Acórdão nº 0341/09 de Supremo Tribunal Administrativo (Portugal), 28 de Janeiro de 2010
Magistrado Responsável | PAIS BORGES |
Data da Resolução | 28 de Janeiro de 2010 |
Emissor | Supremo Tribunal Administrativo (Portugal) |
Acordam, em conferência, na Secção do Contencioso Administrativo do Supremo Tribunal Administrativo: ( Relatório ) I. O VEREADOR DA CÂMARA MUNICIPAL DE LISBOA recorre jurisdicionalmente para este Supremo Tribunal Administrativo da sentença do TAF de Sintra, de 09.10.2008 (fls. 268 e segs.), que, concedendo provimento ao recurso contencioso interposto por A… e outros 14, anulou por vício de violação de lei, o despacho do ora recorrente, de 22.09.2000, pelo qual foi indeferida a pretensão dos recorrentes contenciosos relativa ao pagamento de mais valias na alienação de uma parcela desanexada de terrenos expropriados ao abrigo do DL nº 28.797, de 1 de Julho de 1938 e da Lei de 26 de Julho de 1912.
Na sua alegação, formula as seguintes conclusões: 1. Atenta a sucessão legislativa operada desde a expropriação do terreno objecto dos Autos – ocorrida por escritura celebrada em 10/05/1939 –, constata-se que os artigos 6.° e 7.° da Lei de 26 de Julho de 1912 foram literalmente revogados pelo D.L. n.º 71/76, de 27/01 (cfr. n.º 1 do artigo 107.°), revogação essa que foi expressamente mantida pelo C.E. 76 (cfr. n.º 2 do artigo 128.°).
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Consequentemente, é manifesto que aos aqui Recorridos já não assistiam, aquando da celebração do contrato de permuta e concessão, quaisquer direitos emanados das disposições supra citadas da Lei de 26 de Julho de 1912.
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Isto porque, a expropriação por utilidade pública é uma forma originária de aquisição da propriedade, pelo que o conteúdo do direito da entidade expropriante sobre o bem expropriado em nada depende do título aquisitivo, com excepção da vinculação ao destino justificativo da expropriação.
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O conteúdo do direito da entidade expropriante, o estatuto legal do bem expropriado, depende das normas legais vigentes ao momento da prática dos actos, não tendo qualquer interferência o regime legal em vigor à data da expropriação.
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À semelhança do que sucede com o instituto da reversão, as normas da Lei de 26 de Julho de 1912 que previam o direito de preferência e o direito às mais valias, disciplinando o modo como poderiam ser alienados os bens expropriados e as condições de exercício daqueles direitos, fazem parte do estatuto dos bens.
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O que significa que estamos perante normas que dispõem directamente sobre o conteúdo de uma relação jurídica, in casu sobre o conteúdo do direito do expropriante, abstraindo do facto que lhe deu origem (o acto de expropriação).
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A mesma natureza tem a norma do D.L. n.º 71/76, de 27/01 (artigo 107.º) que revogou os artigos 6.º e 7.º da Lei de 26 de Julho de 1912, alterando o estatuto do bem expropriado.
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Pelo que, nos termos da 2.ª parte do n.º 2 do artigo 12.º do C.C., aplicam-se a factos que ocorram durante a sua vigência, ainda que respeitem a situações já constituídas.
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Neste contexto, o direito de preferência e o direito à mais valia, estabelecidos no artigo 7.º da Lei de 26 de Julho de 1912, foram extintos pelo D.L. n.º 71/76, de 27/01.
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E, pela mesma razão, foi também extinta a obrigação da entidade expropriante de proceder à venda do bem expropriado por hasta pública.
Por conseguinte: 11. Os Recorridos não eram titulares de qualquer dos direitos a que se arrogam.
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Nessa medida, o despacho de indeferimento que aqui vem impugnado é insusceptível de violar qualquer direito dos Recorridos, que não existe, pelo que carece da lesividade necessária para que seja recorrível, conforme resulta do disposto no nº 4 do artigo 268.º da Constituição da República Portuguesa.
