Acórdão nº 220/03.6TBSTB.E1 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 10 de Dezembro de 2009

Data10 Dezembro 2009
Órgãohttp://vlex.com/desc1/1997_01,Supreme Court of Justice (Portugal)

S Privacidade: 1 Meio Processual: REVISTA Decisão: CONCEDIDAS PARCIALMENTE AS REVISTAS Sumário : 1. No âmbito da responsabilidade civil extracontratual por facto ilícito, a regra é a de que incumbe ao lesado provar a culpa do autor da lesão, salvo havendo presunção legal de culpa – nº 1 do art. 487º C.Civil.

Um dos casos em que essa presunção legal de culpa existe é precisamente quando os danos tenham sido causados no exercício de uma actividade perigosa.

O que qualifica uma actividade como perigosa será a sua especial aptidão para produzir danos, aptidão que tanto pode radicar na sua própria natureza como na natureza dos meios utilizados.

Por isso, a perigosidade de uma actividade há-de ser apurada, caso a caso, perante as circunstâncias concretas.

  1. Se a prestação do serviço fixo de telefone não é de considerar, pela sua própria natureza, uma actividade perigosa, já a conclusão a extrair poderá ser diferente se considerarmos os meios utilizados em vista do desempenho dessa prestação, concretamente a utilização de algumas das suas infraestruturas.

  2. A indemnização do dano futuro deve corresponder a um capital produtor do rendimento que a vítima não irá auferir e que se extinga no final do período provável de vida activa.

    No cálculo desse capital intervêm necessariamente a equidade, constituindo as tabelas financeiras de que habitualmente se lança mão mero valor auxiliar, devendo ser corrigidos os resultados assim obtidos se o julgador os considerar desajustados ao caso concreto.

  3. Quem puder legalmente exigir alimentos ao lesado, tem direito a indemnização, a prestar pelo lesante, decorrente do prejuízo que para ele advém da falta daquele.

    E para ser exercitado este direito não é necessário estar-se já a receber alimentos, basta demonstrar que se estava em condições de, legalmente, os poder vir a exigir.

    Este tipo de indemnização, correspondente ao prejuízo que advém para a pessoa que pode exigir a prestação de alimentos, não poderá exceder, nem em montante nem em duração, aquela prestação que o lesado suportaria, se vivo fosse.

    Porque o valor deste dano futuro mas previsível não pode ser averiguado com exactidão, será essencial o recurso à equidade para a sua quantificação, tal como o determina o nº 3 do art. 566º C.Civil.

    Decisão Texto Integral: Acordam no Supremo Tribunal de Justiça: I. Relatório AA, por si e em representação de seu filho menor BB, intentou, a 7 de Janeiro de 2003, a presente acção declarativa, com processo ordinário, contra COMPANHIA DE SEGUROS CC, pedindo que seja condenada a pagar-lhes: - € 494.476,32, a título de danos causados à vítima DD; - € 64.843,72, a título de danos não patrimoniais sofridos pelos autores com a morte de DD, esposa e mãe, respectivamente; - € 49.879,78, a título de danos não patrimoniais padecidos pelo AA; - € 520.328,12, montante dos danos futuros causados ao mesmo autor; - a quantia referente às despesas que este autor venha a suportar relacionadas com o acidente, designadamente despesas médicas e medicamentosas, tudo acrescido de juros de mora e descontadas as quantias pagas adiantadamente no valor de € 8.358,11.

    Para fundamentar a sua pretensão alegam, em síntese, que sua mulher e mãe foi atingida por uma descarga eléctrica quando falava ao telefone, que lhe provocou a morte.

    Tentando o autor AA cortar o fio do telefone, recebeu também ele um choque eléctrico, o que lhe provocou lesões várias.

    Com base em todos os danos sofridos, encontram o montante peticionado, sendo a ré responsável pelo seu ressarcimento por força do contrato de seguro celebrado com a EE.

    Contestou a ré para alegar que a EE tomou as medidas adequadas a evitar um acidente desta natureza, acidente que ocorreu por motivos alheios à sua vontade, mas acabando por aceitar quota parte da responsabilidade na ocorrência dos danos que vitimaram a DD, mas declinando qualquer responsabilidade pelos danos sofridos pelo autor AA, que se ficaram a dever a conduta culposa da sua parte.

    Requereram os autores a intervenção da EE, S.A.

    , que contestou para aceitar quota parte de responsabilidade na ocorrência dos danos que vitimaram DD, mas declinando qualquer responsabilidade pelos danos sofridos pelo autor AA.

    Saneado o processo e fixados os factos que se consideraram assentes e os controvertidos, teve lugar, por fim, a audiência de discussão e julgamento.

