Acórdão nº 2822/06.0TBAGD-A.C1.S1 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 12 de Novembro de 2009

Magistrado ResponsávelFONSECA RAMOS
Data da Resolução12 de Novembro de 2009
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)

S Privacidade: 1 Meio Processual: AGRAVO Decisão: NEGADO PROVIMENTO Doutrina: - Lopes do Rego, “Comentários ao Código de Processo Civil’, vol. 1, 2ª edição, págs.77/78; “Código de Processo Civil Anotado”, vol. I, 1999, pág.80, Lebre de Freitas, João Redinha e Rui Pinto; Gomes Canotilho, “Direito Constitucional e Teoria da Constituição”, 6ª edição, pág.1294: Gomes Canotilho e Vital Moreira, “Constituição da República Portuguesa Anotada” – Volume I – 4ª edição revista – 2007, págs.338 e 339; Baptista Machado, “Introdução ao Direito e ao Discurso Legitimador”, 1983, pág. 95; Oliveira Ascensão, “O Direito-Introdução e Teoria Geral”, 1993, pág. 548; Zenha Martins, “Interpretação conforme com a Constituição”, em Estudos em Homenagem ao Prof. Doutor Inocêncio Galvão Telles, vol. V, 2003, págs. 823 a 957.

Legislação Nacional: ART. 39°, Nº2, DO CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL; ARTIGOS 13º E 20º DA CONSTITUIÇÃO DA REPÚBLICA; LEI N°34/2004, DE 29.7 - ARTS.34°, N°2, E 42°, N°L Jurisprudência Nacional: ACÓRDÃO DO SUPREMO TRIBUNAL, DE 16 DE ABRIL DE 2002, CJSTJ, ANO X, TOMO II – 2002 – PÁG.32;ACÓRDÃO DA RELAÇÃO DE COIMBRA DE 12.12.2006, PROFERIDO NO PROCESSO N.°217/05.1TJCBR-A.CL; ACÓRDÃO DO SUPREMO TRIBUNAL DE 06.03.2002, PROFERIDO NO PROCESSO 337/01-4.3ª SECÇÃO; ACÓRDÃOS DO TRIBUNAL CONSTITUCIONAL: N°398/89, DE 18/5 (DR, II DE 14-9-1989, PÁG. 9199; BMJ, 387-208), N°63/91, DE 19-3 (DR, II, DE 3-7-1991, PÁG. 6973), N°0351/91, DE 4-7 (DR, II, DE 3-12-1991, PÁG.12341) Sumário : I) - O mandato forense, sendo de óbvia constituição voluntária, tem na sua base uma relação de confiança entre o mandante e o advogado que contrata como mandatário.

II) – Essa relação de confiança é que determina a escolha e deve ser recíproca em ordem à salvaguarda dos direitos dos envolvidos no contrato, sendo que o facto do mandato ser forense contende também com o direito de acesso à justiça e aos tribunais que, muitas vezes, postula a constituição obrigatória de advogado imposta por Lei, não só no interesse daquele que demanda a Justiça, como no interesse da paz social, já que o patrocínio forense implicando que as partes pleiteiem representadas pelos seus advogados introduz no conflito uma componente de objectividade, lucidez e descompaixão que são essenciais à correcta e serena discussão e julgamento dos conflitos.

III) – A interpretação defendida pelos recorrentes considerando que a mera apresentação da renúncia ao mandato desvincula, ipso facto, o Advogado, suspendendo ou até interrompendo o prazo processual em curso, não tem apoio mínimo na letra da lei, sabendo-se que a alteração introduzida no art. 39º do Código de Processo Civil, pela Reforma Processual de 1995/96, foi a de não deixar o mandatário-renunciante ad eternum no exercício do mandato, já que na primitiva redacção do preceito inexistia previsto o prazo razoável de 20 dias para o mandante constituir novo advogado, o que redundava em severa sanção para quem desejava retirar-se do patrocínio forense.

IV) Não existe violação dos princípios constitucionais da igualdade e do acesso ao direito, quando, confrontando a norma do art. 39º, nº2, do Código de Processo Civil com o regime legal estabelecido na Lei nº34/2004, de 29.7. – Acesso ao Direito e aos Tribunais – através do patrocínio oficioso por insuficiência económica, que estabelece, nos termos do art. 34º, nº2, que o pedido de escusa do patrono nomeado interrompe o prazo que estiver em curso.

  1. Os regimes legais diferentes não exprimem violação daqueles princípios constitucionais porque situações desiguais não podem merecer tratamento igual.

    VI) – Não existe igualdade substancial entre o regime da Lei nº34/2004, de 29.7, no que se refere ao patrocínio através de advogado nomeado pela Ordem dos Advogados, e o regime do contrato de mandato (forense).

    VII) – Desde logo, porque na lei que assegura o acesso ao direito e aos tribunais pela via do apoio judiciário, uma das modalidades de protecção jurídica dos carenciados economicamente – arts. 1º, nº1, e 6º, nº1, da citada Lei – não é uma lei de auto-regulação como o é o contrato de mandato.

    VIII) – Neste o advogado é escolhido livremente por quem solicita os seus serviços de aconselhamento e patrocínio; no regime de acesso ao direito a pessoa carenciada solicita a protecção jurídica dispensada pelo Estado, estando dependente, no que ao patrocínio concerne, da nomeação oficiosa de advogado, que pode nem sequer conhecer, nem é da sua escolha.

    IX) – A diferença entre livre escolha ou ausência de escolha, implica que, nestes casos, o advogado nomeado, querendo abandonar o patrocínio oficioso, deve comunicar a sua intenção não à parte, mas à Ordem dos Advogados – art. 42º, nº1 – que providencia pela substituição.