Tal determina a rejeição, por irrecorribilidade do acto administrativo impugnado.
Sem conceder, 13. O Município de Lisboa não violou qualquer norma legal vigente, citadas pelos agora Recorridos, ao permutar o terreno sem prévia hasta pública.
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Nessa conformidade, carece de fundamento a imputação ao despacho recorrido da invalidade que decorreria da violação dos artigos 6.º e 7.º da Lei de 26 de Julho de 1912, do n.º 1 do artigo 12.º do C.C. e dos princípios da actividade administrativa a que se reportam os artigos 5.°, 6.° e 6.º-A do CPA.
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Perante o exposto, demonstrada que ficou a incorrecta interpretação e aplicação das normas jurídicas aplicáveis ao caso sub judice, que motivou a anulação proferida pelo douto Tribunal a quo do despacho proferido em 22/09/2000 pelo então Vereador da Câmara Municipal de Lisboa, B…, deve a douta sentença objecto do presente recurso ser revogada e substituída por outra que recuse provimento ao recurso contencioso de anulação em face da validade inquestionável daquele acto administrativo.
Nestes termos e nos demais de Direito que V. Exas. doutamente suprirão, Deve ser concedido provimento ao presente recurso jurisdicional e, em consequência, ser revogada a douta sentença em crise, substituindo-a por outra que rejeite o recurso contencioso de anulação, dada a manifesta irrecorribilidade do acto administrativo impugnado.
Caso assim não se entenda, Deve ser revogada a douta sentença em crise, substituindo-a por outra que conclua pela improcedência do recurso contencioso de anulação, dada a validade inquestionável do despacho proferido em 22/09/2000 pelo então Vereador da Câmara Municipal de Lisboa, B…, só assim se fazendo a devida JUSTIÇA! II. Contra-alegaram os recorrentes contenciosos, ora recorridos, concluindo nos seguintes termos: 1. O presente recurso jurisdicional vem interposto da douta sentença do TAC de Lisboa, de 9/10/2008, que julga procedente o recurso contencioso de anulação e anula o despacho do Exmo. Senhor Vereador da Câmara Municipal de Lisboa, de 22/09/2000, pelo qual foi indeferida a pretensão dos ora Recorridos, relativa ao pagamento de mais valia pela alienação de uma parcela de terreno desanexada de terrenos expropriados ao abrigo do Decreto-Lei n° 28.797 de 01/07/1938 e da Lei de 26 de Julho de 1912.
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A douta sentença recorrida deu por provados os factos 1) a 12), fls. 288 a 290, os quais não mereceram, nem merecem, qualquer censura e deverão ser mantidos nos seus exactos termos.
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Rejeitada a questão prévia da irrecorribilidade do acto, a sentença recorrida entende que o despacho em apreço violou o disposto nos artigos 6.º e 7.º da Lei de 26 de Julho de 1912.
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A Entidade Recorrente não se conformou com este entendimento, porquanto, na sua interpretação do artigo 12.º do Código Civil, entende que a revogação da Lei de 1912 reflecte-se na situação dos autos e que o estatuto legal do bem expropriado não é o que vigora à data da expropriação, mas sim o aplicável na data do contrato de alienação.
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É, porém, manifesto que a douta sentença recorrida decidiu da única forma conforme ao Direito, não merecendo, portanto, qualquer censura. Aliás, fê-lo em sentido coincidente com o parecer do Ministério Público e com a jurisprudência do STA e demais tribunais superiores.
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O acto recorrido é impugnável, porque lesivo, uma vez que indefere um requerimento no qual os Recorridos reivindicam um direito, em concreto o direito ao pagamento de parte da mais-valia da alienação do terreno.
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Como resulta da factualidade provada, a parcela alienada foi destacada de um terreno que foi expropriado a antecessor dos ora contra-alegantes por força do Decreto-Lei n° 28/97, de 01/07/1938, e da Lei de 26 de Julho de 1912.
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O artigo 6.º da Lei de 26 de Julho de 1912 permitia que a expropriação para abertura ou alargamento de vias...
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