Acórdão nº 0228/09 de Supremo Tribunal Administrativo (Portugal), 01 de Março de 2010

Magistrado ResponsávelJOÃO BELCHIOR
Data da Resolução01 de Março de 2010
EmissorSupremo Tribunal Administrativo (Portugal)

Acordam em conferência na Secção de Contencioso Administrativo do Supremo Tribunal Administrativo (STA): I. RELATÓRIO B…, com os demais sinais dos autos, propôs no Tribunal Administrativo de Círculo de Lisboa, Acção Comum contra o Estado Português, pedindo a condenação do Réu (R.) a pagar ao Autor a quantia de 34.400.000$00 (152.000€) e a que viesse a ser liquidada em execução de sentença, acrescida de juros legais contados desde a citação até integral pagamento ou, em alternativa, a condenação do R. Estado Português, a entregar ao autor o Lote 12, completamente livre e desocupado e sem quaisquer ónus, responsabilidades ou encargos.

Após as partes terem apresentado a contestação, réplica e a tréplica o tribunal a quo proferiu o despacho de fls. 240-241, através do qual (i) desatendeu parcialmente a réplica, pois que, “de acordo com o artº 502º, nº 1, do Código de Processo Civil, à contestação pode o autor responder na réplica, se for deduzida alguma excepção e somente quanto à matéria desta”, e (ii) indeferiu a questão da “(in)admissibilidade da contestação”.

Inconformado o A. interpôs recurso para este STA.

Por despacho de fls. 249, aquele tribunal admitiu o recurso, “processado como de agravo, a subir com o primeiro que depois deste haja de subir imediatamente, e com efeitos devolutivo…”.

Prosseguindo os autos seus termos, pela sentença de fls. 299-325, o Tribunal Administrativo de Círculo de Lisboa julgou procedente a excepção de caso julgado quanto ao pedido de indemnização formulado contra a actuação do Tribunal Judicial de Vila Franca de Xira, bem como no que respeita ao pedido de condenação do Estado na entrega do lote de terreno designado por lote 12, e, em consequência, absolveu o réu Estado Português da instância.

Julgou ainda improcedente por não provada a presente acção, quanto ao pedido de condenação do Estado Português a pagar ao autor uma indemnização com fundamento na actuação da Conservatória do Registo Predial de Vila Franca de Xira e, em consequência, absolveu o réu do pedido.

Recorre o autor da sentença, vindo, assim, interpostos dois recursos – PRIMEIRO, atinente ao referido despacho e SEGUNDO, respeitante à sentença.

Quanto ao PRIMEIRO RECURSO, o A. apresentou as seguintes conclusões: “Primeira O R. ESTADO não está isento de custas, uma vez que a digna Procuradora da República age em sede de representação, não actuando em nome próprio.

Segunda A opção legislativa vai no sentido de equiparação do ESTADO aos CIDADÃOS quando o ESTADO enquanto Colectividade é demandante ou demandado civilmente (art° 2º/1/a/ do CCJ.) Terceira Ora, o ESTADO não juntou o documento comprovativo do prévio pagamento da taxa de justiça inicial por não ter procedido de facto ao seu pagamento, a que devia ter procedido.

Quarta Deste modo, a contestação do Réu deve ser desentranhada dos autos, por desatempada e por não ter procedido nos termos legais à autoliquidação da taxa de justiça inicial, situação que é inconstitucional por violar o princípio da “igualdade de armas” ou da “igualdade de meios” consagrado no art° 6º da Convenção Europeia, no art° 8° da Lei Fundamental e no art° 2°/1/a/ do CCJ.

Quinta O ESTADO deve dar o exemplo da autoliquidação das custas, que hoje representam um absurdo “riquismo à Americana” num País de Terceiro Mundo como é Portugal! Sexta O A. pagou a taxa de justiça cível em 7.7.04 e o ESTADO foi citado de imediato para contestar a presente acção, o que só veio a acontecer em 2.11.04, isto é, fora do prazo legal de 30 dias indicado no art° 486°/1/ do CPC, que a decisão impugnada interpretou errada e inconstitucionalmente, conforme já foi sobejamente expendido nas presentes alegações.

Sétima Os referidos Capítulos I. IV, para além de integrarem matéria de resposta às excepções deduzidas na contestação e assim se enquadrarem no regime do art° 205°/1/ do CPC, servem também de base a um recurso de amparo directamente para o Tribunal Constitucional porque estão a ser violados os direitos fundamentais do cidadão ora A.”.

