Acórdão nº 2259/17.5T8LRA.C1.S1 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 26 de Março de 2019
Magistrado Responsável | ALEXANDRE REIS |
Data da Resolução | 26 de Março de 2019 |
Emissor | Supremo Tribunal de Justiça (Portugal) |
Acordam no Supremo Tribunal de Justiça: AA propôs esta acção contra Banco BB, SA, pedindo que esta fosse condenada a pagar-lhe a quantia de € 55.321,57, acrescida de juros. Para tanto, alegou, em suma: - No dia 19‑09‑2005, o A, tendo um depósito a prazo de € 50.000 no banco da R, foi abordado por um funcionário desta que lhe disse que o banco tinha um novo produto totalmente seguro, idêntico nas suas condições a um depósito a prazo, e que lhe permitia auferir uma taxa de juro superior.
- Nesse mesmo dia, subscreveu a compra de uma obrigação CC, no valor de € 50.000, para o que foi colocado na sua frente uma cópia de um documento denominado “Comunicação Cliente”, sem qualquer numeração, já preenchido à mão, que se limitou a assinar, julgando que se tratava de uma variante de um depósito a prazo, só que mais bem remunerado.
- O A pretendia que tal aplicação pudesse ser resgatada a qualquer altura, para além de que a recuperação do seu valor fosse segura a 100%, tendo-lhe sido assegurado que o poderia fazer a qualquer altura, com o que apenas sofreria uma penalização nos juros, como sucede nos depósitos a prazo.
- Não lhe foram explicadas as características mais elementares do produto financeiro em causa, apenas lhe foi dada a palavra empenhada de todos os funcionários da R, que actuaram em representação e sob as ordens desta e nos quais tinha plena confiança, de que se tratava de um produto sem qualquer risco e que podia ser resgatado a qualquer altura.
- O Banco réu, agindo embora como intermediário de outrem na colocação no mercado do produto deste, fê-lo de modo a convencer o autor de que a operação era totalmente segura e que o Banco garantia o retorno dos valores em causa.
- O A só aceitou fazer tal subscrição porque lhe foi afiançado que o retorno da quantia subscrita era garantido pelo próprio banco, uma vez que se tratava de um sucedâneo melhor remunerado de um depósito a prazo, com semelhantes características.
A R contestou, invocando ter prestado informação completa, verdadeira, actual, clara, objectiva e lícita ao A e que este, em momento anterior à aludida compra, tinha investido noutros produtos que não o simples depósito a prazo.
Foi proferida sentença absolvendo a R do pedido.
A Relação, julgando procedente a apelação interposta pelo A, condenou a R a pagar-lhe a quantia de € 50.000, acrescida de juros de mora desde 27-10-2014.
A R interpôs recurso de revista desse acórdão, cujo objecto delimitou com conclusões que colocam a questão da sua não responsabilidade pela quantia em que foi condenada, pelas seguintes (resumidas) razões: - não lhe era exigível a advertência ou informação especial sobre o risco (genérico) de incumprimento de reembolso da obrigação no vencimento, ocorrido 10 anos depois, ou até da probabilidade de insolvência da emitente; - em 2005, a eventualidade desse risco não era relevante, pois nada fazia antever qualquer dificuldade futura da emitente; - a entidade emitente (CC) era titular de 100% do capital social da R, pelo que, sendo totalmente dominante desta, o risco da sua solvência, associado ao reembolso das obrigações, correspondia, então, ao risco de solvabilidade do próprio banco e a segurança da subscrição de obrigações emitidas pela CC era correspondente à segurança de um depósito a prazo no DD; - a R limitou-se a informar que era garantido que o reembolso, no vencimento, seria feito pelo valor do capital investido; - não se apuraram factos concretos que permitam afirmar o nexo de causalidade adequada entre a omissão da informação e o alegado dano sofrido pelo A.
* Importa apreciar a questão enunciada e decidir, para o que relevam os seguintes factos considerados pela 2ª instância como provados: 1. O autor subscreveu o documento cuja cópia consta de fls. 76 dos autos.
-
O produto CC tem as características que constam da nota informativa cuja cópia consta de fls. 84 a 100 dos autos.
-
Os € 50.000 entregues na sequência da subscrição do documento referido em 1. não foram restituídos.
-
O autor subscreveu o documento referida em 1 na sequência de um contacto de um funcionário do Banco.
-
Antes de subscrever o documento referido em 1, o funcionário do banco disse ao autor que a obrigação era semelhante a um depósito a prazo, mas com uma taxa de juro mais alta, que podia recuperar o capital com rapidez, que os juros eram semestrais e que o capital era garantido.
