoviários” (página 7).

  9. Por seu turno, e no que toca às exigências de prevençao especial, “são muito elevadas, atendendo ao facto de a arguida já ter sofrido diversas condenações, sendo cinco delas pela prática do crime de condução sem habilitação legal. Acresce que a arguida já esteve privada da liberdade pela prática deste crime e não se absteve de o voltar a praticar. Também ficou assente que não tem crítica nem arrependimento em relação aos factos em análise” O) Por último, e ao analisar o juizo de culpa do agente no caso concreto, a douta sentença recorrida declara que a arguida actuou “com dolo directo, na modalidade mais intensa, porquanto a arguida representou claramente o facto criminosos e actuou com intenção de o realizar, tendo tal facto constituído o objectivo primeiro e final da sua conduta.” P) Quanto à ilicítude, entendida como juizo de desvalor da ordem jurídica sobre um comportamento, por este lesar e pôr em perigo bens jurídicocriminais, considera‑se a mesma de “grau mediano” (página 7).

  10. Tendo ainda a douta sentença declarado que a arguida tem a seu favor a circunstância de estar inscrita em escola de condução, já ter tentado realizar o exame teórico e ser respeitada no meio social onde se insere.

  11. Não pode, no entanto, o Recorrente concordar com a medida da pena, que se revela desmesuradamente severa e não coincidente com as regras legais impostas para a sua determinação.

  12. Efectivamente, sublinhe‑se desde já que não pretende o ora Recorrente controverter os factos provados ‑ com excepção da conclusão que “o arguído não demonstrou arrependimento” ‑ e, por conseguinte, da concreta prática do crime pelo arguido ‑ a qual foi objecto de confissão em audiência de discussão e julgamento ‑, mas antes protestar contra a concreta pena que lhe foi aplicada.

  13. No que respeita à medida e espécie da pena aplicada in casu, cumpre aferir da consonância da mesma com os critérios plasmados nos artigos 40.º, 70.º e 71.º do Código Penal.

  14. Determina o n.º 1 do artigo 71.º que “a determinação da medida da pena, dentro dos limites definidos na lei, é feita em função da culpa do agente e das exigências de prevenção”, V) Preceito que deverá ser articulado com o artigo 40.º do mesmo diploma que, sob a epigrafe de finalidades das penas e medidas de segurança, dispõe que “1 ‑ A aplicação de penas e de medidas de segurança visa a protecção de bens jurídicos e a reintegração do agente na sociedade; 2 ‑ Em caso algum a pena pode ultrapassar a medída da culpa” W) Assim, as finalidades da pena residem primordialmente na tutela de bens jurídicos e na reinserção ‑ na medida do possível ‑ do agente da comunidade, tendo como limite máximo inultrapassável a culpa deste.

  15. Deveremos fazer assim intervir os critérios da prevenção geral positiva e da prevenção especial positiva no concreto processo de determinação da pena ‑ traduzindo‑se a culpa num limite de todo inultrapassável de todas e quaisquer considerações preventivas.

  16. Como refere Figueiredo Dias ( in Direito Penal Português – As Consequências Jurídicas do Crime, 1993, Aequitas Editorial Noticias, páginas 227 e 231), aquelas finalidades articulam‑se no ordenamento jurídico‑penal português sob uma teoria da prevenção, sendo que a prevenção geral, enquanto critério da medida da pena, não se reconduz a um acto de valoração in abstracto ‑ pois que este foi já realizado pelo legislador ao determinar a moldura penal aplicável.

  17. Tratando‑se antes de um acto de valoração in concreto de conformação social da valoração legislativa ‑ a levar a cabo pelo aplicador à luz das circunstâncias do caso e onde factores da mais diversa natureza e procedência ‑ nomeadamente atinentes ao facto e ao agente concreto ‑ podem fazer variar em concreto a medida da tutela dos bens jurídicos e da necessidade da pena exigida para o restabeleci mento da confiança comunitária.

    A

  18. Assim, e dentro dos limites consentidos pela prevenção geral positiva devem actuar pontos de vista de socialização, sendo eles que vão determinar, em último termo, a medida da pena ‑ pois o que se pretende é evitar a quebra da inserção social do agente e servir a sua reintegração na comunidade, só por esta via se alcançando uma eficácia óptima na tutela de bens jurídicos.

    BB) Esta mesma orientação é secundada unanimemente pela jurisprudência proferida na vigência do actual Código Penal ‑ que introduziu o artigo 40.º na delimitação das finalidades da pena ‑, sendo disso exemplo, entre outros, os Acórdãos do Supremo Tribunal de Justiça de 12 de Março de 1997, de 19 de Janeiro de 2000, de 25 de Abril de 2000 e de 26 de Outubro de 2000 (in www.dgsi.pt ).

    CC) Todavia, o processo de determinação concreta da pena seguido pela Mma. juiz a quo contraria as indicadas regras legais, bem como a doutrina e a jurisprudência aplicáveis.

    DD) De facto, no caso ora em análise foi aplicada ao agente uma pena privativa da liberdade, que a nosso ver e, de acordo com o plasmado na douta sentença, assenta fundamentalmente no facto de o agente ter antecedentes criminais.

    EE) De acordo com Figueiredo Dias, in Direito Penal Português ‑ As consequências jurídicas do crime, pág. 253, “A existência de condenações anteriores do agente constitui uma circunstância atinente à sua vida anterior que pode servir para agravar a medida da pena. Ainda aqui, porém, tal só deve suceder na medida em que tais considerações possam ‑ para além do campo da reincidência – ligar-se ao facto...

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