Acórdão nº 376/10.1TBLNH.L1.S1 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 29 de Janeiro de 2019

Magistrado ResponsávelCATARINA SERRA
Data da Resolução29 de Janeiro de 2019
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)

ACORDAM NO SUPREMO TRIBUNAL DE JUSTIÇA I. RELATÓRIO Recorrentes: AA e BB Recorridos: CC e DD AA e BB instauraram acção declarativa com processo sumário em 15.06.2010 contra CC, pedindo: “a) Ser declarado e a R condenada a reconhecer o direito de propriedade dos AA sobre o prédio urbano, aludido nos arts. 1º a 5º deste articulado, livre de quaisquer ónus ou encargos; b) Ser a R condenada a abster-se da prática de qualquer acto que afecte o direito de propriedade dos AA sobre tal prédio ou que afecte ou diminua o seu gozo; c) Ser a R condenada a restituir /entregar aos AA, livre e devoluto de pessoas e bens, o prédio urbano aludido nos arts. 1º a 5º deste articulado; d) Ser a R condenada a pagar aos AA uma indemnização no montante de 30.000,00 € relativa ao prejuízo que lhes causou pela ocupação abusiva e com a respectiva privação do seu uso nos últimos 5 anos, acrescida dos juros legais contados a partir da citação da R até efectivo e integral pagamento; e) Ser a R condenada a pagar aos AA a quantia de 500,00 € por cada mês que decorrer desde apresente data até à entrega, livre e devoluta de pessoas e bens do mesmo prédio urbano, acrescida dos juros legais que se vencerem, em relação a cada uma das referidas quantias, a contar a partir do último dia da cada mês que sobrevier até efectivo e integral pagamento”.

A Ré contestou e reconveio, pedindo o reconhecimento do seu direito a ser indemnizada pelo valor das benfeitorias e ainda que adquiriu o prédio por usucapião, bem como a condenação dos autores por litigância de má fé.

Os autores responderam, reiterando que desconhecem a que título vem a Ré ocupando o prédio e pugnaram pela improcedência da reconvenção.

Realizada a audiência de discussão e julgamento, em 19.11.2017, foi proferida sentença (fls. 690 dos autos) em que se “julga a acção parcialmente procedente e improcedente a reconvenção e, em consequência: a) Se condenam os RR. a reconhecer o direito de propriedade dos AA. sobre o prédio urbano, situado em ..., composto de casa de habitação de r/c e 1º andar, com 95 m2, de pendência, com 61 m2, e logradouro com 460 m2, descrito sob o nº....da freguesia da … na Conservatória do Registo Predial da …; b) Se condena a R. a restituir aos AA. o prédio indicado em a); c) Se absolve a R. do mais peticionado; d) Se absolvem os AA. do pedido reconvencional; e) Não se condenam os AA. por litigância de má-fé; f) Se condena R. no pagamento das custas, tendo em conta que, conforme resulta do despacho de fls. 157 (refª. 986050), o valor da pretensão indemnizatória aduzida pelos AA, não foi considerado para efeitos de fixação do valor da acção/ causa”.

Inconformada, apelou a Ré para o Tribunal da Relação de Lisboa, pugnando pela anulação da parte da sentença do tribunal a quo em que havia improcedido o seu pedido reconvencional, absolvendo os Autores de reconhecerem a aquisição por usucapião, a seu favor, do prédio em causa, substituindo-a por acórdão que condenasse os Autores a reconhecerem a aquisição por usucapião, a seu favor, do prédio em causa.

O Tribunal da Relação de Lisboa, decidiu, em Acórdão de 10.05.2018 (fls. 732 dos autos): “1 - julgar improcedente a acção absolvendo-se a apelada dos pedidos formulados na petição inicial; 2 - declarar que a apelante adquiriu por usucapião o direito de propriedade sobre o prédio urbano situado em ..., composto de casa de habitação de r/c e 1º andar, com 95 m2, de pendência, com 61 m2, e logradouro com 460 m2, descrito sob o nº....da freguesia da ... na Conservatória do Registo Predial da ...; 3 - manter o decidido na alínea e) do dispositivo da sentença recorrida; 4 - condenar os apelados nas custas, tendo em consideração o despacho de fls. 157 como referido na 2º parte da alínea f) do dispositivo da sentença recorrida”.

Irresignados, vieram, por seu turno, os Autores e Apelados interpor recurso de revista para o Supremo Tribunal de Justiça, pugnando pela revogação do Acórdão recorrido e, consequentemente, pela improcedência do pedido reconvencional formulado pela reconvinte.

