Acórdão nº 642/04.5TBSXL-B.L1.S1 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 20 de Janeiro de 2010

Data20 Janeiro 2010
Órgãohttp://vlex.com/desc1/1997_01,Supreme Court of Justice (Portugal)

S Privacidade: 1 Meio Processual: AGRAVO Decisão: CONCEDIDO PROVIMENTO Sumário : I - Não é admissível por presunção judicial considerar-se provado um facto concreto, essencial à sorte do litígio, que carece de ser alegado para poder ser tomado em consideração pelo Tribunal (arts. 349.º e 351.º do CC e arts. 264.º, 514.º, 515.º e 665.º do CPC).

II - Na presunção judicial (arts. 350.º e 351.º do CC) o facto desconhecido consiste no facto a provar e não no facto que não foi alegado.

III - Não estão isentos de penhora os bens de pessoas colectivas de utilidade pública quando não se demonstre encontrarem-se especialmente afectados à realização de fins de utilidade pública, cumprindo ao executado o ónus de provar essa especial afectação (arts. 342.º, n.º 2, do CC e 823.º do CPC).

Decisão Texto Integral: Acordam no Supremo Tribunal de Justiça 1.

AA recorre para o Supremo Tribunal de Justiça do acórdão da Relação de Lisboa proferido nos autos de execução 642/04 com o valor de 873.079,27€ o que faz nos termos do artigo 754.º/2 por considerar que o acórdão está em contradição com os infra indicados proferidos no domínio da mesma legislação não havendo sido fixada jurisprudência pelo Supremo Tribunal de Justiça.

  1. A disposição que está em causa é o artigo 823.º/1 do C.P.C. com a redacção que lhe foi dada pelo Decreto-Lei n.º 38/2003, de 8 de Março: Artigo 823.º Bens relativamente impenhoráveis 1. Estão isentos de penhora, salvo tratando-se de execução para pagamento de dívida com garantia real, os bens do Estado e das restantes pessoas colectivas púbicas, de entidades concessionárias de obras ou serviços públicos ou de pessoas colectivas de utilidade pública, que se encontrem especialmente afectados à realização de fins de utilidade pública.

    — O Litígio 3.

    AA deduziu execução contra BB Futebol Clube tendo o executado deduzido oposição à penhora de dois imóveis alegando que “ sobre todo o seu património, móvel e imóvel, já recaem penhoras, nada mais havendo para ser penhorado” (artigo 2.º); mais alegou - artigo 8.º - que “ o ora executado, BB Futebol Clube, é uma pessoa colectiva de utilidade pública, como se pode comprovar pela certidão da Conservatória do Registo Comercial do … (doc. n.º1) sendo que e por esse facto, não podem ser penhoradas as verbas requeridas no presente processo segundo o artigo 823.º do Código de Processo Civil” 4.

    O exequente, na resposta ao incidente de oposição, alegou, para além do mais, o seguinte: - Que admite, sem discussão, que o executado é uma pessoa colectiva (associação) de utilidade pública.

    - Que isso, só por si, não isenta de penhora os bens do executado, cumprindo-lhe alegar e provar o seguinte:

    1. Quais os fins de utilidade pública que prossegue.

    2. Que os bens penhorados se encontram “ especialmente afectados à realização de fins de utilidade pública” (cf. artigo 823.º/1 do C.P.C.).

  2. Foi proferida sentença que julgou procedente a oposição à penhora ordenando o levantamento da penhora sobre os prédios descritos identificados.

    Referiu a sentença: "No caso dos autos, alega o exequente que o executado não alegou que os bens penhorados se encontrem afectos a fins de utilidade pública.

    Ainda que se admita que o executado não tenha afirmado concretamente qual o uso dado aos imóveis penhorados, não se pode ignorar que resulta da prova documental junta aos autos de execução apensos, nomeadamente, da certidão predial relativa aos prédios penhorados que os mesmos são balneários e aquecimento e recinto desportivo com campos de jogos e bancadas. Equipamentos que pela sua natureza são necessariamente usados para prossecução das finalidades do executado, pessoa colectiva de utilidade pública.

    Finalidades essas que são, como resulta da factualidade provada, a promoção de educação física dos seus associados e desenvolvimento entre eles da prática dos Desportos e proporcionar--lhes meios de distracção e cultura e que não poderão ser prosseguidos sem os equipamentos penhorados.

