Acórdão nº 181/07.2GDEVR.E1 de Tribunal da Relação de Évora, 08 de Setembro de 2009

Magistrado ResponsávelRIBEIRO CARDOSO
Data da Resolução08 de Setembro de 2009
EmissorTribunal da Relação de Évora

S Meio Processual: RECURSO PENAL Decisão: PROVIDO PARCIALMENTE Sumário: 1. O facto da ofendida declarar não desejar procedimento criminal contra os arguidos é um acto inócuo para efeitos de extinção do procedimento criminal (já que estamos perante um crime público) e não releva para a determinação da medida da pena, pois não traduz qualquer manifestação pessoal agente ou que deva depor a favor dele.

Decisão Texto Integral: Acordam, precedendo conferência, no Tribunal da Relação de Évora:I No âmbito do processo comum do 1.º Juízo Criminal de Évora foram acusados e submetidos a julgamento, perante tribunal colectivo, os arguidos A. M.D.

e L.M.

, sob acusação da prática, em co-autoria material, de um crime de furto qualificado, p. e p. pelos art. 203.º e 204.º, n.º2, alin. e) do Código Penal.

Efectuado o julgamento, tribunal colectivo, por seu acórdão datado de 10 de Fevereiro de 2009, deliberou:

  1. Condenar o arguido L.M., como co-autor material de um crime de furto qualificado, previsto e punido pelos artigos 203.º e e 204º, nº2, e) e 202.º, alin. d), todos do Código Penal, na pena especialmente atenuada de 6 (seis) meses de prisão, suspensa na respectiva execução pelo período de 1 (um) ano; b) Condenar o arguido A.M.D., como co-autor material do mesmo crime na pena especialmente atenuada de 1 (um) ano de prisão.

Inconformado com o decidido, o arguido A.M.D.

veio interpor recurso do referido acórdão para esta Relação, nos termos constantes de fls.247 a 259, pugnando pela suspensão da execução da pena que lhe foi aplicada, extraindo da motivação que apresentou as seguintes conclusões, que se transcrevem “ipsis verbis”, sendo alguns sublinhados e tipo de letra da autoria do relator: 1.ª - Acordaram os juízes do Tribunal Colectivo «Em condenar o ora Recorrente A.M.D.

pela prática de um crime de Furto Qualificado, previsto e punido pelos Artigos 203°, n.°1 e 204°, n.° 2, alínea e), 202, al. d) do Código Penal, na pena única de um ano de prisão.

  1. - Não suspender a execução da referida pena.» - sic fls. 23 do douto Acórdão.

  2. - É pois, com o devido respeito por opinião contrária, mas sempre com o firme propósito de pugnar pela realização da justiça material, que se interpõe o presente recurso.

  3. - Para determinar qual o tipo de pena é suficiente para realizar as respectivas finalidades, impondo a prossecução desse objectivo que seja feita uma avaliação das circunstâncias de cada situação concreta.

  4. - O Art. 71° do Código Penal dispõe que a medida concreta da pena se determina em função da culpa do agente e das exigências de prevenção, cumprindo ao tribunal atender a todas as circunstâncias que, não fazendo parte do tipo de crime, deponham a favor ou contra o agente.

  5. - Ou seja, a pena concreta a aplicar ao agente é limitada em função da sua culpa, reportada a factos concretos e a uma acusação concreta.

  6. - Além disso, a pena concreta a aplicar terá que ter ainda em consideração as exigências de prevenção geral e as necessidades de prevenção especial, ou seja, é mandatório que o tribunal atenda às exigências de ressocialização e de reintegração do agente.

  7. - Porém, in casu, na fundamentação de facto do douto Acórdão sob Recurso, o Tribunal a quo limita-se a reproduzir os factos constantes da Acusação e a considerá-los provados, sem qualquer interpretação e análise crítica dos mesmos.

  8. - Relativamente ao ora Recorrente e para efeitos de determinação concreta da pena, o douto Acórdão limita-se ainda a elencar, os seus antecedentes criminais VALORIZANDO POR EXCESSO ESTES [Art.71°, n.° 2, alínea e) do Código Penal] - as suas condições pessoais e situação económica [Art. 71°, n.° 2, alínea d) do Código Penal] DESVALORIZANDO MANIFESTAMENTE ESTAS, ...

    nomeadamente as actuais.

  9. - Todavia, nada diz, designadamente, sobre o grau de ilicitude, a intensidade do dolo.. nada refere quanto à culpa do ora Recorrente e quanto ao facto da queixosa (estamos face a uma crime particular) ter manifestado de forma expressa nos autos QUE NÃO DESEJAVA PROSSEGUIR O PROCEDIEMNTO CRIMINAL CONTRA OS ARGUIDOS (SUBLINHA-SE QUE SE REPORTA AOS ARGUIDOS E NÃO APENAS A UM DOS DOIS ARGUIDOS).

  10. - Viola, assim, o douto Acórdão recorrido o disposto no art. 71° do Código Penal, que encerra o princípio geral e fundamental de que o Direito Penal é estruturado com base na culpa do agente.

  11. - Ressaltando, por isso, a ideia que o arguido foi condenado em pena privativa da liberdade unicamente pela sua reincidência, o que inculca a ideia de que o julgamento não passou de uma mera formalidade inútil com desperdício de tempo e de recursos para o estado e manifesta desvalorização para a dignidade dos diversos intervenientes processuais 13.ª - Relativamente às exigências de prevenção geral, salvo o devido respeito por opinião contrária, também o douto Acórdão sob Recurso, não se encontra devidamente fundamentado, em clara violação do disposto no n.º 3 do Art 71° do Código Penal.

