Acórdão nº 236/19 de Tribunal Constitucional (Port, 23 de Abril de 2019

Magistrado ResponsávelCons. Claudio Monteiro
Data da Resolução23 de Abril de 2019
EmissorTribunal Constitucional (Port

ACÓRDÃO Nº 236/2019

Processo n.º 29/19

1.ª Secção

Relator: Conselheiro Claudio Monteiro

Acordam, em Conferência, na 1.ª Secção do Tribunal Constitucional,

I – Relatório

1. Nos presentes autos, vindos do Tribunal da Relação de Coimbra, A., Lda., interpôs recurso para o Tribunal Constitucional, ao abrigo da alínea f) do n.º 1 do artigo 70.º da Lei da Organização, Funcionamento e Processo do Tribunal Constitucional (Lei n.º 28/82, de 15 de novembro, de seguida designada por LTC), mediante requerimento dirigido ao Supremo Tribunal de Justiça que, no que, ora importa, ostenta o seguinte teor:

«(…) Sucintamente, está em causa o alcance da interpretação e a aplicação do artigo 205º, nº 1 da Constituição da República Portuguesa e o do artigo 154º, nº 1 do Código de Processo Civil, ao dever de fundamentação das decisões judiciais.

Com efeito, o artigo 205º, nº 1, da CRP determina que "As decisões dos tribunais que não sejam de mero expediente são fundamentadas na forma prevista na lei".

Nos termos do artigo 154º, nº 1 do Código de Processo Civil, também as decisões judiciais devem ser fundamentadas, quer factual, quer juridicamente, sob pena de nulidade, prevista no artigo 615º, nº 1, alínea b), do Código de Processo Civil.

No âmbito do recurso interposto pela ora recorrente da decisão proferida pelo Tribunal de 1~ Instância, invocou esta, que o despacho que ordenou, ao abrigo do disposto no artigo 12º, nº 1 e 3, do Código de Insolvência e da Recuperação de Empresas (CIRE), a dispensa da audição do devedor, é nulo, por falta de fundamentação "na forma prevista na lei", tal como é determinado no invocado artigo 205º, nº 1, da CRP.

Na verdade, a audição do requerido no âmbito de um pedido de declaração da sua insolvência é uma regra, suscetível de ser afastada apenas e quando, acarretar demora excessiva por ser desconhecido o seu paradeiro.

Por outras palavras, apenas se se considerar preenchido o pressuposto acima descrito, pode o Juiz dispensar a audição do requerido, o que fará de forma fundamentada, com a invocação de factos que inelutavelmente preencham o pressuposto legal.

Se esses fundamentos estiverem assentes em pressupostos incorretos - mormente a nulidade da citação da Recorrente, como é por si alegado - não bastará ao Juiz proferir um despacho em que, sem mais, fundamente o seu despacho com o teor do próprio artigo.

Esta fundamentação não pode deixar de considerar-se nula e inconstitucional, face ao disposto no nº 1, do artigo 205º da CRP. De facto, o que o legislador pretende é assegurar, através da obrigação de fundamentação das decisões judiciais, a proteção.».

O relator no Supremo Tribunal de Justiça proferiu, em 13 de setembro de 2017, despacho, nos termos do n.º 5 do artigo 75.º-A da LTC.

Em resposta, a recorrente veio indicar que a decisão de que pretende recorrer é a proferida pelo Tribunal da Relação de Lisboa e que o recurso foi interposto em prazo. Mais reiterou o conteúdo do anterior requerimento quanto aos fundamentos do recurso, acrescentando a afirmação de que «ao decidir afastar o exercício ao contraditório da Recorrente, sem o integral respeito pelo preenchimento integral dos pressupostos de aplicação do artigo 12.º, números 1 e 3, do CIRE, que prevê uma situação excecional de afastamento, naquela fase, do exercício ao contraditório, há uma violação da disposição contida no n.º 1, do artigo 205º da CRP».

Por fim, também reiterou que o recurso é interposto ao abrigo do artigo 70.º, n.os 1, alínea f), 2 e 3, e artigo 75.º, ambos da LTC.

2. Remetidos os autos ao Tribunal da Relação de Lisboa, foi proferido despacho em 1 de outubro de 2018, que não admitiu o recurso de constitucionalidade.

Na referida decisão, pode ler-se, nomeadamente, o seguinte:

«Como vimos do relatório que temos vindo a fazer, a recorrente foi mesmo convidada, nos termos do artigo 75º-A nº 5 da Lei 28/82, a suprir as deficiências do seu requerimento, e esta deficiência - não indicação da peça processual - não foi suprida, pelo que nos termos do artigo 76º nº 2 acima citado, o requerimento de recurso deve ser indeferido.

Mas mais:

Em primeiro lugar, a recorrente deu entrada dum requerimento de recurso incompleto, o qual veio a completar na sequência do convite feito. Só que o convite não convidou a completar o que faltava desse requerimento, mas a completar com a menção que cumpriria as exigências formais do requerimento previstas no artigo 75º- A.

Ora, em bom rigor, temos um requerimento de interposição de recurso para o Tribunal Constitucional que não está completo, e temos que a recorrente veio escrever a parte que faltava escrever na resposta a um convite, e que portanto se passarmos por cima disto, o Tribunal Constitucional teria de ler o requerimento de interposição do recurso na conjugação de dois requerimentos distintos. Mas, além disso, a recorrente limitou-se a indicar que por um fundamento qualquer que fosse que não sabe explicar, o requerimento primeiro seguiu incompleto. A relevância desta incompletude é a de que o requerimento de interposição incompleto não manifesta uma vontade de recorrer completa e portanto não pode valer como vontade de recorrer. Mesmo que assim não seja, então, a relevância passaria para a questão do prazo de recurso, que não se pode contar da data de entrada do requerimento inicial, mas do requerimento de resposta ao convite, que só nesta data fez completar o requerimento de interposição do recurso inicial. E isto porque, a recorrente não alega nem demonstra qualquer justo impedimento na prática atempada do requerimento correto e completo. E portanto, quanto à tempestividade do recurso, a abordaremos de seguida.

Resta ainda dizer que, tendo a recorrente interposto o recurso ao abrigo do artigo 70º nº 1 al. f) da Lei 28/82, isto é, de decisão que aplicou "norma cuja ilegalidade haja sido suscitada durante o processo com qualquer dos fundamentos referidos nas alíneas c), d) e e)", não estamos manifestamente perante o caso das alíneas d) e e) (d) Que recusem a aplicação de norma constante de diploma regional, com fundamento na sua ilegalidade por violação do Estatuto da Região Autónoma ou de lei geral da República; e) Que recusem a aplicação de norma emanada de um órgão de soberania, com fundamento na sua ilegalidade por violação do Estatuto de uma Região Autónoma) e só poderíamos estar então perante o caso da alínea c), ou seja, decisão que tivesse recusado lia aplicação de norma...

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