Acórdão nº 80/2002.C2 de Court of Appeal of Coimbra (Portugal), 01 de Março de 2010

Magistrado ResponsávelARLINDO OLIVEIRA
Data da Resolução01 de Março de 2010
EmissorCourt of Appeal of Coimbra (Portugal)

S Meio Processual: APELAÇÃO Legislação Nacional: ARTIGO 9.º, N.º 5 DO RAU; ARTIGO 28-A, N.º 1 DO CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL; ARTIGOS 260.º; 268.º; 464.º; 1691.º DO CÓDIGO CIVIL Sumário: 1. É parte legítima qualquer dos cônjuges arrendatários que propõe acção de indemnização contra o senhorio, por alegado incumprimento contratual que não ponha em risco a validade e subsistência do arrendamento.

  1. Determinar se uma dívida foi aplicada em proveito comum do casal implica, ao mesmo tempo, uma questão-de-facto (averiguar o destino dado ao dinheiro) e uma questão-de-direito (decidir sobre se, em face desse destino, a dívida foi ou não contraída em proveito do casal).

  2. Sem a alegação e prova dos factos tendentes a demonstrar qual o destino que foi dado ao dinheiro, impossível se torna decidir se estamos em face de uma dívida contraída em proveito comum do casal.

    Decisão Texto Integral: Acordam no Tribunal da Relação de Coimbra A.... propôs contra B....e mulher C...., residentes em 131 Avenue Berthelot, Lyon-França, a presente acção declarativa sob a forma ordinária, pedindo a condenação destes no pagamento da quantia de 13.384,61 € relativo a danos de natureza patrimonial e ainda numa coima referente a um ano de renda, nos termos do artigo 9º, nº. 5 do RAU.

    Funda este pedido alegando que em finais do ano de 1995 efectuou diligência com o representante dos R.R., para tomar de arrendamento uma habitação para residência do seu agregado familiar, referentes a uma habitação pertença dos R.R. que se situava ….., designada pela letra D do prédio.

    Alega que fez saber ao Procurador dos R.R. da necessidade da existência de contrato escrito e da licença de habitabilidade, uma vez que se iria candidatar junto do Instituto de Apoio ao Arrendamento por Jovens, a fim de receber o respectivo subsídio de renda. Mas a licença não lhe foi disponibilizada apesar das várias diligência que fez, pelo que perdeu o subsídio que atingiria 75% do valor da renda desde o início do contrato e até à resolução. Alega que teve dificuldades económicas e solicitou empréstimos que não teria de fazer se pudesse ter beneficiado do subsídio da renda, o que só aconteceu por falta dos R.R. na obtenção da licença de habitação da casa.

    Contestaram os R.R., arguindo a nulidade da citação edital efectuada, com o fundamento em que os respectivos anúncios não foram publicados num jornal de Coimbra, nem deles consta a data da publicação e alegando que o A. aceitou o arrendamento sem a licença de habitabilidade; que esta demorou a obter devido à falta de operários da construção civil, para as obras necessárias e que o Autor nunca fez saber aos R.R. que pretendia candidatar-se a qualquer subsídio. Terminam com o pedido de absolvição da instância e do pedido.

    No prosseguimento dos autos, foi dispensada a realização de audiência preliminar em consequência do que foi proferido despacho saneador, no qual se julgou improcedente a invocada excepção de nulidade da citação edital e foi seleccionada a matéria de facto relevante tida por assente e a provar, de que não houve reclamação.

    Teve lugar a audiência de discussão e julgamento, com recurso à gravação da prova testemunhal nela produzida, finda a qual foi proferida decisão sobre a matéria de facto constante da base instrutória, com indicação da respectiva fundamentação, tal como consta de fl.s 447 e 448, sem que lhe tenha sido formulada qualquer reclamação.

    No seguimento do que foi proferida a sentença de fl.s 269 a 278, na qual se decidiu o seguinte: “Julgo parcialmente procedente a acção e, em consequência condeno os R.R. no pagamento ao A. da quantia de 13.384,61 € (treze mil trezentos e oitenta e quatro euros e sessenta e um cêntimos) de indemnização.

    A esta quantia acrescem os juros de mora desde a data da citação para a presente acção (artº. 805-1 C.C.).

    No demais pedido absolvo os R.R.

    As custas são a cargo dos R.R. e A. na proporção de 1/5 para o autor e 4/5 para os R.R.” Dela notificados, vieram os réus, cf. requerimento de fl.s 461 e 462, pedir a aclaração da mesma, com o fundamento em que o contrato de arrendamento sobre que versa os autos foi celebrado por um gestor de negócios dos réus e sem que tenha sido alegado que o autor os tenha interpelado para o ratificar, nem que o autor tenha exigido ao gestor que fizesse prova dos seus poderes, pelo que importava que o Tribunal a quo esclarecesse se entendia estarem em vigor os artigos 471,º, 268.º e 260.º do CC e se eram aplicáveis in casu e a serem-no que se alterasse a decisão, no sentido de se declarar o arrendamento ineficaz em relação aos réus.

    De tal notificado, o autor defendeu o indeferimento de tal pedido, com o fundamento em que o mesmo não se enquadra no incidente de aclaração, mas sim que contendia com o fundo da questão, só atacável mediante recurso.