  2. – Daí que, não existindo a relação de confiança e a facilidade de contactos (quantas vezes) entre o advogado nomeado oficiosamente e a pessoa carecida de apoio judiciário, se justifique que, em caso de escusa se justifique a interrupção dos prazos em curso, para assim melhor se acautelar a transferência dos dossiês e estudo da causa e, com isso, a protecção do beneficiário do apoio judiciário.

    XI) – Não é inconstitucional a norma do art. 39º, nº2, do Código de Processo Civil na interpretação antes enunciada.

    Decisão Texto Integral: Acordam no Supremo Tribunal de Justiça Refere-se o recurso de agravo a uns autos de oposição à execução, sendo nesta Executados A...J...C... - Urbanismo e Construção e A...J...de C...R...

    (ora Recorrentes/Agravantes) e Exequente J...F...O...C...C...

    (ora Agravado).

    *** Decidida a oposição no sentido da improcedência, no saneador-sentença de fls. 47/53, apresentaram-se os Executados, a fls. 57, a recorrer de tal decisão, sendo o recurso admitido por despacho de fls. 59, do qual foram notificados em 14.04.2008 [fls. 60/61, que comprovam a expedição das cartas contendo essas notificações em 11/04/2008 – cfr. artigo 254º, nº3, do Código de Processo Civil que presume feitas as notificações no terceiro dia posterior ao registo – dia 14 de Abril foi uma segunda-feira].

    *** Entretanto, na véspera do termo do prazo de entrega das correspondentes alegações (as referidas à apelação admitida a fls. 59) pelo requerimento de fls. 62, entrado em Tribunal no dia 14/05/2008, apresentou o Exmo. Advogado dos Executados, Dr. J...A...S..., renúncia aos mandatos que lhe haviam sido conferidos por estes, requerendo a notificação dos mesmos, enquanto Mandantes, dessa renúncia.

    *** Foram, pelo despacho de fls. 64, notificados os Executados, nos termos do artigo 39º, nºs 2 e 3 do Código de Processo Civil, ocorrendo essa notificação em 02.06.2008 – (fls. 68/69).

    *** Subscritas pelo Exmo. Advogado Dr. L...C..., foram apresentadas em 25.06.2008, por fax, as alegações de recurso de agravo para o Tribunal da Relação de Coimbra, constantes de fls. 70/82, acompanhadas de procuração a este outorgada pelos Executados (fls. 83).

    *** Foi proferido o despacho de fls. 107/109, de 22.9.2008, (de que veio a ser interposto recurso de agravo), considerando extemporânea a apresentação das mencionadas alegações e julgando, em função dessa extemporaneidade, o recurso deserto, nos termos do artigo 690º, nº 3, do Código de Processo Civil.

    Fundou-se tal despacho na consideração argumentativa seguinte: “ […] Tendo a declaração de renúncia dado entrada em juízo no penúltimo dia para a apresentação das alegações de recurso (sem contar com os três dias previstos no artigo 145, nº5, do Código de Processo Civil) e tendo a notificação da renúncia aos mandantes/recorrentes tido lugar apenas em 2.6.2008, já há muito que havia expirado o prazo para apresentação das alegações de recurso, sendo certo que o mero requerimento de renúncia ao mandato nenhum efeito suspensivo operou em relação ao prazo então em curso (o qual terminava no dia seguinte à apresentação desse requerimento)”.

    [Transcrição de fls.108] *** Inconformados, interpuseram os Executados recurso de agravo (fls. 113), para o Tribunal da Relação de Coimbra, tendo o Ex.mo Relator, por decisão sumária (art. 705º do Código de Processo Civil), de 12.12.2008 – fls.184 a 194 – negado provimento ao agravo.

    Os agravantes reclamaram para a Conferência que, em 3.3.2008, – fls. 229 a 231 – proferiu Acórdão desatendendo a reclamação e confirmando a decisão recorrida que considerou o recurso deserto por falta de alegações.

    *** Os agravantes recorreram para este Supremo Tribunal – fls. 237 – sustentando que o Acórdão recorrido se encontra em oposição com a fundamentação decisória do Acórdão da Relação de Coimbra de 12.12.2006, proferido no processo n.°217/05.1TJCBRA.Cl, e com o Acórdão deste Supremo Tribunal de Justiça de 06.03.2002 proferido no processo 02S337, bem como na decisão da Reclamação contra o indeferimento deste mesmo.

    Juntaram as peças a que aludiram.

    A Relação admitiu o recurso.

    *** Alegando, formularam as seguintes conclusões: A1. Em contradição com o Acórdão recorrido, quanto à questão, convocatória do regime legal disposto no art. 39º, n.°s 1, 2, e 3, do Código de Processo Civil, do momento da produção dos efeitos da renúncia ao mandato no que tange aos prazos em curso para a prática de actos processuais, encontra-se a fundamentação do Acórdão da Relação de Coimbra de 12/12/2006 proferido no processo n.°217/05.1TJCBR-A.C1, bem como, o Acórdão do STJ de 06/03/2002 proferido no processo 337/01-4.ª Secção e a própria reclamação contra o indeferimento deste mesmo recurso, ambos no processo 153/1999 da 1ª Secção do 4.° Juízo do Tribunal do Trabalho de Lisboa (docs. 1 e 2 que ora se juntam). Efectivamente, A2. O referido Acórdão da Relação de Coimbra considerou que, apesar da prescrição legal do art. 39.°, n.°2, do Código de Processo Civil consignar que os efeitos da renúncia se produzem com a sua notificação, as mesmas bases de raciocínio, intenção legislativa e princípios processuais e constitucionais, que implicam que a suspensão dos prazos processuais em curso para a prática de actos se considerem suspensos com a notificação da...

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