Acórdão nº 00233/00-Porto de Tribunal Central Administrativo Norte, 17 de Setembro de 2009

Magistrado ResponsávelDr
Data da Resolução17 de Setembro de 2009
EmissorTribunal Central Administrativo Norte

Acordam em conferência na Secção de Contencioso Administrativo do Tribunal Central Administrativo Norte: 1.

RELATÓRIO CÂMARA MUNICIPAL MARCO DE CANAVESES, devidamente identificada nos autos, inconformada, veio interpor recurso jurisdicional da decisão do TAF do Porto, datada de 28.10.2008, que julgou procedente o recurso contencioso anulação contra si deduzido por M… com base na verificação dos vícios de violação de lei [arts. 26.º, n.º 1 e 42.º ambos do ED] e anulou a deliberação de 10.01.2000 que aplicou ao aqui recorrido a pena disciplinar de demissão.

Formula a recorrente nas respectivas alegações (cfr. fls. 128 e segs. e correcção de fls. 205 e segs.), as seguintes conclusões que se reproduzem: “...

  1. - Encontra-se evidenciado nos autos que o arguido Recorrente entendeu perfeitamente o conteúdo da acusação, nomeadamente os factos que lhe foram imputados e a integração de tais factos nas normas sancionatórias correspondentes; 2ª - Tal factualidade encontra-se expressa de modo claro e perceptível nos diversos artigos de acusação, nomeadamente a que se refere à não comparência no serviço após ter terminado o tempo de baixa, no dia 26 de Novembro de 1999, que lhe fora concedido por atestado médico que apresentou nos Serviços competentes da Câmara, só o fazendo no dia 7 de Dezembro seguinte, o que perfaz 6 dias de falta ao Serviço, sem motivo justificado e sem que tenha apresentado quaisquer razões para o fazer, infringindo o Dever de Assiduidade, referido na alínea g), do n.º 4, do art. 3.º, punido pelo disposto na alínea h), do n.º 2, do art. 26.º, ambos os artigos do Estatuto Disciplinar dos Funcionários e Agentes da Administração Central, Regional e Local; 3ª - Por outro lado, o n.º 1 do art. 42.º do E.D. o que diz é que «É insuprível a nulidade resultante da falta de audiência do arguido em artigos de acusação nos quais as infracções sejam suficientemente individualizadas e referidas aos correspondentes preceitos legais, bem como a que resulte de omissão de quaisquer diligências essenciais para a descoberta da verdade»; 4ª - Nada se refere em tal normativo quanto a outras circunstâncias e ocorrências, nomeadamente a menção a circunstâncias atenuantes e agravantes, plasmadas no n.º 4 do art. 59.º, as quais deverão ser subsumidas ao n.º 2 daquele art. 42.º que dispõe que «As restantes nulidades consideram-se supridas se não forem reclamadas pelo arguido até à decisão final», não ao seu n.º 1; 5ª - Não resulta dos autos que a dita circunstância agravante da reincidência (constante da parte final do relatório) foi determinante, ou sequer tenha contribuído, para a decisão constante da deliberação camarária que, na sequência de processo disciplinar, em que foi acusado de dar seis faltas seguidas ao serviço, sem motivo justificado, aplicou ao arguido Recorrente a pena de Demissão; 6ª - Foi, portanto, assegurado o direito de defesa do arguido, improcedendo a alegada e declarada nulidade insuprível por pretensa violação dos arts. 42.º, n.º 1 (decorrente da inobservância do imperativo do n.º 4 do art. 59.º, no segmento das circunstâncias agravantes), do Estatuto Disciplinar e 269.º, n.º 3, da Constituição da República Portuguesa; 7ª - No tocante ao erro de direito da deliberação camarária recorrida, por violação do disposto no art. 26.º, n.º 1, do E.D., por não ter sido formulado qualquer juízo sobre se os factos imputados ao arguido - seis faltas seguidas injustificadas - eram idóneos a inviabilizar a continuação da relação funcional em causa, designadamente não tendo sido ponderada a culpa, também tal vício, salvo o devido e muito respeito, se não verifica; 8ª - Não se olvidando a Jurisprudência produzida sobre a matéria, no sentido de que o facto de as faltas deverem ser consideradas injustificadas, não implica, só por si, que se mostrem preenchidos os pressupostos de aplicação da pena de demissão ao abrigo da al. h), do n.º 2, do art. 26.º, do E.D., importando que se pondere se as circunstâncias do caso, pela sua gravidade, indiciam a inviabilização da manutenção da relação funcional, o certo é que importa analisar o caso concreto; 9ª - Ora, no caso dos autos, vê-se do Relatório do Instrutor que «Compulsados os autos e tendo em conta tudo o que me foi dado a ouvir e observar durante o decorrer do presente processo disciplinar, sou levado às seguintes conclusões: - FACTOS PROVADOS: 1. O Funcionário desta Câmara, M…, (...) faltou ao serviço que lhe estava cometido nos dias 26, 29 e 30 do passado mês de Novembro e nos dias 2, 3 e 6 do corrente mês, perfazendo assim o total de seis faltas ao serviço sem motivo justificado.

    1. (O) referido funcionário não entregou nos Serviços Administrativos e Financeiros desta Câmara no dia 26NOV99, atestado médico algum, com vista a justificar as supracitadas faltas ao serviço.