    Na sentença, subsequentemente proferida, foi a acção julgada parcialmente procedente e condenadas: - a ré EE, S.A., a pagar aos autores AA e BB, a título de danos patrimoniais e não patrimoniais, a quantia de € 4.913,17, acrescida de juros desde a data da sentença até efectivo e integral pagamento; - a ré Companhia de Seguros CC a pagar aos autores AA e BB, a título de danos patrimoniais e não patrimoniais, a quantia de € 250.598,87, acrescida de juros desde a data da sentença até efectivo e integral pagamento; - a ré EE, S.A., a pagar ao autor AA, a título de danos patrimoniais e não patrimoniais, a quantia de € 12.469,94, acrescida de juros desde a data da sentença até efectivo e integral pagamento; - a ré Companhia de Seguros CC a pagar ao autor AA, a título de danos patrimoniais e não patrimoniais, a quantia de € 277.530,06, acrescida de juros desde a data da sentença até efectivo e integral pagamento.

    Inconformadas com o assim decidido apelaram ambas as rés, e com parcial sucesso, tendo a Relação condenado: - a ré EE, S.A., a pagar aos autores AA e BB, a título de danos patrimoniais e não patrimoniais, a quantia de € 4.913,17, acrescida de juros desde a data da sentença até efectivo e integral pagamento; - a ré Companhia de Seguros CC a pagar aos AA. AA e BB, a título de danos patrimoniais e não patrimoniais, a quantia de € 197.598,87, acrescida de juros desde a data da sentença até efectivo e integral pagamento; - a ré Companhia de Seguros CC a pagar ao autor AA, a título de danos patrimoniais e não patrimoniais, a quantia de € 239.069,94, acrescida de juros desde a data da sentença até efectivo e integral pagamento.

    Irresignados recorrem agora de revista para o Supremo Tribunal de Justiça a ré seguradora e os autores.

    Contra-alegou apenas a ré EE, defendendo a manutenção do decidido nos termos em que a condenou.

    Colhidos os vistos legais, cumpre apreciar e decidir II. Âmbito do recurso A- De acordo com as conclusões, a rematar as respectivas alegações, o inconformismo dos recorrentes radica, sinteticamente, no seguinte: ré seguradora 1- O acórdão da Relação indeferiu a reclamação que apresentou à organização da Bl por considerar que esta não distinguiu, nos termos do disposto no art. 488.° C.P.C, a defesa por excepção da defesa por impugnação pelo que considerou que toda a defesa foi por impugnação e, como tal, insusceptível, na ausência de réplica, de ser logo levada aos factos assentes.

    2- Em sua contestação, a recorrente inseriu os factos que reclamou deverem ser levados aos a factos assentes em sede de comportamento culposo do autor, como claramente decorre dos arts..° 55 e ss, que apontam, precisamente, para a conduta culposa do recorrido e à sua integração nos pressupostos de aplicação do regime do art. 570.° do C. Civil.

    3- Tais factos relevavam de defesa por excepção que tinham efeito impeditivo do direito que o ora recorrido AA pretendia fazer valer, e que, por não ter merecido réplica por parte deste, deveriam, assim, ser incluídos nos factos assentes.

    4- Por isso, o despacho que indeferiu as reclamações deve ser revogado (excepto quanto ao deferimento que deu origem à al. Z) dos factos assentes) e substituído por um outro que defira totalmente a reclamação e adite aos factos assentes os que nem sequer foram levados à Bl e que se elimine desta os factos objecto da reclamação que a tal Bl foram levados, substituindo-os por correspondentes alíneas de factos assentes.

    5- Tanto a 1ª instância como o Tribunal da Relação entenderam a actuação do autor foi adequada no caso concreto, nada tendo de temerária e que a responsabilidade pelo sucedido é imputável em exclusivo à EE e à ora recorrente, sua seguradora, por assentar numa presunção de culpa nos termos do disposto no n.° 1 do art. 493.° do Código Civil.

    6- Mas dos factos dados como provados, em especial da conjugação das als. G, H, Z, I e J dos factos assentes e das respostas dadas aos pontos controvertidos nºs. 4, 5, 6, 7 e 60, b) e c) da BI, claramente resulta que o autor AA foi o único causador dos danos que sofreu ou que pelo menos, em boa parte para eles contribuiu.

    7- Tendo-se apercebido que a sua esposa estava agarrada ao telefone e de que estava a ser electrocutada por uma corrente eléctrica muito forte, claramente, como homem médio, deveria ter percebido que essa corrente só podia ter como fio condutor o fio do telefone, pois era a ele que a esposa estava agarrada.

    8- Sendo essa percepção tida num momento em que as suas capacidades volitivas e de percepção estavam plenamente activas, tão pouco vindo alegado que agiu transtornado ou com essas capacidades alteradas.

    9- Não releva em contrario a tentativa de desculpabilizar a sua conduta “branqueando-a” com o argumento de que foi o Cabo C… que lhe pediu um alicate para cortar o fio e que, se não fosse ele cortá-lo, seria esse Cabo o electrocutado.

    9- Existem regras legais sobre primeiros socorros a prestar a vitimas de electrocussão que têm que ser escrupulosamente respeitadas nestas situações e que estão previstas na Portaria n.° 17 653, de 31 de Março de 1960, que complementa o Decreto n.° 42 895, também de 31 de Março, este por sua vez alterado pelo Decreto Regulamentar n.° 14/77, de 1 de Fevereiro.

    10- Deve, por isso, a recorrente e a EE...

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