Acórdão nº 00465/08.2BEPRT de Tribunal Central Administrativo Norte, 01 de Março de 2010

Magistrado ResponsávelDrº Carlos Luís Medeiros de Carvalho
Data da Resolução01 de Março de 2010
EmissorTribunal Central Administrativo Norte

Acordam em conferência na Secção de Contencioso Administrativo do Tribunal Central Administrativo Norte: 1.

RELATÓRIO A… e M…, devidamente identificados nos autos, inconformados, vieram interpor recurso jurisdicional da decisão do TAF do Porto, datada de 27.10.2008, que julgou aquele TAF incompetente em razão da matéria, absolvendo da instância a R.

“METRO DO PORTO, SA”.

Formulam os aqui recorrentes nas respectivas alegações (cfr. fls. 131 e segs.

- paginação processo suporte físico tal como as referências posteriores a paginação salvo expressa indicação em contrário) as seguintes conclusões que se reproduzem: “...

  1. Os autores intentaram a presente acção no Tribunal Administrativo e Fiscal do Porto dado o facto da Ré, se tratar de uma Sociedade Anónima de capitais exclusivamente públicos, a quem foi atribuída pelo Estado a concessão de exploração em regime de serviço público e de exclusivo, de um sistema de metro ligeiro na área metropolitana do Porto, sendo nos termos do n.º 1 do art. 3.º do DL 558/99 de 17/12 considerada uma Empresa Pública, 2.ºE sendo portanto o Tribunal administrativo e Fiscal do Porto competente para a presente acção.

  2. Dado que os autores residiam na casa n.º 1 da Rua …, na Póvoa de Varzim desde 1984, 4.º Tendo passado posteriormente a aí residir com três filhas que lhes nasceram na em questão, casa n.º 1 da Rua … Póvoa de Varzim, de nomes C… de 18 anos de idade, A… de 15 anos idade e A… de 12 anos de idade.

  3. Casa essa que era constituída por dois quartos, uma cozinha e uma casa de banho exterior, e que se encontrava já em degradação, 6.º Sendo que os AA. haviam feito com o senhorio J… Herdeiros um contrato de arrendamento verbal, pelo que pagavam os AA. então 200$00 por mês.

  4. Tendo passado a pagar 400$00 por mês em 1/1/2000, passando posteriormente a pagar dois euros, resultantes da mudança do escudo para euros, 8.º Renda que era paga em dinheiro ao senhorio e na casa deste sita na Praça do Almada da Póvoa de Varzim, sendo que não passava o senhorio qualquer recibo.

  5. Acrescendo referir que os AA. tinham um contrato de electricidade com a EDP do qual pagavam a luz mensalmente conforme recibos que juntos à P.I., 10.º Sendo de referir que além da casa n.º 1 onde os autores residiam existiam ainda as casas n.ºs 2, 3, 4 e 5 todas elas habitadas.

  6. Sucede que nos primeiros dias de Março a Ré Metro do Porto SA, na sequência de um processo de expropriação, foi demolir a casa onde residiam os autores, para o efeito de aí passar o Metro do Porto, 12.º Tendo também a Ré procedido à demolição das restantes casas n.ºs 2, 3, 4 e 5, 13.º Tendo então o autor sido informado que a Ré indemnizara todos os moradores das restantes casas n.ºs 2, 3, 4 e 5, por virtude da demolição operada, e designadamente a moradora da casa 2 M….

  7. Sendo que a referida demolição da casa n.º 1, obrigou os AA. a saírem da referida casa em 4/3/2005 e a transportarem os seus haveres para o local onde actualmente residem, passando a pagar € 250,00 mensais, conforme documento junto à P.I..

  8. De salientar que os AA. escreveram através do seu mandatário ao Metro do Porto em 7/4/2006 uma carta registada com aviso de recepção a solicitar uma indemnização pelo facto dos autores terem sido obrigados a deixarem o locado (casa n.º 1 da Rua …), tendo então junto como comprovativo da sua residência um recibo de electricidade, conforme documento junto à P.I..

  9. Ao que a Ré respondeu por carta de 28/11/2007 que apurou o contrato de electricidade havia sido celebrado pelos AA em 14/8/2000 e rescindido por estes em 4.3.2005 e que a parcela em causa não tinha desde 2000/2001 nenhum arrendatário, 17.º Tendo ainda o Metro do Porto SA na referida carta decidido não considerar o A. marido como arrendatário da parcela PE-NM-519.

  10. Sendo que em 14/1/2008 escreveram de novo os AA. à Ré através do seu mandatário, uma carta registada com aviso de recepção, na qual rectificam a data em que foram os AA. desapossados da casa onde residiam na Rua … casa n.º 1, ou seja no início de Março de 2005 e não em Junho de 2005 como por lapso indicaram, sendo que logo nessa data rescindiram o contrato de electricidade em 4/3/2005 face à demolição operada.

  11. Ao que a Ré de novo e por carta datada de 29/1/2008 informou não considerar o A. como arrendatário da parcela PE-NM-519.

  12. Assim resulta evidente que os AA. residiam há mais de 20 anos na casa n.º 1 da Rua … da Póvoa de Varzim, e que essa mesma casa foi demolida pela Ré, 21.º E ainda que, além dessa casa existiam à data da demolição ainda as casas n.ºs 2, 3, 4 e 5 casas essas pelas quais a Ré se responsabilizou pagando as respectivas indemnizações, 22.º Só não o tendo feito aos AA..

