Acórdão nº 71/08.1TTABT.E1 de Tribunal da Relação de Évora, 01 de Março de 2010

Magistrado ResponsávelALEXANDRE BAPTISTA COELHO
Data da Resolução01 de Março de 2010
EmissorTribunal da Relação de Évora

S Meio Processual: APELAÇÃO SOCIAL Decisão: NÃO PROVIDO Sumário: 1. O prazo de 30 dias previsto no art.º 415º, nº 1, do Código do Trabalho de 2003, só começa a correr após encerrada a fase da instrução, ou seja, quando estiverem concluídas as diligências probatórias requeridas pelo trabalhador na resposta à nota de culpa, ou quando findar o prazo de 10 dias previsto no art.º 413º do mesmo código, se nada tiver sido entretanto requerido pelo arguido.

  1. Não constitui, por si só, causa de nulidade o facto de o processo disciplinar se encontrar disponível para consulta em local diverso do local de trabalho, desde que o acesso ao mesmo esteja assegurado em termos de razoabilidade.

  2. A não inquirição das testemunhas arroladas pela parte empregadora na nota de culpa enviada ao trabalhador, em virtude de o seu depoimento ter sido considerado desnecessário pelo instrutor do processo disciplinar, não afecta a validade desse processo, já que é àquela que incumbe provar em juízo os factos imputados ao arguido.

Decisão Texto Integral: ACÓRDÃO Acordam os juízes que compõem a Secção Social deste Tribunal da Relação de Évora: No Tribunal do Trabalho de Abrantes, e em acção com processo comum, P.

, identificado nos autos, demandou J., empresário em nome individual, com sede em Alferrarede, pedindo a declaração de ilicitude do despedimento contra si proferido, por nulidade do processo disciplinar instaurado, por caducidade do direito à aplicação duma sanção disciplinar, e por inexistência de justa causa, e a consequente condenação do R. na sua reintegração, ou no pagamento da indemnização pela qual o A. venha a optar, e bem assim no pagamento das retribuições que o demandante deixou de auferir, desde o despedimento e até trânsito em julgado da decisão judicial, da quantia de € 5.000,00, a título de indemnização por danos não patrimoniais, e de mais € 48.144,68, de diferenças de retribuições em atraso.

Para o efeito, alegou em resumo ter sido admitido ao serviço do R. em 2001, como ajudante de farmácia, auferindo em Julho de 2006 o salário mensal de € 2.538,65; por carta de 30/1/2008, foi-lhe comunicado o seu despedimento, com alegação de justa causa; esse despedimento é no entanto ilícito, dado não corresponderem à verdade os factos a si imputados, e por ser nulo o processo disciplinar a propósito instaurado, por violação do princípio do contraditório, por preterição de formalidades essenciais à defesa, e por caducidade do direito a aplicar a sanção; para além de tudo isso, o R. a partir de Julho de 2006 deixou de pagar-lhe integralmente o salário que lhe era devido.

Gorada a tentativa de conciliação efectuada no âmbito da audiência de partes prevista no art.º 54º do Código de Processo do Trabalho, o R. veio contestar de seguida, deduzindo a excepção de litispendência relativamente ao pedido de pagamento de diferenças de retribuição em atraso, e defendendo a licitude do despedimento proferido, por alegada validade do processo disciplinar, tempestividade do direito de aplicação da sanção, e existência de factos cuja gravidade configura a justa causa invocada.

À contestação veio depois responder o A., quanto à matéria de excepção nela deduzida.

Foi proferido despacho saneador, que julgou verificada a litispendência, absolvendo o R. dos correspondentes pedidos, consignou os factos assentes, e elaborou a base instrutória.

Procedeu-se a audiência de julgamento, e foi finalmente proferida sentença, que julgou a acção inteiramente improcedente, absolvendo o R. em conformidade.

Discordante do assim decidido, dessa sentença veio então apelar o A.. Na respectiva alegação de recurso formulou as seguintes conclusões: - tendo o trabalhador sido notificado da nota de culpa em 19/12/2007, o direito da entidade patronal aplicar uma sanção disciplinar caducou em 18/1/2008, ou seja, passados os 30 dias desde a última diligência probatória que foi seguramente anterior à expedição daquela nota de culpa; - estando assim caduco o direito da entidade patronal aplicar uma sanção disciplinar, não se aplicando ao caso concreto o art.º 329º do Cód. Civil porque esta norma é de natureza supletiva, em relação ao regime de caducidade, pois nele claramente se estabelece se a lei não fixar outra data e no caso de caducidade do direito de aplicar sanção o legislador fixou o legislador no art.º 415º (conjugado com o art.º 414º, nº 3) do Código do Trabalho, que o prazo de caducidade do direito de aplicar uma sanção disciplinar, não sendo o recorrente dirigente sindical, nem existindo uma comissão de trabalhadores, é de trinta dias e que deverá iniciar-se logo que concluídas as diligências probatórias, violando assim a sentença recorrida o disposto nos arts.º 414º e 415º do Código do Trabalho e ainda o disposto no art.º 329º do Cód. Civil; - se nada se produz em termos de prova ou de defesa, não há razão para valorar a prova já produzida no processo disciplinar e que fundamentou a nota de culpa, concedendo para o efeito ainda mais 30 dias, correndo-se o risco de perder a própria mediação entre o momento da produção de prova e a decisão do processo disciplinar; - ao direito de consulta do trabalhador do processo disciplinar corresponde o dever da entidade patronal de disponibilizar o processo para consulta desde que notifica o trabalhador da nota de culpa, independentemente de o trabalhador vir a consultá-lo ou não (cfr. Ac STJ de 4/2/2004), dever este que se vence assim com a notificação da nota de culpa e a que corresponde uma prestação contínua; - o lugar do cumprimento das obrigações laborais é o local de trabalho, não só a obrigação principal do trabalhador, como da entidade patronal, com seja o pagamento da sua retribuição, sendo a relação entre local da prestação e trabalhador uma garantia do trabalhador, com protecção aos mais variados níveis, pelo que é aí que deve ser cumprido o dever; - não corresponde ao cumprimento desse dever oferecer prestação diversa, a consulta do processo em local disto a mais de 77 km de distância, logo o procedimento disciplinar nulo, nos termos do art.º 430º, nº 2, al. b), do código do Trabalho, norma violada pela decisão recorrida; - o processo disciplinar é um acto de vontade com vista à produção de efeitos jurídicos, como tal é um negócio jurídico, sujeito às regras de interpretação dos mesmos, valendo com o sentido que um normal declaratário, colocado na posição do real declaratário, possa deduzir do comportamento do declarante; - o declaratário que receba uma nota de culpa, onde consta a narração de factos e a indicação de meios de prova (prova documental e prova testemunhal) retira dessa declaração negocial o sentido de prova produzida e não a produzir e muito menos de prova parcialmente produzida e parcialmente a produzir; - a sentença recorrida, interpretando a nota de culpa como prova a produzir, viola pois o disposto no art.º 236º e 238º do CC na interpretação do processo disciplinar, havendo pois de concluir-se que as testemunhas foram efectivamente inquiridas e que os seus depoimentos não foram reduzidos a escrito, o que torna nulo o respectivo processo disciplinar; - os presentes autos são uma acção de impugnação de despedimento apurado no âmbito de um processo disciplinar, sendo pois no âmbito desse processo disciplinar que cabe apurar a existência de justa causa, não servindo o processo judicial para apurar e demonstrar factos que não resultaram demonstrados no processo disciplinar, pelo que se os factos que...

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