  12. - Quanto às exigências de prevenção especial, de ressocialização e de reintegração de que os arguidos carecem, não foram de todo tidas em consideração pelo Tribunal a quo na decisão sob Recurso.

  13. - O douto Acórdão limita-se a remeter para conceitos vagos e genéricos de que ". ..

    afigura-se-nos justo e equilibrado aplicar aos arguidos penas que revelem a culpa dos mesmos no sucedido." - cfr. fls. 21, § 2° do douto Acórdão.

  14. - Para além da atenuação especial da pena a que aludem os Artigos 73° e 206°, n.º 2 {quando deveria ser o n° 1), já que a reparação foi integral e não apenas parcial - cfr. facto provado 10 - do Código Penal e com o devido respeito por opinião contrária, o douto Acórdão recorrido apenas atendeu às circunstâncias que depõem contra o acorrente quando ipsis verbis refere.: "Contra o arguido A.D. militam o extenso rol de antecedentes criminais... o facto de não ter mostrado qualquer arrependimento, nem ter colaborado no ressarcimento do prejuízo. "- cfr. fls. 21, § 1° do douto Acórdão.

  15. - O Acórdão refere que milita ainda (para além do "...extenso rol de antecedentes criminais...") não ter o ora Recorrente "... colaborado no ressarcimento do prejuízo, "—cfr. fls. 21, § 1° in fine do Acórdão.

  16. - Porém, o que é verdade e consta dos autos - cfr. declaração escrita da ofendida I. G. a fls. 210 dos autos - é que foi a mãe do co-arguido L.M. quem procedeu ao ressarcimento integral da ofendida, ignorando, por exemplo o tribunal se o aqui recorrente teve/tem extrajudicialmente algum compromisso nesse ressarcimento....

  17. - Portanto, não se encontrando igualmente provado nos autos que aquele arguido tenha colaborado no ressarcimento do prejuízo da ofendida.

  18. -Pelo que não se compreendendo assim, porque razão o comportamento do ora recorrente é desvalorizado e, ao invés, o comportamento do co-arguido L.M. é valorizado, não obstante estarmos, em ambos os casos perante por um acto praticado por terceiro...... que na sua vontade expressa quis que os efeitos jurídicos desse seu acto se repercutisse em ambos os arguidos.

  19. - Há, pois, manifesto erro notório na apreciação da prova - Art. 410°, n.° 2, alínea c) do CPP.

  20. - O que é certo é que "A. mãe do arguido l.M. ressarciu a ofendida I.G., tendo esta declarado nos autos que não desejava prosseguir o procedimento criminal contra os arguidos." — cfr. ponto 10 «Quanto à determinação da sanção» a fls. 4 do Acórdão recorrido.

  21. - Porém, este facto de que a ofendida não desejava prosseguir o procedimento criminal contra os arguidos (sem distinção ou exclusão de qualquer deles) — circunstância que depõe a favor dos arguidos — não foi valorado pelo Tribunal a quo relativamente ao aqui Recorrente, em clara violação ao disposto no art. 71°, n.°s 2 e 3 do Código Penal.

  22. - De igual modo a pena aplicada ao Recorrente, manifestamente, não cumpre as finalidades de prevenção especial da punição, porque não atende devidamente à circunstância, provada, de que o recorrente se encontra a frequentar um curso de formação profissional que lhe dará equivalência ao 12° ano - cfr. fls. 7, ponto 14 do Acórdão.

  23. - Que lhe conferirá maiores qualificações enquanto cidadão e certamente uma “janela de oportunidade” para a sua reintegração sócio-profissional in concreto que o recorrente não queria deixar escapar — circunstâncias que depõem a favor do ora Recorrente e que a lei manda que o tribunal atenda devidamente na determinação concreta da pena.

  24. - E nem se diga que a pena concreta aplicada o foi ao abrigo da aplicação da regra da livre apreciação da prova em processo penal nos termos consagrado no Art. 127° do CPP.

  25. - Pois, livre apreciação da prova não se confunde de modo algum com apreciação arbitrária da prova, nem com a mera impressão gerada no espírito do julgador pelos diversos meios de prova, in casu a reincidência do recorrente tipo "caso perdido''; a prova livre tem como pressupostos valorativos a obediência a critérios da experiência comum e da lógica do homem médio suposto pela ordem jurídica que deveriam ser superiormente interpretados por um experiente julgador.

  26. - Pelo que, entende o Recorrente, face a todo o exposto, que a pena de um ano de prisão que lhe foi aplicada, deverá ser suspensa na sua execução, na medida em que, actualmente, face às suas condições actuais de vida, a simples ameaça da prisão realiza de forma adequada e suficiente as finalidades da punição, garantindo-lhe que possa aproveitar a referida "janela de oportunidade" e quiçá poder recomeçar a sua integração social de forma adequada, nos termos constantes do Art. 50° do Código Penal. “ Respondeu o Ministério Público na primeira instância, nos termos constantes de fls.284 a 287, pugnando pela confirmação do acórdão recorrido, dizendo, em conclusão, na parte que ora releva o seguinte: - Não ocorreu qualquer erro notório na apreciação da prova conforme com facilidade se infere do texto da decisão recorrida.

    - Atento o elevado grau de ilicitude dos factos, a culpa intensa do agente e as fortes exigências de prevenção geral e especial), conclui-se que a...

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