Acórdão nº 1860/07.0TVLSB.S1 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 11 de Março de 2010

Data11 Março 2010
Órgãohttp://vlex.com/desc1/1997_01,Supreme Court of Justice (Portugal)

S Privacidade: 1 Meio Processual: REVISTA Decisão: NEGADAS AS REVISTAS Sumário : 1.

Reveste a natureza de contrato de adesão, o contrato de seguro de Vida-Grupo, cujo clausulado é negociado apenas entre um Banco e uma seguradora, que, para garantia de contratos de mútuo para aquisição de habitação ou para obras na habitação que celebraram com o Banco tomador do seguro, os particulares segurados se limitam a subscrever ou aceitar, através de simples declaração individual de adesão.

  1. A esse contrato é aplicável o regime jurídico das cláusulas contratuais gerais, definido no Dec-lei 446/85, de 25/10, com as alterações introduzidas pelo Dec-lei 220/95, de 31/08.

  2. O princípio da proibição das decisões-surpresa, contido no n.º 3 do art. 3º do CPC, vale apenas para os casos em que a qualificação jurídica que o juiz se propõe adoptar ou a subsunção a determinado instituto que se propõe fazer não correspondam, de todo, àquilo com que as partes, pelas posições assumidas no processo, possam contar.

  3. Esse princípio não pode ser levado tão longe que esqueça que as partes são representadas por técnicos que devem conhecer o direito e que, por isso, conhecendo ou devendo conhecer os factos, devem igualmente prever todas as qualificações jurídicas de que os mesmos são susceptíveis.

  4. Nos seguros de grupo, o tomador do seguro deve obrigatoriamente informar os segurados sobre as coberturas e exclusões contratadas, as obrigações e direitos em caso de sinistro e as alterações posteriores que ocorram neste âmbito, competindo àquele o ónus da prova de ter fornecido essas informações.

  5. As cláusulas contratuais gerais devem ser comunicadas na íntegra aos aderentes que se limitem a subscrevê-las ou a aceitá-las, cabendo ao contratante determinado que as submeta a outrem o ónus da prova da comunicação adequada e efectiva.

  6. Consideram-se excluídas dos contratos singulares as cláusulas que não tenham sido comunicadas nos termos do n.º anterior.

    Decisão Texto Integral: Acordam no Supremo Tribunal de Justiça: 1.

    AA e marido BB intentaram, em 21.04.2005, pela 14ª Vara Cível da comarca de Lisboa, a presente acção com processo ordinário, contra - CC HISPANO SEGUROS – COMPANHIA DE SEGUROS DE VIDA, S.A.

    , - COMPANHIA DE SEGUROS DD, S.A.

    , - EE, COMPANHIA DE SEGUROS, S.A.

    , e - BANCO FF S.A.

    .

    Alegaram, em síntese, o seguinte: Celebraram com o Banco T...& A......, mais tarde incorporado no Banco 4º réu, um contrato de mútuo com hipoteca, destinado a aquisição de habitação – contrato celebrado ao abrigo do Regulamento do Crédito à Habitação para os Trabalhadores Bancários, condição que a autora detinha, pois era empregada do mutuante.

    O capital mutuado foi de 7.300.000$00, sendo que já antes o mesmo Banco havia emprestado aos autores 1.000.000$00, para obras na habitação.

    O empréstimo foi ainda garantido por um seguro de Vida-Grupo, em nome dos autores – cada um dos quais subscreveu, em 18.01.96, a respectiva declaração de adesão – por via do qual o Banco se comprometeu a pagar à seguradora, a aqui 3ª ré, o prémio do seguro, de que seria reembolsado pela autora, em duodécimos que acresceriam às prestações mensais do empréstimo.

    Seguro com as mesmas condições havia sido celebrado para garantia do valor do mútuo de 1.000.000$00.

    Em data que ignoram e unilateralmente, o Banco transmitiu o contrato de seguro de Vida-Grupo que garantia o empréstimo de 7.300.000$00 para a Companhia de Seguros M......C......., S.A., que veio a integrar a seguradora ora 2ª ré, desconhecendo os autores se o fez também em relação ao contrato que garantia o outro empréstimo.

    Posteriormente, com efeitos a 01.08.2001, de forma unilateral, o mesmo Banco transmitiu os dois contratos de seguro para a aqui 1ª ré, mantendo todas as condições destes, incluindo coberturas e prémio.

    A apólice subscrita pelos autores, relativa à garantia do mútuo de 7.300 contos, tinha como objecto a garantia, em caso de invalidez total e permanente, por doença ou por acidente, de qualquer dos autores, de pagamento ao beneficiário do capital seguro, isto é, do capital mutuado, o qual, com os encargos, ascendia a 7.500.000$00, o mesmo acontecendo com a apólice referente à garantia do mútuo de 1.000 contos, e mantendo-se os seguros em vigor enquanto os empréstimos não se encontrassem pagos.

    E, ocorrendo algum daqueles eventos – morte ou invalidez total e permanente por doença ou acidente de qualquer dos autores – o capital ainda em dívida ao Banco em qualquer dos dois contratos, ser-lhe-ia pago pelos restantes réus, enquanto titulares das apólices, e o remanescente aos autores.

    O autor marido veio a ser reformado por invalidez total e permanente, por doença, com efeitos a 13.08.2004 – o que veio a ser reconhecido por sentença judicial, transitada em julgado, sendo o pagamento dessa reforma da responsabilidade do BES, que foi a sua entidade patronal.

