Acórdão nº 3716/17.9T9STB.E1 de Tribunal da Relação de Évora, 26 de Junho de 2018
Magistrado Responsável | JO |
Data da Resolução | 26 de Junho de 2018 |
Emissor | Tribunal da Relação de Évora |
Acordam os Juízes, em conferência, na Secção Criminal do Tribunal da Relação de Évora: I - RELATÓRIO No recurso de contra-ordenação nº 3716/17.9T9STB, que corre termos no Juízo Central Criminal de Setúbal (Juiz 4), em que é arguida “A…, S.A.”, por sentença, datada de 11 de janeiro de 2018, decidiu-se nos seguintes termos: “Atento o exposto, decide-se julgar totalmente improcedente o recurso e, em consequência, decido condenar a arguida pelo cometimento, na forma negligente, da contraordenação prevista e punida pelos artigos 1° e 11°, nº 1, alínea b), e 2, ambos do DL n.º 138/90, de 26/04, na coima única de €2.600,00 (dois mil e seiscentos euros).
Custas pela recorrente, que se fixam em 2 UC's (cfr. artigos 92°, 93°, n.º 3, a contrario, e 94° do DL n.° 433/82, de 27 de outubro, 513° e 514° do CPP)”.
* Dessa decisão foi interposto pela arguida o presente recurso, extraindo a arguida da motivação do recurso as seguintes (transcritas) conclusões: “1. Vem o presente recurso interposto da douta sentença proferida em 11 de janeiro de 2018, pela qual a ora Recorrente foi condenada no pagamento de coima no valor de €2.600,00, a título de negligência pela prática de contraordenação prevista e punida pelos arts. 1.° e 11.° do Decreto-Lei n.º 138/90 de 26 de abril, que consiste na falta de afixação de preços em todos os bens destinados à venda a retalho.
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A douta sentença recorrida incorreu em nulidade, nos termos do disposto no art. 379.°, n.º 1, al, c) do CPP, bem como em erro na interpretação e aplicação do Direito.
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Ao dar como provado o facto sob n.º 6, da matéria de facto (aqui se dá por reproduzido) incorreu o douto Tribunal a quo em nulidade por excesso de pronúncia, porquanto olhando à demais matéria de facto dada como provada, não se vislumbra em que medida se poderá imputar a infração objetivamente verificada a conduta negligente da Recorrente. Em momento algum, quer da acusação (aqui traduzida na decisão condenatória proferida pela ASAE), quer da douta sentença em crise se demonstrou, sequer se indiciou, que a falta de afixação de preços decorresse de ato praticado pela Recorrente ou por funcionário seu, sequer se identificando quem teria sido o agente da infração.
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Não podendo presumir-se que num estabelecimento aberto ao público, em que os clientes circulam livremente, mexem diretamente nos produtos sem intermediação de qualquer funcionário, onde é possível que as etiquetas de preços caiam pelo volume de afluência e constante movimentação de carrinhos de compras, paletes de mercadoria e um número diário de clientes na ordem de milhares, concluir que a ausência da etiqueta de preço se deveu a incúria da Recorrente. Tanto mais que o relatório fotográfico efetuado pela ASAE em sede de visita inspetiva e constante dos autos a fls. ... reflete uma realidade totalmente diferente aí se encontrando demonstrado à saciedade o cabal cumprimento que a Recorrente realiza do normativo de cuja violação se encontra condenada.
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Sem a identificação de alguém que tenha agido ou omitido dever de cuidado no cumprimento do normativo em apreço e que demonstração que essa pessoa era na verdade funcionário da Recorrente não poderá presumir-se que o incumprimento decorre da Recorrente.
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Ao adotar tal entendimento, o douto Tribunal a quo decidiu com base numa presunção e não num facto, o que em direito sancionatório não é permitido, sob pena de nulidade requerendo-se a declaração da mesma com as legais consequências.
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A douta sentença em crise incorreu em erro na interpretação e aplicação do Direito, concretamente do art. 7.°, n.º 2, do RGCO, no qual se determina que as pessoas coletivas serão sancionadas pelos factos praticados pelos seus órgãos societários no desempenho das suas funções e no interesse da pessoa coletiva. No caso sub judice, inexiste a identificação de quem foi o agente da infração, sendo a douta sentença omissa na identificação do órgão societário que tenha agido no âmbito das suas funções e no interesse da Recorrente.
