Acórdão nº 77/19 de Tribunal Constitucional (Port, 05 de Fevereiro de 2019

Magistrado ResponsávelCons. Gonçalo Almeida Ribeiro
Data da Resolução05 de Fevereiro de 2019
EmissorTribunal Constitucional (Port

ACÓRDÃO Nº 77/2019

Processo n.º 1033/2018

3ª Secção

Relator: Conselheiro Gonçalo de Almeida Ribeiro

Acordam, em conferência, na 3ª secção do Tribunal Constitucional

I. Relatório

1. Nos presentes autos, vindos do Supremo Tribunal de Justiça, em que é reclamante A., Unipessoal, Ld.ª e reclamada B., Ld.ª, a primeiro reclamou, ao abrigo do artigo 76.º, n.º 4, da Lei n.º 28/82, de 15 de novembro (Lei do Tribunal Constitucional, referida adiante pela sigla «LTC»), do despacho de 19 de outubro de 2018, daquele Tribunal, que não admitiu o recurso para o Tribunal Constitucional.

2. O ora reclamante, na qualidade de autora, intentou ação de anulação da deliberação arbitral proferida por tribunal arbitral, relativa a litígio envolvendo contratos de subarrendamento celebrados entre as partes.

Através de acórdão datado de 25 de janeiro de 2018, o Tribunal da Relação de Lisboa julgou a ação improcedente.

Inconformada, a ora reclamante interpôs recurso de tal acórdão para o Supremo Tribunal de Justiça, encerrando a sua alegação com as seguintes conclusões (aperfeiçoadas):

«(…)

18. Uma vez mais, apenas se enunciam princípios gerais sobre a nulidade da falta de fundamentação, sem que o Acórdão recorrido justifique e fundamente, em concreto, por que considera a Sentença Arbitral fundamentada.

19. Ou seja, novamente, o próprio Acórdão recorrido não se encontra fundamentado, no sendo inteligível.

20. Dessa forma, também neste ponto, o Acórdão recorrido viola a alínea c) do n.º 1 do artigo 615.º do CPC, que determina que as sentenças têm que ser inteligíveis e viola também o n.º 1 do artigo 205.º Constituição da República Portuguesa, que determina que as sentenças têm que ser fundamentadas.

21. Também neste ponto, a Sentença Arbitral deveria ter sido anulada pelo Tribunal da Relação de Lisboa por falta de fundamentação na parte relativa ao não conhecimento da nulidade da Cláusula 11.4. (cláusula penal) do Contrato de Subarrendamento Lote 5, nos termos da subalínea vi) da alínea a) do nº 3 do artigo 46.º e do n.º 3 do artigo 42.º da LAV e do nº 1 do artigo 205.º Constituição da República Portuguesa.

22. Conclui-se que a Sentença Arbitral devia ter sido anulada pelo Tribunal a quo por dois fundamentos: (i) falta de fundamentação na parte relativa à interpretação das Cláusulas 11.4. (cláusulas penais) do Contrato de Subarrendamento Lote 5 e do Contato de Subarrendamento Lote 7 e (ii) na parte relativa ao não conhecimento da nulidade da Cláusula 11.4. (cláusula penal) do Contrato de Subarrendamento Lote 5, nos termos da subalínea vi) da alínea a) do n.º 3 do artigo 46.º e do nº 3 do artigo 42.º da LAV e do n.º 1 do artigo 205.º Constituição da República Portuguesa.

23. Dessa forma, o Acórdão recorrido não está fundamentado e não é inteligível, violando a alínea c) do n.º 1 da artigo 615.º do CPC, que determina que as sentenças têm que ser inteligíveis, e o n.º 1 do artigo 205.º Constituição da República Portuguesa, que determina que as sentenças têm que ser fundamentadas, violando também a subalínea vi) da alínea a) do n.º 3 do artigo 46.º, o n.º 3 do artigo 41º da LAV e o nº 1 do artigo 205.º Constituição da República Portuguesa, dado que o Acórdão Recorrido deveria ter anulado a Sentença Arbitral por falta de fundamentação na parte relativa à interpretação das Cláusulas 11.4. (cláusulas penais) do Contrato de Subarrendamento Lote 5 e do Contrato de Subarrendamento Lote 7 e na parte relativa ao não conhecimento da nulidade da Cláusula 11.4. (cláusula penal) do Contrato de Subarrendamento Lote 5.»

3. Através do acórdão recorrido, datado de 27 de setembro de 2018, o Supremo Tribunal de Justiça julgou improcedente o recurso, confirmando o acórdão recorrido.

Com interesse para os autos, pode ler-se em tal aresto:

«Da leitura da fundamentação do acórdão recorrido resulta evidente não ocorrer qualquer ambiguidade ou obscuridade que torne a decisão ininteligível pelo que não se verifica a alegada nulidade prevista no art. 615º, nº 1, alínea c), do CPC.

Quanto à alegada falta de fundamentação, segundo a jurisprudência constante deste Supremo Tribunal apenas ocorre havendo uma ausência total de fundamentação de facto ou de direito e não quando a fundamentação seja “meramente deficiente, medíocre ou errada” (cfr., entre muitos, o acórdão de 05/04/2016, proc. n.º 415/07.3TBMMV.C1.S1, consultável em sumários da jurisprudência cível, www.stj.pt).

No caso dos autos, a fundamentação do acórdão recorrido, ainda que sucinta, existe e apresenta-se como suficiente. Ainda que, porventura, possa ser incorreta, questão que corresponde afinal à questão subsidiária objeto do presente recurso.

Por ora, resta-nos concluir pela não verificação da alegada nulidade prevista no art. 615º, nº 1, alínea b), do CPC.

