Acórdão nº 1324/04.3TTVNG.S1 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 01 de Março de 2010

Magistrado ResponsávelPINTO HESPANHOL
Data da Resolução01 de Março de 2010
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)

S Privacidade: 1 Meio Processual: REVISTA Decisão: CONCEDIDA A REVISTA Sumário : 1. O autor peticiona que seja declarada a base do Porto como local de trabalho, com efeitos desde que foi deferida a sua transferência para a mesma, em 1 de Março de 1997, o que viabiliza que a causa de pedir se possa desdobrar em duas realidades distintas, atinente uma à validade substantiva da ordem de transferência e outra quanto à sua validade formal, e embora o autor desenvolva, com maior acuidade, a factualidade integradora da violação dos pressupostos substanciais da ordem de transferência, nem por isso arreda da sua alegação os seus pressupostos formais, concretamente no que se prende com a ausência de fundamentação da decisão de transferência, daí que não ocorra a pretendida nulidade, por excesso de pronúncia.

  1. E também inexiste nulidade da sentença, por violação do princípio do dispositivo, porquanto a ré aduz conceitos distintos a fim de sustentar a sua tese sem curar pelo realce que deve e se impõe seja dado ao facto de o não pagamento de créditos de natureza laboral configurar ilícito contratual gerador de responsabilidade que, estando nesta fase impedida de naturalmente reconstituir, deve reparar — e nessa reparação veio a ser condenada, conforme ulterior liquidação, sem que daí decorra condenação em pedido diverso do explicitado na petição inicial.

  2. No caso em análise, qualquer declaratário normal colocado na posição do autor compreenderia que a ré só aceitava promovê-lo a comandante de Airbus 320 se passasse a trabalhar na base de Lisboa, tendo-lhe sido dada a opção, no caso de não aceitar o local de trabalho proposto, de «não ser largado como comandante», pelo que, tendo aceite a sua investidura nessas funções de comando, por força da própria proposta contratual dirigida pela ré ao autor, a aceitação da investidura nas ditas funções, por parte do autor, vale como declaração de aceitação da proposta, nos precisos termos em que foi formulada.

  3. Assim, o estabelecimento do local de trabalho do autor como comandante de Airbus 320, na base de Lisboa, foi definido no contexto da autonomia das partes, ao abrigo do n.º 1 do artigo 154.º do Código do Trabalho de 2003, não tendo aplicação o regime jurídico previsto nos artigos 315.º a 317.º do mesmo Código.

    Decisão Texto Integral: Acordam na Secção Social do Supremo Tribunal de Justiça: I 1.

    Em 17 de Dezembro de 2004, no Tribunal do Trabalho de Vila Nova de Gaia, AA intentou a presente acção declarativa, com processo comum, emergente de contrato individual de trabalho contra TAP – AIR PORTUGAL, S. A., pedindo que, «declarada a Base do Porto como sendo a Base do A., com todos os direitos e deveres inerentes, com efeitos desde que foi deferida a sua transferência para a mesma, em 1 de Março de 1997», aquela ré fosse condenada a pagar-lhe (i) todos os subsídios, encargos e ajudas de custo pertinentes ao período de 9 de Abril de 2004 até efectivo reconhecimento, por parte da ré, da sua colocação na Base do Porto, totalizando esses danos patrimoniais, em 10 de Dezembro de 2004, € 10.986, (ii) € 6.000, a título de indemnização por danos não patrimoniais, a que deverá acrescer € 750, por cada mês, até efectivo reconhecimento pela ré de ser a Base do Porto aquela que lhe está atribuída, (iii) a sanção pecuniária compulsória de € 200, por cada dia de atraso no cumprimento da sentença e até à sua execução, e (iv) «juros legais vencidos e vincendos sobre todas as importâncias supra discriminadas até efectivo e integral pagamento».

    Alegou, em suma, que, com efeitos desde 1 de Março de 1997, foi colocado na Base do Porto, como co-piloto (Boing 737), por força de transferência ocorrida na sequência de pedido formulado nesse sentido, entendendo-se por «Base», conforme resulta do artigo 2.º da Portaria n.º 238-A/98, de 15 de Abril, bem como do artigo 2.º, alínea d), do Decreto-Lei n.º 139/2004, de 5 de Junho, «o local onde a empresa tem a sua sede ou onde o tripulante normalmente inicia os seus períodos de serviço de voo, ou outro que, para o efeito, seja definido do contrato de trabalho entre o tripulante e o operador», sendo que, já investido na função de comandante, tomou conhecimento, em 2 de Abril de 2004, que tinha sido transferido o seu planeamento para a base de Lisboa, com efeitos a partir de 9 de Abril seguinte, decisão que não foi minimamente fundamentada, nem teve qualquer indicação da sua natureza e da respectiva duração, implicando tal transferência para Lisboa prejuízos elevados.

