Acórdão nº 73/08.8GDSCD.C1 de Court of Appeal of Coimbra (Portugal), 01 de Março de 2010

Magistrado ResponsávelRIBEIRO MARTINS
Data da Resolução01 de Março de 2010
EmissorCourt of Appeal of Coimbra (Portugal)

S Meio Processual: RECURSO PENAL Decisão: RECURSO IMPROCEDENTE Legislação Nacional: ARTIGOS ,22º,23º,131º, 132º 40º,71º E 72º DO CP ,127º. 410º, 412º,428 DO CPP Sumário: 1.A apreciação da prova faz-se segundo as regras da experiência e a livre convicção, a significar que a prova deve ser analisada através da formulação de juízos assentes no bom senso e na experiência de vida temperados pela capacidade crítica, o distanciamento e a ponderação adquiridos pela experiência.

2 Do exame da motivação constante do acórdão verifica-se que o tribunal elegeu fundamentalmente as declarações do ofendido C. conjugadas pontualmente com as dos arguidos e de algumas passagens das declarações que estes prestaram no 1º interrogatório judicial em detrimento do acolhimento integral da versão que estes deram na audiência de julgamento.

  1. As versões dadas pelos arguidos no primeiro interrogatório judicial também são atendíveis como meio de prova para a decisão final já que os arguidos foram confrontados em julgamento com as suas divergências [art.º 356//3 alínea b)], tendo o tribunal optado por aquilo que delas lhe pareceu mais credível.

  2. O julgador não está obrigado a aceitar ou a rejeitar acriticamente e em bloco as declarações prestadas, podendo delas respigar aquilo que lhe pareça credível, desde que justifique a sua opção.

  3. Analisadas as provas, ouvindo a gravação que nos foi presente, nada resulta que nos imponha diverso juízo sobre o acontecido. A prova na base da qual o tribunal formou a sua convicção relativamente aos factos nucleares objecto do processo justifica a decisão assumida.

    5, O agente age com frieza de ânimo quando selecciona os meios a utilizar, reflecte na opção pelo meio mais adequado repudiando o que menos probabilidades de êxito lhe oferecer dum ponto de vista pragmático por ter em mente o que menos possibilidade de defesa represente para a vítima. A frieza de ânimo resulta duma vontade formada de modo frio, reflexivo e cauteloso na preparação e execução da resolução criminosa. Frieza de ânimo significa sangue frio, insensibilidade, indiferença ou insensibilidade do agente.

  4. Estatui o art.º 72º do Código Penal que o tribunal atenuará especialmente a pena quando existirem circunstâncias de que resulte uma acentuada diminuição da ilicitude do facto, da culpa do agente ou a necessidade da pena. O n.º2 do preceito contém uma enumeração exemplificativa dalgumas dessas circunstâncias. Mas para ter lugar a especial atenuação da pena haverá de concluir-se que dessas circunstâncias se retira acentuada diminuição da ilicitude do facto, da culpa do agente ou das exigências de prevenção. Se tal diminuição não for acentuada, as circunstâncias enunciadas no referido n.º2 terão, então, valor de circunstâncias atenuantes gerais.

    Decisão Texto Integral: 50 Acordam na Secção Criminal de Coimbra – I – 1- No processo comum com o n.º 73/08 de Santa Comba Dão SA e SB foram condenados pela prática dum crime tentado de homicídio qualificado p. e p. pelos artºs. 22º, 23º/1 e 2, 73º/1 alíneas a) e b), 131º e 132º/1 e 2 alínea j) do Código Penal, nas penas, respectivamente, de 6 e de 7 anos de prisão.

    O arguido foi ainda condenado na pena de 10 meses de prisão pela prática do crime de detenção de arma ilegal p. e p. pelas disposições conjugadas dos artigos 2º, 3º/6 alínea c) e 86º/1 alínea c) da Lei nº 5/2006 de 23.02. Em cúmulo jurídico foi condenado na pena única de 7 anos e 3 meses de prisão.

    Foram ainda condenados no pagamento das seguintes indemnizações –

    1. Aos Hospitais da Universidade de Coimbra, a quantia de € 4.593,66 acrescido de juros de mora contados da sua notificação do pedido até integral pagamento.

    2. Ao ofendido C.

      as quantias de – - € 30.000 por danos não patrimoniais, com juros de mora contados da condenação até integral pagamento; - € 7.341.45 por danos patrimoniais, com juros de mora desde a notificação do pedido até integral pagamento; - o que vier a liquidar-se como despesas posteriores em exames, consultas médicas, medicamentos e perda de rendimentos resultantes de I.P.P.

    3. Ao Instituto de Segurança Social IP, € 13.448,43 com juros de mora sobre €11.321,27 desde o final do prazo para contestar o pedido inicialmente formulado e sobre €2.127,16 desde a notificação para se pronunciarem sobre a ampliação apresentada.

