Acórdão nº 2117/16.0T8PTM.E1 de Tribunal da Relação de Évora, 09 de Novembro de 2017

Magistrado ResponsávelM
Data da Resolução09 de Novembro de 2017
EmissorTribunal da Relação de Évora

Sumário: 1. Ocorrida a ruptura da união de facto, e na ausência de filhos do casal, a casa de morada de família deve ser atribuída de acordo as necessidades de cada um dos membros do casal, relevando a situação económica de cada um, a idade, o estado de saúde, a localização da casa relativamente ao local de trabalho, e a eventual disponibilidade de outra casa onde um deles possa residir; 2. Deve igualmente ser avaliada a adequação da casa às específicas necessidades de habitação de cada um dos membros do casal.

  1. Cessada a união de facto, cada um dos seus membros deve ajustar o seu modo de vida à sua situação económica, cabendo a cada um diligenciar pela obtenção de casa compatível com os seus rendimentos e a dimensão do seu agregado familiar.

  2. Concluindo-se que os dois membros da união de facto necessitam por igual da casa, haverá que dar predominância à condição de proprietário exclusivo que um deles tem sobre a casa.

Acordam os Juízes da 2.ª Secção Cível do Tribunal da Relação de Évora: No Juízo de Família e Menores de Portimão, (…) deduziu acção especial de atribuição da casa de morada da família contra (…), na qual, após oposição desta e inquirição das testemunhas arroladas, foi proferida sentença declarando que ambos viveram em união de facto entre 1988 e 2011, data em tal união cessou, e atribuindo a casa de morada de família ao Requerente, devendo a Requerida deixar a fracção livre e devoluta.

Inconformada, a Requerida recorre e remata com 78 conclusões prolixas, não efectivando uma autêntica síntese das suas alegações.

Entendendo-se, porém, que o Relator deve usar com parcimónia os poderes que lhe são conferidos pelo art. 639.º, n.º 3, do Código de Processo Civil, apenas se justificando o convite a completar, esclarecer ou sintetizar as conclusões, quando não for possível, de todo, a rápida e fácil compreensão das questões suscitadas e a sua fundamentação essencial, faremos a seguinte súmula das questões ali enunciadas: · impugnação da matéria de facto, devendo ser considerado que o Recorrido é proprietário de um veículo automóvel, que não passa todas as noites em casa mas sim noutro lugar e que é proprietário de um prédio rústico; · no aspecto jurídico, afirma ter maior necessidade de habitar na casa, porquanto está reformada e aufere uma pensão mensal na ordem dos € 400, enquanto o Recorrido trabalha e pode auferir mensalmente € 1.130, tendo assim maior facilidade em encontrar outro lugar onde habitar.

Termina pedindo que lhe seja atribuído o arrendamento da casa pelo prazo de cinco anos, renovável, e pela renda mensal de € 100,00, actualizável anualmente.

Na resposta sustenta-se a manutenção da decisão recorrida, argumentando-se, no essencial, que não ficou provado que a reforma da Recorrente fosse no valor de € 400,00, prova essa que deveria ter sido efectuada por documento, e que o Recorrido será o mais prejudicado com uma alteração da sua morada.

Corridos os vistos, cumpre-nos decidir.

Da impugnação da matéria de facto: Garantindo o sistema processual civil um duplo grau de jurisdição na apreciação da matéria de facto, como previsto no art. 640.º do Código de Processo Civil, continua a vigorar o princípio da livre apreciação da prova por parte do juiz – artigo 607.º, n.º 5, do mesmo diploma, ao dispor que “o juiz aprecia livremente as provas segundo a sua prudente convicção acerca de cada facto.” Deste modo, a reapreciação da prova passa pela averiguação do modo de formação dessa “prudente convicção”, devendo aferir-se da razoabilidade da convicção formulada pelo juiz da 1.ª instância, face às regras da experiência, da ciência e da lógica, da sua conformidade com os meios probatórios produzidos, sem prejuízo do poder conferido à Relação de formular uma nova convicção, com renovação do princípio da livre apreciação da prova[1].

Por outro lado, o art. 662.º, n.º 1, do Código de Processo Civil permite à Relação alterar a decisão proferida sobre a matéria de facto, se os factos tidos como assentes, a prova produzida ou um documento superveniente impuserem decisão diversa.

Trata-se de uma evolução em relação ao art. 712.º da anterior lei processual civil, consagrando uma efectiva autonomia decisória dos Tribunais da Relação na reapreciação da matéria de facto, competindo-lhes formar a sua própria convicção, podendo, ainda, renovar os meios de prova e mesmo produzir novos meios de prova, em caso de dúvida fundada sobre a prova realizada em primeira instância.

Deste modo, na reapreciação da matéria de facto o Tribunal da Relação deve lançar mão de todos os meios probatórios à sua disposição e usar de presunções judiciais para obter congruência entre a verdade judicial e a verdade histórica, não incorrendo em excesso de pronúncia se, ao alterar a decisão da matéria de facto relativamente a alguns pontos, retirar dessa modificação as consequências devidas que se repercutem noutra matéria de facto, sendo irrelevante ter sido esta ou não objecto de impugnação...

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