5. Quanto à questão do alegado erro de julgamento do acórdão recorrido ao não anular a sentença arbitral com fundamento em falta de fundamentação, formula a Recorrente, em síntese, a seguinte conclusão: “Conclui-se que a Sentença Arbitral deveria ter sido anulada pelo Tribunal a quo por dois fundamentos: (i) falta de fundamentação na parte relativa à interpretação das Cláusulas 11.4. (cláusulas penais) do Contrato de Subarrendamento Lote 5 e do Contrato de Subarrendamento Lote 7 e (ii) na parte relativa ao não conhecimento da nulidade da Cláusula 11.4. (cláusula penal) do Contrato de Subarrendamento Lote 5, nos termos da subalínea vI) da alínea a) do n.º 3 do artigo 46.° e do n.º 3 do artigo 42.º da LAV e do n.º 1 do artigo 205.° Constituição da República Portuguesa”.

Importa, assim, apreciar se a sentença arbitral padece de:

- Falta de fundamentação na parte relativa à interpretação das Cláusulas 11.4. (cláusulas penais) do Contrato de Subarrendamento Lote 5 e do Contrato de Subarrendamento Lote 7;

- Falta de fundamentação na parte relativa ao não conhecimento da nulidade da Cláusula 11.4. (cláusula penal) do Contrato de Subarrendamento Lote 5, nos termos da subalínea vI).

Está aqui em causa a possibilidade de anulação de sentença arbitral por falta de fundamentação, prevista no art. 46º, nº 3, alínea a), vi), conjugado com o art. 42º, nº 3, da Lei da Arbitragem Voluntária, aprovada pela Lei nº 63/2001, de 14 de dezembro (regime idêntico ao do art. 27º, nº 1, alínea d), conjugado com o art. 23º, nº 3, da Lei nº 31/86, de 29 de agosto).

Vejamos.

Percorrida a fundamentação do acórdão arbitral (de fls. 874 a 962) que a Recorrente pretende anular, constata-se que nele se conhece da interpretação e aplicação aos factos das cláusulas 11.4 do Contrato de Subarrendamento Lote 5 e do Contrato de Subarrendamento Lote 7 nas fls. 921-931 e 933-944 dos presentes autos (correspondentes, respetivamente, às págs. 96-115 e 119-142 do acórdão arbitral). Em tais páginas o tribunal arbitral apreciou, em termos lógicos, claros e consistentes, a dita questão da interpretação das Cláusulas 11.4. (cláusulas penais) do Contrato de Subarrendamento Lote 5 e do Contrato de Subarrendamento Lote 7, pelo que não ocorre o alegado vício de falta de fundamentação.

Quanto ao que a Recorrente qualifica, autonomizando-a da questão anterior, como sendo “Falta de fundamentação na parte relativa ao não conhecimento da nulidade da Cláusula 11.4. (cláusula penal) do Contrato de Subarrendamento Lote 5, nos termos da subalínea vI)”, analisado o acórdão arbitral, constata-se que, a fls. 931-933 (correspondentes às págs. 115-119 da decisão) e sob a epígrafe “Exceção de nulidade da cláusula 11.4, por violação de normas imperativas do regime do arrendamento urbano”, se enunciou a questão da alegada nulidade da dita cláusula 11.4 do Contrato de Subarrendamento Lote 5, começando por apreciar, em termos lógicos, claros e consistentes, da relevância da resolução da mesma questão para a decisão da causa, concluindo-se (a fls. 933, correspondente à pág. 119 do acórdão arbitral) pela sua irrelevância. Trata-se, por isso, de questão que fica prejudicada pela solução de questão anterior.

Tanto basta para considerar não padecer o acórdão arbitral, também nesta parte, do alegado vício de falta de fundamentação.

Assim sendo, conclui-se não se verificar erro de julgamento do acórdão recorrido ao decidir não padecer a sentença arbitral de falta de fundamentação.

6. Pelo exposto, julga-se o recurso improcedente, confirmando-se a decisão do acórdão recorrido.»

4. Foi então interposto o presente recurso de constitucionalidade, através de requerimento onde se pode ler o seguinte:

«A., Unipessoal, Lda., Recorrente, nos autos acima identificados, tendo sido notificada de Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 27 de setembro de 2018, que julgou improcedente o recurso de revista do Acórdão da Relação de Lisboa de 25 de janeiro de 2018 e confirmou o Acórdão recorrido, vem requerer a admissão de RECURSO PARA O TRIBUNAL CONSTITUCIONAL do citado Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 27 de setembro de 2018, ao abrigo do disposto na alínea b) do n.º 1 e do n.º 2 do artigo 70.º, na alínea b) do n.º 1 e do n.º 2 do artigo 72.º, no artigo 75.º e no artigo 75.º-A da Lei n.º 28/82, de 15 de novembro, a Lei da Organização, Funcionamento e Processo do Tribunal Constitucional (“LTC”), o qual deve subir imediatamente, nos próprios autos e com efeito devolutivo, nos termos do disposto no n.º 4 do artigo 78.º da LTC,

O que faz, nos termos e com os seguintes fundamentos:

I. ENQUADRAMENTO

A 18 de abril de 2017, a Recorrente interpôs, no Tribunal da Relação de Lisboa, uma ação de anulação da Sentença Arbitral proferida no Processo Arbitral ad hoc n.º 24/2015/AHC/AP, que correu termos no Centro de Arbitragem Comercial da Câmara de Comércio e Indústria Portuguesa, em que foi Demandante a B., Lda., e Demandada a ora Recorrente, tendo o...

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