Acórdão nº 95/17.8GCLMG.C1 de Court of Appeal of Coimbra (Portugal), 27 de Março de 2019

Magistrado ResponsávelBELMIRO ANDRADE
Data da Resolução27 de Março de 2019
EmissorCourt of Appeal of Coimbra (Portugal)

Acordam, em conferência, na 4ª Secção, Criminal, do Tribunal da Relação de Coimbra: I - RELATÓRIO Nos autos, após realização da audiência pública de discussão e julgamento perante o Tribunal Singular, com exercício amplo do contraditório, foi proferida sentença com o seguinte DISPOSITIVO: - Decide-se julgar procedente por provada a acusação do Ministério Público e nessa conformidade: 1. Condenar a arguida A pela prática, em autoria material, na forma consumada, em concurso real: a) - de um crime de ofensa à integridade física, p. p. pelo artigo 143º, n.º 1 do Código Penal, na pessoa de …, na pena de 120 dias de multa à taxa diária de €5,50.

  1. - de um crime de ofensa à integridade física, p. p. pelo artigo 143º, nº 1 do Código Penal, na pessoa de …, na pena de 120 dias de multa à taxa diária de €5,50.

  2. - em cumulo jurídico das penas de multa, na pena única de 170 dias de multa à taxa diária de €5,50.

  3. - um crime de ofensa à integridade física qualificada, p. p. pelo artigo 143º, n.º 1 e 145ºn.º 1 al. a) e n.º 2 por referência ao art. 132º n.º 2 al. c) todos do Código Penal, na pessoa de …, na pena de 10 meses de prisão; pena esta que se substitui por 300 dias de multa à taxa diária de €5,50.

    1. Condenar a arguida B pela prática, em autoria material, na forma consumada, em concurso real: a) - de um crime de ofensa à integridade física, p. p. pelo artigo 143º, n.º 1 do Código Penal, na pessoa de …, na pena de 120 dias de multa à taxa diária de €5,50.

    b)- de um crime de ofensa à integridade física, p. p. pelo artigo 143º, n.º 1 do Código Penal, na pessoa de …, na pena de 120 dias de multa à taxa diária de €5,50.

  4. - em cumulo jurídico das penas de multa, na pena única de 170 dias de multa à taxa diária de €5,50.

    1. Condenar a arguida C pela prática, em autoria material, na forma consumada, em concurso real: a) - de um crime de ofensa à integridade física, p. p. pelo artigo 143º, n.º 1 do Código Penal, na pessoa de …, na pena de 120 dias de multa à taxa diária de €5,50.

    b)- de um crime de ameaça agravado p. e p. pelo art. 153º n.º 1 e 155º n.º 1 al. a) ambos do Código Penal, na pessoa de …, na pena de 80 dias de multa à taxa diária de €5,50.

  5. - em cúmulo jurídico das penas de multa, na pena única de 140 dias de multa à taxa diária de €5,50.

    1. Condenar a demandada … a pagar ao demandante … a quantia de €450,00 acrescida de juros, a titulo de danos morais. Improcedendo o pedido quanto às demandadas … e ….

    2. Condenar as demandadas … a pagar à demandante … a quantia de €620,00 acrescida de juros, sendo €550,00 a titulo de danos morais. Improcedendo o pedido quanto à demandada ….

    3. Condenar a demandada … a pagar à demandante … a quantia de €820,00 acrescida de juros, sendo 450,00 euros a titulo de danos morais. Improcedendo o pedido quanto às demandadas … e ….

    4. Condenar as demandadas a pagar ao demandante … a quantia de €590,00 acrescida de juros, sendo 500,00 euros a titulo de danos morais.

      * Inconformadas com a sentença dela recorrem, fazendo-o em conjunto, as arguidas A, B e C.

      Na motivação do recurso formulam as seguintes CONCLUSÕES: 1. O Tribunal a quo decidiu condenar as arguidas nos seguintes termos: (…) 2. As arguidas não podem conformar com tal decisão, pelo que, pelo presente, recorrem da sentença proferida.

    5. Desde logo entende a recorrente, que foi condenada pela prática de um crime de ofensa à integridade física qualificada na pessoa da ofendida …, quando tal não resulta cabalmente justificado nem fundamentado na sentença recorrida.

    6. A Meritíssima Juiz do Tribunal a quo por forma a condenar a recorrente elenca uma série de doutrina a propósito da especial censurabilidade ou perversidade do agente, mas, apenas em geral, sendo que no que concerne ao caso específico apenas refere: “Assim, temos de concluir face aos factos dados como provados que a arguida … cometeu um crime de ofensa à integridade física qualificada, na pessoa de … pois estão verificados todos os elementos constitutivos dos tipos objetivos e subjectivos do crime que é imputado e não se verificam quaisquer circunstâncias que excluam a ilicitude ou a culpa da mesma”.

    7. Não procedeu o Tribunal a quo, como a tanto estava obrigado à justificação e fundamentação da sua decisão em considerar que a conduta da arguida … revestiu de tal censurabilidade que apenas poderia redundar na condenação da mesma pela prática de um crime de ofensa à integridade física qualificada.

