Acórdão nº 871/08.2PRPRT.P1 de Court of Appeal of Porto (Portugal), 01 de Março de 2010

Magistrado ResponsávelVASCO FREITAS
Data da Resolução01 de Março de 2010
EmissorCourt of Appeal of Porto (Portugal)

S Privacidade: 1 Meio Processual: REC PENAL.

Decisão: NEGADO PROVIMENTO.

Indicações Eventuais: 1ª SECÇÃO - LIVRO 620 - FLS 01.

Área Temática: .

Sumário: Deduzida acusação contra o arguido pela detenção de 12 embalagens com heroína, com o peso liquido de 1,71g, que destinava ao seu consumo, sem que, do exame efectuado pelo LPC constem os componentes do produto nem a percentagem do princípio activo, vedado fica ao Tribunal conhecer o grau de pureza da substância estupefaciente identificada no produto como, daí, vedado lhe fica o recurso aos valores indicativos constantes do Mapa Anexo à Portaria 94/96.

Reclamações: Decisão Texto Integral: Recurso Penal nº 871/08.PRPRT.P1 Acordam, em conferência, na 1ª Secção Criminal do Tribunal da Relação do Porto: I- RELATÓRIO No .º Juízo Criminal do Porto, nos autos de processo comum, sobre a acusação deduzida pelo digno MºPº contra o arguido B………., foi proferido pelo Mº Juiz o seguinte despacho: “Registe e Autue como processo comum O tribunal é competente.

Questão previa.

Nos presentes autos vem o(a) arguido(a) B………., vem acusado da autoria material de um crime p. e p. pelo n°2, do art. 40, da Lei 15/93 de 22 de Janeiro.

Fez-se constar da acusação que: "No dia 14 de Agosto de 2008, e no circunstancialismo descrito de fls. 58 e 59 que aqui se supõem integradas e reproduzidas, foi apreendido ao arguido diversas embalagens de produto que o mesmo transportava consigo quando se fazia transportar num táxi.

Tais produtos, em sede de exame laboratorial revelou ser Heroína e Cocaína - substâncias incluídas na Tabela I-A e 1-8 do D. L. 15193, de 22 de Janeiro - como peso líquido global respectivamente de 1, 171g, e 0,219 gramas.

Quantidades que alega ser superior à necessária para o consumo médio individual, durante 10 dias.

O arguido agiu livre e conscientemente, sabendo que a detenção e consumo daquela quantidade de estupefaciente — heroína - era superior à necessária para um consumo médio durante 10 dias, cujas características conhecia, não era permitida por lei.

Desta forma ficou incurso, como o autor material e na forma consumada, na prática de um crime de consumo de estupefacientes, da previsão dos artigos 14°, n° 1, e 26° do Código Penal, e artigo 40°, n° 2, do D. L. 15193, de 22 de Janeiro.” Como resulta do disposto no artigo 311°., n.° 1, do CPP, "recebidos os autos no tribunal, o presidente pronuncia-se sobre as nulidades e outras questões prévias ou incidentais que obstem à apreciação do mérito da causa, de que possa desde logo conhecer"; e se "o processo tiver sido remetido para julgamento sem ter havido instrução, o presidente despacha nomeadamente no sentido- a) de rejeitara acusação, se a considerar manifestamente infundada" ( n.º 2), entendendo-se como tal a acusação cujos factos descritos não constituam crime (n.º 3, al. d)).

Vejamos.

A conduta do arguido como se encontra descrita, integra em nosso entender a previsão da Lei n° 30/2000, de 29111, em vigor desde 01/07/01. Dispõe o artigo 2°, n° 1 deste citado diploma que "O consumo, a aquisição e a detenção para consumo próprio de plantas, substâncias ou preparações compreendidas nas tabelas referidas no artigo anterior (as tabelas 1 a IV do Dec-Lei n° 15/93, de 22/1) constituem contra-ordenação". Mas, pelo n° 2 do mesmo art. 2, "para efeitos da presente lei, a aquisição e a detenção para consumo próprio das substâncias referidas no número anterior não poderão exceder a quantidade necessária para o consumo médio individual durante o período de 10 dias".

