Acórdão nº 29/10.0YFLSB.S1 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 01 de Março de 2010

Data01 Março 2010
Órgãohttp://vlex.com/desc1/1997_01,Supreme Court of Justice (Portugal)

S Privacidade: 1 Meio Processual: HABEAS CORPUS Decisão: PROCEDENTE Sumário : I - A petição de habeas corpus, em caso de prisão ilegal, tem os seus fundamentos taxativamente previstos no n.º 2 do art. 222.º do CPP, confrontando-se com situações de violação ostensiva da liberdade das pessoas, quer por incompetência da entidade que ordenou a prisão, quer por a lei não a permitir com o fundamento invocado ou não tendo sido invocado fundamento algum, quer ainda por estarem excedidos os prazos legais da sua duração, havendo, por isso, urgência na reposição da legalidade.

II - A prescrição da pena é um pressuposto negativo da punição, que, tal como a prescrição do procedimento criminal, tem natureza substantiva e processual, predominando hoje a teoria jurídico-material da prescrição.

III - A natureza substantiva, que muitos autores pretendem dominante ou mesmo exclusiva, advém-lhe de razões ligadas às finalidades da punição. Com o decurso do tempo sobre o trânsito em julgado da sentença condenatória sem que o condenado tenha iniciado o cumprimento da pena imposta, esbate-se a necessidade comunitária da sua execução e, ao mesmo tempo, a exigência de socialização do condenado perde também a sua razão de ser, a ponto de poder tornar-se completamente desajustada, se o condenado a tivesse que cumprir muito tempo depois da condenação.

IV - A natureza processual, por seu turno, liga-se a razões que têm a ver com o próprio processo, também neste caso, pois a prescrição obsta a que a pena seja executada, não obstante basear-se numa decisão transitada em julgado. Neste sentido, é um pressuposto negativo de carácter processual, ou como diz Figueiredo Dias, obstáculo de realização (execução) processual.

V - Tendo a prescrição natureza substantiva e processual, é de entender que as respectivas normas constituem leis processuais materiais, o que implica, no domínio da aplicação da lei no tempo, a sujeição ao princípio da lei mais favorável (cf. Acs. do STJ proferidos nos Procs. n.ºs 2868/08 - 3.ª e 2558/08 - 3.ª, este último relativo a processo de habeas corpus).

VI - É de reconhecer fundamento à providência de habeas corpus, por ser patentemente ilegal a prisão do requerente (cf. art. 222.º, n.º 2, al. b), do CPP), no caso em que esta foi ordenada judicialmente, mas em que é claro o erro de direito em que incorreu, abrangendo na suspensão da prescrição da pena períodos de tempo que legalmente não podiam ser computados como tal e não equacionando o regime mais favorável ao requerente.

VII - Se é certo que o habeas corpus não se perfila como um recurso e, portanto, como meio de impugnação de uma decisão judicial, também é verdade que, sendo ostensiva a ilegalidade da prisão por força de um erro manifesto na aplicação do direito, esta providência é o meio adequado para pôr termo a essa ilegalidade − cf. Acs. do STJ de 16-12-2003 e de 26-01-2006, proferidos respectivamente nos Procs. n.ºs 4397/03 - 5.ª e 282/06 - 5.ª.

VIII - Acresce que a ter havido caso julgado da decisão que, por último, se pronunciou sobre a prescrição da pena, tal caso julgado, formal, tem efeito vinculativo intraprocessual, mas não os efeitos próprios do caso julgado material, que decide em substância da relação controvertida, impondo-se dentro e fora do processo e pondo fim à causa, pela solução do litígio. A prescrição da pena tem uma natureza marcadamente material e substantiva, pelo que “não pode, na dimensão substantiva, estar coberta por qualquer caso julgado formal quanto à estabilidade de determinado regime dos vários que podem suceder-se no tempo”− cf. Ac. do STJ proferido no Proc. n.º 2868/08 - 3.ª.

Decisão Texto Integral: I.

  1. AA, identificado nos autos, veio, por meio de advogado, requerer ao presidente do Supremo Tribunal de Justiça a providência de habeas corpus, invocando em síntese: - O requerente foi detido no passado dia 28 de Janeiro em cumprimento de mandado de detenção emitido pelo 2.º Juízo Criminal do Tribunal Judicial de Santo Tirso, no âmbito do processo comum n.º 673/99.5TBSTS, para cumprimento do remanescente de 1 ano da pena de prisão de 3 anos, cuja execução lhe ficou suspensa por cinco anos.

    - Não tendo ocorrido qualquer causa de suspensão ou interrupção da prescrição daquela pena e tendo decorrido mais de 10 anos sobre a sua fixação, nos termos do art. 122.º do Código Penal (CP), a mesma prescreveu em 6 de Abril de 2005.

    - A suspensão da execução da pena não é causa de suspensão da prescrição.

    - A declaração de contumácia também não constitui causa de suspensão da prescrição à luz do CP 1982 – lei vigente à data dos factos que determinaram a condenação do requerente.

    - Os factos remontam a 1986 e a decisão final condenatória transitou em julgado em 1995, tendo, por isso, decorrido mais de 24 anos e 14 anos sobre aqueles factos e decisão.

    - A prisão do requerente deve, por isso, considerar-se ilegal e ordenar-se a sua imediata libertação.

    Juntou certidões dos acórdãos da 1.ª instância e do Supremo Tribunal de Justiça.

  2. A Sr.ª Juíza do processo prestou a informação a que alude o art. 223.º, n.º 1 do CPP: (…) o arguido acima referido foi condenado por acórdão cumulatório de fls 372 a 384 na pena única de 3 anos de prisão.

    Por acórdão do STJ de 23/3/95, foi...

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