Acórdão nº 713/05.0TTGMR.S1 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 01 de Março de 2010

Magistrado ResponsávelVASQUES DINIS
Data da Resolução01 de Março de 2010
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)

S Privacidade: 1 Meio Processual: REVISTA Decisão: NEGADA REVISTA Sumário : I - Não enferma do vício de omissão de pronúncia, determinante de nulidade decisória, nos termos do artigo 668.º, n.º 1, alínea d), 1.ª parte, do Código de Processo Civil, a sentença — proferida em acção em que se pedem indemnização por resolução do contrato de trabalho e créditos retributivos — que não se pronuncia sobre a categoria profissional do trabalhador, quando, na petição inicial, a alusão à categoria não se apresenta como elemento integrante dos fundamentos da acção, surgindo apenas como referência meramente explicativa do objecto de contrato, sem a invocação de factos tendentes a demonstrar o direito a determinada classificação profissional, sem a formulação do pedido de reconhecimento de tal direito, e sem a expressão de qualquer nexo entre as tarefas alegadamente exercidas (e o nomen usado para as enquadrar) e os valores da retribuição invocados.

II - Não ofende o disposto no n.º 1 do artigo 712.º do Código de Processo Civil o acórdão da Relação que, conhecendo da atinente impugnação da decisão proferida sobre a matéria de facto, altera a factualidade fixada na 1.ª instância e declara provado que a Ré entregou ao Autor determinada importância, com vista ao pagamento de créditos salariais, através de um cheque, baseando tal veredicto no exame da cópia do cheque incorporada nos autos e na alegação produzida pelo Autor, na petição inicial, de um pretérito acordo para pagamento de créditos salariais, mencionado na carta de que ele se serviu para comunicar a resolução do contrato, com cópia incorporada nos autos, na qual diz que, dos montantes em dívida, lhe foi paga importância igual à inscrita no cheque.

III - No âmbito da vigência do Decreto-Lei n.º 421/83, de 2 de Dezembro, para que o trabalhador tenha direito à retribuição por trabalho suplementar, basta que se prove que ele existiu e que foi efectuado com o conhecimento e sem oposição do empregador, prova que se mostra feita quando se demonstra o cumprimento continuado, nas instalações da empregadora, ao longo de vários anos, de um horário de trabalho que excedia os limites máximos dos períodos de trabalho, diário e semanal, previstos na lei.

IV - Na falta de prova dos concretos dias em que foi prestado o trabalho suplementar e do exacto valor da retribuição, relevante para efeito do cálculo do montante em dívida, nada impede que, ao abrigo do disposto no artigo 661.º, n.º 2, do Código de Processo Civil, seja proferida condenação ilíquida, relegando-se a liquidação para momento ulterior à prolação da sentença.

V - Não configura litigância de má fé, designadamente por violação do dever de cooperação no sentido de se alcançar de forma breve e eficaz a justa composição do litígio, a não aceitação pela parte de uma transacção judicial celebrada pelo seu mandatário sem poderes para o acto, por não concordar com parte de uma das cláusulas da mesma.

Decisão Texto Integral: Acordam na Secção Social do Supremo Tribunal de Justiça: I 1.

No Tribunal do Trabalho de Guimarães, em acção com processo comum, intentada em 15 de Junho de 2005, AA demandou C... & M..., Lda, pedindo a condenação desta a pagar-lhe, com juros, “a quantia a liquidar em execução de sentença”, bem como a importância liquidada de € 69.814,45, acrescida de juros de mora contados desde a citação até integral pagamento.

Alegou, em síntese, que: — Foi admitido ao serviço da Ré em Janeiro de 1997, para lhe prestar trabalho próprio da categoria de empregado de escritório e auferindo a retribuição de Esc.: 100.000$00 que, em Janeiro de 1999, foi actualizada para Esc.: 120.000$00 e, em Janeiro de 2001, para € 1.000,00 mensais.

— Em 21 de Janeiro de 2005, o Autor resolveu o contrato de trabalho com invocação de justa causa, por falta de pagamento de créditos salariais, que a Ré aceitou ter-lhe ficado a dever, tendo as partes até chegado a um acordo de pagamento. Em consequência tem direito à indemnização de antiguidade e diuturnidades, no montante de € 8.000,00.

— No interesse e por ordem expressa da Ré, praticava um horário de trabalho de segunda a sábado, das 8:00 às 12:30 horas e das 13:30 às 20:00 horas, em consequência do que lhe é devida a quantia de global de € 25.560,00 referente a 3 horas de trabalho suplementar de 2.ª a 6.ª feira, nos anos de 2001 a 2004, além do pagamento do trabalho prestado aos sábados, dia de descanso complementar, bem como de descanso compensatório, que nunca gozou, a liquidar em execução de sentença.

— Em 1997, a Ré impediu-lhe o gozo de 8 dias úteis de férias, pelo que tem direito ao pagamento desses dias de férias acrescido da indemnização por violação de tal direito, no montante total de € 727,27.

— A Ré, desde o início do contrato, nunca lhe pagou as férias e respectivo subsídio, encontrando-se em dívida a quantia global de € 12.400,00 (referente às férias, e respectivo subsídio, vencidas em 1998, 1999, 2000, 2001, 2002, 2003, 2004 e 1 de Janeiro de 2005). E, em 2003 e 2004, a Ré apenas lhe permitiu o gozo de 8 dias de férias, pelo que, a título de indemnização por violação do direito a férias, lhe é devida a importância de € 3.818,18.

