Acórdão nº 1012/08.1GLSNT.S1 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 01 de Março de 2010

Magistrado ResponsávelRAÚL BORGES
Data da Resolução01 de Março de 2010
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)

S Privacidade: 1 Sumário : I - De acordo com o ar. 445º, n.º 1, do CPP, fixada jurisprudência, a decisão que resolve o conflito tem eficácia no processo em que o recurso foi interposto e nos processos cuja tramitação tiver sido suspensa nos termos do n.º 2 do art. 441º. Dispõe o n.º 3 que a decisão que resolver o conflito não constitui jurisprudência obrigatória para os tribunais judiciais, mas estes devem fundamentar as divergências relativas à jurisprudência fixada naquela decisão.

II - No caso presente o MP deduziu acusação, imputando ao arguido a prática de um crime de consumo de estupefacientes, p. p. pelo art. 40º, n.º 1, do DL 15/93, por o arguido no dia 06-06-08, deter 20, 983 g de canabis, correspondendo a 21 doses. A Exma. Juíza, após ordenar a autuação como processo comum com intervenção do tribunal singular, rejeitou a acusação, considerando que não havia ilícito criminal, que a acusação teria na sua base o entendimento subjacente ao AUJ n.º 8/2008, que não acompanhava, citando os dois votos de vencido expressos e avançando com a curiosidade do facto da Lei 18/2009 ter procedido à republicação do DL 15/93, contendo o art. 40º.

III - É patente a oposição entre o despacho recorrido, que rejeitou a acusação do MP, que na sua base teve o pressuposto da observância do decidido no acórdão uniformizador, bastando assinalar que aquele afasta de forma clara a aplicação deste, ao considerar que a conduta imputada ao arguido não possui qualquer relevância criminal. Os argumentos apresentados, por mera adesão, para justificar a discordância com a jurisprudência fixada não são originais nem novos; foram apresentados ao Pleno, conhecidos, analisados, sujeitos a debate, ponderados, confrontados, discutidos, sendo que não lograram obter vencimento. Daqui que o argumentário da Exma. Juíza subscritora do despacho recorrido, que só o é por adesão, não sendo novo, não expõe uma linha argumentativa fundamentadora da proclamada divergência, que seja inovadora, ainda não vista, analisada, debatida e ponderada, que faça luz sobre outros caminhos e diferentes soluções.

IV -A Lei 18/2009, de 11-05, entrada em vigor no dia seguinte (art. 4º), procedeu à 16ª alteração ao DL 15/93, alterando, através do art. 1º, o texto do diploma em dois artigos – os arts. 15º e 16º, preceitos que regulam sobre “Prescrição médica” e “Obrigações especiais dos farmacêuticos”, no que toca a substâncias e preparações compreendidas nas tabelas I e II e IV anexas ao diploma – e aditando, pelo art. 2.º, uma substância a cada uma das tabelas – Tabela I-A e Tabela II-A – anexas ao citado DL, e pelo art. 3.º procedeu à republicação em anexo, que é parte integrante da Lei, “o Decreto-Lei n.º 15/93, de 22 de Janeiro, com a redacção actual”.

V - A redacção actual (sendo a actualidade reportada a Maio de 2009) do DL 15/93, não comportava no seu seio o art. 40.º, bem como o art. 41.º, ambos revogados em 2000, pelo art. 28º da Lei 30/2000, de 29-11, ressalvado o cultivo – “excepto quanto ao cultivo” – no que ao 1.º respeita.

VI - A verdade é que a republicação teve em vista a revogação que havia sido operada no que ao art. 41.º respeita, que deu como revogado, mas outrotanto não fez, como seria normal, em relação ao art. 40.º. Com efeito, no texto republicado, o há mais de sete anos defunto art. 40.º, ressalvado o cultivo, está presente. Esta norma não poderia ter sido republicada, porque já não existia, só fazendo sentido a republicação do que vigente está. Não se trata, porém, de renascimento de uma qualquer Fénix, nem de um especialíssimo caso de represtinação.

VII - Aliás, a norma apresentada, tal como o é, nunca existiu. Como facilmente se apreende, trata-se de uma cópia falhada da anterior redacção (no fundo a originária, constante da versão primeira do DL 15/93, com a rectificação operada pela Declaração de Rectificação n.º 20/93, in DR, Suplemento, de 20-02-93), em que as condutas previstas no âmbito do consumo eram para além do cultivo, restrito a plantas, a detenção e a aquisição, reportadas estas a plantas, substâncias e preparações, ou seja, foram omitidas as condutas de detenção e aquisição de produtos estupefacientes.

VIII - A republicação é uma operação de conteúdo técnico que não tem, em si, subjacente uma deliberação normativa, pelo que não se pode atribuir à republicação de uma norma uma vontade deliberada de repor [no caso que nos ocupa, de modificar] a sua disciplina.

IX - A republicação de diplomas está prevista no chamado Decreto Formulário, mais concretamente no art. 6.º, n.º 2, da Lei 74/98, de 11-11 (Lei sobre a publicação, identificação e formulário dos diplomas), preceito intocado na 1ª alteração operada pela Lei 2/2005, de 24-01 e alterado pela Lei 26/2006, de 30-06, que introduziu o n.º 3 e passou a prever a republicação de forma mais abrangente e detalhada.

X - A republicação efectuada só podia ter o alcance de consagrar, introduzindo no seio do diploma, as modificações constantes do mesmo, oferecendo com a incorporação a panorâmica integral e certeira da lei nova emergente da alteração operada, conferindo maior acessibilidade à leitura do texto, e nunca outras alterações.

XI - O acórdão do STJ de 03-06-09, proc. n.º 21/08.5GAGDL.S1-5ª, tomou posição sobre a republicação, defendendo que a modificação do art. 40.º do DL 15/93, de 22-01, na citada republicação, não pode ter qualquer repercussão no recurso, dizendo, a final: “O art. 3.º da Lei 18/2009, de 11-05, não tem ele mesmo qualquer conteúdo normativo. A republicação do DL 15/93, de 22-01, que esse art. 3.º anuncia, é um acto organizativo que se não propõe obviamente redefinir o direito, e simplesmente tornar mais acessível o texto da lei.” XII - Já posteriormente a esse acórdão e 40 dias após a vigência da citada Lei, foi publicada uma rectificação – Declaração de Rectificação n.º 41/2009, in DR...

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