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Ao presumir que a infração foi cometida por funcionário da Recorrente entende o douto Tribunal a quo que o art. 7.°, n.º 2, do RGCO deverá ser interpretado extensivamente, incluindo os funcionários da pessoa coletiva que ajam no cumprimento das suas funções e no interesse da pessoa coletiva.
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Jurisprudência há que entende em sentido claramente oposto à douta sentença sub judice, nomeadamente quando não se encontre determinada a relação entre o agente da infração e a pessoa coletiva. Entendimento que encontra acolhimento num caso como o dos presentes autos em que sequer há identificação do agente infrator. Neste sentido, o acórdão proferido, em 18 de março de 2015, pelo Venerando Tribunal da Relação de Coimbra, que teve como relatora a Desembargadora Alcina Costa Ribeiro, nos autos de processo n.º 304/14.5TBCVL.C1, disponível para consulta em www.dgsi.pt. (supra transcrito e que ora se dá por integralmente reproduzido).
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Em face do exposto, forçoso será concluir que a douta sentença recorrida incorreu em erro na interpretação e aplicação do art. 7.°, n.º 2, do RGCO, erro esse que urge retificar, revogando a douta sentença recorrida e, consequentemente, absolvendo a Recorrente.
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A douta sentença recorrida alterou, parcialmente, a decisão da ASAE, concretamente no que à imputação subjetiva da infração respeita, entendendo a infração cometida a título de negligência e não de dolo eventual. Não obstante, a douta sentença recorrida não determinou qualquer alteração da medida da coima mantendo integralmente o valor aplicado pela ASAE.
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A alteração de imputação subjetiva, importando uma valoração diversa quer da conduta da Recorrente, quer da gravidade da mesma conduta e das suas consequências sociais e económicas, teria necessariamente de encontrar eco numa diferente fixação da medida da coima, sob pena de se quedar inconsequente a diferenciação do juízo de censura associado aos conceitos de dolo e de negligência.
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Tanto mais que a douta sentença recorrida fundamenta a decisão de manutenção da medida da coima, entre outros, na obtenção de benefício económico por parte da Recorrente, o qual não se mostra demonstrado e do qual sequer há indícios. Termos em que se requer a redução da medida da coima em conformidade com a diferente imputação subjetiva decidida na douta sentença recorrida.
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Consequentemente, deverá a douta sentença recorrida ser revogada com as legais consequências.
Nestes termos, e nos mais de Direito que Vs. Exas. doutamente suprirão, deverá o presente recurso ser considerado procedente por provado e, em consequência, ser a douta sentença recorrida declarada nula e de nenhum efeito, ou, caso assim se não entenda, ser a Recorrente absolvida, ou a medida da coima reduzida em consequência da alteração da imputação subjetiva”.
* Notificada da interposição do recurso, a Exmª Magistrada do Ministério Público junto da primeira instância apresentou resposta, pugnando para que seja negado provimento ao recurso e mantida a decisão recorrida.
Neste Tribunal da Relação, o Exmº Procurador-Geral Adjunto emitiu douto parecer, concluindo que o recurso deve ser julgado improcedente.
Cumprido o disposto no artigo 417º, nº 2, do Código de Processo Penal, a recorrente apresentou resposta, reafirmando o já alegado na motivação do recurso.
Efetuado o exame preliminar, determinou-se que fosse o presente recurso julgado em conferência.
Colhidos os vistos legais e tendo os autos ido à conferência, cumpre apreciar e decidir.
II - FUNDAMENTAÇÃO 1 - Delimitação do objeto do recurso.
Como é jurisprudência pacífica, o âmbito do recurso é delimitado pelas conclusões da respetiva motivação (artigo 412º, nº 1, do C. P. Penal).
Assim, e seguindo literalmente as conclusões extraídas pela recorrente da motivação do recurso, as questões a apreciar por este tribunal são as seguintes: 1ª - Nulidade da sentença recorrida, por excesso de pronúncia.
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- Erro de Direito, por falta de identificação de quem foi o agente concreto da infração.
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- Montante da coima aplicada.
2 - A decisão recorrida.
É do seguinte teor (integral) a sentença revidenda: “1. Relatório: A Autoridade de Segurança Alimentar e Económica (ASAE) condenou a sociedade "A …, S.A.", …, no pagamento de coima no valor de €2.600,00 (dois mil...
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