    8. Para assentar a sua decisão o Tribunal a quo deu como provados os seguintes factos: 3. A ofendida …, nascida a 15.03.1938, à data com 79 anos de idade, que se encontrava sentada, no banco de trás do veículo, saiu do mesmo, tendo em acto contínuo, a arguida … desferido à ofendida … uma bofetada, na face do lado direito e puxou-lhe os cabelos, fazendo com que os seus óculos caíssem ao chão e partissem. 12. A arguida … actuou de forma voluntária, deliberada e consciente com intenção conseguida de molestar fisicamente, a ofendida …, causando-lhe dores e ferimentos, com as condutas acima descritas, bem sabendo que ofendida é uma pessoa frágil e de idade avançada, com 79 anos, portanto naturalmente desprotegida. 13. Sabia ainda que, pelo facto de ter relativamente a esta superioridade física, aproveitava-se das limitações derivadas da idade avançada desta, para melhor concretizar os seus intentos, o que quis e conseguiu.

    9. O Tribunal a quo teve como preenchida e operante a circunstância qualificadora da alínea c) do nº 2 do artº 132º do CP que estatui: “É suscetível de revelar a especial censurabilidade ou perversidade a que se refere o número anterior, entre outras a circunstância de o agente: Praticar o facto contra pessoa particularmente indefesa, em razão de idade, deficiência, doença …” 8. Pessoa particularmente indefesa neste contexto é aquela que se encontra à mercê do agente, incapaz de esboçar uma defesa minimamente eficaz, em função de qualquer das qualidades previstas na norma, concretamente em situação de desamparo, como fala Figueiredo Dias (Comentário, Tomo I, página 31). E concretamente estará nessa situação a pessoa que, em razão da idade, doença ou deficiência física ou psíquica, não tem capacidade de movimentos, destreza ou discernimento para tomar conta de si e, logo, para verdadeiramente se defender de uma agressão.

    10. Da análise dos factos dados como provados apenas resulta o juízo formulado pelo Tribunal a quo da alegada “fragilidade” em função da idade da ofendida, 79 anos de idade, em contraponto com a idade da arguida, ora recorrente, tendo o tribunal a quo dado como provado: A ofendida …, nascida a 15.03.1938, à data com 79 anos de idade (facto 3), …A arguida … actuou de forma voluntária, deliberada e consciente… bem sabendo que ofendida é uma pessoa frágil e de idade avançada, com 79 anos, portanto naturalmente desprotegida. (facto 12) 10. Para além da idade da vítima nenhum facto foi dado como provado no sentido de atestar a alegada fragilidade, antes pelo contrário da prova produzida resultou que apesar da idade a ofendida … é uma pessoa autónoma, independente e activa, note-se que se deu como provado que a mesma saiu do carro de forma autónoma e rápida para interpelar a arguida, atente-se ao facto 3: “A ofendida …, nascida a 15.03.1938, à data com 79 anos de idade, que se encontrava sentada, no banco de trás do veículo, saiu do mesmo” e até se provou que mesmo após os acontecimento a ofendida deslocou-se, por si mesma, à Óptica e à GNR, - Vide pontos 23. e 24. dos factos provados, sem precisar de auxílio .

    11. Em concreto, nenhum facto foi dado como provado e que ateste qualquer fragilidade da ofendida …, pelo contrário, provou-se que a mesma, apesar da idade, não tinha qualquer problema de saúde ou limitação, tanto mais que, de acordo com os factos, dados como provados e ainda a sua filha estava sentada no carro, já a ofendida tinha saído e interpelado a arguida.

    12. A idade da ofendida …, por si só, não pode, sem mais, ser vista como geradora de incapacidade da vítima, para retirar-lhe a autonomia. E a “fragilidade”, sendo um mero conceito, teria de ser integrado por factos, não se bastando a conclusão tirada pelo tribunal a quo, no facto 12. “A ofendida é uma pessoa frágil e de idade avançada, com 79 anos, portanto naturalmente desprotegida”.

    13. Mal andou o Tribunal a quo, ao considerar que o exemplo-padrão em discussão se preenche com a simples superioridade em razão da idade, que não vai além de uma agravante de carácter geral, ou seja, fez uma aplicação automática em função da idade da ofendida. A especial maior culpa subjacente a esta circunstância qualificativa exige uma atitude, bem mais distanciada dos valores, o que salvo melhor opinião não foi feito pelo Tribunal a quo.

    14. Não se preenchendo a circunstância da alínea c) do nº 2 do artº 132º do CP, nem outra ali prevista ou que apresente análoga estrutura valorativa, tem de concluir-se que os factos provados integram somente o crime de ofensa à integridade física simples p. e p. pelo art.º 143º do Código Penal.

    15. O Tribunal recorrido ao ter considerado que a arguida … praticou um crime de ofensa à integridade física qualificada, na pessoa da ofendida …, ao invés de um crime de ofensa à integridade física simples, incorreu em erro na aplicação do artigo 132°, nº 2, alínea c) do C.P, por remissão do artº 145º nº 2 do Código Penal, o que deve ser apreciado revisto e reformulado por Vªs Exªs, reformulando-se nessa sequência a medida da pena aplicada à recorrente à luz do tipo de ofensa à integridade física simples ao invés de ofensa à integridade física qualificada.

    16. Entende ainda a recorrente … que, mal andou o Tribunal a quo, na parte em que a condenou em autoria material, na forma consumada, em concurso real de um crime de ameaça agravado p. e p. pelo art. 153º n.º 1 e 155º n.º 1 al. a) ambos do Código Penal, na pessoa de …, na pena de 80 dias de multa à taxa diária de €5,50, na medida em que esta condenação está errada existindo erro na aplicação do direito aos factos uma vez que...

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