    A 1ª ré foi, por carta registada de 03.07.2006, interpelada para que fossem cumpridas as garantias e pago o capital em dívida ao beneficiário, ora 4º réu, e o remanescente aos autores, em ambas as apólices, vindo, por carta registada de 23.10.06, a informar o autor marido de que não podia garantir o pagamento das importâncias seguras, por o sinistro ser devido a um risco que se encontrava excluído, já que se inseria na previsão “doenças neurológicas e psiquiátricas de que a pessoa seja portadora”.

    A doença que levou à reforma por invalidez total e permanente do autor foi uma doença psiquiátrica, mas à data da celebração das apólices com a 3ª ré, não se encontrava excluído o risco relativo a doenças psiquiátricas – e, em qualquer caso, a doença do autor só foi diagnosticada em 2004.

    Nenhum dos empréstimos está já pago ao 4º réu, sendo que os autores têm pago as prestações mensais e os prémios dos dois seguros, nas condições acordadas, pelo que têm, além do direito a que as 1ª, 2ª e 3ª rés cumpram a garantia coberta pelas apólices, pagando ao 4º réu o capital ainda em dívida dos dois mútuos (€ 2.066,41 e € 23.330,91, à data da reforma do autor), o direito a receber o remanescente do capital em dívida destes mesmos mútuos, e bem assim o direito a que o 4º réu lhes restitua as prestações que indevidamente pagaram desde a invalidez do autor (13.08.2004). Isto porque a cobertura por invalidez total e permanente do autor, resultante de doença psiquiátrica, estava, ab initio, abrangida por ambas as apólices.

    Na sequência do alegado formulam os pedidos de condenação dos réus: a) a reconhecerem que o risco de invalidez total e permanente, por doença psiquiátrica, se encontrava garantido pelas apólices de seguro iniciais associadas aos dois contratos de mútuo celebrados pelos autores com o BTA e de que este era beneficiário, garantindo o valor dos empréstimos de 1.000.000$00 e de 7.300.000$00 (7.500.000$00, com encargos); b) a reconhecerem que a invalidez total e permanente do autor marido, por doença psiquiátrica, não se encontrava excluída dos Seguros de Vida-Grupo que foram celebrados pelos autores por exigência do BTA, ora 4º réu, para garantia dos valores dos mútuos de 1.000.000$00 e 7.500.000$00, com esta instituição; c) a reconhecerem que tais apólices se transmitiram com as mesmas condições da 3ª ré para as 2ª e 1ª rés; d) a entregarem as 1ª, 2ª e 3ª rés ao 4º réu os valores do capital em dívida relativos aos mútuos, que à data da reforma por invalidez do autor marido perfaziam € 2.066,41 e € 23.330,91; e) a entregarem as 1ª, 2ª e 3ª rés aos autores o remanescente dos valores mencionados na alínea anterior – respectivamente, € 2.933,59 e € 14.078,90 – até perfazerem os valores de capital garantidos pelos dois seguros de vida, de 5.000,00 € e 37.409,89, acrescidos de juros de mora à taxa legal; f) a devolver o 4º réu aos autores as prestações dos mútuos pagas desde a data da invalidez do autor, ou seja, desde 13.08.2004, acrescidas de juros de mora à taxa legal .

    A 1ª ré, agora FF SEGUROS, S.A.

    (que incorporou CC Hispano Seguros – Companhia de Seguros de Vida, S.A.), alegou em síntese, em contestação, que a aceitação das propostas de seguro só veio a ser feita pela M......C.......a, actualmente DD, e os contratos foram objecto de transmissão para a ré; porém, a doença do autor marido era anterior ao contrato de seguro e foi pelo demandante omitida aquando do preenchimento da proposta, sendo ainda certo que, nos termos clausulados, a invalidez por doença psíquica está excluída da cobertura de ambos os seguros. Termina pedindo que a acção seja julgada não provada e improcedente, com a sua consequente absolvição do pedido.

    Também contestou a 2ª ré, Companhia de Seguros DD, S.A.

    , sustentando, em síntese, que os contratos foram transmitidos em 01.08.2001 para a 1ª ré, conforme os autores reconhecem, pelo que é a contestante parte ilegítima. Além disso, a invalidez total e permanente por doença ou acidente por riscos devidos a perturbações neurológicas e epilépticas ou perturbações ou danos do foro psíquico está excluída das apólices. Conclui pedindo a sua absolvição da instância por ilegitimidade, ou, a assim não ser entendido, a sua absolvição do pedido, por improcedência da acção.

    A 3ª ré EE, Companhia de Seguros, S.A.

    também ofereceu contestação, na qual alegou, em resumo, que o BTA celebrou com ela um contrato de seguro da espécie Vida-Grupo, titulado pela apólice Vida Grupo n.º 02.000.144, mas tal contrato foi denunciado pelo Banco em 27.10.95, produzindo a denúncia efeitos em 31.12.95, deixando o contrato de vigorar a partir desta data. O contrato de mútuo dos autos foi celebrado em 28.02.96, sendo que, para efeitos de adesão do mutuário ao contrato de seguro Vida Grupo, foram usados indevidamente, pelo BTA, impressos da contestante, que esta lhe fornecera aquando da celebração do contrato supra aludido. Porém, as propostas para o contrato de seguro a que os autores aludem nunca entraram na EE. Quanto ao mútuo de 1.000.000$00 e respectiva garantia, nada sabe, nem tem obrigação de saber. Deve...

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