Acórdão nº 307/05.0GBTNV.C1 de Court of Appeal of Coimbra (Portugal), 01 de Março de 2010

Magistrado ResponsávelBELMIRO ANDRADE
Data da Resolução01 de Março de 2010
EmissorCourt of Appeal of Coimbra (Portugal)

S Meio Processual: RECURSO PENAL Decisão: CONFIRMADA Legislação Nacional: ARTIGOS 494,º496,º562º A 566ºDO CC Sumário: 1.

O que releva, para efeito da atribuição da indemnização, não é a “proporção” ente a matéria alegada e aquela que logrou provar, mas a real e efectiva dimensão do dano que emerge da matéria provada em confronto com as normas jurídicas aplicáveis. Aliás o tribunal está vinculado ao pedido formulado pelo demandante, mas não ao valor de cada uma das múltiplas parcelas em que o pedido se decompõe.

  1. A decisão recorrida não arbitrou a verba em questão como compensação pela incapacidade para a actividade profissional do demandante - ponderando expressamente, em contrário, que encontrando-se na situação de reformado, não viu reduzido o seu rendimento nesse âmbito – mas apenas para o compensar do esforço adicional que a redução da visão causa nas tarefas indiferenciadas do dia-a-dia, nomeadamente nos “afazeres domésticos” e nos “cuidados da horta que costumava cultivar 3.São indemnizáveis os danos futuros, desde que previsíveis. E tendo a capacidade de ganho ficado diminuída, não sofre dúvida que existe quebra da capacidade aquisitiva futura.

  2. Tais danos devem ser calculados com base em critérios de verosimilhança ou de probabilidade, de acordo com o que no caso concreto poderá ou poderia vir a acontecer, seguindo as coisas o seu curso normal e se, mesmo assim, não puder apurar-se o seu valor exacto, deverá o tribunal julgar segundo a equidade.

  3. A indemnização por danos não patrimoniais não visa propriamente ressarcir o lesado mas apenas oferecer ao lesado a compensação que neutralize, na medida do possível o dano moral sofrido.

    Decisão Texto Integral: I.

    Após audiência de discussão e julgamento foi proferida sentença, na qual o tribunal recorrido decidiu: - Condenar o arguido ZZ pela prática, em autoria material e na forma consumada, de um crime de ofensa à integridade física simples, agravada pelo resultado, previsto e punido pelos artigos 143º, n.º 1, 144º, alínea b) e 147º, n.º 2, do Código Penal, na pena de 280 (duzentos e oitenta) dias de multa, à taxa diária de €6,00 (seis euros), a que corresponde 186 (cento e oitenta e seis) dias de prisão subsidiária, nos termos do artigo 49º do Código Penal; (…) - Julgar procedente por provado o pedido de indemnização civil formulado por AA e, em consequência, decido condenar o demandado ZZ no pagamento ao demandante AA das seguintes quantias: a) €989,10 (novecentos e oitenta e nove euros e dez cêntimos) a título de danos patrimoniais; b) €10.000,00 (dez mil euros) a título de perda da capacidade de ganho, c) €20.000,00 (vinte mil euros) a título de danos morais, e d) nas despesas médicas e hospitalares que o demandante venha a ter de liquidar em consequência das lesões por si sofridas, bem como nos inerentes danos morais emergentes de futuros tratamentos médicos, a liquidar em incidente de liquidação.

    e) A estas quantias acrescem juros de mora calculados desde a data de notificação para contestar o pedido cível até integral pagamento, a qual, actualmente, é de 4%.

    (…) * Recorre da sentença o arguido/demandado, ZZ.

    Formula as seguintes CONCLUSÕES: 1. O montante indemnizatório deve sofrer uma substancial redução, pois verificou-se uma deficiente interpretação dos factos provados e uma errada aplicação do direito.