      2- Os arguidos recorrem concluindo –

    4. A SB I – O tribunal condenou os arguidos valorando somente a versão do ofendido como se de uma única verdade se tratasse, considerando o tribunal que o seu depoimento “ não foi, de modo algum, susceptível de sequer beliscar a credibilidade que nos mereceu o depoimento do ofendido e com base nele formar a nossa convicção quanto ao modo como os factos se desenrolaram no dia dos factos”; II – O tribunal valoriza quase em exclusividade o depoimento do ofendido, que é parte interessada e tem ressentimento relativamente aos arguidos; III – O tribunal desvalorizou por completo os depoimentos dos arguidos e valorou até à exaustão e quase em exclusivo o 1º interrogatório dos arguidos: - Entendeu o tribunal (fls. 33 e segs do Acórdão) «valorar, no que diz respeito à arguida SB o por si referido em sede de 1º interrogatório »; - Entendeu o tribunal (fls. 33 do acórdão) « valorar, no que diz respeito ao arguido SA o por si referido em sede de 1º interrogatório »; IV - A desvalorização dos depoimentos dos arguidos é por demais evidente e fixar a matéria dada como provada assente no 1º interrogatório destes é, além do mais, totalmente, absurdo e contrário à lei.

    5. - Neste caso acabado o 1º interrogatório passaríamos imediatamente à prolação do douto acórdão, sem necessidade do princípio do contraditório e dispensando-se, desde logo, a audiência de discussão e julgamento uma vez que no entender do tribunal esta é a prova bastante e adequada para sentenciar, sem mais nem menos, os arguidos, no enquadramento dos factos e na aplicação da medida da pena.

    6. - O 1º interrogatório é tão simplesmente um 1º interrogatório numa fase processual distinta e serve, fundamentalmente, para determinar um despacho judicial de aplicação de uma medida de coacção ou de garantia patrimonial (artº 194º/4 do CPP), proceder à qualificação jurídica dos factos imputados e referir os factos concretos que preenchem os pressupostos da medida de coacção, incluindo os previstos nos artigos 193º e 204º do CPP.

    7. - Fundamentar uma decisão judicial ao dar como provados factos com base no 1º interrogatório dos arguidos menosprezando o contraditório e a prova produzida em audiência de discussão e julgamento é ilegal e desconforme à realidade jurídica.

      V - Desvaloriza em seguida todos os outros depoimentos e aqui chamamos à colação que o ofendido ao longo de todo o inquérito e mesmo em sede de audiência e discussão de julgamento apresentou sempre diversas versões, aliás nada condizentes com toda a dinâmica factual produzida em audiência de julgamento; VI – Se procedermos à análise dos depoimentos dos arguidos e ofendidos sem quaisquer intervenção de testemunhas presenciais e tendo em conta a prova produzida em julgamento, teremos de concluir: 1 – Os arguidos iniciaram a preparação dum encontro com o ofendido por iniciativa da arguida SB para todos terem uma conversa de modo a esclarecer quem era quem, nunca chegando a admitir a possibilidade de durante tal encontro virem a agredir fisicamente o ofendido; 2 – A compra dum cartão telemóvel numa loja chinesa por parte dos arguidos para a arguida SB combinar o encontro com o ofendido, nunca foi feito com o propósito de esconder quaisquer registos telefónicos; 3 – O arguido SA dirigiu-se a casa do pai onde sabia que este guardava uma arma de caça, de 2 canos paralelos, de alma lisa, com o nº de série FS 77063, da marca “ Fausti Stefano “, vulgo caçadeira, que levou consigo juntamente com um saco de tiracolo contendo, pelo menos, 35 cartuchos, com o objectivo de a levar consigo para o referido encontro sem pensar no uso da mesma; 4 - A arguida SB desconhecia que o arguido SA levasse para o encontro marcado com o ofendido uma arma de caça e um saco de tiracolo contendo, pelo menos, 35 cartuchos; 5 – A arguida SB não entregou ao arguido SA quaisquer luvas de borracha cor-de-rosa para o encontro marcado com o ofendido, desconhecendo que aquele as tivesse trazido e muito menos para que este ocultasse qualquer vestígio; 6 - As luvas cor-de-rosa que o arguido SA utilizou no lugar dos factos sempre se destinaram para a limpeza do carro e não para qualquer outro fim; 7 – A arguida SB após se encontrar com o ofendido C., quando seguia apeada ao encontro do ofendido, no caminho entre o parque do restaurante e o viaduto do IP3, entrou para a viatura do mesmo, mas foi este que decidiu por si só e por sua exclusiva iniciativa alterar o lugar do encontro e dirigir-se para a zona da Albufeira da…, vindo a estacionar o veículo num caminho térreo perto da margem da albufeira da … 8 – Apercebendo-se do trajecto feito pelo ofendido, o SA saiu do parque de estacionamento e seguiu no seu encalço; e ao aperceber-se do local onde aquele acabara de estacionar a viatura imobilizou o seu automóvel e dirigiu-se para o lugar do condutor sem ter qualquer arma ou luvas calçadas; 9 – Após ver o ofendido e a arguida SB dentro no veículo daquele debruçado e a apalpar os seios da sua companheira, o arguido SA veio ao seu carro e foi buscar a arma que trazia, aproximou-se do lado do ofendido, deu um tiro para o ar e de seguida dirigindo-se ao ofendido disse-lhe «dá-me a tua carteira; isto é um assalto»; 10 – Como o arguido SA tivesse com resposta do ofendido «estás com azar que eu não tenho carteira », chegou-se para trás e calçou umas luvas cor-de-rosa e voltou a insistir « dá-me a tua carteira» « isto é um assalto»; 11 – Neste momento tanto o ofendido como a arguida SB encontravam-se sentados no interior do veículo daquele; 12 - A arguida SB nunca bateu com um pau nem desferiu qualquer pancada na cabeça do ofendido C.

      13 - A arguida SB nunca provocou quaisquer tipo de lesões físicas ao...

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