Acórdão nº 276/03.1GBOBR.C1 de Court of Appeal of Coimbra (Portugal), 01 de Março de 2010

Magistrado ResponsávelBRÍZIDA MARTINS
Data da Resolução01 de Março de 2010
EmissorCourt of Appeal of Coimbra (Portugal)

S Meio Processual: RECURSO PENAL Decisão: CONFIRMADA Legislação Nacional: ATIGO 129º DO CP, 494ºE 496º,563 Sumário: 1. Danos não patrimoniais são os que afectam bens não patrimoniais (bens da personalidade), insusceptíveis de avaliação pecuniária ou medida monetária, porque atingem bens, como a vida, a saúde, a integridade física, a perfeição física, a liberdade, a honra, o bom nome, a reputação, a beleza, de que resultam o inerente sofrimento físico e psíquico, o desgosto pela perda, a angústia por ter de viver com uma deformidade ou deficiência, os vexames, a perda de prestígio ou reputação, tudo constituindo prejuízos que não se integram no património do lesado, apenas podendo ser compensados com a obrigação pecuniária imposta ao agente, sendo mais uma satisfação do que uma indemnização, assumindo o seu ressarcimento uma função essencialmente compensatória, embora sob a envolvência de uma certa vertente sancionatória ou de pena privada.

  1. Assim, atentando-se igualmente nos arestos citados pela decisão recorrida, que comportam situações de vida e sequelas próximas á presente, tendemos a considerar o valor aí arbitrado como aquele que deve subsistir enquanto correspectivo tendente a indemnizar os danos em causa.

  2. No que diz respeito o quantitativo arbitrado para ressarcimento dos danos futuros sobrevindos ao lesado deve dizer-se que a capitalização dessa indemnização em dinheiro correspondente ao dano futuro previsível deve abranger tão só a vida activa da vítima, pois é durante a vida activa que a vítima perde a força do seu trabalho, agora diminuída: é a força de trabalho que se perde no caso da incapacidade permanente para o trabalho, sendo esse valor que se substitui pelo equivalente em dinheiro.

  3. Actualmente, na sociedade discute-se o alargamento da idade da reforma, tendencialmente até aos 70 anos; em face disso, caso a caso, deve a indemnização capitalizar-se até essa idade, o que a lei nos permite, fazendo uso do princípio da equidade (artigo 566.º, n.º 3, do Código Civil) que serve precisamente para fazer a justiça do caso concreto, porque previsivelmente a idade da reforma vai sofrer um alongamento.

    Decisão Texto Integral: 23 I – Relatório.

    1.1. Nos presentes autos, o Ministério Público deduziu acusação contra FX já neles melhor identificado, imputando-lhe, nomeadamente, a prática de um crime de ofensa à integridade física negligente, agravada pelo resultado, previsto e punido pelo artigo 148.º, n.ºs 1 e 3 do Código Penal.

    LA, também já mais identificado, vítima deste ilícito, foi oportunamente admitido a intervir nos autos, na qualidade de assistente, e, simultâneamente, deduziu pedido de indemnização contra o dito arguido e sua seguradora, B…. S.A.

    , pretendendo ver-se assim ressarcido pelos danos patrimoniais e não patrimoniais sobrevindos em virtude da assacada conduta delitiva, computando-os em € 511.620,46 [= € 16.875,00 de perda de salários - € 5.969,43 já recebidos + € 330.750,00 de perda de capacidade de ganho + € 1.672,16 de perdas materiais + € 125.000,00 de danos não patrimoniais + actualizações devidas à inf1ação], acrescidos de juros vincendos desde a notificação.

    X… S.A.

    , deduziu pedido de reembolso contra a B… S.A., a título de sub-rogação, pelos € 38,432,21 [= a € 21.366,31 como pensão anual convertida em capital + € 5.969, 43 de indemnizações salariais por incapacidades temporárias durante todo o período em que o assistente esteve de baixa + € 7.496,52 com despesas médicas, medicamentosas e hospitalares, incluindo cirúrgicas + € 2.010,45 com despesas de transportes + € 1.589, 50 com despesas judiciais obrigatórias e outras que pagou a título de indemnização pelo acidente dos autos que também teria sido um acidente de trabalho].

    Na subsequente e normal tramitação processual, aberta a audiência de julgamento, as duas seguradoras lograram pôr termo ao litígio, por meio de transacção obtida e logo homologada por sentença, entretanto transitada em julgado, em cujos termos essenciais, a demandada B. S.A., aceitou pagar à demandante X… S.A., a indicada quantia de € 38,432,21, no prazo de 30 dias, e esta lhe deu quitação por tal montante, logo que efectivamente recebido (fls. 1.346).

