Acórdão nº 2733/06.9TBBCL.S1 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 08 de Setembro de 2009

Data08 Setembro 2009
Órgãohttp://vlex.com/desc1/1997_01,Supreme Court of Justice (Portugal)

S Privacidade: 1 Meio Processual: REVISTA Decisão: NEGADA A REVISTA Sumário : I - São indemnizáveis os danos morais directos ou reflexos que, pela sua gravidade, mereçam a tutela do direito, tenha o facto lesivo causado ou não a morte da vítima (art. 496.º do CC).

II - São concretamente ressarcíveis os danos morais sofridos pelo autor em consequência do acidente de viação que vitimou a autora, sua mulher, e do qual resultaram para esta lesões e sequelas várias que comprometeram gravemente os direitos de coabitação (no qual se inclui o débito conjugal), cooperação e assistência de que o autor é titular enquanto membro da sociedade conjugal formada com a autora.

III - Nesta perspectiva, tais danos são directos, e não reflexos ou causados a terceiros, na medida em que atingem concomitantemente ambos os autores, enquanto pessoas casadas entre si.

Decisão Texto Integral: Acordam no Supremo Tribunal de Justiça: I.

Relatório AA e seu marido BB propuseram uma acção ordinária contra G... – Companhia de Seguros, SA, e Companhia de Seguros T..., SA, pedindo que as rés fossem condenadas a pagar-lhes: - À autora, a quantia de 760.000 € de indemnização pelos danos patrimoniais e não patrimoniais que sofreu, bem como o que se apurar em execução de sentença quanto aos danos cuja extensão ainda não lhe foi possível contabilizar; - Ao autor, a quantia de 150.000 € de indemnização pelos danos não patrimoniais que sofreu; - Juros de mora à taxa legal sobre os danos patrimoniais, com referência à data em que os mesmos se verificaram.

O pedido teve por fundamento um acidente de viação ocorrido em 28/7/03 na área da comarca de Barcelos em que intervieram os veículos automóveis ...-...-EF e ...-...-FD, seguindo a autora como passageira do primeiro, de que resultaram para ela ferimentos muito graves, designadamente traumatismo craniano com esmagamento da massa encefálica, que implicaram tratamento hospitalar e dores de que ainda não está totalmente curada, necessitando de continuada assistência médica.

Segundo a petição inicial o veículo, ligeiro de passageiros, EF pertencia a CC e era conduzido por DD, que o fazia seguindo ordens, instruções e no interesse daquela.

O veículo, pesado de mercadorias, FD pertencia a A...R...P... & Filhos, Ldª, e era conduzido por um seu empregado, EE.

A condutora do EF circulava pela metade direita da estrada, a uma distância de cerca de 50 cm a um metro da berma, e a uma velocidade que não ultrapassava os 30 a 40 Km/hora.

Quando chegou ao local acima referido defrontou-se, repentinamente, com o FD, que, provindo do acesso ao adro da Igreja, entrava, de marcha-atrás, na estrada e na faixa de rodagem por onde seguia o EF, não se encontrando a mais de 4 ou 5 metros da embocadura daquele acesso.

Por não contar com tal manobra a condutora do EF não conseguiu evitar o choque, apesar de ter travado.

À data do acidente existiam no local algumas roulottes de um circo instalado no adro, roulottes essas que, estacionadas também junto à berma da faixa de rodagem por onde seguia o EF, tapavam por completo a visibilidade ao condutor do FD.

A ré G... contestou, impugnando parte dos factos relativos ao acidente e a extensão dos danos sofridos pela autora, assim como os alegados pelo autor.

A ré T... também contestou, aceitando, no essencial, a versão do acidente apresentada pelos autores, e concluindo, por isso, pela inexistência de culpa do veículo seu segurado na produção do sinistro.

Realizado o julgamento e estabelecidos os factos foi proferida sentença que, julgando a acção parcialmente procedente: 1) Condenou a Ré G... a pagar à autora a importância de 642.800,00 €, com juros de mora à taxa anual de 4% desde 12/7/06 no que se refere à importância de 581.800,00 €, e a contar da data da sentença sobre a importância total da parte da indemnização já liquidada; 2) Condenou ainda esta Ré a pagar à autora o que se liquidar em ulterior decisão no que toca ao futuro acompanhamento médico a que vai ser submetida, nos termos especificados no ponto VI da sentença; 3) E ainda a pagar ao autor 25.000,00 € a título de danos não patrimoniais, com juros de mora a contar da sentença; 4) Absolveu a ré T... do pedido.

A ré G... apelou, mas sem êxito, pois a Relação de Guimarães confirmou a sentença.

