Acórdão nº 0837201 de Court of Appeal of Porto (Portugal), 01 de Março de 2010

Data01 Março 2010
ÓrgãoCourt of Appeal of Porto (Portugal)

S Privacidade: 1 Meio Processual: APELAÇÃO.

Decisão: REVOGADA.

Indicações Eventuais: LIVRO 823 - FLS. 24.

Área Temática: .

Sumário: I – Por ora, a união de facto apenas tem alguns efeitos jurídicos expressamente previstos na lei, situando-se estes no âmbito da assistência social, do direito a alimentos após o falecimento do companheiro/a e na garantia de habitação (Cfr. arts. , e , todos da Lei nº 7/2001, de 11.05).

II – No que respeita aos efeitos patrimoniais relativamente às pessoas que vivem em união de facto, não existe um “regime de bens”, não tendo, aqui, aplicação as regras que disciplinam os efeitos patrimoniais do casamento independentemente do regime de bens (Cfr. arts. 1678º e 1679º, ambos do CC), nomeadamente, a administração dos bens dos cônjuges, as dívidas dos cônjuges e bens que respondem por elas, bem como a partilha dos bens do casal.

III – Nos casos de cessação da união de facto, pode encarar-se a ideia de se seguir o processo de liquidação judicial de património da sociedade de facto, se se verificarem os respectivos pressupostos, entre os quais se inclui a declaração judicial de dissolução prevista no art. 8º, nº/s 1, al. b) e 2 daquela Lei nº 7/2001.

IV – Não se verificando, ou não se tendo seguido essa tramitação específica, há que atender às regras do enriquecimento sem causa, previsto nos arts. 473º e segs. do CC.

Reclamações: Decisão Texto Integral: Processo nº 7201/08 – Apelação Tribunal Recorrido: Tribunal Judicial de Miranda do Douro [Processo nº …../04.8TBMDR] *** Acordam no Tribunal da Relação do Porto I – RELATÓRIO B…………..

, divorciado, residente na Rua ……, freguesia de ……, Vimioso instaurou acção declarativa de condenação com processo comum sob a forma ordinária contra C……………, divorciada residente na Rua ………, nº …., freguesia de …….., Miranda do Douro, alegando, em síntese, que viveu maritalmente com a ré em união de facto de Abril de 1996 até Abril de 2004, havendo da parte de ambos o propósito de contrair matrimónio; no decurso dessa união o autor suportava a generalidade das despesas da casa e a ré assegurava as tarefas domésticas; foi o autor que coordenou a construção de um pavilhão e de um assador anexos à casa da ré e de uns muros pagando os materiais e mão-de-obra, despendendo €4.500,00, €374,10 e €500,00; ainda, o autor depositou-lhe €5.000,00 numa conta da ré para a compra de um tractor; finalmente tinham conta conjunta com o saldo de €26.000,00 à data da cessação da vida em comum.

A - Pede que se declare que: 1º - As deslocações operadas da esfera patrimonial do autor para a esfera patrimonial da ré, referidas nos artºs 21º a 34º da petição inicial, cujo resultado, desprezadas as operações bancárias intermédias - consistiu em: 1.1 Depósito a favor da ré de 1.000.000$00 na conta …../…./800 da D…………, de que a beneficiária era titular; 1.2 Depósito a prazo de €26.000,00 efectuado no Banco E…………. (conta.......1) em nome do autor e da ré; 1.3 Constituição da conta à ordem …….1600/300 da D………. em nome do autor e da ré e depósito nessa conta de quantias que pertenciam apenas ao autor e dos juros resultantes do referido depósito a prazo; 1.4 Dispêndio das importâncias de €5.000,00, €4.500,00, €374,10 e €500,00 feito pelo autor em obras efectuadas na casa da ré; foram efectuadas no âmbito e por causa da união de facto que o autor e a ré mantiveram um com o outro desde Abril de 1996 a Abril de 2004.

  1. - O autor aceitou efectuar essas deslocações patrimoniais em vista do casamento que autor e ré manifestavam intenção de contrair um com o outro; 3º - Tendo-se extinguido essa união de facto, houve um enriquecimento ilegítimo da ré à custa do autor, na medida dessas deslocações patrimoniais; 4º - Esse enriquecimento determina a obrigação de a ré restituir ao autor as importâncias referidas em 1.1. e 1.4. do pedido e o direito do autor de levantar a totalidade dos depósitos bancários referidos em 1.2. e 1.3., e não apenas a metade; 5º - O depósito de € 26 000,00 referido em 1.2. fica a pertencer apenas ao autor; 6º - O total resultante do saldo actual da conta bancária referida em 1.3. e dos juros provenientes da conta a prazo identificada em 1.2 que aí forem depositados no futuro fica a pertencer apenas ao autor.

B - Pede também que a ré seja condenada a reconhecer: 1º - O que se peticionou em A; 2º - A pagar ao autor as importâncias referidas em 1.1. e 1.4., num total de quinze mil, trezentos e sessenta e dois euros e oito cêntimos (15 362,08 = 4 987,98 + 5.000,00 + 4.500,00 + 374,10 + 500,00), bem como os respectivos juros, contados à taxa legal desde a citação até o pagamento efectivo; 3º - E a abrir mão da titularidade nas contas bancárias identificadas em 1.2. e 1.3.

C - Pede ainda: Que se ordene à D………… a entrega ao autor, quando solicitada, dos montantes atrás referidos, relativos às contas bancárias mencionadas.