    Por despacho de fl.s 471, já transitado em julgado, a M.ma Juiz a quo, indeferiu o requerido, com o fundamento em os autores manifestam a sua discordância relativamente à apreciação jurídica nela vertida, o que só podem atingir por via de recurso.

    Inconformados com a mesma, interpuseram recurso os réus, recurso, esse, admitido como de apelação e com efeito devolutivo (cf. despacho de fl.s 477), concluindo as respectivas motivações, com as seguintes conclusões (resumidas): 1. O contrato de arrendamento referido nos autos foi apenas celebrado pelo autor, como inquilino, não obstante estar já á época casado, no regime da comunhão de adquiridos, figurando como causa de pedir o direito a indemnização a que se arroga aquele e sua mulher.

  3. Pelo que se tratava de direitos que só por ambos podiam ser exercidos, nos termos do artigo 28.º A, CPC, ou por um deles com o consentimento do outro.

  4. Pelo que se verifica a ilegitimidade do autor, que era de conhecimento oficioso e determina a absolvição dos réus da instância.

  5. O contrato de arrendamento dos autos foi celebrado entre o autor e um terceiro, que se assumiu como gestor dos réus, sem que aparecesse qualquer procuração a seu favor e em conformidade.

  6. O autor, enquanto inquilino, tendo negociado e contratado tão só com o gestor de negócios, não curou, uma vez celebrado o contrato de arrendamento, que o dono homologasse, por ratificação, a intervenção do gestor, o que estava sujeito à forma escrita.

  7. Pelo que tal contrato é ineficaz em relação aos réus, o que acarreta a improcedência da acção.

  8. Não se podia retirar das declarações da testemunha José Augusto Dias, a demonstração dos factos constantes dos quesitos 1.º a 4.º, 7.º, 11.º e 12.º da base instrutória, pelo que os mesmos não podem ser dados como provados.

  9. A ré sempre deveria ter sido absolvida do pedido, porque além de não estar provado o regime de bens dos réus, que apenas poderá ser documentalmente provado, não foi alegado o proveito comum do casal, que legitimasse que a ré fosse demandada e condenada.

  10. O proveito comum do casal não se presume e tem de se determinar dos factos para tal alegados.

  11. De igual forma, não foi alegado consentimento da ré para a celebração do contrato de arrendamento.

  12. A decisão recorrida viola, além do mais, todas as disposições legais referidas nas alegações de recurso.

    Terminam, peticionando a revogação da sentença recorrida, com a consequente absolvição dos réus da instância ou do pedido, ou a ré do pedido.

    Contra-alegando, o autor, pugna pela manutenção da decisão recorrida, com o fundamento em que, relativamente à alegada gestão de negócios sem poderes de representação, se demonstrou que o contrato de arrendamento foi celebrado pelos réus, por intermédio do seu representante e sem que, ao longo do processo, os réus o não tenham aceite, pelo que sempre estaria ratificado, para além de que se trata de uma questão nova, nunca invocada em sede de articulados.

    No que concerne à invocada ilegitimidade activa, que a mesma não se verifica, porque o contrato de arrendamento já se encontrava resolvido, pelo que já não constituía (o respectivo objecto), a casa de morada de família.

    Quanto à ilegitimidade passiva, refere que alegou que os réus eram casados sob o regime da comunhão geral de bens, sem que estes o tenham impugnado e nem o casamento exige, no caso, a prova documental, dado que o objecto da presente acção não é o casamento em si mesmo.

    Por último, quanto à impugnação da matéria de facto, defende que a prova foi bem apreciada, pelo que é de manter, tal como foi fixada em 1.ª instância.

    Colhidos os vistos legais, há que decidir.

    Tendo em linha de conta que nos termos do preceituado nos artigos 684, n.º 3 e 690, n.º 1, ambos do CPC, as conclusões da alegação de recurso delimitam os poderes de cognição deste Tribunal e considerando a natureza jurídica da matéria versada, são as seguintes as questões a decidir: A. Se o autor é parte ilegítima para a presente acção, por a ter proposto desacompanhado da mulher, dado que era casado e a mesma versa sobre a casa de morada de família; B. Se o contrato de arrendamento deve ser considerado ineficaz em relação aos réus, por ter sido celebrado por um representante destes, a título de gestão de negócios, sem que tenha sido alegada nem provada a ratificação da dita gestão pelos réus; C. Se a ré deve ser absolvida do pedido, quer porque não se encontra provado o regime de bens do casamento dos réus, que apenas o pode ser documentalmente, quer porque não foi alegado o proveito comum e; D. Incorrecta análise e apreciação da prova – reapreciação da prova gravada, relativamente aos quesitos 1.º a 4.º, 7.º, 11.º e 12.º da base instrutória; É a seguinte a matéria de facto dada por provada na decisão recorrida: Da matéria relativa aos factos Assentes:

    1. Em finais do ano de 1995, o A. efectuou diligências no sentido de tomar de arrendamento uma habitação para o seu agregado familiar.

    2. Na sequência dessas diligências, o A. conheceu o representante do R., Sr. José Augusto Dias.

    3. O A. informou ao referido representante que pretendia celebrar um contrato, por escrito, de arrendamento para habitação.

    4. Tendo por...

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