O Estado Português contra-alegou, tendo formulado as seguintes conclusões: “1. O recurso interposto do despacho que indeferiu a pretensão do recorrente no sentido do desentranhamento da contestação do R. dirige-se efectivamente ao despacho que, ao abrigo do disposto no art.° 486, n.° 4 do C. P. Civil, concedeu ao R. prorrogação de prazo para contestar. Porém, 2. De acordo com o disposto no n.° 6 do mesmo preceito tal despacho é irrecorrível, pelo que, nesta parte, o recurso não deveria ter sido admitido. De todo o modo, 3. São infundadas, não passando de meras conjecturas e considerações desprovidas de qualquer comprovação nos autos e suporte factual, as asserções produzidas pelo recorrente como suporte do alegado juízo de inconstitucionalidade norma do n.° 4 do art.° 486 do C. P. Civil, ou seja, a desnecessidade de informações a obter pelo M.P. e a possibilidade de obter as de que necessitava – segundo o recorrente o Proc. 1522/93 de Vila Franca de Xira - em 24 horas; 4. Além de que não é ao recorrente que cabe avaliar da necessidade ou desnecessidade de obtenção de informação pela contra-parte para organização da sua defesa, nem lhe caiba pronunciar-se à cerca da organização da mesma, o recorrente olvida que o recurso à prorrogação de prazo para contestar (aliás não integralmente aproveitado) consagrado na norma em causa foi fundamentalmente determinado pela sua atitude ao ocultar deliberadamente a existência do mencionado processo com as inerentes dificuldades na sua identificação e obtenção. De resto, 5. O princípio da igualdade não funciona apenas na vertente formal e redutora da igualdade perante a lei; implica do mesmo passo a aplicação de direito igual, o que pressupõe a averiguação e valorização casuística da diferença de modo que recebam tratamento semelhante os que se encontram em situações semelhantes e diferenciado os que se achem em situações legitimadoras da diferenciação.

6. Dito de outro modo o direito a um “processo equitativo” não se basta com uma igualdade aritmética, antes exige que a lei, na oferta de iguais meios de defesa dos direitos das partes, tenha construído um modelo que permita, também, de uma forma adequada e equilibrada, uma defesa eficaz das perspectivas antagónicas que se confrontam no processo.

7. É o que acontece com o art.° 486, n.° 4 do C. P. Civil que não sofre de qualquer inconstitucionalidade, não violando o princípio da igualdade das armas enquanto elemento inerente à noção de processo equitativo perante um tribunal.

8. Trata-se, tão somente (a possibilidade de prorrogação de prazo para contestar aí consagrada), de uma faculdade reconhecida ao Ministério Publico, quando actua em representação do Estado, do mesmo modo que é reconhecida actualmente no n° 5 do preceito em causa a qualquer outro réu e ao seu mandatário, quando ocorram motivos ponderosos que dificultem anormalmente a elaboração da defesa.

9. Distinção que tem razão material e objectiva bastante, assente na diferente natureza da representação assumida pelo M. P. quando actua em representação do Estado, e no reconhecimento das maiores dificuldades e delongas, que são óbvias, que, quando em comparação com um mandatário normal, enfrenta para, obtenção dos elementos necessários à elaboração da defesa do seu representado, mais não pretendendo, afinal, do que assegurar, quanto ao M.P. e nos demais casos previstos no n.° 5, a igualdade real de armas dos sujeitos processuais.

10. Acresce que independentemente da conformidade constitucional do preceito invocado, - que todavia, não enferma de qualquer inconstitucionalidade - uma vez produzidos os efeitos de decisão que concedeu ao R. prorrogação de prazo para contestar, não poderiam tais efeitos ser posteriormente destruídos abalando as expectativas do R. relativamente ao prazo de que dispunha para contestar, 11. Sob pena de ser, neste caso, violada a garantia constitucional do acesso aos tribunais nas suas dimensões de direito a uma tutela efectiva e de proibição da indefesa, consagrado no art° 20º da C.R.P., e no princípio da tutela da confiança ínsito no princípio de Estado de Direito democrático.

12. A isenção de custas, compreendendo a taxa de justiça inicial, reconhecida ao Estado, e a várias outras entidades, pelo art.° 2° da Tabela de Custas (DL 42150, 12.2.59), e pelo art.° 2°, n.° 1 al. a), do C. C. Judiciais, aprovado pelo DL 224-A/96, de 26.11, aplicável no caso vertente, não contende com o princípio da igualdade de armas ou de meios pois que em nada restringe o direito de acesso aos tribunais, por parte do A., ora recorrente, e em nada onera ou diminui os seus direitos processuais, 13. Acresce que, a perfilhar-se entendimento diverso tal não conduziria ao desentranhamento da contestação mas à notificação do R. para proceder ao pagamento da taxa de justiça inicial acrescida da taxa sancionatória, em conformidade com o disposto nos art.°s 28° do C.C.J. e 41.° da Tabela das Custas, regime de que o A. amplamente beneficiou; 14. Nos capítulos I e IV da réplica apresentada o A. não responde a qualquer excepção deduzida na contestação, pelo que, tendo a réplica por função unicamente responder à matéria de excepção (ou reconvenção) que tiver, e se tiver, sido deduzida na contestação, bem andou a decisão recorrida ao considerar não escritos os aludidos capítulos da réplica.

15. Nessa parte, como no demais, a decisão recorrida limitou-se a fazer correcta interpretação e aplicação do direito aplicável, não merecendo qualquer censura, pelo que deve ser integralmente mantida e confirmada”.

Quanto ao SEGUNDO RECURSO, o A. formulou as seguintes conclusões: “Primeira A 1ª Instância não analisou criteriosamente os conceitos básicos do ESTADO (em sentido amplo) e o ESTADO (os seus organismos).

Segunda Entre a Jurisdição Comum e a Jurisdição Administrativa não operada a questionada excepção dilatória de caso julgado, porque foi o próprio TJ Vila Franca de Xira que remeteu o A.

para o competente Tribunal Administrativo para...

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