E assim entendemos, uma vez que não podemos recorrer ao mapa anexo à portada 94/96 de 26/03.

Explicitando, como ponto de partida, e dilucidar o que se entende por "quantidade necessária para o consumo médio individual durante o período de 10 dias" (cf. n° 2 do art. 2 da Lei n° 30/2000, norma que pune o consumo como contra-ordenação), coloca a questão de saber se o tribunal pode socorrer-se dos valores indicativos constantes do mapa anexo à Portada n° 94/96, visto que a mesma, como consta do respectivo preâmbulo, apenas se reporta aos arts. 26 n° 3 e 40 n° 2 do DL n° 15/93 de 2211.

Recorde-se que, os factos aqui em apreciação (relativos à detenção pelo arguido de heroína, cocaína para consumo próprio) terão tido eventualmente lugar em 14.08.08, em plena vigência da Lei n° 30/2000 Como dizíamos, tem-se discutido se as considerações feitas no citado Ac. do TC n° 534/98, relativas ao recurso aos valores indicativos da "dose média individual diária" constantes do mapa anexo à Portaria n° 94/96 para integrar o conceito de "consumo médio individual" durante determinados dias (usados nos arts. 26° n° 3 e 40° n° 2 - este último no que respeita ao cultivo - ambos do DL n° 15/93) poderão também aqui ser aplicadas, tendo em vista o disposto no art. 2 n° 2 da Lei n° 30/2000.

Como valores indicativos, propenderíamos para os aceitar, sob pena de se poder considerado violado o princípio da legalidade, consagrado no n° 1, do art. 29, da CRP, também aplicável ao direito de mera ordenação social (art. 3°, do Regime do ilícito de mera ordenação social: cf. DL n° 433/82 de 27/10 e respectivas alterações). Assim sendo, os ditos valores indicativos (estatísticos) contidos no mapa anexo à Portaria n° 94/96, não são de aplicação automática.

Mas a isto acresce outro problema, que é o do art. 10, n° 1 da Portaria n° 94/96, bem como mapa anexo, se referir também à percentagem do princípio activo e, na sua maior parte (como sucede no caso destes autos), os exames aos produtos apreendidos, efectuados pelo LPC, não o quantificam (isto é, não indicam a percentagem do princípio activo), antes indicando o peso liquido do produto que contém o estupefaciente examinado, sem identificarem os respectivos componentes (o que leva a desconhecer-se o grau de pureza da substância estupefaciente identificada no produto examinado). Ora, como é sabido os produtos apreendidos têm produtos de corte, não são puros, pelo que, nesses casos não é observado o disposto no art. 10 n° 1 da dita Portaria n° 94/96.

De facto, os valores constantes da portaria continuam sem aplicação, porque os exames do LPC limitam-se a identificar o peso líquido mas sem o depurarem pelo que não há quantificação do princípio activo. E não poderemos deixar de assinalar que uma coisa, é o teor estupefaciente da substância composta analisada, outra, o peso global desse composto. A pesagem do produto apreendido não interessa para nada, excepto se estiver no estado puro.

Conforme resulta do teor do exame pericial, levado a cabo pelo Laboratório de Polícia Científica e junto aos autos, não foi determinada qual a percentagem do princípio activo contido na substância apreendida, o que inviabiliza, sem mais, o recurso exclusivo à tabela constante da citada Portaria.

Assim, a jurisprudência estabeleceu e definiu quantidades médias para consumo individual durante um dia, conforme, entre outros o fez no Ac. do STJ de 15/57 1996, proc. n° 48306 da 3 secção, fixando tal quantidade em 1,5 gramas para a cocaína e heroína e em 2 gramas para o haxixe, (cfr. entre outros, os Ac. do STJ de 10/7/1991, in BMJ 409, 392, Ac do STJ de 5/2/1991, in BMJ 404, 151, Ac, da RL de 9/1/1990, in BMJ, 393, 648, Ac STJ de 30/1/1990, in BMJ, 393, 319) [1] Critério este que é...

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