-
No momento da subscrição do documento referido em 1, para os funcionários da Agência do DD de ..., a CC era dona do DD, sendo a obrigação subordinada CC um produto seguro, sem risco e com capital garantido, semelhante a um depósito a prazo.
-
O autor, antes da subscrição do documento referido em 1, era tido pelos funcionários do DD como um investidor conservador.
-
O que motivou a autorização do autor foi o facto de lhe ter sido dito pelos funcionários do Banco que o capital era garantido como um depósito a prazo e com uma taxa de juro superior.
-
O autor atuou convicto de que estava a colocar o seu dinheiro numa aplicação com as características de um depósito a prazo.
-
Pelo menos em outubro de 2014 o autor apercebeu-se que não iria reaver o valor investido na obrigação subordinada CC nos mesmos termos em que o reaveria se se tratasse de um depósito a prazo.
-
No momento da subscrição do documento referido em 1 não foi entregue ao autor qualquer documento com as características do produto subscrito.
-
Antes de o autor subscrever o documento referido em 1 o funcionário do DD disse-lhe que a aplicação tinha capital garantido pelo DD.
-
Se o autor tivesse tomado conhecimento que o produto que lhe foi apresentado não era de capital garantido pelo Banco não teria autorizado tal aplicação.
* O objecto deste recurso circunscreve-se à questão da delimitação da responsabilidade da R alegadamente gerada no âmbito do contrato de intermediação financeira ([1]) que a mesma celebrou com o A, seu cliente bancário, com vista à comercialização e aquisição por este do produto financeiro em causa.
Como tem sido consensualmente apontado pela jurisprudência deste Tribunal, a atividade de intermediação financeira desenvolvida pelos bancos é legalmente regida por um conjunto de princípios atinentes aos respectivos exercício e organização, consagrados, em termos gerais, no preceituado nos artigos 73º e ss. do DL 298/92, de 31/12 (RGICSF) e, em especial, nos artigos 7º, 304º, 304º-A, 309º, 309º-A, 312º e 314º do DL 486/99, de 13/11 (CVM), dos quais decorrem que a mesma é norteada por elevados padrões de exigência e pelos princípios, entre outros, da boa-fé (ou da probidade comercial) e do conhecimento e da proteção (e prevalência) dos interesses do cliente, designadamente em relação a qualquer interesse que o intermediário financeiro tenha no serviço a prestar.
No acórdão de 10-04-2018 (p. 753/16.4TBLSB.L1.S1) foi assim...
Para continuar a ler
PEÇA SUA AVALIAÇÃO-
Acórdão nº 7745/17.4T8LSB.L1.S1 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 10 de Novembro de 2022
...de 7 de Fevereiro de 2019, proferido no processo 31/17.1T8PVZ.P1.S1 (ROSA TCHING) e de 26 de Março de 2019, proferido no processo 2259/17.5T8LRA.C1.S1 (ALEXANDRE Ora, essas diferenças não foram explicadas ao Autor. Deveriam ter sido? Entendemos que sim. Por um lado, nada permite acreditar f......
-
Acórdão nº 901/17.7T8VRL.G1 de Tribunal da Relação de Guimarães, 11 de Fevereiro de 2021
...de 7 de Fevereiro de 2019, proferido no processo 31/17.1T8PVZ.P1.S1 (ROSA TCHING) e de 26 de Março de 2019, proferido no processo 2259/17.5T8LRA.C1.S1 (ALEXANDRE Diferenças essas que deveriam ter sido explicadas ao Autor, por nada nos permitir concluir, face ao seu perfil de investidor, que......
-
Acórdão nº 7745/17.4T8LSB.L1.S1 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 10 de Novembro de 2022
...de 7 de Fevereiro de 2019, proferido no processo 31/17.1T8PVZ.P1.S1 (ROSA TCHING) e de 26 de Março de 2019, proferido no processo 2259/17.5T8LRA.C1.S1 (ALEXANDRE Ora, essas diferenças não foram explicadas ao Autor. Deveriam ter sido? Entendemos que sim. Por um lado, nada permite acreditar f......
-
Acórdão nº 901/17.7T8VRL.G1 de Tribunal da Relação de Guimarães, 11 de Fevereiro de 2021
...de 7 de Fevereiro de 2019, proferido no processo 31/17.1T8PVZ.P1.S1 (ROSA TCHING) e de 26 de Março de 2019, proferido no processo 2259/17.5T8LRA.C1.S1 (ALEXANDRE Diferenças essas que deveriam ter sido explicadas ao Autor, por nada nos permitir concluir, face ao seu perfil de investidor, que......