    Tais factos, que resultam dos autos, não podem ser ignorados pelo julgador sendo de sufragar o entendimento do douto acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa de 2-3-2006 […] Tal facto é notório, não carecendo de alegação".

  3. O Tribunal da Relação de Lisboa confirmou, por maioria, a decisão de 1ª instância, reconhecendo "que o executado é parco na sua alegação no que concerne à explicitação de que os imóveis em questão, instalações onde leva a cabo a prossecução de actividade desportiva, estejam afectos, sejam usados para essa finalidade […] E, por outra feita, a natureza inextrincável entre um edifício destinado à prática de desportos, com espaços para o efeito, balneários, secretaria e outros conexos, e o desenvolvimento da actividade desportiva de interesse público, acaba por redundar no célebre definir o definido pela definição […] É dever do Tribunal socorrer-se , de todos os elementos trazidos aos autos, e de sobremaneira, quando a apreciação da questão tem por detrás um documento autêntico, como é o caso do registo predial […]. Nessa medida secundamos a decisão de 1ª instância que se socorreu desse suporte documental para concluir, que os imóveis servem a actividade e o interesse público da actividade prosseguida pelo executado, e decorrentemente, que a utilidade pública resulta do uso do próprio bem e que é essa a sua afectação e não outra" — A admissibilidade do recurso 7.

    O exequente, para fundamentar o recurso de agravo para o Supremo Tribunal, sustentou que "foi decidido no acórdão recorrido que não é necessário que o executado, associação civil com o estatuto de pessoa colectiva de utilidade pública ( por via de reconhecimento administrativo que não afecta a natureza dos respectivos bens) alegue e prove os factos concretos que demonstrem a afectação especial dos bens penhorados à realização dos fins que prossegue e que foram reconhecidos como de utilidade pública […] Interpretou, assim, este Tribunal , de acordo com a posição que fez vencimento, a referida norma naquele sentido[…] Tal solução […] está em flagrante oposição com muitos outros acórdãos anteriores […)”, a saber: - Ac. da Relação de Lisboa de 11-5-2004 in www.dgsi.pt (P. 2849/2004 - 7 2849/2004 - 7 ª secção) onde se concluiu: I- Em princípio, os bens da CC (enquanto pessoa colectiva de direito público) são penhoráveis ( a não ser que se trate de bens do domínio público), apenas deixando de o ser quando estiverem afectos à realização de um fim de utilidade pública, a qual tem de resultar do uso que esteja a ser dado ao próprio bem II- Compete à executada (CC) para evitar a penhora alegar e provar que os seus bens estão afectos à realização de um fim de utilidade pública.

    - Ac. da Relação de Lisboa de 13-7-2005 (P. 4399/2005 - 8 4399/2005 - 8 ª secção) in www.dgsi.pt e também na C.J.,2005, Tomo IV, pág. 82/83 onde se concluiu: I- Os saldos bancários podem, inclusivamente, não se destinar, de momento, a nenhum fim específico, ou seja, a utilidade pública tem de ser aferida no tocante ao uso a que especificamente se destina o bem a penhorar.

    II- No âmbito da execução, e não tendo o oponente alegado um único facto concreto que permita inferir que os saldos bancários visam a aplicação em determinado projecto de utilidade pública, prevalece a sua penhorabilidade, atento o disposto no já mencionado artigo 823.º/1 do C.P.C.

    - Ac. da Relação de Évora de 12-1-2006 (P. 1845/2005 - 2 1845/2005 - 2 ª secção inwww.dgsi.pt onde se conclui: I- No que respeita à penhora de bens do domínio público existe uma salvaguarda absoluta - impenhorabilidade total - assente, obviamente, na presunção juris et de jure de que tais bens estão , pela sua própria natureza, afectos exclusivamente a fins de utilidade pública II - Já quanto aos bens do domínio privado do Estado e demais pessoas colectivas públicas só os que estiverem afectos a fins de utilidade pública beneficiarão da prerrogativa da impenhorabilidade.

    III- A natureza destes bens não permite concluir ou presumir a afectação exclusiva ou sequer predominante a fins de utilidade pública e daí que, se pretender obter o levantamento da penhora desses...

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