— A Ré nunca lhe pagou o subsídio de Natal, pelo que, a esse título, com referência aos anos de 1997 a 2004, tem a receber a quantia de € 6.200,00.

— A Ré não lhe pagou os salários referentes aos meses de Janeiro a Dezembro de 2004 e de 20 dias de Janeiro de 2005, cujo valor ascende a € 12.909,09.

— Encontram-se ainda em dívida os proporcionais de férias e de subsídios de férias e de Natal de 2005, no montante de € 200,00.

Para sustentar a total improcedência da acção, contestou Ré, dizendo, em síntese que: — o Autor tinha a categoria de escriturário de 2.ª e auferiu, até 2001, a retribuição de € 75.000$00 e, a partir do início de 2002, a de € 374,10, que se manteve inalterada; — Não prestou qualquer trabalho suplementar, cumprindo um horário de 2.ª a 6.ª feira, das 8:30 às 12:00 e das 14:00 às 17:30 horas e, ao sábado, das 8:00 às 13:00 horas; — A Ré nunca o impediu de gozar as férias a que tinha direito e sempre lhe pagou integralmente as quantias que lhe eram devidas a título de férias e de subsídios de férias e de Natal, sendo falso que não lhe tenha pago as retribuições de 2004; — Em Janeiro de 2005, o Autor já não se encontrava ao serviço da Ré, em virtude de, por carta datada de 26 de Outubro de 2004, ter comunicado que deixaria de lhe prestar trabalho a partir de 31 de Dezembro de 2004, o que ocorreu.

— A Ré não estabeleceu com ele qualquer tipo de acordo relativo a créditos salariais vencidos e não pagos e o Autor, ao comunicar a resolução do contrato por carta de 21 de Janeiro de 2005, excedeu o prazo de 30 dias subsequente ao conhecimento dos factos que fundamentam a invocada justa causa.

Houve resposta do Autor para sustentar, entre o mais, que o contrato de trabalho durou até 21 de Janeiro de 2005.

  1. Em tentativa de conciliação prévia à audiência de julgamento, foi, entre o Autor e a Ré, representada pelo seu então ilustre mandatário, celebrada a transacção de fls. 113/114, nos termos da qual, em síntese, foi estipulado que o Autor reduzia o pedido para a quantia de € 32.000,00, que seria paga em prestações (de acordo com o plano nela previsto) e, na cláusula 4.ª, que, para garantia do seu pagamento, seriam mantidos os efeitos do arresto dos bens efectuado nos autos de procedimento cautelar apenso, prescindindo a Ré do prazo para dedução de oposição e que os bens arrestados são propriedade da Ré.

    Ordenada a notificação da Ré, em cumprimento do disposto no art.º 301.º, n.º 3, do Código de Processo Civil, veio a ela dizer concordar com o teor do acordo, à excepção da última parte da cláusula 4.ª, “uma vez que os bens arrestados não são sua propriedade”.

    A transacção veio a ser declarada nula por despacho lavrado a fls. 148, que não foi impugnado.

  2. Durante a audiência de discussão e julgamento, que decorreu com gravação da prova pessoal, o mandatário da Ré apresentou fotocópia de um cheque (fls. 176), que disse titular a quantia de € 3.897,74, entregue ao Autor para pagamento de créditos salariais.

    À junção de tal documento opôs-se o Autor, pela voz do seu mandatário, que, alegando que o acto configura conduta processual reprovável, uma vez que a Ré tinha, na aludida transacção, reconhecido dever a importância de € 32.000,00, requereu a condenação da demandada como litigante de má fé.

    Seguiu-se requerimento da Ré em que pediu a condenação do Autor por litigância de má fé.

    O documento foi aceite pelo tribunal, conforme despacho ditado para a acta, no qual se decidiu relegar a apreciação da má fé dos litigantes para a sentença, em função da prova que viesse a ser produzida.

    Decidida a matéria de facto, foi proferida sentença que julgou a acção parcialmente procedente, condenando a Ré a pagar ao Autor as quantias a liquidar, nos termos do disposto no artigo 378.º, n.º 2, do Código de Processo Civil, a título de: «- Acréscimo de retribuição pelo trabalho suplementar prestado no período compreendido entre o dia 15 de Junho de 2000 e o dia 31 de Dezembro de 2004 .

    - Férias e subsídio de férias vencidos entre 01/01/98 a 31/12/04 ; - Subsídios de Natal vencidos entre 1997 a 2004 ; - Salários vencidos entre Janeiro e Dezembro de 2004, sendo tais quantias acrescidas de juros de mora desde a citação até integral pagamento.

    » Dos restantes pedidos foi a Ré absolvida.

  3. Apelaram ambas as partes.

    O Autor arguiu a nulidade da sentença, por não se ter pronunciado quanto à sua categoria profissional, nem quanto ao pedido de condenação da recorrida como litigante de má fé, impugnou a decisão proferida sobre a matéria de facto e sustentou que o contrato cessou, em 21 de Janeiro de 2005, por resolução fundada em justa causa, e não, como se decidiu na sentença, em 31 de Dezembro de 2004, por denúncia com aviso prévio, operada pela comunicação de 26 de Outubro de 2004.

    A Ré também arguiu a nulidade da sentença, por omissão de pronúncia, pediu a...

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