Acórdão nº 231/17.4PBLMG.C1 de Court of Appeal of Coimbra (Portugal), 24 de Abril de 2019

Data24 Abril 2019
ÓrgãoCourt of Appeal of Coimbra (Portugal)

Acordam em conferência os juízes na 5.ª Secção Criminal do Tribunal da Relação de Coimbra I. Relatório 1. No âmbito do processo n.º 231/17.4PBLMG do Tribunal Judicial da Comarca de Viseu – Lamego – JL Criminal, em 20.09.2018, foi proferida sentença de cúmulo jurídico entre as penas aplicadas ao arguido A.

nos processos n.º 183/17.0PBLMG e n.º 231/17.4PBLMG, cujo dispositivo se transcreve: Nestes termos o tribunal decide condenar o arguido A., em cúmulo jurídico da pena aplicada nos presentes autos, e no processo n.º 183/17.0PBLMG - na pena única de 3 anos e 4 meses de prisão; pena de prisão esta que se suspende na sua execução por igual período, acompanhada: - de regime de prova, assente num plano individual de readaptação social, executado com vigilância e apoio durante o tempo de duração da suspensão da execução, dos serviços de reinserção social.

- o afastamento da vítima, da sua residência ou local de trabalho e a proibição de contactos, por qualquer meio, durante o período da suspensão; - e dever de o arguido se sujeitar às consultas e/ou tratamento ao álcool que lhe vier a ser determinado (uma vez que o arguido consentiu submeter-se a tratamento).

- Condenar o arguido na pena acessória única de proibição de contactos com a ofendida (…), por qualquer meio e em qualquer local, incluindo a residência daquela), pelo período de 19 meses, a qual deverá ser fiscalizado por meios técnicos de controlo à distância, ou seja, de vigilância eletrónica, ao abrigo do disposto no artigo no artigo 152.º, n.ºs 4 e 5, do Código Penal.

(…).

  1. Por decisão de 29.11.2018 o tribunal decidiu revogar a suspensão da execução da pena única de 3 (três) anos e 4 (quatro) meses de prisão, resultante da sentença que procedeu ao cúmulo jurídico das penas cominadas ao arguido A., conforme supra referido em 1.

  2. Inconformado com a decisão recorreu o arguido, formulando as seguintes conclusões: 1. O Recorrente não se conforma, nem concorda com a decisão de revogação da suspensão na sua execução da pena de 3 (três) anos e 4 (quatro) meses de prisão, suspensa na sua execução por igual período, entendendo que o Tribunal a quo poderia ter decidido de forma diferente.

  3. O Tribunal a quo, na decisão recorrida, considerou que o Arguido no período de suspensão da pena de prisão em que foi condenado à ordem destes autos, cometeu um crime de roubo, pelo qual foi condenado, que confrontado com tais factos, em sede de audição, nada disse, nem se predispôs a alterar o seu comportamento, concluindo que o mesmo não interiorizou as regras sociais, que persiste em desrespeitar, o que determinou a revogação da suspensão.

  4. Salvo o devido respeito, cremos que os autos não fornecem, com segurança e certeza necessárias, o referido incumprimento culposo do Arguido, que justifique a revogação da suspensão da pena de prisão, tal como foi determinado o que se impugna com as legais consequências.

  5. O Tribunal a quo não escalpelizou corretamente todos os fatores que pudessem depor a favor ou contra o Arguido, e não ponderou devidamente as declarações do Arguido e do técnico de vigilância eletrónica.

  6. Atentando nas declarações do Arguido, da Ofendida e dos técnicos de reinserção social e de vigilância eletrónica, o Tribunal a quo, não valorou, como se impunha que: a. O Arguido esclareceu que o único trajeto que tem para se deslocar para o trabalho é aquele que acusa eventuais alarmes; b. Em diversas ocasiões avistando a Ofendida o Arguido seguiu por caminho diferente para evitar a aproximação; c. A maioria dos alarmes registados decorreu na época das festas da cidade de (...) , cujo termo é 9 de Setembro; d. Não são conhecidos incidentes registados entre as 5, 6 e 7 da manhã; e. Quando é contactado pela equipa de vigilância eletrónica o Arguido acata as suas orientações e afasta-se do local.

  7. Resulta ainda dos autos que após 22/10/2018 (data do trânsito em julgado da sentença de cúmulo jurídico) o Arguido não regista quaisquer incidentes de incumprimento, nomeadamente de aproximação à Ofendida.

