Acórdão nº 214/03.1LDBRG de Tribunal da Relação de Guimarães, 01 de Março de 2010

Magistrado ResponsávelCRUZ BUCHO
Data da Resolução01 de Março de 2010
EmissorTribunal da Relação de Guimarães

S Privacidade: 1 Meio Processual: RECURSO PENAL Decisão: NEGADO PROVIMENTO Sumário: I - A responsabilidade civil emergente da prática de um crime de abuso de confiança fiscal é regulada pela lei civil, para a qual remete quer o artigo 129º do Código Penal quer o artigo 3º do RGIT.

No caso de o arguido ter sido gerente de uma sociedade entretanto declarada falida, a sua responsabilidade não é meramente subsidiária, nem há que aplicar o instituto da reversão, por o regime de responsabilidade previsto na Lei Geral Tributária ser específico do direito tributário e referir-se às dívidas das prestações tributárias em que o devedor directo é o ente colectivo.

II - A circunstância de ter sido instaurado um processo de execução fiscal para cobrança das prestações em falta e respectivos juros de mora não impede que se demande o arguido no enxerto cível deduzido em processo penal.

III - Para efeitos do pedido cível, não obstante a descriminalização do crime de abuso de confiança fiscal no que concerne às prestações de valor inferior a €7500, aplica-se a lei vigente à data dos factos (artigo 12º, n.º1 do Código Civil).

Assim, não obstante a descriminalização operada, se os factos provados integram todos os pressupostos geradores de responsabilidade civil impõe-se a condenação no enxerto cível.

Decisão Texto Integral: Acordam, em conferência, no Tribunal da Relação de Guimarães: *I- Relatório No 3º Juízo Criminal de Guimarães, no âmbito do processo comum singular nº 214/03.1IDBRG, por sentença de 12 de Junho de 2009, o arguido Nuno R..., com os demais sinais dos autos, foi condenado pela prática de um crime de abuso de confiança fiscal, p. e p. pelo artigo 105, nºs 1, 2 e 4 do RGIT, na pena de 90 (noventa) dias de multa à taxa diária de € 9 (nove euros).

Na procedência parcial do pedido de indemnização civil deduzido pelo Estado, o arguido foi, ainda, condenado a pagar-lhe “a quantia de € 23 637,40 (vinte e três mil, seiscentos e trinta e sete euros e quarenta cêntimos), acrescida de juros de mora à taxa legal, nomeadamente a decorrente do artº 3º/1 do DL nº 73/99 de 16/03, desde a data do vencimento de cada uma das respectivas prestações tributárias e sobre os respectivos montantes até integral pagamento.” *Inconformado com esta decisão, o arguido dela interpôs recurso, rematando a sua motivação com as seguintes conclusões que se transcrevem: 1.º Vem o presente recurso interposto da sentença de fls. _ e sgs que condenou o arguido, como autor material, pelo crime de abuso de confiança fiscal, previsto e punível pelo art.° 24.°, 1, do RJFINA, aprovado pela Lei n..º 20-N90, de 15 de Janeiro, a uma pena de multa de 90 (noventa) dias de multa a uma taxa diária de € 9,00 (nove) Euros, num total de € 810,00 (oitocentos e dez euros) e a pagar ao Estado, a título de indemnização, a quantia de € 23.637,40 (vinte de três mil seiscentos e trinta e sete euros e quarenta cêntimos).

  1. Ficou demonstrado que: - Algumas das referidas quantias foram cobradas e recebidas efectivamente de clientes da sociedade, concretamente da empresa M..., Lda., no âmbito de vendas efectuadas, e retidas por conta de IVA e as restantes quantias respeitam à aquisição de matérias-primas efectuadas pela sociedade G... Calçado, Lda. á sociedade Calçado F..., Lda., para abatimento de um crédito da primeira sociedade sobre a segunda - Na verdade, a sociedade G... Calçado, Lda., era, à data, um dos principais credores da sociedade Calçado F..., Lda., - para abatimento da referido crédito, foi acordado entre ambas as sociedades que a sociedade G... Calçado, Lda., adquiriria à sociedade Calçado F..., Lda., algumas matérias-primas, nomeadamente, couro e peles de vacas.

    - a sociedade apresentava "naquele período de tempo dificuldades financeiras, que viriam a culminar na sua declaração de falência".

  2. Para o preenchimento do tipo exigia-se que a não entrega da prestação deduzida fosse acompanhada de apropriação. O agente teria de fazer sua a prestação deduzida, de a fazer confundir e integrar no seu património à imagem do que está previsto no artigo 205º do CP, isto é, de operar uma inversão do título da posse ou detenção.

  3. No que respeita às vendas efectuadas à sociedade G... - e, conforme decorre dos documentos juntos aos autos, respeitantes a Março, Abril, Maio e Junho de 2001 - não houve qualquer entrega de dinheiro à F... para pagamento das facturas em causa.

  4. Não ocorreu qualquer apropriação de «prestação tributária (...) que tendo sido recebida, haja obrigação legal de a liquidar» (art.° 24.°, 1 e 2 do RJIFNA).

  5. É que o valor não foi recebido, mas apenas houve «abatimento de um crédito».

  6. A infracção só acontece «se o infractor inverter o título de posse e fizer sua a prestação tributária retida ou recebida, incorporando-a no seu património» (NUNO SÁ GOMES, Evasão...

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