    Findo o contraditório, por Acórdão prolatado, foi decidido, apenas ao que ora releva e no atinente ao pedido cível em causa: - Atenta a respectiva ilegitimidade, absolver da instância o arguido e demandado FX.

    - Julgá-lo parcialmente procedente contra a demandada B…. S.A. que, por consequência, se viu condenada a pagar ao demandante L.: - € 125.000,00, por danos não patrimoniais sofridos, acrescendo a tal quantia os juros de mora, vincendos a partir da sentença, à taxa legal anual de 4%, até integral pagamento.

    - € 198.448,75, por danos patrimoniais sobrevindos, acrescendo a este montante os juros de mora vencidos desde 5 de Fevereiro de 2007, bem como os vincendos, à mesma taxa legal anual, até integral pagamento.

    - Mais o valor que se apurar em liquidação de execução dessa sentença, respeitante ao valor da camisa, das calças, dos ténis e dos óculos (referidos em 57 e 58 dos factos provados), até ao máximo de € 280,00, valor actualizado de 15 de Maio de 2003 até 5 de Fevereiro de 2007, de acordo com a taxa de inflação durante esse período, e com juros vencidos desde a última data e vincendos até integral pagamento, à taxa legal anual de 4%.

    1.2. Desavinda tão-somente com o segmento da decisão que arbitrou os danos respeitantes à perda da capacidade aquisitiva do lesado, bem como os danos não patrimoniais também sofridos pelo mesmo, a seguradora B… S.A., interpôs recurso, extraindo da motivação apresentada as seguintes conclusões: 1.2.1. Na determinação do valor da indemnização pela perda da capacidade aquisitiva ou de ganho, a utilização de coeficientes constantes de tabelas financeiras ou o recurso a fórmulas complementares deverão sempre assumir um mero carácter auxiliar, e não deverão nunca sobrepor-se a uma ponderação judicial com base na equidade (artigo 566.º, n.º 3 do Código Civil), sob pena da determinação da indemnização por tal dano se reduzir a uma mera questão técnico-contabilística, que dispensaria a intervenção dos Tribunais.

    1.2.2. Conforme vem sendo entendido de forma pacífica quer pela Doutrina quer pela Jurisprudência, em síntese, a respectiva indemnização deve equivaler a um capital capaz de gerar o rendimento que, no caso de IPP, “compense” a diferença entre a situação anterior ao acidente e a que dele emerge em termos de incapacidade, capital esse que se deverá extinguir no final do período de vida activa expectável para o lesado, devendo merecer ponderação o facto da indemnização ser paga ao lesado antecipadamente e de uma só vez, sob a forma de um único capital, o que, além do mais, lhe permite retirar o benefício e a vantagem da sua rendibilidade em termos financeiros. Assim, justificar-se-á que se opere uma dedução de 1/3 relativamente ao capital apurado, evitando-se um qualquer enriquecimento ilegítimo do lesado.

    1.2.3. No cálculo a efectuar deverá ter-se em conta a idade correspondente ao limite de vida activa do lesado – e não a esperança média de vida, relevante apenas para consideração do dano não patrimonial – considerando-se assim os anos, idade a partir da qual o lesado atingirá o direito à reforma, ficando dispensado de trabalhar, passando então a auferir a respectiva pensão evitando-se assim também aqui uma duplicação entre o valor da indemnização e o valor de reforma, que redundaria num enriquecimento ilegítimo do ofendido.

    1.2.4. No caso concreto do recorrido, atendendo à sua idade à data do final do período de baixa – pois que é integralmente ressarcido de todas as perdas salariais até tal data – teremos de considerar um período expectável de 35 anos de vida activa; o seu salário anual, no valor de € 8.872,50 e, a IPP de 40 % de que ficou a padecer, a qual, embora impeditiva do exercício da actividade profissional habitual, já o não é do exercício de outras profissões da área da sua preparação técnico profissional.

    1.2.5. Assim, tudo conjugado e com recurso à equidade, impunha-se fixar o valor da indemnização decorrente da perda da capacidade aquisitiva ou de ganho do demandante em quantia não superior a € 100.000,00.

    1.2.6. Quantia esta abatida, tal como se fez no Acórdão impugnado, do montante entretanto já recebido pelo recorrido da X.., S.A., a título de capital de remição – € 21.366,31 – e resultante da conversão da pensão anual que lhe fora conferida em sede laboral (acidente simultâneamente de viação e de trabalho).

    1.2.7. E, logo, significaria que o valor final devido a tal título, fosse de € 80.000,00.

    1.2.8. No que concerne ao valor da indemnização a atribuir ao recorrido a título de danos não patrimoniais, além dos factos dados como provados, a propósito [designadamente, o facto ter 29 anos à data do acidente; ter ficado afectado de uma IPP de 40%, impeditiva do exercício da actividade profissional habitual mas não de...

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