  4. O montante da indemnização pelos lucros cessantes é exageradamente elevado, pois nem sequer foram provados todos os fados alegados pelo demandante; 3. O demandante alegou que tinha ficado privado de executar qualquer tipo de trabalho ou biscate, mas tal facto não ficou provado, tendo ficado apenas provado que “o arguido Américo Antunes tem maiores dificuldades em efectuar qualquer tipo de tarefa…” 4. Ter maiores dificuldades em efectuar qualquer tipo de tarefa não traduz a mesma realidade que ter ficado impedido de executar qualquer tipo de tarefa, sendo realidades substancialmente diferentes, as quais têm consequências também muito diferentes; 5. A indemnização arbitrada não teve em conta este aspecto e também não teve em conta o grau de IPP de que o demandante estará afectado, sendo certo que este nem sequer foi apurado; 6. Nos termos do artigo 496º nº 3 do C.C., o montante da indemnização por danos não patrimoniais deve ser fixado equitativamente pelo Tribunal, tendo em atenção, em qualquer caso, as circunstâncias do artigo 494º do CC; 7. O tribunal devia ter fixado a indemnização por danos não patrimoniais tendo em conta o grau de culpabilidade do agente, a situação económica deste e do lesado e as demais circunstâncias do caso que o justifiquem, mas não o fez; 8. De todos os aspectos referidos nos artigos 494º e 496º do CC, a douta sentença apenas deu atenção às lesões sofridas pelo demandante; 9. Não ficou provado que, com a sua conduta, o arguido tenha previsto e querido causar as lesões sofridas pelo demandante, sendo certo que a sua conduta se molda pela negligência inconsciente; 10. O mecanismo previsto no artigo 494º do CC deve utilizar-se precisamente nos casos em que o montante da indemnização é claramente injusta, como é o caso dos autos, o que a douta sentença não fez; 11. O montante indemnizatório por danos não patrimoniais deve ser substancialmente reduzido; 12. A douta sentença violou o disposto no artigo 494º do CC, bem como o disposto no artigo 496º nº 3 do CC.

    * Respondeu o demandante AA sustentando a improcedência do recurso.

    *** II.

  5. Vistas as conclusões, que definem o objecto do recurso, este circunscreve-se à quantificação da indemnização civil que o recorrente foi condenado a pagar a favor de do demandante AA.

    A apreciação obriga a recapitular a matéria de facto provada.

    * 2. A matéria de facto provada é a seguinte: 1 - No dia 23 de …. de 2005, pelas 20:30 horas, o arguido ZZ circulava no seu veículo e, ao chegar à Rua do Correio, na localidade dos Riachos, concelho …, verificou que ali se encontrava o veículo do arguido AA, dificultando a entrada na mesma.

    2 - O arguido ZZ apeou-se e dirigiu-se ao arguido AA, solicitando-lhe que chegasse o respectivo veículo mais para a frente para o dele poder passar.

    3 - O arguido AA não retirou o veículo e começou a proferir algumas palavras.

    4 - A dada altura, o arguido AA desferiu um murro no nariz do arguido ZZ e este desferiu outro murro no olho esquerdo daquele.

    5 - O arguido AA que se encontrava sob o efeito da ingestão de bebidas alcoólicas, como o arguido ZZ se apercebeu, caiu no chão, em posição que não se logrou apurar, e em cima de uns vasos que ali se encontravam.

    6 - Mercê da referida conduta do arguido AA sofreu o arguido ZZ lesões que lhe provocaram traumatismo do nariz com epistaxis e que lhe determinaram 10 (dez) dias de doença, sem afectação da capacidade para o trabalho profissional e em geral, conforme auto de exame médico de fls. 130 a 132 dos autos, aqui dado por reproduzido.

    7 - Mercê da referida conduta do arguido ZZ, sofreu o arguido AA lesões que lhe provocaram traumatismo do olho esquerdo, luxação do cristalino com ruptura do globo ocular e prolapso da íris, que lhe determinaram um período de 10 (dez) dias de...

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