Acórdão nº 09B0263 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 01 de Março de 2010

Magistrado ResponsávelMARIA DOS PRAZERES PIZARRO BELEZA
Data da Resolução01 de Março de 2010
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)

S Privacidade: 1 Meio Processual: REVISTA Decisão: CONCEDIDA PARCIALMENTE A REVISTA Legislação Nacional: CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL, ARTIGOS 661º, 754º CÓDIGO CIVIL, ARTIGOS 227º, 251º, 254º, 287º, 905º E SEGS., 913º E SEGS. Jurisprudência Nacional: ACÓRDÃOS DO SUPREMO TRIBUNAL DA JUSTIÇA DE 16 DE JUNHO DE 2008, WWW.DGSI.PT, 08B1184 E DE 18 DE JUNHO DE 2009, WWW.DGSI.PT , 08B3202 Sumário : 1. Registada a dissolução e o encerramento da liquidação de uma sociedade comercial, as acções em que era parte prosseguem, sendo a sociedade substituída pelos sócios.

  1. A efectiva anulação ou a anulabilidade não invocada não são em abstracto incompatíveis com a obrigação de indemnizar, nos termos da responsabilidade pré-contratual.

  2. Mas a obrigação de indemnização não pode equivaler à transferência, para o vendedor, do risco inerente à concretização ou não concretização dos objectivos que levaram o comprador a celebrar o contrato de compra e venda.

  3. A opção do comprador por não invocar a anulabilidade do contrato, apesar de a sua vontade ter sido determinada por erro sobre o objecto, que funda na falta de informações que o vendedor estava obrigado a prestar, é compatível com um pedido de indemnização pelos danos que não teria sofrido se a obrigação de informações tivesse sido cumprida e, portanto, se o contrato não tivesse sido celebrado.

    Decisão Texto Integral: Acordam, no Supremo Tribunal de Justiça: 1. Sociedade de Construções C..., Lda. instaurou contra A. M..., Lda. uma acção na qual pediu a sua condenação no pagamento de uma indemnização de € 64.976,00, com fundamento em responsabilidade pré-contratual, acrescida de juros de mora contados desde a citação até efectivo e integral pagamento.

    Para o efeito, e em síntese, alegou ter adquirido à ré um lote de terreno para construção de uma moradia bifamiliar; ter verificado que a sua configuração geométrica era diversa da que lhe correspondia na planta síntese oficial do loteamento, que lhe fora entregue pela ré, responsável pelo mesmo, o que inviabilizava a construção prevista; que ocorreu, assim, erro sobre o objecto do negócio; que a configuração do lote apenas permitia a construção de uma moradia unifamiliar; que o erro, decisivo “para a vontade de comprar”, lhe causou prejuízos, que calcula em € 55.000,00, por diminuição do lucro que provavelmente auferiria e por aumento dos encargos que tem de suportar; que realizou despesas, relativas à “tramitação do processo junto da Câmara Municipal de Valongo”, no montante de € 9.976,00.

    A ré contestou, por impugnação e por excepção; a autora replicou.

    Por sentença de fls. 299, a acção foi julgada apenas parcialmente procedente. A ré foi condenada a pagar à autora “uma indemnização equivalente à quantia monetária que esta, em consequência da apurada divergência de configuração geométrica, teve de suportar com a tramitação do processo na Câmara Municipal de Valongo, a liquidar em execução de sentença, e acrescida de juros de mora (…)” e ainda, como litigante de má fé, em 20 ucs de multa.

    Já quanto ao pedido de indemnização por lucros cessantes, a sentença, considerando que no caso foi efectivamente celebrado o contrato de compra e venda e que este, quanto aos seus efeitos essenciais, foi executado, entendeu que devia ser antes apreciado à luz do regime definido pelos “arts. 913º e ss. do C. Civil, referente à venda de coisas defeituosas”; que, tendo a compradora incorrido em erro, criado pela ré, esta deveria ser responsabilizada pela frustração da expectativa da autora, a título de negligência grave; que a autora, não pretendendo anular o contrato, por erro, teria direito à redução do preço; que não a tendo requerido, não pode “substituir tal direito pela formulação de um pedido indemnizatório com base nos lucros cessantes decorrentes da diferente configuração do terreno”; e que, não tendo ficado provado o dolo da ré, a autora apenas teria direito a ser indemnizada nos termos do disposto no artigo 909º do Código Civil, ou seja, pelos danos emergentes (mas não por lucros cessantes).

    A sentença foi todavia parcialmente revogada pelo acórdão do Tribunal da Relação do Porto de fls. 379, que condenou a ré a pagar à autora a quantia de € 50.000,00, “equivalente à vantagem patrimonial que a autora auferiria – entre a venda da moradia bifamiliar e a venda da fracção unifamiliar que a nova configuração do lote de terreno apenas permitiu edificar”, mantendo a condenação nas despesas, no pagamento de juros e na multa por litigância de má fé.

    Diferentemente do decidido em 1ª Instância, a Relação entendeu que continuava a ser aplicável o regime da responsabilidade pré-contratual, cujos pressupostos se verificavam; e que o âmbito da obrigação de indemnizar abrangia os lucros cessantes invocados, não estando limitado ao interesse contratual negativo.

  4. A ré recorreu para o Supremo Tribunal da Justiça; o recurso foi recebido como revista, com efeito meramente devolutivo.

    Nas alegações que apresentou, a recorrente requereu que fosse declarada a extinção da instância, por inutilidade superveniente da lide, por falta de “capacidade judiciária para intervir nos presentes autos” por parte da autora, em resultado da perda de personalidade jurídica, “como flui do disposto no artigo 5º nº 2 do CPC"; subsidiariamente, requereu “a anulação do processado” a partir do momento em que ocorreu essa perda, invocando o disposto no nº 3 do artigo 277º do mesmo Código. E formulou as seguintes conclusões: “ I. Na data de registo de dissolução, liquidação e encerramento a sociedade autora perdeu a perdeu a personalidade e capacidade jurídica, sendo tal o equivalente a dizer-se que deixou de existir, mais não restando que julgar extinta a instância por impossibilidade superveniente da lide; II. Ainda que tal não se entenda, uma vez que a extinção e subsequente perda de personalidade e capacidade jurídica mais não resta que ordenar a anulação de todo o processado a partir da data de registo de dissolução, liquidação e encerramento da sociedade autora, ficando as custas do processo a cargo de quem lhes deu causa; III. Não resulta dos factos provados que no lote em questão apenas seja possível a construção de uma moradia unifamiliar; IV. Ao invés, aquilo que resulta dos factos provados (mais propriamente do ponto 9° dos factos provados) é que no referido lote só é possível a construção de uma moradia de dimensões inferiores às projectadas, e nesse âmbito inclui-se uma moradia bifamiliar, ainda que de menores dimensões da que inicialmente se havia idealizado pelo que a autora jamais deixou de poder cumprir aquilo que havia projectado fazer aquando da compra, tendo unicamente ficado limitada, em medida não concretamente apurada, no que...

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