***Na sua contestação a ré impugna os factos da petição inicial e alega, em síntese, que recebia mensalmente €662,34, correspondentes à pensão de velhice dos pais que com eles residiam, bem como à pensão de alimentos suportada pelo pai dos seus filhos; comprometeu-se o autor a contribuir para as despesas domésticas com 75.000$00 mensais o que nunca fez; razão porque o pôs na rua em Dezembro de 1999; era ela que pagava as despesas, cuidava das lides domésticas, da vinha, da horta e de 4 vacas leiteiras, que lhe proporcionavam 3 vitelos, destinando um a abate para consumo da casa; na venda dos vitelos, com a criação de animais de capoeira angariava €6.562,00 por ano; da sua parte nunca houve o propósito de casar com o autor; em Abril de 2000 quando aceitou o autor em sua casa de novo e depois volvidos 4 meses de ausência foi com a condição de pagar os referidos 75.000$00 mensais; os atrasados e garantir o pagamento das mensalidades futuras: assim se explicando os depósitos bancários que alega. Pede assim, em reconvenção, 22 mensalidades, no montante de €8.250.00. Conclui pela improcedência da acção e procedência da reconvenção.

***Na réplica o autor impugna a matéria da reconvenção e conclui como na petição inicial.

Também na tréplica a ré mantém o expendido e alegado na sua contestação/ reconvenção.

***A final foi proferida sentença com a seguinte decisão: “a) Julgar a acção e a reconvenção parcialmente procedentes por parcialmente provadas e, em consequência decide-se: b) Condenar o A. a pagar à ré em sede de pedido reconvencional o montante de €12.625,00.

  1. Condenar a ré a pagar ao A. a quantia de € 536,83.

    Relativamente ao dinheiro: - O depósito a favor da ré de 1.000.000$00 na conta ………860/800 da D………...

    - Depósito a prazo de €26.000,00 efectuado no Banco E………… conta 504581 em nome do A e da ré.

    - Constituição de conta à ordem ……/…../300 da D……….. em nome do A e da ré e depósito nessa conta de quantias de depósitos à ordem ou outros.

    Mais se decide que: d) As quantias em dinheiro depositadas nas referidas contas apenas poderão ser levantadas ou resgatadas pelo A. depois de comprovar nos autos o pagamento à ré dos referidos €12.625,00 mais os juros.

  2. O A. pagará juros à taxa legal desta importância desde a notificação da reconvenção.

  3. A ré pagará juros desde citação: - Da importância de € 536,83.

    - Da importância dos 1000.000$00 se for caso disso, ou seja se for ela a proceder ao levantamento dessa importância.

    ***Custas por ambas as partes de acordo com o decaimento”.

    ***Inconformado, o autor interpôs recurso de apelação pedindo que a acção seja julgada procedente na sua quase totalidade e que seja julgada improcedente a reconvenção.

    O apelante/autor formula as seguintes conclusões: …………..

    …………..

    …………..

    …………..

    ***Na resposta, a apelada/ré pugna pela improcedência da apelação do autor.

    ***Igualmente inconformada, a ré interpôs também recurso de apelação, pedindo que seja revogada a sentença em crise e substituída por acórdão que julgue a acção totalmente improcedente e absolva a ora recorrente do pedido e, julgue o pedido reconvencional totalmente procedente e condene o ora recorrido a pagar à ora recorrente a quantia de €8.250,00 (oito mil duzentos e cinquenta euros), acrescida de juros legais.

    São as seguintes as conclusões da apelante/ré: …………… …………… …………… ……………***Não houve resposta do apelado/autor.

    Colhidos os vistos legais, cumpre decidir.

    ***II – FUNDAMENTAÇÃO É pelas conclusões do recurso que se delimita o respectivo âmbito de cognição, nos termos do disposto nos artigos 690.º e 684.º n.º 3, ambos do Código de Processo Civil, salvo questões do conhecimento oficioso (artigo 660.º n.º 2 do Código de Processo Civil).

    Assim, as questões a decidir são as seguintes: Nulidade da sentença por violação do disposto no artº 668º nº 1 al. e) do Código de Processo Civil - (apelação da ré).

    Erro na apreciação da matéria de facto (apelação do autor e apelação da ré).

    Apreciação de mérito: há ou não o dever de restituição, por parte de autor e/ou ré, e qual o enquadramento jurídico desse eventual dever (apelação do autor e apelação da ré).

    ***III – FUNDAMENTAÇÃO DE FACTO Na sentença recorrida foram dados como provados os seguintes factos: 2- Autor e Ré viveram maritalmente um com o outro, em união de facto (A).

    3- O Autor tinha vivido na Alemanha, onde era trabalhador emigrante, até 11.03.96, data em que regressou a Portugal definitivamente (B).

    4- Autor e Ré residiam na povoação de ………., numa casa pertencente à Ré (C).

    5- Quando se iniciou a união de facto entre o Autor e a Ré viviam também na mesma casa os dois filhos desta (um rapaz, com cerca de 12 anos, e uma menina, com cerca de 10 anos) e os seus pais (D).

    6- A filha F………… foi viver com o pai, ex-marido da Ré, cerca de um ano após o início da união de facto em causa (E).

    7- A partir da saída dos pais da Ré ficaram a viver na casa desta o Autor, a Ré e o seu filho varão (G…………), até à extinção da união de facto (F).

    8- A ré assegurava a generalidade das tarefas domésticas, cozinhava, lavava a roupa, passava a ferro, lavava a loiça, limpava a casa (G).

    9- Autor e a Ré apresentaram...

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