    A acção, contestada pela ré, foi julgada parcialmente procedente, tendo sido exarada sentença que declarou «a Base do Porto como sendo a do autor» e condenou a ré: a) a pagar ao autor as quantias relativas a subsídios, encargos e ajudas de custo (despesas de transporte, hotel, refeições, pernoita e ajuda de custo complementar ou “per diem”) correspondentes ao período de 9/4/2004 até reposição da situação, a liquidar em incidente de liquidação, acrescidas de juros de mora à taxa legal desde a liquidação; b) a pagar uma sanção pecuniária compulsória de € 200 dia por cada dia de atraso no cumprimento do decidido quanto à colocação do autor na Base do Porto.

    Quanto ao mais peticionado pelo autor, a ré foi absolvida.

    Subsequentemente, a ré impetrou o esclarecimento daquela sentença, quanto ao sentido da condenação vertida na sua alínea a), requerimento que foi indeferido, com o fundamento de que não ocorria qualquer ambiguidade entre o que foi dado por assente e a condenação proferida, pois a ré «não poderia ser condenada a assegurar, por si, despesas já ocorridas, só havendo um sentido útil para a condenação, o de pagar tais despesas (já ocorridas) ao A., ainda que por quantitativos a liquidar».

  4. Inconformada, a ré apelou para o Tribunal da Relação do Porto, o qual decidiu conceder provimento parcial ao recurso, revogando, nessa conformidade, a sentença e condenando a ré a pagar, a título de sanção pecuniária compulsória, € 150 por cada dia de atraso no cumprimento do decidido quanto à colocação do autor na Base do Porto, mantendo, no mais, a sentença recorrida, sendo contra aquela decisão do Tribunal da Relação que a ré agora se insurge, ao abrigo das conclusões seguintes: «a) No acórdão recorrido deveria ter sido julgada nula a sentença por excesso de pronúncia, por a questão da validade formal da suposta ordem de transferência da Recte. ao Recdo. não ter sido suscitada por qualquer das partes, não sendo de conhecimento oficioso.

    b) Saber se tal configura questão que deva ser apreciada impõe a análise da causa de pedir, conforme jurisprudência abundante.

    c) A causa de pedir na acção foi não ter sido considerado o prejuízo sério alegadamente resultante da transferência do A. e não a inobservância de requisitos formais da suposta ordem de transferência.

    d) A sentença era nula por condenação diversa do pedido, o que o acórdão recorrido, censuravelmente, não reconheceu.

    e) Na apreciação de tal nulidade o Tribunal a quo não teve em conta a aclaração da sentença a fls. 577 dos autos, onde se esclareceu que a Recte. foi afinal condenada no «pagamento de despesas já ocorridas», ou seja, em indemnização (ilíquida) por danos patrimoniais suportados pelo A.

    f) Mas o A. o que pedira fora o pagamento de «(...) todos os subsídios, encargos e ajudas de custo correspondentes ao período que vai desde 09 de Abril até (...)», pelo que é incontestável a discrepância entre o pedido (créditos em mora) e o objecto de condenação (indemnização por despesas indevidamente suportadas).

    g) A transferência do Recdo. para a base de Lisboa resultou de acordo, pois a sua aceitação foi-lhe apresentada como pressuposto da sua promoção a comandante de A320.

    h) A transferência não decorreu de ordem unilateral da Recte.

    i) Ainda que o Recdo. se considerasse afecto à base do Porto, em face da matéria de facto assente, ao Recdo. assistiria apenas o direito de exigir que a Recte. lhe assegurasse o transporte, alojamento e refeições e nunca o pagamento de despesas que alegadamente realizou.

    j) Não tendo o Recdo. alegado e provado que exigiu da Recte. tal transporte, alojamento e refeições, e que esta o tenha recusado, a matéria de facto provada não poderá conduzir à condenação da Recte. em quaisquer pagamentos, nem mesmo em sede de liquidação de sentença.

    k) Invocado abstractamente direito genérico a encargos, subsídios e abonos, que inclusivamente o Recdo. liquidou, mas não tendo alegado convenientemente os factos de que depende a identificação das prestações que reclama, nem os factos de que depende a sua quantificação, nem fazendo prova desses factos, deve a Recte. ser absolvida do correspondente pedido, não podendo ser condenada em genéricos encargos, subsídios e abonos, e relegada para incidente de liquidação a quantificação dos supostos créditos.

    1) Não se provou que o Recdo. tivesse direito a qualquer subsídio, ou que fosse usual a Recte. pagar quaisquer subsídios, pelo que não podia a sentença condenar no seu pagamento.

    m) Conforme jurisprudência desse Supremo Tribunal...

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