Acórdão nº 60/08.6GFCVL.C1 de Court of Appeal of Coimbra (Portugal), 16 de Dezembro de 2009

Magistrado ResponsávelBELMIRO ANDRADE
Data da Resolução16 de Dezembro de 2009
EmissorCourt of Appeal of Coimbra (Portugal)

Acordam, em conferência, no Tribunal da Relação de Coimbra: I.

O arguido, J…, identificado nos autos, recorre da sentença em que o tribunal recorrido decidiu condená-lo: - como autor material de um crime de dano p ep pelo art. 212º, n.º1 do C. Penal, na pena de 90 dias de multa à taxa diária de € 6,00; - no pagamento, a favor da demandante H…, a título de indemnização por danos patrimoniais, da quantia de € 500,00 (quinhentos euros) acrescida de IVA.

* Na motivação são formuladas as seguintes CONCLUSÕES: PRIMEIRA — Considerada a matéria de facto assente nas alíneas b), c), d), f), k), l), m), n), o) e p) da fundamentação, bem como a exegese na mesma levada a cabo, não resultam preenchidos nem o elemento objectivo nem o elemento subjectivo do tipo de ilícito criminal pelo qual foi o arguido condenado.

SEGUNDA — Com efeito, e quanto ao elemento objectivo, considerada a matéria levada às alíneas b), c), d) e o) dos factos provados não resulta a danosidade social relevante que o tipo exige, pois não resultou danificação, inutilização, ou desfiguramento da “res”da assistente.

TERCEIRA — Quanto ao elemento subjectivo, considerada a matéria de levada às alíneas b), d), k), L), m), o) e p) dos factos provados, resulta que a conduta do arguido não estava imbuída de dolo em qualquer das suas vertentes, já que o arguido nunca representou sequer a possibilidade de a sua actuação típica configurar um tipo de ilícito criminal.

QUARTA — Por outro lado, e a não se entender assim sempre resultaria evidente o erro do arguido sobre os elementos de facto e de direito que enformam o tipo legal de crime de que vinha acusado, mostrando-se assim por este lado excluída a ilicitude e a culpa da sua conduta.

QUINTA — Assim, o Tribunal “a quo”, ao condenar o arguido pelo crime previsto no art. 129º do C. Penal, assim como na indemnização a assistente nos termos do disposto nos arts.483 nº 1 e 563º do C. Civil, violou o disposto nos arts. 13, 14, 16 e 31 nº 2 al. b) do C. Penal, tendo igualmente lavrado em equivoco ao considerar preenchidos os tipos de ilícito criminal e civil supra referidos, padecendo assim a douta sentença recorrida do vício constante da alínea b) segunda parte do nº 2 do art. 410º do CP. Penal, já que é manifestamente contraditória a decisão face a fundamentação, além de lavrar em equivoco na aplicação do direito aos factos.

SEXTA — Por consequência, considerada a factualidade assente e o iter que delinea toda a fundamentação, deveria o Tribunal ter concluído pelo não preenchimento dos elementos objectivo e subjectivo do tipo de ilícito que conformam o crime de dano previsto e punido no art.212 do C. Penal, e concluído igualmente pelo não preenchimento dos elementos preenchedores do tipo de ilícito civil, tudo nos termos do disposto nos arts. 13º, 14, 16, 31, nº2 al. b) do Código Penal, bem como dos arts. 483 nº1 e 563º do Código Civil, assim determinando absolvição do arguido, quer na parte crime, quer na cível.

SÉTIMA — Assim, revogando a douta decisão recorrida, e substituindo-a por outra que absolva in totum o arguido farão JUSTIÇA * Respondeu a assistente sustentando a improcedência do recurso, alegando, em síntese, que a decisão recorrida procede a uma criteriosa ponderação das circunstâncias provadas, não se mostrando preenchidos os requisitos da acção directa.

Respondeu também o digno magistrado do MºPº junto do tribunal recorrido, sustentando em síntese, que: - existe alguma contradição na sentença recorrida quando por um lado dá como provado que o arguido agiu livre e conscientemente e por outro lado que o arguido retirou as pedras colocadas pela assistente no leito do caminho de passagem que o arguido utilizava há mais de 20 anos para acesso ao seu prédio convencido do exercício de um direito, afastando as pedras colocadas pela assistente com o único objectivo de desimpedir essa passagem, obstruída pela assistente, pelo que muitas dúvidas permanecem sobre se o arguido soubesse que a sua acção era proibida e punida por lei penal; - a contradição apontada poderá integrar os vícios previstos no art. 410º, n.º2, al) b) e c) do CPP; - ao exercício da passagem pode a assistente ter-se oposto de forma igualmente ilegal sendo, nesta conformidade, lícito o recurso á força com o fim de assegurar o próprio direito; - pende para a absolvição do arguido.

Neste Tribunal o Ex. Mo Procurador-Geral Adjunto apôs o seu visto.

Corridos os vistos e realizado o julgamento, mantendo-se a validade e regularidade afirmadas no processo, cumpre decidir.

* ** *II.

  1. O recorrente sustenta, em primeira linha, que matéria de facto provada não preenche os elementos quer do tipo objectivo quer do tipo subjectivo do crime; e, numa segunda linha, para o caso de assim não se entender, que existe erro sobre os elementos do tipo.

Na sequência dos fundamentos invocados conclui que a sentença padece do vício de contradição insanável entre fundamentação e a decisão. Vício a que o digno magistrado do MºPº, tendo sempre por referência que o arguido se limitou a afastar as pedras colocadas pela assistente a impedir a passagem com o único objectivo de desimpedir essa passagem, acrescenta o vício de erro notório na apreciação da prova.

Para a apreciação, vejamos a matéria de facto provada com a fundamentação que a suporta.

* É a seguinte: A) Matéria de Facto Provada a) O prédio rústico denominado por P…, destinado a cultura arvense, mato e pastagem, com a arca de 26.470 in2, que confronta a norte e a poente com J…, a sul com caminho e a nascente com L…, descrito na Conservatória do Registo Predial de Belmonte sob o n.º …, da freguesia de C…, encontra-se inscrito a favor da assistente H…. pela Ap. …, por partilha da herança de M… b) Pelo menos desde 1997, que o arguido, para aceder ao prédio infra descrito em i), passa, quer a pé, quer com maquinas, tractores e outros veículos automóveis, por uma passagem que atravessa o prédio referido em a).

  1. Em data não concretamente apurada, mas nos finais do ano de 2007, a assistente colocou, na passagem referida em b), várias pedras de grandes dimensões encostadas umas às outras juntamente com terra, impedindo dessa forma a passagem, com veículos automóveis, quer do arguido, quer de terceiros pelo prédio referido em a).

  2. Em data não concretamente apurada, mas meses depois e no ano de 2008, o arguido procedeu ao afastamento das pedras colocadas mais ao centro, para, desse modo, continuar a passar pela passagem referida em o que fez de forma livre, voluntária e consciente.

  3. A assistente, para repor os cômoros e transformar a passagem referida cm b) despenderia uma quantia de €500,00, acrescida de IVA.

    1) O arguido sabia que a passagem referida em b) se situava no prédio referido em a).

  4. A assistente não deu autorização ao arguido para passar pe1o prédio referido em a).

  5. O arguido sabia ser-lhe proibida e punida por lei penal a sua...

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