  8. Mais resulta dos autos e em especial do CRC do Arguido que o mesmo não foi condenado por qualquer crime após a suspensão da pena de prisão determinada nestes autos, nem tem averbada qualquer outra.

  9. Não há notícia nos autos de que o Arguido tenha pendente qualquer investigação criminal em causa, por factos de idêntica ou distinta natureza.

  10. Os planos de reinserção social elaborados ao Arguido ainda não foram judicialmente homologados, sendo certo que, o Arguido já iniciou o tratamento à sua dependência ao álcool junto do CRI de (...) .

  11. Todos estes dados resultam do teor dos relatórios juntos aos autos e demais documentação e bem assim das declarações do mesmo e dos demais intervenientes, sendo que, para o caso que aqui importa, damos por reproduzido o depoimento da testemunha (…), técnico de vigilância eletrónica, conforme gravação efetuada a 19/10/2018, entre as 14:32:19 e as 14:35:51, aos minutos 00:01 e 03:00 e entre as 14:35:56 e as 14:45:22, aos minutos 01:10 a 02:40, cujo conteúdo aqui damos por reproduzido.

  12. Venerando, V. Exas. procedendo à audição da gravação elencada e bem assim da demais documentação junta aos autos, facilmente concluirão que a decisão recorrida não escalpelizou todos os fatores que depõem a favor do Arguido, o que, pela presente via se requer. 12. Por sentença de cúmulo jurídico proferida nestes autos a 17/09/2018, foi o Arguido condenado na pena única de 3 (três) anos e 4 (quatro) meses de prisão, suspensa na sua execução, por igual período, subordinada a deveres e regras de conduta, decisão esta que transitou em julgado a 22/10/2018.

  13. Os alarmes/incidentes de aproximação são anteriores a 22/10/2018.

  14. Aquando do cúmulo jurídico o Tribunal a quo era conhecer destes incidentes/alarmes e ainda assim efetuou um juízo de prognose favorável ao Recorrente, que lhe permitiu suspender a execução da pena única de prisão.

  15. Os factos em que se baseou a decisão que revogou a suspensão da pena de prisão são anteriores ao trânsito em julgado da decisão que operou o cúmulo jurídico, tendo ficado precludidos com a prolação dessa decisão.

  16. Salvo o devido respeito, os incumprimentos/incidentes registados em data anterior ao cúmulo jurídico, que permitiram ao Tribunal efetuar uma prognose favorável, não podem ser por este utilizados no futuro para fundamentar a revogação da suspensão da pena de prisão.

  17. O Tribunal a quo, conhecedor dos incidentes à data do cúmulo jurídico, efetuou um juízo de prognose favorável, que lhe permitiu suspender a execução da pena de prisão, quando podia, querendo, ter decidido de forma diferente, sendo ilegal fundamentar uma futura revogação da suspensão com base em incidentes que já eram conhecidos à data da suspensão da pena prisão.

  18. A sentença de cúmulo jurídico precludiu os incidentes/incumprimentos registados em data anterior ao seu trânsito em julgado, não podendo, por essa via subsistir a decisão recorrida, que deve ser revogada.

  19. As finalidades da punição são essencialmente a proteção de bens jurídicos e a reintegração do agente na sociedade, sendo certo que, no atual tempo do Estado de Direito o legislador preferiu as penas não privativas da liberdade em detrimento das penas privativas daquela e bem assim afastou (dado o variado leque de penas de substituição) o efetivo cumprimento da pena de prisão em penas de curta duração.

  20. A suspensão da execução da pena de prisão pode assumir três modalidades: suspensão simples; suspensão sujeita a condições (cumprimento de deveres ou de certas regras de conduta); suspensão acompanhada de regime de prova.

  21. Qualquer alteração à suspensão da execução da pena, por violação dos deveres ou das regras de conduta impostas na sentença, pressupõe a culpa no não cumprimento da obrigação.

  22. E no caso de revogação, a culpa há-de ser grosseira.

  23. A jurisprudência dos nossos Tribunais superiores mostra-se pacífica no entendimento de que a apreciação sobre a falta de cumprimento dos deveres impostos em sentença como condicionantes da suspensão da execução da pena deve ser cuidada e criteriosa, e que apenas uma falta grosseira determina a revogação.

  24. A revogação da suspensão da pena por incumprimento do agente das obrigações impostas, só pode ocorrer se o incumprimento se verificar com culpa, e só terá lugar como “ultima ratio”, isto é, quando estiverem esgotadas ou se revelarem de todo ineficazes as restantes providências contidas no art. 55.º do Cód. Pen. 25. Não se pode branquear a posição do Arguido...

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