    2. Da defesa escrita, apresentada pelo arguido, nada resulta que possa relevar o cometimento da infracção que lhe é cometida no presente processo.

    - INFRACÇÃO: O funcionário (...) infringiu o dever de assiduidade, referido na alínea g), do n.º 4, do art. 3.º, punido pelo disposto na alínea h), do n.º 2, do art. 26.º, ambos os artigos do (...) Estatuto Disciplinar.

    - CIRCUNSTÂNCIAS AGRAVANTES: Do seu Processo Individual consta que já lhe foram injustificadas duas faltas ao serviço, verificadas nos dias 30 e 31 de Julho de 1998.» 10ª - Veja-se a Nota de Culpa, onde o arguido é acusado de dar “...6 dias de falta ao serviço, sem motivo justificado e sem que tenha apresentado quaisquer razões para o fazer», com o que «infringiu o Dever de Assiduidade, referido na alínea g), do n.º 4, do art. 3.º, punido pelo disposto na alínea h), do n.º 2, do art. 26.º, ambos os artigos do pré-citado Estatuto».

  2. - Em processo disciplinar, a constatação da inviabilização da continuação da relação funcional não está sujeita a fórmulas sacramentais, interessando que o arguido seja posto de sobreaviso quanto à possível consequência do processo disciplinar por forma inequívoca para que ele possa organizar convenientemente a sua defesa, devendo ressaltar da nota de culpa, desiderato legal que foi satisfeito, pois que na nota de culpa entregue ao arguido expressamente vinha assinalada, além do mais, a INFRACÇÃO: Infringiu o Dever de Assiduidade, referido na alínea g), do n.º 4, do art. 3.º, punido pelo disposto na alínea h), do n.º 2, do art. 26.º [Aposentação compulsiva e demissão].

  3. - Em matéria disciplinar vigora o princípio da livre apreciação da prova, com a inerente sujeição às regras da experiência e senso comum (…).

  4. - O conceito de inviabilização da manutenção da relação funcional concretiza-se através de juízos de prognose, na fixação dos quais a Administração goza de grande liberdade de apreciação (Ac. do STA de 6-10-1993; AP-DR de 15-10-1996, p. 4831).

  5. - O resultado do processo decisório sobre a realidade e a interpretação da factualidade adquirida em processo disciplinar releva do domínio da chamada «justiça administrativa», em que intervêm factores de apreciação de grande subjectividade e imponderabilidade, fundados num critério de livre convicção do intérprete, que impede o Tribunal de o sindicar, salvo em situações extremas de erro manifesto de apreciação (Ac. do STA de 12-10-1993; AP-DR, de 15-10-1996, p. 5101; BMJ n.º 430, p. 275) 15ª - O comportamento do arguido Recorrente, apurado em processo disciplinar, por si considerado, e atentas as circunstâncias do caso, tal como descritas na nota de culpa e no relatório do instrutor, reflectem, traduzem, acarretam, a impossibilidade de o mesmo arguido se manter ao serviço (cfr. Manuel Leal-Henriques, Procedimento Disciplinar, 3.ª ed., 1997, p. 159), não sendo desproporcionada, excessiva ou desadequada a pena de demissão que lhe foi imposta na deliberação camarária impugnada.

  6. - Em suma, verifica-se a regularidade e total conformidade do processo disciplinar dos autos e da deliberação camarária impugnada, não se verificando os vícios que lhes foram assacados e declarados na douta Sentença, nem quaisquer outros que os invalidem, devendo o presente recurso obter provimento, com a total improcedência do pedido do arguido Recorrente.

  7. - Ao decidir nos termos em que o fez na douta sentença, o Mm.º Juiz a quo violou e fez errada interpretação e aplicação do disposto nas normas e princípios legais e constitucionais supra referidos …”.

    Termina pugnando pela procedência do recurso jurisdicional, com consequente manutenção da deliberação disciplinar punitiva por total improcedência do recurso contencioso de anulação.

    O ora recorrido, apresentou contra-alegações (cfr. fls. 230 e segs.), concluindo da forma seguinte: “...

    1. A douta sentença, ora em censura, apura todos os factos que podem contribuir para a boa decisão da causa.

    2. A existência de agravantes tomadas em conta no relatório final e totalmente ausentes da nota de culpa constituem uma nulidade insanável.

    3. Mesmo que nenhuma irregularidade contivesse o processo, jamais se encontrariam no processo factos que levassem à conclusão da inviabilização da relação funcional.

    4. Ao decidir como decidiu, aplicou o Mm.º juiz «a quo», a lei e o direito de forma irrepreensível. Nenhuma norma ou princípio constitucional foi violado.

    5. O processo em causa é efectivamente nulo, não podendo produzir qualquer efeito, conforme o refere a douta sentença, ousadamente posta em crise …”.

      Termina no sentido da improcedência do recurso e confirmação da decisão judicial recorrida.

      O Ministério Público junto deste Tribunal emitiu parecer no sentido do improvimento do recurso (cfr. fls. 201).

      Colhidos os vistos legais juntos dos Exmos. Juízes-Adjuntos foram os autos submetidos à Conferência para julgamento.

    6. DELIMITAÇÃO DO OBJECTO DO RECURSO - QUESTÕES A APRECIAR Cumpre apreciar e decidir as questões colocadas pela recorrente, sendo certo que o objecto do recurso se acha delimitado pelas conclusões das respectivas alegações, nos termos dos arts. 660.º, n.º 2...

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