Por isso recorreu novamente, de revista, pedindo a revogação do acórdão recorrido por ter violado o disposto nos artºs 29º do Código da Estrada e 562º e seguintes do Código Civil. Em síntese, concluiu, de útil, o seguinte: 1º - Face à teoria da causalidade adequada, a actuação da condutora do veículo EF não foi indiferente ao facto lesivo (acidente); 2º - Ambos os condutores contribuíram para ele em termos causais pois tanto um como o outro violaram regras estradais e deveres de cuidado; 3º - Deve ser reduzido o montante de 316.800,00 € atribuído a título de assistência por terceira pessoa visto que não se atendeu a que a lesada o receberia de uma só vez; 4º - Se bem que elevado, o dano moral da recorrida não pode ser comparado a uma morte, contrariamente ao que as instâncias fizeram; 5º - O recorrido BB não tem direito a indemnização por danos morais sofridos devido à ausência de débito conjugal, pois não é um lesado nos termos e para os efeitos do disposto no artº 496º do CC.

O autor e a ré T... contra alegaram, defendendo a manutenção do julgado.

Tudo visto, cumpre decidir.

II.

Fundamentação

  1. Matéria de Facto: 1) No dia 28.7.03, cerca das 10,20 horas, no lugar da Igreja, na Estrada Municipal que liga Rio Covo Santa Eugénia a Areias de Vilar, ambas freguesias do concelho de Barcelos, ocorreu um embate em que intervieram o veículo ligeiro de passageiros com a matrícula ...-...-EF, na altura conduzido por DD, e o veículo pesado de mercadorias com a matrícula ...-...-FO, na altura conduzido por EE.

    2) À data do embate EE conduzia o veículo identificado em 1) por ordem de A...R...P... e Filhos, Ldª, sociedade por quotas, com sede na Zona Industrial de Neiva - 1ª. Fase, Neiva, Viana do Castelo, da qual é assalariado.

    3) No veículo ...-...-EF, sentada no banco dianteiro ao lado do lugar da condutora, seguia a autora AA.

    4) O veículo ...-...-EF circulava pela estrada identificada em 1) no sentido Rio Covo Santa Eugénia/Areias de Vilar.

    5) - Do lado direito da estrada, atento o sentido de marcha do veículo onde seguia a Autora, existe uma saída/entrada para o adro da Igreja e que dá directamente para a referida estrada.

    6) Antes do embate o veículo ...-...-FD encontrava-se imobilizado no adro referido em 5).

    7) No adro referido em 5) estavam estacionadas algumas roulottes, junto à berma direita da estrada atento o sentido de marcha do veículo ...-...-EF, o que retirava ao condutor do veículo ...-...-FD a visibilidade sobre a hemi-faixa por onde circulava o veículo ...-...-EF.

    8) O condutor do veículo ...-...-FD efectuou uma manobra de marcha-atrás.

    9) Naquele local o piso da estrada é betuminoso e estava seco.

    10) No dia referido em 1) o tempo estava seco.

    11) No local onde se deu o embate, referido em 1), a via configura uma recta.

    12) Na altura do embate DD conduzia o veículo identificado em 1) ao serviço da proprietária do mesmo.

    13) O veículo ...-...-EF circulava a uma velocidade que não ultrapassava os 30 a 40 Km/ hora.

    14) O veículo ...-...-EF seguia pela hemi-faixa direita, atento o sentido referido em 4), afastado entre 50 cm a um metro da berma direita.

    15) A autora AA seguia com o cinto de segurança devidamente acondicionado e preso nos pontos a tal destinados.

    16) O condutor do veículo ...-...-FD efectuou a manobra referida em 8) quando o veículo ...-...-EF estava a uma distância inferior a 4 ou 5 metros da saída mencionada em 5).

    17) A parte traseira do veículo ...-...-FD e a parte frontal direita do veículo ...-...-EF colidiram quando aquele fazia a manobra referida em 8) e este circulava na estrada, como se refere em 4).

    18) Por via do referido embate, o veículo ...-...-EF foi arrastado para e sobre o eixo da via.

    19) Quando a traseira do veículo ...-...-FD se encontrava sobre a estrada referida em 1) o seu condutor apercebeu-se da aproximação do veículo ...-...-EF.

    20) No momento em que se deu o embate não circulava qualquer outro veículo na via, pelo menos em sentido contrário ao seguido pelo EF.

    21) A condutora do veículo ...-...-EF não travou.

    22) Nem desviou a trajectória do veículo que conduzia.

    23) Na sequência do embate referido em 1), a autora foi de imediato transportada ao Hospital de Barcelos, seguindo no mesmo dia para o Hospital de São Marcos, em Braga.

    24) Em...

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