  13. Razão porque se impõe que a Ré indemnize os AA. na quantia de € 50.000,00 quantia idêntica à indemnização que a Ré deu a cada um dos restantes moradores das casas 2, 3, 4 e 5.

  14. Sendo que ao ficarem os AA. desapossados da casa onde viviam há mais de 20 anos e sendo obrigados a ir residir para outra casa de renda muito superior ficaram prejudicados na quantia de € 50.000,00 que ora se solicitam.

  15. Para além de que não cumpriu a Ré todas as regras legais que deveria ter cumprido quando da demolição, pois que a Ré disse ao A. marido que não tinha nada a ver com ele.

  16. Ora o Metro do Porto SA trata-se de uma Entidade Pública, pelo que compete aos Tribunais administrativos dirimir o presente litígio e não aos Tribunais civis como a Douta Sentença Recorrida aponta, violando os arts. 2.º, 4.º e 10.º, n.º 2 do CPTA.

  17. Já que o Acto de demolição praticado pelo Metro do Porto SA foi um acto público e não privado, porque praticado enquanto no exercício do poder público.

  18. Sendo os Tribunais Administrativos competentes para dirimir a presente acção e designadamente o Tribunal a quo, conforme arts. 2.º, 4.º e 10.º, n.º 2 do CPTA …”.

Pugna pela revogação da decisão julgando-se competente aquele Tribunal.

A R., aqui ora recorrida, uma vez notificada apresentou contra-alegações (cfr. fls. 144 e segs.

) nas quais sustenta a improcedência do recurso e manutenção do julgado, sem todavia haver formulado quaisquer conclusões.

O Ministério Público (MºPº) junto deste Tribunal notificado nos termos e para efeitos do disposto no art. 146.º do CPTA não emitiu qualquer pronúncia (cfr. fls. 159 e segs.

).

Dispensados os vistos legais foram os autos submetidos à Conferência para julgamento.

  1. DELIMITAÇÃO DO OBJECTO DO RECURSO - QUESTÕES A APRECIAR Cumpre apreciar e decidir as questões colocadas pelos recorrentes, sendo certo que, pese embora por um lado, o objecto do recurso se acha delimitado pelas conclusões das respectivas alegações, nos termos dos arts. 660.º, n.º 2, 664.º, 684.º, n.ºs 3 e 4 e 690.º, n.º 1 todos do Código de Processo Civil (CPC) “ex vi” arts. 01.º e 140.º do CPTA, temos, todavia, que, por outro lado, nos termos do art. 149.º do CPTA o tribunal de recurso em sede de recurso de apelação não se limita a cassar a sentença recorrida, porquanto ainda que declare nula a sentença decide “sempre o objecto da causa, conhecendo de facto e de direito”, pelo que os recursos jurisdicionais são “recursos de ‘reexame’ e não meros recurso de ‘revisão’” (cfr. J.C. Vieira de Andrade in: “A Justiça Administrativa (Lições)”, 9.ª edição, págs. 453 e segs.

    ; M. Aroso de Almeida e C.A. Fernandes Cadilha in: “Comentário ao Código de Processo nos Tribunais Administrativos”, 2.ª edição revista, págs. 850 e 851, nota 1; Catarina Sarmento e Castro em “Organização e competência dos tribunais administrativos” - “Reforma da Justiça Administrativa” - in: “Boletim da Faculdade de Direito Universidade de Coimbra - Stvdia ivridica 86”, págs. 69/71).

    As questões suscitadas resumem-se, em suma, em determinar se a decisão judicial recorrida ao julgar verificada a excepção dilatória de incompetência em razão da matéria e ao absolver a R. da instância enferma de erro de julgamento, ofendendo o disposto nos arts. 02.º e 04.º do ETAF (e não do “CPTA” como é referido certamente por lapso pelos AA. nas alegações de recurso) e 10.º, n.º 2 do CPTA [cfr. alegações e demais conclusões supra reproduzidas].

  2. FUNDAMENTOS 3.1.

    DE FACTO Para a apreciação do objecto do presente recurso tem-se em conta o seguinte quadro factual: I) Os AA., aqui recorrentes, interpuseram no TAF do Porto acção administrativa comum, sob a forma ordinária, contra a R. “METRO DO PORTO, SA”, peticionando a condenação da mesma a “… pagar aos AA. uma indemnização em razão da expropriação, desapossamento e demolição da casa n.º 1 da Rua … da Póvoa de Varzim onde os AA. residiam desde 1984 na quantia de € 50.000,00 …”, pelos fundamentos vertidos no articulado inicial inserto a fls. 03 a 08 dos autos e cujo teor aqui se dá por reproduzido; II) Na contestação apresentada pela R. foi deduzida defesa por excepção (incompetência material do TAF, erro na forma processo, ilegitimidade, prescrição) e por impugnação (cfr. fls. 71 e segs. dos autos cujo teor aqui se dá por reproduzido); III) Conclusos os autos veio nos mesmos a ser proferida a decisão judicial ora objecto de recurso a julgar procedente a excepção dilatória de incompetência em razão da matéria, absolvendo a R. da instância (cfr. fls. 124 e segs. dos autos cujo teor aqui se dá por reproduzido).

    3.2.

    DE DIREITO Considerada a factualidade supra fixada importa, agora, entrar na análise dos fundamentos do presente recurso jurisdicional.

    π3.2.1. DA DECISÃO JUDICIAL RECORRIDA O TAF do Porto absolveu a R. da instância por entender que nos termos, nomeadamente, dos arts. 01.º, 04.º, 37.º, n.º 2...

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