As conclusões das alegações dos Recorrentes são as seguintes: “1.ª: A R aceitou a condenação da douta sentença proferida a reconhecer o direito de propriedade dos AA ora Recorrentes (al. a)), a restituir-lhes o prédio em causa nos presentes autos (al. b)), pois peticionou ao Venerando Tribunal da Relação apenas a anulação da decisão na parte em que improcedeu o pedido reconvencional (al. d)).

  1. : No recurso de apelação interposto sobre matéria de direito a apelante não deu cumprimento ao estipulado no art. 639º nº 2 als. a) e b) do CPC, na medida em que não indicou as normas jurídicas violadas, nem apontou o sentido em que no seu entender tais normas deveriam ser interpretadas e a este respeito não se pronunciou o acórdão em recurso; 3.º: Considerando que o Tribunal a quo não conheceu questão que devia apreciar e conheceu de outras de que não podia tomar conhecimento, o acórdão recorrido encontra-se ferido de nulidade, que expressamente se invoca para todos os devidos e legais efeitos - art.s 615º, nº 1, al. d), 666º e 674º, nº 1, al. c), todos do CPC.

  2. : Os AA. intentaram ação de reivindicação contra a R. invocando o seu direito de propriedade sobre o imóvel identificado em 1) dos factos provados (Podes transcrevê-los)[1].

  3. : Beneficiavam da presunção derivada do registo - artº 7º do C. R. Predial.

  4. : A R. reconveio, nos termos que se referiram no corpo destas alegações, alegando que estava na posse do imóvel desde 1980, e que entrou (ela e o marido) na mesma, após terem acordado com EE, com quem o ex-marido da reconvinte negociara a venda do imóvel e a quem os AA. concederam poderes para proceder à negociação e venda do imóvel, tendo-lhe entregado, após acordarem quanto à compra, a quantia de um milhão e duzentos e cinquenta mil escudos, não se tendo realizado a acordada escritura de compra e venda, por ter caducado a procuração que os AA. alegadamente haviam conferido ao referido EE, pedindo ao Tribunal que reconhecesse que adquirira o imóvel por usucapião.

  5. : Além de ter resultado provado que « …» - factos provados de 19) -, dessa alegação da R. apenas se provou que «…» - factos provados de 10).

  6. : Para fazer valer o seu direito, a R. invocou o “corpus” sobre o identificado prédio ao longo dos anos, mas não o “animus” em que baseia o seu pedido reconvencional.

  7. : O Tribunal de 1ª Instância, com base na factualidade provada e na fundamentação acima transcrita, considerou, como não provado qualquer dos elementos, quer o objetivo (corpus), quer o subjetivo (animus) da posse.

  8. : Por sua vez, o acórdão recorrido, com base na mesma factualidade, julgou procedente a reconvenção e reconheceu ter a recorrida adquirido, por usucapião, o direito de propriedade sobre o imóvel, por ter entendido que dos factos provados resultava que os atos por ela praticados sobre o imóvel se mostravam preenchidos os referidos dois elementos da posse, recorrendo, no que respeita ao elemento psicológico, à presunção judicial (artº 349º do CC) e legal (artº 1252º, nº 2, do CC).

  9. : No nosso entendimento, foi a decisão da 1ª Instância, que fez correta subsunção dos factos provados aos preceitos legais atinentes à posse e, como tal, deve ser repristinada por esse Colendo Tribunal.

  10. : Efetivamente, apesar de a recorrida exercer sobre o imóvel o poder de facto a que aludem os factos provados de 12) a 18), esse poder de facto é o de mera detentora ou possuidora precária, desde logo porque o imóvel lhe foi entregue por quem não tinha poderes para dele dispor, já que os AA. são os titulares inscritos sobre o imóvel e eles não conferiram poderes a EE para negociar a venda do imóvel - factos provados de 1) e 19) -, o mesmo é dizer que ela não provou o elemento objetivo da posse.

  11. : Assim sendo, os atos praticados pela recorrida sobre o imóvel, enquanto mera detentora ou possuidora precária, não poderiam levar a que ela adquirisse por usucapião, a propriedade do imóvel, a não ser que lograsse provar ter havido inversão do título de posse - artº 1290º do Código Civil -, o que nem sequer alegou, pelo que não podia, como não logrou, provar essa inversão.

  12. : Mas, também falece o elemento subjetivo da posse, ou animus.

  13. : Na verdade, tendo a recorrida alegado que «A Ré vem exercendo publicamente os direitos inerentes à propriedade, cuidando e zelando do imóvel» - artº 50º da contestação -, tal factualidade não consta dos factos provados, pois a mesma não os logrou provar, pelo contrário, demonstrou convictamente em sede de audiência de julgamento que sabia não ser a proprietária.

  14. : Daí que, não provada tal factualidade, que foi submetida a discussão probatória, não podia o acórdão recorrido, com recurso a presunção judicial ao abrigo do disposto no art. 349º do Código Civil...

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